quarta-feira, 30 de março de 2011

Pepe Escobar: Os que já estão lucrando com a invasão da Líbia




por Pepe Escobar, Asia Times Online
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu via Viomundo

Mentiras, hipocrisias e agendas ocultas. Eis os temas dos quais o presidente Barack Obama não tratou, ao explicar aos EUA e ao mundo a sua doutrina para a Líbia. A mente se perde, vacila, ante tais e tantos buracos negros que cercam essa esplêndida guerrinha que não é guerra (é “ação militar com escopo limitado por prazo limitado”, nos termos da Casa Branca) – complicados pela inabilidade do pensamento progressista, que não consegue condenar, ao mesmo tempo, tanto a crueldade do governo de Muammar Gaddafi quanto o “bombardeio humanitário” dos exércitos de EUA-anglo-franceses.
A Resolução n. 1.973 do Conselho de Segurança da ONU operou como cavalo de Tróia: permitiu que o consórcio EUA-anglo-francês – e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) – se convertesse em força aérea da ONU usada para apoiar um levante armado. Aparte nada ter a ver com proteger civis, esse arranjo é absoluta e completamente ilegal em termos da legislação internacional. O objetivo final aí ocultado, que até as crianças subnutridas da África já viram, mas que ninguém assume ou confessa, é mudar o governo na Líbia.
O tenente-general Charles Bouchard do Canadá, comandante da OTAN para a Líbia, que insista o quanto quiser, repetindo que a missão visa exclusivamente a proteger civis. Pois os “civis inocentes” lá estão, dirigindo tanques e disparando Kalashnikovs, brigada de farrapos que, de fato, são soldados em guerra civil. O problema é que, agora, a OTAN foi convertida em força aérea daquele exército, seguindo as pegadas do consórcio EUA-franco-inglês.
Ninguém diz que a “coalizão de vontades” que hoje combate o governo líbio é coalizão de apenas 12 vontades (das 28 vontades representadas na OTAN), mais o Qatar. Isso absolutamente nada tem a ver com a “comunidade internacional”.
O veredicto sobre a zona aérea de exclusão ordenada pela ONU só será conhecido depois que houver governo “rebelde” na Líbia e terminar a guerra civil (se terminar rapidamente). Só então se poderá saber se, algum dia, os Tomahawks e bombas-em-geral foram algum dia justificados; o porquê de os civis de Cyrenaica terem sido “protegidos”, ao mesmo tempo em que os civis em Trípoli foram Tomahawk-eados; quem, afinal eram os ditos “rebeldes” ditos “salvos”; se a coisa toda, desde o início, em algum momento deixou de ser ilegal; como aconteceu de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU ser usada para acobertar golpe de Estado (digo, “mudança de regime”); como o caso de amor entre “revolucionários” líbios e o Ocidente pode acabar em divórcio sangrento (lembrem o Afeganistão!); e quais os atores ‘ocidentais’ que lucrarão mais, imensamente, com a exploração de uma nova Líbia – seja unificada seja balkanizada.
Pelo menos por hora, é muito fácil identificar os que já estão lucrando.
O Pentágono
Roberto “O Supremo do Pentágono” Gates disse no fim-de-semana, na maior cara dura, que só há três regimes repressivos em todo o Oriente Médio: Irã, Síria e Líbia. O Pentágono se encarrega agora do elo mais fraco – a Líbia. Os outros dois sempre foram figuras chaves da lista dos neoconservadores, de governos a serem derrubados. Arábia Saudita, Iêmen, Bahrain etc. são exemplos de democracia.
Como nessa guerra de prestidigitação “agora se vê, agora não se vê”, o Pentágono obra para lutar não uma, mas duas guerras. Começou pelo AFRICOM – Comando dos EUA na África –, criado no governo George W Bush, reforçado no governo Obama, e rejeitado por legiões de governos, intelectuais, organizações de direitos humanos e especialistas africanos. Agora, a guerra está em transição, passando para as mãos da OTAN, que é o mesmo que a mão pesada do Pentágono sobre seus asseclas europeus.
É a primeira guerra africana do AFRICOM, comandada agora pelo general Carter Ham diretamente de seu quartel-general nada-africano em Stuttgart. O AFRICOM é fraude, como diz Horace Campbell, professor de estudos afro-norte-americanos e ciência política na Syracuse University: fundamentalmente, é uma frente de operação comercial, para que empresas contratadas pelos militares nos EUA – Dyncorp, MPRI e KBR possam fazer negócios na África. Os estrategistas dos EUA que muito se beneficiaram na porta giratória que se criou entre as privatizações e as guerras estão adorando a intervenção na Líbia, como magnífica oportunidade para dar credibilidade político-militar ao AFRICOM-business.”
Os Tomahawks do AFRICOM-EUA atingiram também – metaforicamente – a União Africana (UA) a qual, diferente da Liga Árabe, não se deixa facilmente comprar pelo ocidente. As petro-monarquias do Golfo, todas, festejaram o bombardeio; Egito e Tunísia, não.
Só cinco países africanos não são subordinados ao AFRICOM-EUA: Líbia, Sudão, Costa do Marfim, Eritreia e Zimbabwe.
A OTAN
O plano master da OTAN é dominar o Mediterrâneo, como lago da OTAN. Sob essa “ótica” (no jargão do Pentágono), o Mediterrâneo é infinitamente mais importante hoje, como teatro de guerra, que o “AfPak”.
Apenas três, das 20 nações do ou no Mediterrâneo não são da OTAN ou aliadas de seus programas “de parceria”: a Líbia, o Líbano e a Síria. O Líbano já está sob bloqueio da OTAN desde 2006. Atualmente, já há bloqueio também contra a Líbia. Os EUA – via OTAN – já praticamente conseguiram fazer do círculo, o quadrado. Que ninguém se engane: a Síria é o próximo alvo.
A Arábia Saudita
Excelente negócio! O rei Abdullah vê-se livre de Gaddafi, seu arqui-inimigo. A Casa de Saud – do modo abjeto que é sua marca registrada – rende-se ao atraso, para beneficiar o ocidente. A atenção da opinião pública ganha objeto alternativo, para distrair-se: os sauditas invadem o Bahrain, para esmagar movimento popular legítimo, pacífico, pró-democracia.
A Casa de Saud vendeu a ficção segundo a qual “a Liga Árabe” teria votado unanimemente a favor da zona aérea de exclusão. É mentira.
Dos 22 membros da Liga Árabe, só 11 estiveram presentes à sessão que aprovou a “no-fly zone”; seis desses são membros do Conselho de Cooperação do Golfo, gangue da qual a Arábia Saudita é o cão-chefe.
A Casa de Saud teve de aplicar uma chave-de-braço em três. A Síria e a Argélia estavam contra a no-fly zone contra a Líbia. Tradução: só nove, dentre 22 países árabes, votaram a favor de implantar-se a zona aérea de exclusão na Líbia.
Agora, a Arábia Saudita já pode até mandar que o presidente do Conselho de Cooperação do Golfo Abdulrahman al-Attiyah declare sem piscar que “o sistema líbio perdeu a legitimidade”. Sobre a Casa de Saud e os al-Khalifas do Bahrain… não faltará quem os indique para o Hall da Fama da Assistência Humanitária.
O Qatar
O país que hospedará a Copa do Mundo de Futebol de 2022 sabe, sim, amarrar negócios. Seus Mirages já ajudavam a bombardear a Líbia, enquanto Doha preparava-se para vender aos mercados ocidentais o petróleo da Líbia. O Qatar foi o primeiro país a reconhecer o governo dos “rebeldes” líbios como único governo legítimo; fê-lo um dia depois de ter fechado o negócio do varejão do petróleo líbio no ocidente.
Os “rebeldes”
Sem desrespeitar as importantes aspirações democráticas do movimento da juventude líbia, fato é que o grupo mais bem organizado da oposição a Gaddafi é a Frente Nacional de Salvação da Líbia – há anos financiada pela Casa de Saud, pela CIA e pela inteligência francesa. O “rebelde’ “Conselho Nacional do Governo de Transição” é praticamente a velha Frente Nacional, acrescida de alguns militares desertores. A “coalizão” “protege” essa “elite” de “civis inocentes”, hoje.
Nessa linha, o “Conselho Nacional do Governo de Transição” acaba de nomear novo ministro das finanças: Ali Tarhouni, economista formado nos EUA. Foi ele quem disse que vários países ocidentais há lhe haviam dado créditos, sob garantias do fundo soberano líbio; e que os britânicos lhe deram acesso a 1,1 bilhão de dólares do dinheiro de Gaddafi.
Significa que o consórcio EUA-anglo-francês – e agora a OTAN –, só terão de pagar a conta da compra das bombas. No que tenha a ver com histórias da imundície das guerras, essa é impagável: o ocidente está usando o dinheiro da Líbia para pagar um bando de líbios oportunistas interessados em derrubar o governo da Líbia. França e Inglaterra gozam, de tanto que amam as bombas. Nos EUA, os neoconservadores devem estar se estapeando, lá entre eles, de inveja: por que o vice-secretário de Defesa Paul Wolfowitz não teve a mesma ideia, para o Iraque, em 2003?
A França
Oh la la, a coisa bem poderia servir de substrato para romance proustiano. A coleção estrela da primavera francesa nas passarelas parisienses é o show de moda-fantasia de Nicolas Sarkozy: uma zona aérea de exclusão na Líbia, rebordada com ataques-acessórios pelos jatos Mirage/Rafale. Todo o show e pirotecnia foi concebido por Nouri Mesmari, chefe de protocolo de Gaddafi, que desertou e fugiu para a França em outubro de 2010. O serviço secreto italiano vazou para jornalistas e jornais selecionados os detalhes da deserção e da fuga. O papel do DGSE, serviço secreto francês, está mais ou menos explicado no e-jornal (só para assinantes) Maghreb Confidential.
A verdade é que o coq au vin da revolta de Benghazi já estava cozinhando em fogo baixo desde novembro de 2010. Os galos-estrelas foram Nouri Mesmari; Abdullah Gehani, coronel da Força Aérea da Líbia; e o serviço secreto francês. Mesmari era chamado “o WikiLeak líbio”, porque vazou quase todos os segredos militares de Gaddafi. Sarkozy adorou, furioso desde que Gaddafi cancelou gordos contratos para comprar aviões Rafales (para substituir os Mirages líbios que, hoje, estão sendo bombardeados por Mirages franceses) e usinas nucleares francesas.
Isso explica por que Sarkozy, que estava tão animadinho, posando de neoliberador de árabes, foi o primeiro líder europeu a reconhecer “os rebeldes” (para tristeza de muitos, na União Europeia) e o primeiro a bombardear as forças de Gaddafi.
Vê-se aí também exposto o papel do desavergonhado filósofo e autopropagandista Bernard Henri-Levy, que se esfalfou enchendo a mídia mundial com notícias de que ele telefonara a Sarkozy, de Benghazi, e assim despertou o filão humanitário no coração do presidente. Ou Levy é o otário da hora, ou é uma conveniente cereja “intelectual” acrescentada ao já assado bolo-bomba contra Gaddafi.
Ninguém detém Sarkozy, o Terminator. Já avisou todos os governos árabes que estão na mira para serem bombardeados ao estilo Líbia se espancarem manifestantes. Até já avisou que a Costa do Marfim seria “a próxima”. Bahrain e Iêmen, claro, não têm com o que se preocuparem. Quanto aos EUA, mais uma vez os EUA apoiam golpe militar (não deu certo com o Omar “Sheikh al-Tortura” Suleiman no Egito. Talvez funcione na Líbia).
Al-Qaeda
O coringa sempre conveniente renasce. O consórcio EUA-franco-inglês – e agora também a OTAN – outra vez combatem aliados à al-Qaeda, dessa vez representada pela al-Qaeda no Maghreb (AQM).
Abdel-Hakim al-Hasidi, líder dos “rebeldes” líbios – que combateu ao lado dos Talibã no Afeganistão – confirmou, com detalhes, para a mídia italiana, que recrutara pessoalmente “cerca de 25” jihadistas na região de Derna no leste da Líbia para combater os EUA no Iraque; e que agora “eles estão na linha de frente em Adjabiya”.
Isso, depois de o presidente do Chad Idriss Deby ter dito que a al-Qaeda no Maghreb assaltou arsenais militares na Cyrenaica e provavelmente já têm alguns mísseis terra-ar. No início de março, a al-Qaeda no Mahgreb apoiou publicamente os “rebeldes”. O fantasma de Osama bin Laden deve estar rindo como o gato Cheshire de Alice; mais uma vez, conseguiu por o Pentágono a trabalhar para ele.
Os privatizadores da água
Poucos no ocidente sabem que a Líbia – como o Egito – repousa sobre o Sistema Aquífero do Arenito Núbio [ing. Nubian Sandstone Aquifer]: é um oceano de extremamente valiosíssima água doce. Ah, sim, sim, essa guerra de prestidigitação “agora se vê, agora não se vê”, é crucial guerra pela crucial água.
O controle do aquífero é patrimônio sem preço: além da água para beber, o prestígio para dominar: a EUA-França-Inglaterra “resgatando” valiosos recursos naturais, das mãos dos árabes “selvagens”.
É um Aquedutostão – enterrado fundo no coração do deserto. São 4.000 quilômetros de dutos. É o Maior Projeto de Rio Criado pelo Homem [ing. Great Man-Made River Project (GMMRP)], que Gaddafi construiu por 25 bilhões de dólares sem tomar emprestado nem um centavo nem do FMI nem do Banco Mundial (mais um exemplo de barbárie de Gaddafi, que não se deve deixar vazar para o resto do mundo subdesenvolvido).
O sistema GMMRP fornece água para Trípoli, Benghazi e todo o litoral da Líbia. A quantidade de água disponível, estimada por especialistas, é o equivalente à toda a água que corre pelo Nilo por 200 anos. Comparem-se esses números os números das chamadas “Três Irmãs” – empresas Veolia (ex-Vivendi), Suez Ondeo (ex-Generale des Eaux) e Saur – as empresas francesas que controlam mais de 40% do mercado global de água.
Todos os olhos devem-se focar, atentos, para ver se algum dos aquedutos da GMMRP serão bombardeados. Cenário altamente possível, caso sejam bombardeados, é que imediatamente comecem a ser negociados os gordos contratos de “reconstrução” – que beneficiarão a França. Será o passo final para privatizar toda aquela – até o momento gratuita – água. Da doutrina do choque, chegamos à doutrina da água.
Essa lista dos que ganham com a guerra está longe de ser completa – ainda não se sabe quem ficará nem com o petróleo nem com o gás natural da Líbia. Enquanto isso, o show (das bombas) tem de continuar. Não há business como o guerra-business.

