terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Além dos desmandos de sempre, muito marketing e pouca bola

  Gabriel Brito, da Redação do CORREIO DA CIDADANIA   

Tal como 2010, o ano que finda tampouco deixa motivos para grandes festejos no esporte brasileiro. No anterior artigo retrospectivo, destacou-se a obscenidade de diversos acontecimentos da política esportiva, basicamente relacionados aos grandes eventos que se avizinham. Dentro dos campos, quadras, pistas, piscinas, mais dissabores que alegrias, capitaneados pela desastrosa Copa do Mundo da seleção de futebol.

Dessa forma, fica difícil expor algo de novo e, acima de tudo, positivo em mais um ano que termina em nossa pátria tão repleta de ufanismos. Mas diante, justamente, desse quadro de grande manipulação, desinformação e enganações diversas, mantém-se a necessidade de se fazer o papel mais chato da trama que só anuncia a felicidade geral da nação.

Trata-se do contraponto ao que se vende como emancipação esportiva do país, na mesma esteira eufórica do desenvolvimento econômico nacional, mas que esconde muito mal as vísceras de projeto meramente capitalista, comandado pela parceria público-privada que realmente funciona por aqui: a associação de governantes, que, sob os mais cínicos e variados discursos, falsificam suas tarefas de promoção da justiça social e econômica, com seus empresários financiadores de campanha, que cartelizam todos os grandes negócios, projetos e obras deste “desenvolvimento”.

Assim, o que podemos dizer é que, mais do que nunca, o esporte e, em especial, o futebol brasileiro têm reproduzido em escala acentuada a própria vida cotidiana verde e amarela. Enquanto vemos os mesmos políticos desmoralizados em seus parlamentos anunciarem com pompa as grandes obras de infra-estrutura e estádios que nos servirão de “legado”, temos uma mídia que predominantemente vende tais eventos como autêntica agência de propaganda.

Empresas que sempre foram marcadas pela corrupção e super-faturamento em seus serviços ao Estado são apresentadas como grandes atores de nosso crescimento e do próprio orgulho que tais eventos representarão. A mídia comercial, com suas edições de fim de ano destacando os mais influentes e “especiais” dos brasileiros, deita perfis de cartolas esportivos e corporativos, apresentando-os com capa de homens de visão e conscientes de seu papel social.

Tal cobertura acrítica da grande e monopólica mídia acaba superando largamente o papel do contraditório desempenhado pelos movimentos sociais, especialmente os comitês populares de cada cidade sede, e da chamada imprensa alternativa, que se esforça na divulgação dos acontecimentos por um ponto de vista social. Mas não tem o poder de alcance, por exemplo, de uma das grandes sócias da Copa e das Olimpíadas: a Rede Globo, claro, que, além de transmitir, faz todo o trabalho de marketing que se possa desejar para o “bom andamento” dos fatos.

Assim, um estádio que será construído em torno de uma série de imoralidades, a começar pelo uso indiscriminado do dinheiro público e a quase certeza de remoções mal recompensadas, é vendido como grande ponto de partida do desenvolvimento da zona leste de São Paulo. E tal como em diversos outros momentos políticos de relevância histórica mundo afora, um time de grande força popular é o grande escudo do poder público para dar vazão a interesses escusos.

Só não se sabe qual será o futuro do Corinthians, em seu estádio que só será seu de verdade após a Odebrecht recuperar o dinheiro investido (a partir de empréstimo do BNDES), sob risco de uma impagável dívida. O mesmo vale para todas as outras “arenas” (nome dos shoppings travestidos de estádios) reformuladas ou novinhas, superfaturadas desde o início e cercadas de incerteza acerca de sua gestão e viabilidade posteriores ao Mundial de futebol.

Portanto, tal como dito desde a escolha do Brasil como sede de tais eventos, não haverá muito a fazer contra processo tão avassalador. Remar contra tem a serventia de evitar um massacre ainda maior e a promoção ilimitada de injustiças e violências sociais, especialmente através das remoções de famílias de favelas em áreas de interesse do mercado. No entanto, o máximo que se conseguirá é a chamada redução de danos. E posteriormente, a briga pela apropriação pública e social do que houver de “legado” estrutural.