Servidores divergem sobre adesão a órgão de diálogo com governo criado por Tarso

Rachel Duarte no Sul21

Ramiro Furquim/Sul21

Uma questão de interpretação, um entrave ou um erro político e conceitual. Estas foram algumas opiniões das entidades que representam os servidores públicos gaúchos convidadas a integrar o Comitê de Diálogo Permanente (Codipe), sobre a metodologia de participação proposta pelo executivo estadual. A primeira reunião do comitê ocorreu nesta terça-feira (29) e provocou um intenso debate sobre a oferta do governo de que as entidades assinem um “Termo de Adesão” ao Codipe, a fim de que efetivem participação no espaço criado para discutir as necessidades dos servidores públicos.
Das 22 entidades presentes na reunião, 15 já aderiram ao termo proposto pelo governo estadual. O documento conceitua o Comitê de Diálogo Permanente como um espaço de negociação com os servidores públicos e o governo estadual. As entidades contrárias ao termo, como a presidente do Cpers, Rejane de Oliveira, defendem que o termo está equivocado e fere a autonomia dos sindicatos. “Estamos (Cpers) dispostos a participar deste espaço, mas não assinaremos termo de adesão. Isto é um gesto que fere a constituição e a história do sindicalismo”, disse.
Ramiro Furquim/Sul21

O Cpers foi a primeira entidade a fazer uso da palavra e também a reiterar sua posição ao final da reunião, contestando a posição final da secretária Stela sobre considerar a discussão sobre o termo “adesão” um entrave ao processo de construção do comitê. Rejane apresentou um parecer jurídico à secretária e aos demais colegas de sindicato, argumentando a necessidade de as entidades rejeitarem a adesão.
Segundo o parecer do Cpers, o Decreto nº 47.897 – que instalou o Codip em 16 de março de 2011 -, é inaceitável do ponto de vista político e democrático. “Não podem os sindicatos aderir organicamente a uma estrutura de governo e muito menos, dela participando, se submeter a um programa de conteúdo, sob pena de estarem, neste ato, renunciando a sua independência e autonomia. Além de um erro conceitual e político, o Decreto, com seu programa associado ao ‘Termo de Adesão’, concretizam uma forma de intervenção do estado na organização sindical”, diz o texto apresentado pelo Cpers. Entidades como o Sindicaixa-RS e o Centro de Auditores do Tribunal de Contas do Estado também se manifestaram contra a assinatura do termo.
Por outro lado, entidades como a Associação dos Oficiais de Nível Superior da Brigada Militar (ASOFBM) e o Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas e de Fundações Estaduais (Semapi), afirmaram acreditar na proposta do Codipe e consideraram uma contradição não participar de espaços de diálogo promovidos pelo Governo do Estado. “Aderir é aceitar o convite. Não significa que vamos concordar com tudo que será dito. Eu não poderia me furtar desta possibilidade de aceitar esta oportunidade que está sendo oferecida pelo governo. A minha impressão é que cada um tem uma leitura diferente sobre o que está sendo propondo pelo Codipe”, afirmou o tenente-coronel José Carlos Ricardi Guimarães, presidente da ASOFBM.