Lá dentro, as mesmas ilusões

Já nos campos, o Brasil continua em péssima fase de sua história. Tal como nos últimos anos, a seleção, agora sob o comando de Mano Menezes, encontra-se completamente sem rumo, incapaz de reavivar a velha escola nacional que encantou o mundo e formou timaços. Não se consegue montar um grupo coerente e regular de jogadores, com estilo fiel ao que aprendemos a apreciar e livre dos vícios impostos pelo futebol de resultados, obsessivo física e taticamente e divorciado da perfeição nos fundamentos mais técnicos do jogo. Fora a contaminação por variados pragmatismos absorvidos da Europa, por onde vive ou deseja viver a nata do nosso futebol. Obviamente, isso é fator chave para a descaracterização do nosso jogo, “artístico”, “moleque”, “imprevisível”, ou o que o valha e hoje inexiste.

“Um futebol muito corrido e pouco pensado. O Brasil precisa se reencontrar”, resume, há anos, Tostão, um dos maiores se não o maior analista de futebol do país – e craque da seleção de 70, se não bastar...

O problema, pouco compreendido, é que não se atira a essência de um poção mágica ao espaço e depois a recupera num piscar de olhos. Essa seleção sem cara, alma, graça, distanciada das raízes e da própria casa, é o mais límpido e cristalino reflexo dos 22 anos de Ricardo Teixeira e sua gestão comprovadamente mafiosa e incompetente na CBF, associada a outra aliada de primeira hora do atraso: de novo, a Globo, que não se cansa de transformar o futebol em mero produto de entretenimento, onde reina a paparicação, e se poda a verdadeira cultura popular e autêntica do jogo.

Essa nefasta sociedade foi quem passou tal período evitando os necessários avanços, que vão muito além da escolha de um treinador certo e a conquista de uma ou outra taça. O grande desastre é que o futebol brasileiro ficou não apenas sem escola, mas sem direção, cara, visão, mentalidade, coerência, gestão, e como vai longe a lista... Em suma, tudo que o aclamado Barcelona, e também a seleção espanhola, não fizeram. Não à toa agora gozam o trono que pensamos ser eternamente nosso.

Em todo este período, no qual o futebol se “modernizou” e se transformou também em grande negócio capitalista, deixaram-se no Brasil as mesmas estruturas que nas décadas anteriores já anunciavam a penúria, até por nunca terem sido capazes de organizar coerentemente sequer duas edições consecutivas do campeonato nacional, como mostra a história.

O interesse mesquinho, e falsamente favorável aos pequenos, das federações estaduais, a inadequação do nosso calendário, sempre na contramão do resto do mundo, a liderança não menos despótica da confederação continental e o nível de imbricação, protagonismo e ingerência atingido pelos empresários, agora turbinadíssimos por fundos ainda mais poderosos de investimentos, nos levaram a tamanha decadência. Portanto, nada gratuita.

Mesmo assim, seguimos sem visão

Mas como o esporte é uma das áreas da vida mais pródigas em desfazer mitos e desmentir as maravilhas do marketing, dentro de campo tivemos um ano que, se não nos levar a uma rápida reflexão, pode significar novos e traumáticos infortúnios. O que não é nada desejável quando se está perto de sediar Copa e Olimpíadas...

Na Libertadores, 5 dos 6 brasileiros fracassaram retumbante e precocemente, sendo derrotados para equipes de países vizinhos sempre desabonadas por nossa mídia, que, por mais que raramente os veja jogar, jamais dá o braço a torcer e reconhece seus méritos, até mesmo quando batem nos brasileirinhos, o que fizeram a granel em 2011. Via de regra, “são times limitados, mas esforçados, raçudos e que jogam com a pressão da torcida”. É hora de contar outra...

Apesar do título do Santos na Libertadores, os demais foram um fracasso. Assim como na Copa Sul-Americana, vencida pela virtuosa Universidad de Chile – que já vendeu o artilheiro do torneio pra Europa, nessa triste saga... E também na Copa América de seleções, na qual fomos eliminados nas quartas de final para o Paraguai, nos pênaltis, com três empates, uma vitória e outra campanha horrorosa.

Já o massacre sofrido pelo Santos contra o Barcelona na final do Mundial de Clubes deve ser visto como choque de realidade, não como “maior espetáculo da Terra”. Pois parece muito oportunista da parte da mídia, e de todos, sempre resistentes em aplaudir rivais gringos, agora reverenciar incansavelmente o timaço catalão. Sim, trata-se de um dos maiores que já vimos, mas não se pode perder de vista que foi a maior diferença de gols da história do Mundial de Clubes e que foi aterradora a postura entregue, reverente, submissa, dos atletas santistas, como se cientes de estarem diante de mestres imbatíveis e de que o negócio era fruir a aula... Não parece ser o papel que melhor cabe ao futebol brasileiro.

Não há marketing que cubra tamanha fraqueza e despreparo de nosso futebol diante de outras grandes potências, que passaram as últimas décadas saqueando livremente nossos talentos (e dos vizinhos), melhoraram seu futebol doméstico, evoluíram na maneira de jogar, (re)criaram estilos, variações táticas ofensivas e também progrediram na formação de jogadores, até pelo fato de contarem com legiões imigrantes, cujos filhos talentosos florescem por lá mesmo. Em suma, estamos no futebol exercendo o mesmo papel periférico e subalterno de sempre da geopolítica e da economia.

A tragédia é que tal tendência não dá o mínimo sinal de reversão. Os megaeventos simplesmente não estão servindo como oportunidade de retomada de “nosso devido lugar” no esporte, especialmente naquele em que éramos reis. E ninguém parece atentar para tamanho desperdício.

O pior de tudo é que o boom econômico brasileiro já chegou ao futebol (e aos poucos aos demais), nossos clubes têm dinheiro como nunca, mas não conseguem sair da fórmula fácil de trazer de volta medalhões cadentes sem conter a sangria “juvenil”. “Essa grana toda só vai servir pra deixar tudo igual, mas com um custo maior. Eles vão deixar tudo no mesmo nível, apenas custando mais”, opina o jornalista Paulo Calçade, do Estadão/ESPN.

Diante do atual protagonismo brasileiro no esporte, e também sua história ao menos em alguns deles, fica clara a falta que faz uma verdadeira política esportiva, inclusive com participação do Estado, algo mais que comum na organização de parâmetros e objetivos “macro” de toda uma nação, neste e em qualquer âmbito. Até pela possibilidade mais clara de punir desmandos e assaltos, o que nunca ocorre no nosso espúrio cenário. A maneira como caiu o ministro Orlando Silva, aliado de primeira hora do que há de pior no mundo esportivo, foi só um pequeno exemplo de como ainda estamos atrasados nessa estruturação, que pode cobrar um inesquecível preço nos próximos e esperados tempos.

Gabriel Brito é jornalista do Correio da Cidadania.

2011: crise capitalista e novo cenário no Oriente Médio


Emir Sader no CARTA MAIOR

O cenário geral que englobou a todo o ano de 2011 foi o novo ciclo da crise geral do capitalismo, iniciado em 2008. Pelo tipo de medidas tomadas naquele momento, era de se esperar que houvesse um novo brote da crise, mesmo se não se pudesse imaginar uma intensidade tão forte como aquela que afeta especialmente a economia europeia.

Ao ter salvado os bancos, detonante e epicentro da crise, os governos acreditavam que salvariam as economias e os países. Os bancos se salvaram e deixaram as economias e os países abandonados. Até porque os bancos tem a seu favor os organismos financeiros internacionais e as agências de risco, que agem de forma coerente e coordenada.

Por isso a crise voltou como bumerangue, tendo agora diretamente os governos como epicentros, pressionados pelo sistema bancário e pelos organismos que expressam seus interesses – FMI, Banco Central Europeu. Depois de bancos e outras instituições financeiras, em 2008, agora países passaram a falir, tendo a Grécia como caso paradigmático, que estende sua sombra sobre quase todos os países da zona do euro.

A unificação monetária – que foi a essência da unificação europeia, a ponto que os referendos perguntavam diretamente se queriam a moeda única e não a Europa unificada – se revelou uma armadilha, tanto para os países mais fragilizados, que na ausência de políticas monetárias nacionais, não tiveram formas de se defender minimamente da crise, como os países em melhores condições, que tiveram que acudir a eles, sob o risco de desabamento de toda a arquitetura do euro, levando-os também de roldão.

As respostas se deram no marco das políticas neoliberais dominantes, combatendo centralmente os déficits públicos e não os efeitos econômicos e sociais dessas políticas: a recessão e o desemprego. Como é típico do neoliberalismo, a centralidade está na estabilidade monetária e não no desenvolvimento econômico e na geração de empregos.

Como resultado, a maior novidade do 2011 é que a Europa ingressou de cheio numa fase recessiva, que deve demorar pelo menos uma década e que, dramaticamente, termina com seu Estado de bem-estar social, característico de suas sociedades no segundo pós-guerra. Os outros países do centro do capitalismo – EUA, Inglaterra, Japão – se defendem minimamente, por ter politicas monetárias nacionais, mas estão envolvidos na mesma tendência, que abrange a totalidade dos países centrais do capitalismo.