“Não queremos instrumentalizar sindicatos”

Ramiro Furquim/Sul21

Na linha de frente com os ex-colegas de Cpers, a secretária da Administração e dos Recursos Humanos, Stela Farias, coordenou os trabalhos por parte do Executivo. A reunião que deveria definir as câmaras temáticas para encaminhar as reivindicações prioritárias dos servidores acabou sendo um momento de o  governo ouvir as posições das entidades convidadas para aderir ao Codipe. “A proposta do governo é a explicitada e construída em campanha. Nós não queremos enganar ninguém nem utilizar este espaço para instrumentalizar os sindicatos”, disse, ressaltando sua intimidade com as causas dos sindicalistas. E reforçou: “As questões levantadas por representantes de algumas categorias, como o Cpers, podem ser perfeitamente ajustadas. O Codipe não será um espaço para represar demandas das categorias, pelo contrário, nós queremos produzir acordos, a partir de diálogos”, disse.
Sobre a retirada do “Termo de Adesão”, Stela disse que irá analisar o termo jurídico apresentado pelo Cpers e a comissão técnica que criou o comitê poderá refazer a metodologia de participação das entidades. “Nós entendemos que é perfeitamente possível descompatibilizar o termo de adesão e fazer uma carta convite”, falou.
As sugestões, críticas e apontamentos feitos pelas entidades de classe dos servidores deverão ser analisadas em reunião com as secretarias que compõem o Comitê no início da próxima semana e as conclusões apresentadas na segunda quinzena de abril em nova reunião do Codipe.

O Codipe

Ramiro Furquim/Sul21

As discussões do Codipe serão mensais e ocorrerão em dois espaços: um mais amplo, que vai tratar de temas como concepção do Estado e dos serviços públicos, a relação dos servidores com o Estado, o programa do Governo eleito e sua relação com os servidores; o outro espaço, funcional e de gestão de pessoas, que terá câmaras temáticas e setoriais. As câmaras temáticas vão discutir temas como Saúde do Trabalhador, Previdência, Capacitação continuada, Convenção 151 – OIT, Modernização e tecnologia e diretrizes para planos de cargos, carreiras e salários. Já as setoriais vão tratar de assuntos específicos dos quadros de pessoal da Segurança, Educação, Saúde, Quadro Geral e técnicos-científicos.
O Codipe abrange os servidores e empregados públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações, autarquias, empresas públicas e sociedades de economia Mista. Do governo estadual, integram o Codipe as secretarias da Fazenda, Educação, Saúde, Segurança Pública, Casa Civil, Planejamento, Secretaria-Geral de Governo e Procuradoria Geral do Estado.
Antes das inscrições dos interessados em falar, a secretária Stela explicou por uma hora as intenções do comitê. Segundo ela, o órgão tem poder deliberativo, mas não decidirá nada por voto e sim por consenso. Os encaminhamentos tirados dos encontros mensais do Codipe deverão ocorrer por consenso entre as partes e serão registrados em ata para encaminhamento ao gabinete do governador. “A ideia é que a reunião aconteça em uma segunda-feira, na tarde de expediente dos servidores. Precisamos montar os temas e definir as câmaras. Serão seis representantes de categorias por câmara temática”, sugeriu a secretária.

Recuperar a confiança

O discurso coletivo da maioria das entidades presentes na primeira reunião do Codipe foi de que é preciso construir uma relação de confiança entre o novo governo e os servidores públicos. Todos reclamaram da falta de valorização e espaço de participação no governo de Yeda Crusius (PSDB) e depositam elevadas expectativas com o governo de Tarso Genro (PT). Porém, defenderam a legitimidade de suas entidades e os pleitos de suas categorias.
Ramiro Furquim/Sul21

O grupo de servidores recordou o que considerou como “uma experiência traumática”: o Grupo de Assessoramento Estadual para Política de Pessoal (GAE) criado no governo Yeda. Segundo o representante do Centro de Auditores do Tribunal de Contas do Estado, Amauri Peruso, o órgão era um instrumento do gabinete da ex-governadora e pouco contribuía com as necessidades dos servidores. “Era um inibidor dos anseios dos servidores. Não produzia resultados, mas contenções. A própria Secretaria de Administração nunca teve peso”, disse.
Ciente do desafio para com a gestão e o funcionalismo, a secretária de Administração e Recursos Humanos, Stela Farias, propôs ao governador a participação dos servidores na definição do Plano Plurianual Participativo (PPA). E salientou que, apesar de não definir as câmaras temáticas do Codipe no encontro, já tem em vista alguns encaminhamentos com setores do funcionalismo. “Os empregados dos serviços públicos estaduais em fundações, autarquias e empresas de economia mista estão em plena database. Então não temos saída. Mesmo sem tempo para fechar acordo com as entidades, nós vamos ter que chamar individualmente as setoriais destes servidores e debater suas demandas salariais”, explicou.

KADAFI E AS POTÊNCIAS OCIDENTAIS



Frei  Betto 



As potências ocidentais,  lideradas pelos EUA, botam a boca no trombone em defesa dos direitos humanos  na Líbia. E as ocupações genocidas do Iraque e do  Afeganistão?
Quem dobra os  sinos por um milhão de mortos no Iraque? Quem conduz à Corte Internacional de Justiça  da ONU os assassinos confessos no Afeganistão, os responsáveis por crimes de  lesa-humanidade? Por que o Conselho de Segurança da ONU não  diz uma palavra contra os massacres praticados contra os povos iraquiano,  afegão e palestino?

O interesse dos EUA e da União  Europeia não é a defesa dos direitos humanos na Líbia. É assegurar o controle  de um território que produz 1,7 milhão de barris de petróleo por dia, dos  quais depende a energia de países como Itália, Portugal, Áustria e Irlanda.

O caso do Iraque é exemplar: os EUA inventaram as jamais  encontradas “armas de destruição em massa” de Saddam Hussein para exercer o  controle sobre um país que é o segundo maior produtor mundial de petróleo –  2,11 milhões de barris por dia, só superado pela Arábia Saudita. E possui uma  reserva calculada em 115 bilhões de barris. Soma-se a essa riqueza o fato de  ocupar uma posição geográfica estratégica, já que faz fronteiras com Arábia  Saudita, Irã, Jordânia, Kwait, Síria e Turquia.

No dia 20  de março, completou-se oito anos que os EUA e parceiros invadiram o Iraque sob  o pretexto de “estabelecer a democracia”. O governo de Maliki está longe do  que possa ser considerado uma democracia. Em fevereiro último, milhares de  iraquianos foram às ruas para reivindicar trabalho, pão, eletricidade e água  potável. O exército os reprimiu brutalmente, com mortes, detenções arbitrárias  e sequestro de ativistas. Nenhuma potência mundial clamou em favor do direitos  humanos nem sugeriu que Maliki responda perante tribunais internacionais.  
A ONU é, hoje, lamentavelmente, uma instituição desacreditada.  Os EUA a utilizam para aprovar resoluções que justifiquem seu papel de polícia  global a serviço de um sistema injusto e excludente. Quando a ONU aprova  resoluções que contrariam a Casa Branca – como a condenação do bloqueio a Cuba  e da opressão dos palestinos – ela simplesmente faz ouvidos moucos.  

Kadafi está no poder desde 1969. São 42 anos de ditadura. Por  que os EUA e a União Europeia jamais falaram em derrubá-lo? Porque, apesar de  seus atentados terroristas, era conveniente manter ali um déspota que atraía  investimentos estrangeiros e impedia que chegassem à Europa os imigrantes  ilegais da África subsaariana, ou seja, todos os países ao sul do deserto de  Saara.

Agora que o povo líbio clama por liberdade, os EUA ocupam  posições estratégicas no Mediterrâneo. Barcos anfíbios, aviões e helicópteros  são transportados pelos navios de guerra US Ponce e US Kearsarge. A União  Europeia, por sua vez, não está preocupada com a democracia na Líbia, e sim em  evitar que milhares de refugiados desembarquem em seus países combalidos pela  crise financeira.

Temem ainda que a onda libertária que assola os  países árabes, produtores de petróleo, elevem o preço do produto, onerando  ainda mais as potências ocidentais, que lutam com dificuldade para vencer a  crise do sistema capitalista.