Essa a consequência mais importante do que ocorreu em 2011: projeção de recessão prolongada no centro do capitalismo, que será o cenário econômico internacional. Não significa que não haja oscilações, mas sempre entre recessão, estagnação e crescimento baixo, com os problemas sociais correspondentes e a instabilidade política de governos de turno que pagarão sempre o preço das politicas recessivas.

No outro plano estrutural – o da hegemonia imperial no mundo – o ano trouxe a novidade da guerra da Líbia, como nova modalidade de intervenção imperial. Tomada de surpresa pelas rebeliões populares na Tunisia e no Egito, que derrubaram alguns de seus aliados fundamentais na região, a reação das potencias ocidentais foi buscar revidar com o apoio maciço, especialmente militar, à oposição na Líbia, que contou com o beneplácito da ONU – com sua cínica decisão de “proteção da populações civis”- e a intervenção militar pesada da Otan, que bombardeou o pais durante mais de 6 meses, contando com o protagonismo da Inglaterra, da França e da Italia e o apoio logístico dos EUA, até obter o que buscava: a queda do regime de Kadafi e sua morte. Foi uma nova modalidade de intervenção, numa região que passa a ter instabilidades politicas prolongadas.

Renovou-se assim o arsenal de formas de intervenção das potências imperialistas, que se voltam agora para a Síria e o Irã, enquanto a saída das tropas dos EUA do Iraque não prenunciam o fim dos conflitos, transferindo-os agora para a disputa de hegemonia entre as facções internas. A violência só aumentou, o que passa também no Afeganistão, o que faz com que, depois do sucesso da derrubada dos regimes desses dois países, a uma vitória militar os EUA nao tenham conseguido impor uma vitória politica.

A chamada “primavera árabe” trouxe um elemento novo na região, que estava congelada de participação popular e, de repente, viu multidões ocuparem praças para derrubar ditaduras. O movimento, que começou neste ano, ainda deve ter longos desdobramentos, porque as ditaduras bloquearam o surgimento de forças alternativas durante décadas e nas eleições tendem a triunfar aquelas que tinham espaço, mesmo se restringido, nos velhos regimes: partidos e movimentos islâmicos. Mas os processos em países como a Tunísia e o Egito estão longe de terminar, como demonstra o novo ímpeto das mobilizações no Egito, agora diretamente contra o papel que os militares tentam manter na transição politica.

O ano de 2011 acentuou a natureza prolongada e profunda da atual crise capitalista, porém os modelos alternativos ao neoliberalismo ainda tem existências regionais – como o caso da América Latina e, de forma distinta, a China. Da mesma forma, as debilidades da hegemonia imperial norteamericana – não consegue manter e ganhar duas guerras ao mesmo tempo, por exemplo – não encontra ainda formas multipolares com capacidade suficiente para superar o mundo unipolar existente. Assim, se prolongará o período de instabilidades e turbulências que a crise do neoliberalismo e do imperialismo introduziram, até que forças com capacidade de superação possas se afirmar. Passos têm sido dados e a própria capacidade de resistência do Sul do mundo – em especial da América Latina e da China – à recessão no centro do capitalismo demonstram isso. Mas a disputa hegemônica ainda tende a prolongar por um tempo longo. O certo é que o mundo sairá distinto desta segunda década do século XXI – melhor ou pior -, mas distinto, porque os sintomas de esgotamento dos seus esquemas econômicos e políticos dominantes são evidentes.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Rússia lidera novo bloco econômico, vinte anos após fim da URSS

no OPERA MUNDI

Vladimir Putin nega que intenção seja recriar URSS, mas classifica nova União Euroasiática como “avanço histórico”


Há exatos vinte anos, a bandeira da União Soviética deixava de ser hasteada no Kremlin, dando lugar à bandeira da Federação Russa. Mikhail Gorbachev renunciou ao cargo em 25 de dezembro de 1991 e a União Soviética deixou formalmente de existir. A nostalgia dos tempos soviéticos ainda está presente em muitas das ex-repúblicas e, politicamente, um primeiro passo para a integração entre os antigos países do bloco soviético foi dado no mês passado.
No dia 18 de novembro, os presidentes da Rússia, Vladimir Putin, do Cazaquistão, Nursultan Nazarbayev e da Belarus, Aleksandr Lukashenko ratificaram um acordo com o objetivo de estreitar os laços entre os antigos parceiros soviéticos, com a assinatura de uma declaração de integração econômica euroasiática cuja meta é a criação de um Espaço Econômico Comum entre os três países. Os líderes signatários deixaram claro que isso não significa um retorno ao passado soviético, mas sim uma maneira de fortalecer os laços históricos entre eles.
Efe
Com Putin, Rússia abandonou a postura de ‘mais um país do extinto bloco soviético’ para liderar região