Fala-se em estabelecer uma “zona de  exclusão aérea” na Líbia. Isso significa bombardear os aeroportos do país e  todas as aeronaves ali estacionadas. E exige o envio de porta-aviões às costas  africanas. Em suma: uma nova frente de guerra.

O fato é que a  Casa Branca foi surpreendida pelo movimento libertário no mundo árabe e,  agora, não sabe como proceder. Era mais cômodo prosseguir cúmplice dos regimes  autoritários em troca de fontes de energia, como gás e petróleo. Mas como  opor-se ao clamor por democracia e evitar o risco de o governo de tais países  cair em mãos de fundamentalistas?

Kadafi chegou ao poder com amplo  apoio popular ao derrubar o regime tirânico do rei Idris, em 1969. Mordido  pela mosca azul, com o tempo esqueceu todas a promessas libertárias que  fizera. Em 1974, valendo-se da recessão mundial, expulsou as empresas  ocidentais, expropriou propriedades estrangeiras, e promoveu uma série de  reformas progressistas que fizeram melhorar a qualidade de vida dos  líbios.

Finda a União Soviética, a partir de 1993 Kadafi  deu boas-vindas aos investimentos estrangeiros. Após a queda de Saddam,  temendo ser a bola da vez, assinou acordos para erradicar armas de destruição  em massa e indenizou vítimas de seus atentados terroristas. Tornou-se feroz  caçador de Osama Bin Laden. Pediu ingresso no FMI, criou zonas especiais de  livre comércio, abriu o país às transnacionais do petróleo e eliminou os  subsídios aos produtos alimentícios de primeira necessidade. Iniciou o  processo de privatização da economia, o que fez o desemprego aumentar cerca de  30% e agravar a desigualdade social.

Kadafi mereceu elogios de  Tony Blair, Berlusconi, Sarkozy e Zapatero. Como ao Ocidente, desagradou-lhe a  derrubada dos governos tirânicos  da Tunísia e do Egito. Agora, atira  contra um povo desarmado que aspira vê-lo fora do poder.

Para as  potências ocidentais, Kadafi tornou-se uma carta fora do baralho. O problema,  agora, é como derrubá-lo de fato sem abrir uma nova frente de guerra e tornar  a Líbia um “protetorado” sob controle da Casa Branca. Se Kadafi resistir, Bin  Laden pode ganhar mais um aliado ou, no mínimo, um concorrente em matéria de  ameaças terroristas.

O discurso do Ocidente é a democracia. O  interesse, o petróleo. E para o capitalismo, só isto interessa: privatizar as  fontes de riqueza. Enquanto a lógica do capital predominar sobre a da  liberdade, o Ocidente jamais conhecerá verdadeiras democracias, aquelas nas  quais a maioria do povo decide os destinos da nação.

Frei  Betto (Belo Horizonte, 25 ago 1944) é escritor, autor de Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura  militar brasileira (Rocco), entre outros  livros.

Cubadebate inaugura página em português


Com versões das Reflexões de Fidel Castro e artigos de atualidade sobre diversos assuntos nacionais e internacionais, o site Cubadebate inaugurou, nesta terça-feira (29), sua página em português, que funciona no endereço http://pt.cubadebate.cu/

Esta página se une a uma versão em inglês e outra em francês, de uma série de páginas em pelo menos oito línguas que o Cubadebate começou a publicar, como antessala para uma nova reformulação do site, que está na internet desde 5 de agosto de 2003.

Não se trata de um espelho mimético do site em espanhol. Cubadebate em português reproduz alguns dos materiais mais populares do site original e os serviços da chamada web 2.0, com canais próprios no Facebook e Twitter, além de manter abertas suas páginas às opiniões dos internautas. Também possui um canal com informações do Brasil, com a conta Cubadebate_bra.

Serviço:
Cubadebate em Português: http://pt.cubadebate.cu/
Twitter: Cubadebate_pt y Cubadebate_bra
Facebook: Cubadebate.pt

Paz para um lutador incansável

Brizola Neto no tijolaco


No momento triste da morte de José Alencar, vice-presidente de Lula, nos dois mandatos, reproduzo as palavras ditas sobre ele, em janeiro deste ano, pela Presidenta Dilma Rousseff, que expressam melhor que qualquer texto que eu escreva aqui, na correria, o significado desta figura que conquistou admiração e respeito de todos, independente de ideologias, pelo seu amor ao país, por sua discreta sinceridade e, sobretudo, por sua tinhosa luta com uma doença que inevitavelmente o derrotaria, mas jamais conseguiu dobrar sua alma e seu otimismo.
“Queria cumprimentar o nosso vice-presidente da República e homenageado hoje, meu querido José Alencar. Ele hoje é, de fato, a figura do protocolo mais importante aqui presente. Importante para cada um de nós, brasileiros e brasileiras que convivemos com ele, e para todos os brasileiros e brasileiras que ao longo de todos esses anos assistiram, vivenciaram a luta tenaz de um homem que não só sobrevive com honradez, vive com energia mas, sobretudo, dá um exemplo de dignidade que deve ser seguido e que é um exemplo para cada um de nós. (…)
Eu estou aqui hoje como presidenta da República, mas, sobretudo, como cidadã brasileira, para homenagear uma pessoa que todos nós sabemos que tem uma profunda dimensão humana. E que todos nós, todo nosso povo, aprendemos a respeitar e admirar.(…)
Eu acho que a gente deve reconhecer a importância deste homem, que saiu de baixo, que construiu um império econômico no Brasil, mas que não perdeu jamais o seu compromisso com a soberania do país e, sobretudo, com o resgate de milhões de brasileiros da pobreza e da miséria. Eu tenho certeza de que, neste momento, nós estamos homenageando um exemplo para as novas gerações do nosso país, no sentido de que o Brasil produz pessoas com essa dimensão, com essas características e com esse caráter.
Ele foi, sem dúvida nenhuma, um grande vice-presidente, ao lado de um grande presidente. Os dois presidentes que não tinham diploma universitário mostraram um compromisso com a educação, como diz o nosso querido presidente Lula, “nunca dantes visto na história deste país”. Lá de Minas, lá do fundo do nosso estado, ele trouxe também aquela sabedoria cotidiana de perceber que o país devia, podia e ia crescer, e foi um parceiro nessa trajetória.
Eu experimentei junto com o José Alencar essa extraordinária experiência, que foi participar do governo do presidente Lula, e convivi diariamente com ele, com a sua generosidade, mas com a sua verve também, com o seu espírito crítico, com a sua capacidade de ajudar cada um de nós e de, junto conosco, construir esse grande desafio que era fazer o Brasil voltar a crescer e, sobretudo, fazer com que o Brasil assumisse uma posição em relação ao conjunto das nações, e, sobretudo, encontrasse aqui dentro do Brasil um lugar para todos os brasileiros e brasileiras.”
Um beijo, José Alencar, muito fraterno, e um grande abraço”.
Que José de Alencar esteja como disse hoje o seu médico, Raul Cutait, um pouco mais cedo:
“O presidente está em uma fase se preparando para descansar. Ele está dormindo, sem dores, confortável com a família dele.”

Renato Rabelo rende homenagens a José Alencar, "um patriota"


Em nota de cinco parágrafos divulgada nesta terça-feria (29), data da morte do ex-presidente da república José Alencar, o presidente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Renato Rabelo, rende homenagens a esse que era considerado antes de tudo  "um patriota", como define o texto. Confira a íntegra do documento:

José Alencar, destacado defensor do desenvolvimento nacional

A Nação brasileira perdeu um de seus ardorosos defensores com o falecimento de José Alencar. Se tivéssemos de defini-lo numa só palavra, sem relutar, proclamaríamos: um destacado patriota, um eminente brasileiro. Uma personalidade de relevo que ajudou o Brasil a adentrar e a percorrer um tempo novo.

Na campanha de 2002, convicto de que o Brasil precisava de mudanças, aceitou disputar as eleições presidenciais como candidato a vice-presidente da República na chapa encabeçada por Luiz Inácio Lula da Silva. Este fato foi importante para alargar a base de apoio de Lula e viabilizar o engajamento de setores do empresariado na campanha. Desde então, Alencar se torna um grande aliado de Lula, um amigo leal, um coadjuvante valioso sem o qual é difícil compreender o êxito do protagonista. Por isto, Lula ao saber da morte de Alencar assim se referiu sobre o elo que unia os dois: “era uma relação de irmãos e companheiros”.

Quando tomamos conhecimento da notícia de sua morte fomos tomados pela mesma tristeza que se abateu sobre o povo brasileiro que o respeitava e a quem ele dedicou o melhor de si. José Alencar era um amigo do PCdoB, amizade que tive a honra de cultivar, como presidente do Partido, em variados encontros e contatos e, também, nas solenidades que ele prestigiou a legenda dos comunistas. Em junho último, em Brasília, na Convenção Nacional do PCdoB que oficializou o apoio à então candidata Dilma Rousseff ele, mesmo adoentado, fez questão de atender ao nosso convite. Naquela oportunidade, mais uma vez disse que às vezes lhe perguntavam: como ele, um grande empresário, tinha um relacionamento político fluente com o Partido Comunista? Alencar, na tribuna de nossa Convenção, disse que essa amizade aparentemente inusitada vinha das afinidades e coincidências entre seus posicionamentos políticos e os do PCdoB. Posicionamentos estes relacionados à defesa da soberania nacional e, sobretudo, acerca da remoção dos obstáculos que travam o desenvolvimento brasileiro.

Tenho na lembrança que, em abril de 2004, escrevi-lhe uma carta acerca do conteúdo de uma entrevista que ele concedera à revista CartaCapital. Alencar desencadeara uma verdadeira cruzada contra o sistemático aumento da taxa básica de juros. Segundo ele, isso “representa, na história do Brasil, a maior transferência de renda de que se tem notícia”, do trabalho, da produção em benefício do sistema financeiro. Indo além, Alencar, na referida entrevista colocou o dedo na ferida: “há interesses muito organizados que seguram ao máximo essas taxas em cima”.

Setores da grande mídia pintaram Alencar como uma espécie de Quixote dessa luta contra a política ortodoxa do Banco Central. Na verdade, ele, como patriota, deu importantes contribuições na luta política e de ideias pelo redirecionamento da política macroeconômica. Foi um lúcido e corajoso defensor e empreendedor de um novo projeto nacional de desenvolvimento.

Como cidadão deu lições de amor à vida e bravura. Filho de família humilde, balconista na juventude, com trabalho e empreendedorismo administrou uma empresa que se tornou a maior complexo têxtil do país. Por treze anos travou uma luta contra o câncer cuja determinação e coragem transmitiram uma pujante mensagem de resistência e paixão pela vida.
Neste momento de dor, transmitimos aos seus familiares nossos sentimentos e as condolências do Partido Comunista do Brasil.

João Guimarães Rosa, outro ilustre mineiro, numa passagem de seu clássico Grande Sertão: Veredas, diz: “E deputado fosse, então reluzia perfeito o Norte, botando pontes, baseando fábricas, remediando a saúde de todos, preenchendo a pobreza, estreando mil escolas”.
Exatamente esta foi a concepção desenvolvimentista de José Alencar: produção e bem-estar do povo. Sua vida e o seu legado irão alimentar a luta pelo desenvolvimento soberano do Brasil que prossegue.

São Paulo, 29 de março de 2011.

Renato Rabelo
Presidente do Partido Comunista do Brasil-PCdoB

segunda-feira, 28 de março de 2011

Palestina: adeus às divisões?



Por Carmelle Wolfson, do Alternet| Tradução: Daniela Frabasile,via Patria Latina






Num grande painel com uma caricatura do presidente Barack Obama, pendurado em uma sacada sobre a praça Al-Manarah, em Ramallah, no dia 15 de março, podia-se ler: “Ele disse: liberdade para o povo da Tunísia. Ele disse: liberdade para o povo egípcio. Ele disse: liberdade para o povo líbio. Mas ele não se atreve a dizer liberdade para o povo palestino”.
Estimulada pela dinâmica das revoltas que se espalham pelo mundo árabe, a juventude palestina ergueu um acampamento de protesto no centro de Ramallah, em cidades na Cisjordânia e na faixa de Gaza, em 15 de março. Esse grupo de jovens ativistas, não alinhado politicamente, é incapaz de se reunir devido aos postos de controle do exército de Israel e aos muros. Estão se conectando por Facebook, Twitter e telefones celulares.
O movimento de 15 de março, como está sendo chamado, reivindica reestruturação do Conselho Nacional Palestino (CNP), convocação de eleições, liberação de todos os prisioneiros políticos em poder da Autoridade Palestina e do Hamas e a unificação nacional da Palestina.
Na semana passada, centenas de milhares de palestinos protestaram nas ruas da cidade de Gaza, e milhares na Cisjordânia. Logo em seguida, o presidente palestino Mahmoud Abbas, do grupo Fatah, anunciou planos para encontrar o líder do Hamas, Ismail Haniyed, em Gaza.
Uma das figuras-chaves do movimento de 15 de março é Fadi Quran. Junto com nove outros companheiros, ele fez uma greve de fome de quatro dias, às vésperas do protesto. Diz que o CNP não representa todos os palestinos, e que “sistemicamente levará a uma divisão”, como atual impasse entre o Fatah e o Hamas. Quran acredita que se Abbas e Haniyet se encontrarem, os líderes tentarão chegar a um acordo de partilha do poder, combinando posições e dividindo cadeiras entre os partidos.
Abbas e Haniyet ainda precisam acertar os termos desse encontro. Abbas pede a formação de um governo transitório para preparar as eleições. Como o Hamas provavelmente receberia uma pequena quantidade de votos, perdendo assim seu poder sobre a faixa de Gaza, Haniyet está pouco estimulado a apoiar as eleições agora. Haniyet insiste em uma reunião que lance conversações pela reconciliação

O Movimento 15 de Março

Os ativistas palestinos estão esperando para ver se os planos vão dar frutos. Mas falando com eles fica claro que a derrubada dos presidentes Mubarak e Ben Ali, no Egito e Tunísia, reavivou suas esperanças. “Daqui para a frente, as coisas serão diferentes”, disse Quran no protesto de terça-feira.
Mas Quran, que estudou em Standford, é também pragmático. Indagado se 15 de março poderia se tornar a versão palestina do movimento 25 de janeiro (o primeiro dia de grandes manifestações populares no Cairo), ele respondeu: “acho que aqui, as mudanças que queremos precisam de mais tempo para ser implementadas. No Egito, reivindicava-se que Mubarak saísse. Nós não podemos pedir isso [em relação a Abbas] agora”.
O presidente Abbas tem apoio insignificante. Desde que a Al Jazeera liberou documentos [do Wikileaks] confirmando as suspeitas de que a Autoridade Palestina, dirigida pelo Fatah, cedeu demais a Israel (principalmente por permitir a expansão dos assentamentos, abandonar o direito de retorno para todos os refugiados palestinos e recuar da exigência de partes de Jerusalém Oriental), ele está tentando evitar uma grande revolta, como as que varreram o Oriente Médio e norte da África. A julgar pela tática de Abbas, ele deve ter aprendido alguma coisa com Mubarak.
Durante os últimos meses, nos comícios na Cisjordânia em solidariedade aos egípcios e tunisianos, as forças da Autoridade Palestina foram convocadas para entoar suas próprias palavras-de-ordem, e também para ameaçar e deter manifestantes. Nessa semana, a Autoridade Palestina usou estratégia parecida para suprimir protestos voltado mais diretamente a seus dirigentes.
Em toda a manifestação de 15 de março, em Ramallah, agentes secretos da inteligência da Autoridade Palestina (Mukhabarat) identificaram e retiraram os principais organizadores. A certa altura, a Mukhbarat arrastou uma jornalista da agência de notícias Ma’na para o posto de polícia depois que a repórter tirou uma foto de um dos agentes. A britânica foi liberada logo depois, mas ao final do dia pelo menos seis palestinos tinham sido detidos e sete foram levados por ambulâncias devidos a lesões. Ao escurecer, as forças de segurança isolaram a rua.
Após a implementação dos Acordos de Oslo, os palestinos parecem conviver com uma nova força de repressão, criada no interior da Autoridade Palestina, dirigida pelo Fatah. Ela captura e interroga regularmente ativistas políticos palestinos na Cisjordânia. A economia palestina pode ter crescido na região, mas os assentamentos israelenses expandem-se mais rapidamente. É essa realidade, tanto quanto a divisão de facções e as revoltas árabes, que inspiram os jovens palestinos hoje.
Mais cedo naquele dia, partidários do Fatah, incluindo alguns antigos membros da segurança da Autoridade Palestina, encheram a praça, tentando fixar-se em locais estratégicos. A multidão do Fatah cantou músicas tradicionais nacionalistas que tocavam nos auto-falantes, e espalhou pelas ruas cartazes de líderes palestinos martirizados. Um cartaz destacava a foto do antigo líder do Fatah, Yasser Arafat, beijando o líder espiritual do Hamas, Sheik Yassin.
Uri Davis, do Conselho Revolucionário do Fatah – o único membro judeu israelense da Organização pela Libertação da Palestina (OLP) – falou com repórteres no meio da praça. “O fim da fragmentação da cena política palestina”, deveria ser a principal demanda , disse ele, atribuindo o processo à tática colonial de dividir para reinar usada por Israel.
Sobre a reestruturação do Conselho Nacional, Davis disse que abrir o voto às comunidades palestinas em Israel e às espalhadas pela diáspora tornaria o órgão mais representativo.
Quem observasse os que pedem unificação nacional na semana passada, julgaria que a divisão é insuperável. As tensões ferviam sob a superfície, entre os que apoiavam o Fatah e os esquerdistas e os ativistas não alinhados a nenhum dos dois grupos (que organizaram a manifestação). Dois grupos distintos se formavam, cada um tentando se sobrepor ao outro.
Depois que os membros do Fatah se retiraram no começo da tarde, um grupo de aproximadamente 500 pessoas permaneceu. Jovens de ambos os sexos lideraram os coros. Dois homens sentaram-se sobre um painel da Autoridade Palestina 4 metros de altura onde podia-se ler “restauração do centro da cidade”. Eles seguravam um cartaz com um desenho de duas jovens palestinas gritando, com os cabelos aparecendo sob lenços frouxos, no fundo vermelho, branco e verde da bandeira palestina.

Reação israelense

Dezenas de soldados israelenses também estavam mobilizados no posto de controle em Qalandia na última terça-feira, para a eventualidade de os manifestantes palestinos em Ramallah dirigirem-se para lá
Os levantes regionais alimentam o medo que os israelenses têm de serem cercados por inimigos prontos para atacar. Oficiais de segurança israelenses claramente foram pegos de surpresa quando Mubarak caiu. Ainda assim, o governo de Israel parece indeciso sobre como responder politicamente à agitação no Oriente Médio e no norte da África, permanecendo em compasso de espera antes de dar o próximo passo.
Israel perdeu seu maior aliado no Oriente Médio quando o presidente egípcio, Mubarak, resignou. A estabilidade do Estado baseia-se na paz com o Egito e em manter Gaza em rédeas curtas. É por essa razão que Israel apressa-se para terminar a construção do muro ao longo da fronteira com o Egito.
O primeiro-ministro Netanyahu espera que emerja, no Egito, um novo líder com quem Israel possa contar para continuar a mesma política de Mubarak.
Enquanto isso, têm aparecido no Facebook grupos chamando refugiados palestinos a marchar em direção às fronteiras do Egito, Líbano, Síria, Jordânia e os Territórios Palestinos Ocupados em 15 de maio. Seria a “terceira intifada palestina”. Se essa ação acontecer, Israel terá de lidar com uma séria preocupação com segurança.
No momento, com os militares egípcios – financiados pelos Estados Unidos – exercendo forte controle e com fissuras que começam a aparecer na revolta popular do Egito, a situação política pode se mover a favor ou contra Israel. Se alguma coisa está clara, é que Israel baseia-se na divisão da Palestina e não irá tolerar um movimento democrático se isso significar uma negociação com o Hamas.

Islamofobia

14777.jpegO cidadão da foto, com essa cara de mau, é o deputado republicano Peter King, uma das figuras em maior evidência hoje nos EUA.  É dele a iniciativa de criar uma comissão que vai investigar as atividades de organizações muçulmunas no país,  vista como uma atitude discriminatória e revanchista. 

por Eliakim Araujo em Miami


O cidadão da foto, com essa cara de mau, é o deputado republicano Peter King, uma das figuras em maior evidência hoje nos EUA.  É dele a iniciativa de criar uma comissão que vai investigar as atividades de organizações muçulmunas no país,  vista como uma atitude discriminatória e revanchista.  Desde já, King  está sendo chamado de o McCarthy do século XXI, numa referência ao parlamentar dos anos 50 e 60 que perseguiu e destruiu famílias pela simples suspeita de que poderiam ser comunistas.

O novo mccarthysta considera que o inimigo está dentro de casa e que a crescente radicalização dos muçulmanos nascidos e criados nos Estados Unidos representa uma ameaça que deve ser avaliada antes que seja tarde demais.  Como presidente do Comitê de Segurança Nacional da Câmara - cargo conquistado pelos republicanos depois da vitória nas eleições parlamentares de novembro passado - King argumenta que os americanos muçulmanos não cooperam com a lei e a ordem na hora de denunciar atividades suspeitas e que 80% dos líderes islâmicos são extremistas.

Mas King não é flor que se cheire.  Além de acusado de falsas alegações e de estar querendo estigmatizar e demonizar a comunidade muçulmana de sete milhões de pessoas,  seus adversários afirmam que ele defendeu nos anos oitenta a luta armada do IRA, a organização terrorista irlandesa.
Quem tem um deputado como esse, não precisa de terrorista. Ele é o próprio.

Washington made in China
A rede ABC mostrou outro dia em seu principal telejornal uma reportagem super interessante. O repórter percorreu as lojas de souvenirs de Washington e descobriu que quase todos eram fabricados na China. Miniaturas dos memoriais, do Capitólio, da Casa Branca e, pasmem,  até bandeirinhas dos EUA eram "made in China".   

Esse tipo de reportagem,  cada vez mais frequente, revela a preocupação do cidadão americano com o rival chinês, acusado de manipular sua moeda e roubar empregos dos Estados Unidos.  A desgastada crise econômica,  que não dá sinais de arrefecimento,  não é mais a única culpada pelo índice de desemprego que teima em permanecer em torno dos 10%.

Até Donald Trump, misto de empresário e apresentador de TV (ele apresenta o original do "Aprendiz"), com seu jeito meio bufão, dizia em um programa de entrevista que é fácil acabar com o desemprego nos EUA "é só mandar para a China os nossos trabalhadores, porque nossos empregos foram todos levados para lá".

Na contramão da reportagem da ABC, a Boeing anunciou esta semana ter fechado encomendas de 10 bilhões de dólares com duas companhias aéreas da China, o mercado de aviação de crescimento mais rápido no mundo. 

Ou seja, pelo menos nesse segmento a China ainda não conseguiu roubar os empregos dos técnicos e operários norte-americanos. Por enquanto.

Eu ainda amo Bill
A revista sensacionalista Enquirer tirou do ostracismo uma mulher que quase derrubou um presidente dos Estados Unidos. Monica Lewinski, a mais famosa estagiária americana,   hoje com 37 anos (ela tinha 22 por ocasião do escândalo)  revelou que nunca se esqueceu do romance proibido com Bill Clinton, tanto que até hoje não conseguiu preencher o vazio deixado por ele. Não casou e nem quis ter filhos com pretensos namorados. E Mônica confidenciou a amigos mais próximos que não consegue mais amar ninguém, pois seu coração pertence ao ex-presidente.

Monica, que chegou a escrever um livro sobre seu "estágio" na Casa Branca, conta que foi muito pressionada na época pela chamadas forças ocultas do governo para calar a boca sobre os acontecimentos no Salão Oval.  Mas confidenciou que faria tudo de novo, porque Bill foi seu "único e verdadeiro amor".

É a tal história do amor que bate e fica.

Sem Harvard, mas com Eike

Pesquisa divulgada na semana que passou, com pouco destaque na mídia preocupada com a cobertura do Carnaval, revelou que nenhuma universidade brasileira foi classificada entre as cem melhores do mundo.  O trabalho é da Times Higher Education (THE), instituição baseada em Londres.

Harvard, nos EUA, obteve a pontuação máxima no ranking, montado a partir de uma pesquisa com convidados de mais de 13 mil professores de 131 países do mundo.  Como nos anos enateriores, as universidades americanas seguem dominando o ranking.  Entre as dez primeiras da lista, sete são dos EUA, duas do Reino Unido e uma do Japão.

A nós, brasileiros, resta o consolo de saber que, se não temos uma universidade do topo, temos em compensação trinta bilionários na lista da Forbes. Para ser preciso, subimos de 18 para 30 em um ano. Sinal de que as coisas andam bem para os negócios no Brasil. 

Melhor ainda. Se não temos uma universidade entre as melhores, temos um empresário entre os dez mais ricos do mundo. Eike Batista, aparece no oitavo lugar, com uma fortuna estimada em 27 bilhões de dólares. Só não dá para entender como alguém que tem uma fortuna de 27 bi precisa de um aporte de capital público (BNDES) de 600 milhões de reais para tocar seus negócios.

Se alguém souber, me explique, por favor.

EUA e aliados cometem crimes monstruosos na Líbia


Miguel Urbano Rodrigues
 
 
Na Líbia de hoje, tal como sucedeu na Jugoslávia, no Iraque ou no Afeganistão, as “missões humanitárias” do imperialismo deixam um hediondo rasto de morte e destruição. Apesar do silêncio, da manipulação e da mentira dos grandes media internacionais e nacionais, a barbaridade da agressão imperialista contra o povo líbio começa a surgir em toda a sua criminosa dimensão.


Os EUA e os seus aliados repetem na Líbia crimes contra a humanidade similares aos cometidos no Iraque e no Afeganistão.
A agressão ao povo líbio difere das outras apenas porque o discurso que pretende justificá-la excede o imaginável no tocante à hipocrisia.
A encenação prévia, pela mentira e perfídia, traz à memória as concebidas por Hitler na preparação da anexação da Áustria e das campanhas que precederam a invasão da Checoslováquia e da Polónia.
Michel Chossudovsky, James Petras e outros escritores progressistas revelaram em sucessivos artigos - citando fontes credíveis - que a rebelião de Benghazi foi concebida com grande antecedência e minúcia e alertaram para o papel decisivo nela desempenhado pelos serviços de inteligência dos EUA e do Reino Unido.
A suposta hesitação dos EUA em apoiar a Resolução do Conselho de Segurança da ONU que criou a chamada zona de «Exclusão Aérea», e posteriormente, em assumir a «coordenação das operações militares» foi também uma grosseira mentira. Farsa idêntica caracterizou o debate em torno da transferência para a NATO do comando da operação dita «Amanhecer de Odisseia», titulo que ofende o nome e a epopeia do herói de Homero.
O Pentágono tinha elaborado planos de intervenção militar na Líbia muito antes das primeiras manifestações em Benghazi, quando ali apareceram as bandeiras da monarquia fantoche inventada pelos ingleses após a expulsão dos italianos. Tudo isso se acha descrito em documentos (alguns constantes de correspondência diplomática divulgada pela Wikileaks) que principiam agora a ser tornados públicos por webs alternativos.
OS CRIMES ENCOBERTOS
Os discursos dos responsáveis pela agressão ao povo líbio e a torrencial e massacrante campanha de desinformação montada pelos grandes media ocidentais, empenhados na defesa e apologia da intervenção militar, são diariamente desmentidos pela tragédia que se abateu sobre a Tripolitania, ou seja o ocidente do país controlado pelo Governo.
Hoje não é mais possível desmentir que o texto da Resolução do CS - que não teria sido aprovado sem a abstenção cúmplice da Rússia e da China – foi desafiadoramente violado pelos Estados agressores.
Os ataques aéreos não estavam previstos. Mas foram imediatamente desencadeados pela força aérea francesa e pelos navios de guerra dos EUA e do Reino Unido que dispararam em tempo mínimo mais de uma centena de mísseis de cruzeiro Tomahwac sobre alvos muito diferenciados.
Têm afirmado repetidamente os governantes dos EUA do Reino Unido, da França, da Itália que a «intervenção é humanitária» para proteger as populações e que «os danos colaterais» por ela provocados são mínimos.
Mentem consciente e descaradamente.
As «bombas inteligentes» não são cegas. Têm atingido, com grande precisão, depósitos de combustíveis e de produtos tóxicos, pontes, portos, edifícios públicos, quartéis, fábricas, centrais eléctricas, sedes de televisões e jornais. Reduziram a escombros a residência principal de Muamar Khadafi.
Um objectivo transparente foi a destruição da infra-estrutura produtiva da Líbia e da sua rede de comunicações.
Outro objectivo prioritário foi semear o terror entre a população civil das áreas bombardeadas.
Afirmaram repetidas vezes o secretario da Defesa Robert Gates e o secretario do Foreign Ofice, William Haggue que as forças daquilo a que chamam a «coligação» mandatada pelo Conselho de Segurança, não se desviaram das metas humanitárias de «Odisseia». Garantem que o número de vítimas civis tem sido mínimo e, na maioria dos bombardeamentos cirúrgicos, inexistente.
Não é o que informam os correspondentes de alguns influentes media ocidentais e árabes.
Segundo a Al Jazeera e jornalistas italianos, o «bombardeamento humanitário» de Adhjedabya foi na realidade uma matança sanguinária, executada com requintes de crueldade.
Outros repórteres utilizam a palavra tragédia para definir os quadros dantescos que presenciaram em bairros residenciais de Tripoli.
Generais e almirantes norte-americanos e britânicos insistem em negar que instalações não militares ou afins tenham sido atingidas. É outra mentira. As ruínas de um hospital de Tripoli e de duas clínicas de Ain Zara, apontadas ao céu azul do deserto líbio, expressam melhor do que quaisquer palavras a praxis dos «bombardeamentos humanitários». Jornalistas que as contemplaram e falaram com sobreviventes do massacre, afirmam que em Ain Zara não havia um só militar nem blindados, sequer armas.
Numa tirada de humor negro, no primeiro dia da agressão, um oficial dos EUA declarou que a artilharia anti aérea líbia ao abrir fogo contra os aviões aliados que bombardeavam Tripoli estava a «violar o cessar-fogo» declarado por Khadafi.
Cito o episódio por ser expressivo do desvario, do farisaísmo, do primarismo dos executantes da abjecta agressão ao povo líbio, definida como «nova cruzada» por Berlusconi, o clown neofascista da coligação ocidental.
Khadafi é o sucessor de Ben Laden como inimigo número um dos EUA e dos governantes que há poucos meses o abraçavam ainda fraternalmente.
O dirigente líbio não me inspira hoje respeito. Acredito que muitos dos seus compatriotas que participam na rebelião da Cirenaica e exigem o fim do seu regime despótico actuam movidos por objectivos louváveis.
Mas invocar a personalidade e os desmandos de Muamar Khadafi no esforço para apresentar como exigência de princípios e valores da humanidade a criminosa agressão ao povo de um país soberano é o desfecho repugnante de uma ambiciosa estratégia imperialista.
O subsolo líbio encerra as maiores reservas de petróleo (o dobro das norte-americanas) e de gás da África. Tomar posse delas é o objectivo inconfessado da falsa intervenção humanitária.
É dever de todas as forças progressistas que lutam contra a barbárie imperialista desmascarar a engrenagem que mundo afora qualifica de salvadora e democrática a monstruosa agressão à Líbia.
A Síria pode ser o próximo alvo. Isso quando não há uma palavra de crítica às monarquias teocráticas da Arábia Saudita, do Bahrein, dos Emirados.
Uma nota pessoal a terminar. Os líderes da direita Europeia, de Sarkozy e Cameron à chanceler Merkel, cultivam nestes dias – repito - o discurso da hipocrisia. Nenhum, porém, consegue igualar na mentira e na desfaçatez a oratória de Barack Obama, que, pelos seus actos, responderá perante a História pela criminosa política externa do seu país, cujo povo merecia outro presidente.

A discriminação ao trabalho das empregadas domésticas


Do conjunto de mulheres ocupadas no país, 17% são trabalhadoras domésticas, em sua maioria negras


 

Inesc

Assessor de diversidade e apoio aos cotistas da Universidade de Brasília (UNB), Joaze Costa é autor do estudo Sindicatos das trabalhadoras domésticas no Brasil: teorias de descolonização e saberes subalternos, de 2007.
Coordenador da mesa Políticas Públicas de Promoção da Igualdade Racial, no Seminário Internacional Igualdade, Racismo e Políticas Públicas, que acontece dias 30 e 31 de março no anfiteatro 12 da UNB, Joaze é também segundo secretário da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros e Negras (ABPN).
O evento contará com alguns dos principais especialistas da área e, além de tratar das desigualdades e do racismo enfrentado pelos brasileiros, tem como objetivo discutir temáticas como: cotas, ações afirmativas, Estatuto da Igualdade Racial, comunidades quilombolas, modelo de desenvolvimento e racismo institucional à luz de experiências internacionais e também da atuação do Estado brasileiro.

Inesc - Quantas trabalhadoras domésticas existem no país e quantas são sindicalizadas?

Joaze Costa - A Pnad 2009, divulgada no final de 2010, indica um contingente de 7,2 milhões de trabalhadores domésticos, em sua expressiva maioria mulheres. Trata-se de uma categoria socioprofissional extremamente significativa numericamente, representando 7,8% da População Economicamente Ativa. Se considerarmos apenas o conjunto das mulheres ocupadas no país, 17% das mulheres empregadas são trabalhadoras domésticas.
Infelizmente, não tenho dados mais recentes em mãos, mas com certeza trata-se de uma categoria que também tem uma sobrerrepresentação de mulheres negras, o que torna muito interessante os estudos sobre estas profissionais, pois sobre elas incidem práticas discriminatórias de gênero e raça, conjugados obviamente com fatores classistas. Porém, além dessa dimensão analítica, a categoria profissional das trabalhadoras domésticas impõe enormes desafios no campo das políticas públicas.
Também lamento não ter dados atuais sobre o número de trabalhadoras domésticas sindicalizadas. Porém, quando defendi minha tese de doutorado no Departamento de Sociologia da UNB, em 2007, o índice de trabalhadoras sindicalizadas era em torno de 1,6%. 

Este não é um percentual muito baixo?

Com certeza trata-se de um índice baixo, entretanto, numa perspectiva histórico-sociológica torna-se compreensivo este índice, podendo inclusive ser motivo para comemorações. As barreiras para uma luta política das trabalhadoras domésticas são inúmeras, para se ter uma idéia, citaria apenas um dos obstáculos, talvez o central: o isolamento intramuros das trabalhadoras domésticas nos seus locais de trabalho.

Da fundação da Associação Profissional das Empregadas Domésticas de Santos, em São Paulo, em1936, à criação da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, em 1997, que conquistas a classe conseguiu?

Esta é uma ótima pergunta; para uma resposta mais completa recomendo a leitura da minha tese de doutorado. Mas, posso adiantar que a principal conquista do grupo foi a sua própria organização como categoria profissional. Essa história inicia-se com Laudelina de Campos Melo, na década de 30 do século 20, passando por uma articulação com o Teatro Experimental do Negro, e com a corrente progressista da igreja católica nas décadas de 50 e 60.
Em minha pesquisa de doutorado descobri que na sombra de cada direito conquistado – mesmo que insuficiente, comparado aos outros/as trabalhadores/as – havia uma forte militância das trabalhadoras domésticas. Por exemplo, os primeiros direitos da categoria profissional em 1972 foram um produto direto do 1o Congresso Nacional das Trabalhadoras Domésticas, que ocorreu em 1968, no Rio de Janeiro. Em 1974, elas realizaram o 2o Congresso Nacional para avaliar os ganhos com a lei 5958/72. Após o 5o Congresso Nacional da Categoria em 1985, em Recife, as trabalhadoras domésticas iniciam uma forte articulação nacional com outros movimentos sociais, especialmente as feministas, com Constituintes, com a própria igreja católica progressista, para apresentar uma proposta de lei, que contemplasse os direitos da categoria. Esta longa e silenciada história, revela o ativismo destas mulheres, divididas entre cuidar da casa dos outros e pensar no futuro delas mesmas e até mesmo do país. Com a Constituição de 1988, as trabalhadoras domésticas foram contemplados com alguns direitos, muito aquém dos demandados. Aliás, é muito revelador o parágrafo único dos Direitos Sociais da Constituição Cidadã, que menciona as trabalhadoras, é para dizer que 25 dos 34 direitos sociais previstos na Constituição Federal para todos/as os trabalhadores brasileiros/as não se aplicam às domésticas. Após a década de 80, os sindicatos criados a partir de 1988 sentiram a necessidade de uma representação uniforme, sobretudo para lidar com o governo federal. Decidiram então pela criação da Fenatrad, a Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, que tem como sua atual presidenta Creuza de Oliveira.

E que desafios tem a categoria agora?

Os desafios continuam enorme à categoria. Por exemplo, a elevação do número de trabalhadoras com carteira assinada e com contribuição à previdência social, regulamentação da jornada de trabalho, campanha da casa própria, obrigatoriedade do FGTS, hora extra etc. Estes direitos têm estado na pauta da categoria após 1988 e talvez ganhem novo fôlego a partir da Conferência Internacional da OIT, que ocorrerá em junho de 2011.

O trabalho das empregadas domésticas reúne três tipos de discriminação: de gênero, de classe e 
de raça; ainda assim é visto com muita naturalidade pela sociedade em geral. O que isso aponta em termos de cultura nacional?

Esta é uma das questão que mais me interessa no estudo do trabalho doméstico. Ainda não tive tempo para uma grande elaboração a este respeito, mas minha hipótese é que no trabalho doméstico temos uma das chaves para entender a formação de uma gramática moral que explica a estabilidade da desigualdade social no Brasil. E é bastante óbvio que o trabalho doméstico herda a funcionalidade do trabalho escravo.

O livro Levando a Raça a Sério: ações afirmativas e universidade, lançado em 2004, traz um panorama de ações de enfrentamento do racismo no campo da educação. O que pensa da lei 10.639, que torna obrigatório o ensino de História da África nos currículos escolares?

O livro foi resultado de um seminário que organizei em 2003, na Universidade Federal de Goiás, no âmbito do Programa Políticas da Cor na Educação Brasileira, com o Laboratório de Políticas Públicas da Uerj e com apoio da Fundação Ford. Naquela ocasião, reunimos coordenadores e participantes de alguns dos projetos daquele programa, que estavam nas suas respectivas universidades propondo políticas de ação afirmativa. Assim, o foco do livro foram os debates e negociações que estavam ocorrendo em cada uma das universidades ali representadas: UNB, Universidade do Estado da Bahia, UFBA, UFSCar, UFMG, UFG, UFMT etc.
As discussões sobre a lei 10.639/03 não entraram naquele seminário e, portanto, não foram expressas no livro. Porém, lembro-me vagamente que meses depois viemos para uma reunião em Brasília no MEC, quando foi assinada a primeira minuta do programa Uniafro, voltado para o financiamento de projetos de pesquisa e atividades sobre a 10.639/03.

E como garantir a implantação efetiva dessa lei?

Devemos a existência desta lei à professora Petronilha da Silva, relatora do parecer que aprovou a 10.639/03. Obviamente, outros personagens são e foram fundamentais para termos alcançado essa conquista legal. Esta lei se mostra como um primeiro passo para o combate ao chamado racismo epistemológico, assim também como o primeiro passo para o combate à cultura racista existente na sociedade brasileira, que até pouco tempo atrás era ensinada nas nossas escolas impunemente.
Eu diria que o grande desafio hoje para a implementação efetiva desta lei no sistema de ensino brasileiro passa pelo envolvimento das universidades. As universidades têm o dever de formar pessoas capazes de lidar de maneira qualificada com a 10639/03. Para isso, as universidades têm que contratar novos professores para desempenhar esta tarefa.
De que maneira as cotas raciais têm colaborado para o acesso e a manutenção da população negra nas universidades? Além de garantir o ingresso, como garantir a permanência do(a) aluno(a) cotista?
As cotas raciais foram o primeiro passo para uma reestruturação as universidades brasileiras, porém não podem ser pensadas como ato único e isolado. As universidades têm que trazer para o seu bojo imediatamente uma discussão sobre a permanência dos cotistas, o acesso dos mesmos às redes de pesquisa e a reforma curricular. Enfim, há um conjunto de ações ainda por implementar para caracterizar uma efetiva política de ação afirmativa nas universidades brasileiras.

Acredita que políticas de ação compensatória, como o Bolsa Família, são eficazes também para o combate às desigualdades raciais?

Sem dúvida. Seria um grande engano dizermos que as chamadas políticas universais não teriam impacto sobre as desigualdades raciais.
Estes 10 primeiros anos deste novo milênio foram fundamentais para a discussão sobre as políticas de ação afirmativa. Convencemos setores importantes da sociedade brasileira da necessidade de adoção destas políticas para quebrarmos o “teto de vidro” e para a adoção de políticas valorativas. Entretanto, não podemos pensar que as políticas de ação afirmativa serão a panaceia para todas as desigualdades raciais brasileiras. As ações afirmativas precisam ser combinadas com políticas universais de combate à pobreza, de elevação de escolaridade, de equidade regional etc. Sem abrir mão das políticas de ação afirmativa – que cumprem um papel decisivo na sociedade brasileira – temos que partir para um movimento político de elevação da qualidade do ensino fundamental e médio brasileiro, de aumento de matrículas no ensino médio, de melhoria do sistema de saúde, de melhoria da habitação etc.
Os próximos anos de crescimento econômico do Brasil não podem repetir os erros do passado, quando o crescimento econômico não veio acompanhado de igualdade social e racial.

Qual sua expectativa em relação ao Seminário Igualdade, Racismo e Políticas Públicas?

O Seminário traz pesquisadores refinados da questão racial brasileira; pessoas que com uma seriedade incrível tem refletido sobre nossa sociedade e os desafios para a igualdade social e racial. Certamente, a Universidade de Brasília ganhará muito com a presença desses pesquisadores e pesquisadoras.
Serão colocadas questões importantes para o desenvolvimento social brasileiro. Para o/a aluno/a que comparecer, certamente ele perceberá inúmeros possíveis temas de pesquisa para sua monografia, dissertação e tese. Para os/as pesquisadores/as será uma ótima oportunidade para intensificar o diálogo com outros/as pesquisadores/as nacionais e internacionais. E espero que tenhamos um público expressivo, pois num seminário como este são discutidas questões que tem a ver com o futuro do nosso país.