A Comissão Econômica Euroasiática começará a operar no dia 1º de janeiro de 2012 e os tratados assinados entrarão em vigor no mesmo dia. O principal objetivo a curto-prazo é a criação da União Econômica Euroasiática, em 2015, consolidando a economia dos três países e abrindo espaço para a gradual integração de outras nações. O PIB (Produto Interior Bruto) da União Euroasiática, com os três países fundadores, seria de 2 trilhões de dólares, um valor ainda pequeno se comparado aos 16 trilhões de dólares da União Europeia, “mas é somente um primeiro passo”, afirma o primeiro-ministro russo, Vladimir Putin, idealizador da União.
Os três países já possuem uma união aduaneira, mas o novo bloco significa a criação de um comitê executivo comum, composto por um Conselho liderado pelo vice-primeiro-ministro de cada país, e uma Comissão, cujo número de oficiais será proporcional ao número de habitantes de cada membro (84% russos, 10% cazaques e 6% bielorrussos). A Comissão terá a sua sede em Moscou e seguirá o modelo da Comissão Europeia. Os gastos de infraestrutura serão financiados inteiramente pela Rússia.
Liderança regional

Nenhum país terá, oficialmente, um papel de líder, mas os especialistas coincidem que o acordo faz parte da nova política geoestratégica russa. “Com Putin, a Rússia abandonou a postura de ‘mais um país do extinto bloco soviético’ e decidiu assumir a posição de líder regional. Com Medvedev, estamos vendo o resultado prático desta política externa e a União Euroasiática é o primeiro exemplo claro de um novo bloco geoeconômico”, afirma o diretor do Instituto de Estratégia Nacional, Mikhail Remizov.
Segundo Putin, "esta nova união, forte e supranacional, pode se tornar um dos pólos do mundo moderno e desempenhar o papel de uma ponte efetiva entre a Europa e a região Ásia-Pacífico". Quirguistão e Tadjiquistão estão em conversações sobre a adesão.
Após a queda da URSS, houve várias tentativas de manter as conexões entre as ex-repúblicas. O exemplo mais conhecido é a CEI (Comunidade de Estados Independentes), formada em dezembro de 1991. Apesar de servir como plataforma de diálogo entre os chefes de Estado, os críticos dizem que a CEI tem sido incapaz de produzir qualquer sucesso notável na integração. Na resolução de conflitos políticos, por exemplo, a CEI não conseguiu impedir a guerra entre Rússia e Geórgia em 2008, resultando na saída da Geórgia do bloco.
De acordo com o centro de opinião pública russo VTsIOM, o maior do país, a ideia de uma integração entre os países da ex-URSS é apoiada por 67% dos quirguizes e 62% dos bielorrussos, mas recebe pouco apoio no Azerbaijão (24%) e na Lituânia (26%). Entre os russos, 43% apóiam uma integração no modelo da Uniao Soviética. No entanto, de acordo com uma pesquisa do Centro Levada divulgada em novembro, apenas 53% dos entrevistados na Rússia tinham conhecimento da nova União Euroasiática.
O embaixador da Rússia na OTAN, Dmitry Rogozin, afirmou que “esta é uma união de povos, muito mais do que uma união de territórios”.
Vladimir Putin, que já havia descrito o fim da União Soviética como “a maior tragédia geopolítica do século XX”, negou que tenha a intenção de recriar a URSS, mas afirma que a União seria um “avanço histórico” para os ex-Estados soviéticos. “Queremos criar uma união com os melhores valores da União Soviética”, conclui o primeiro-ministro russo.

Aleksandr Sokurov: A Voz Solitária do Homem


Créditos: CINÉFILO
Título original: Odinokiy golos cheloveka
Direção: Aleksandr Sokurov
Gênero: Drama
Tempo de duração: 87 minutos
Ano de lançamento: 1987
Sinopse: Filmado em 1978, mas banido até 1987, o primeiro longa-metragem de Sokurov foi baseado na obra do escritor soviético Andrej Platonov - este também um artista censurado em seu país. A narrativa, que se passa na década de 1920, durante os anos pós-revolução, está centrada em Nikita, um homem solitário que foi profundamente traumatizado pela guerra civil. O filme acompanha os tortuosos caminhos de sua relação com a esposa, uma mulher de classe média, e as dificuldades que eles enfrentam para se adaptar à nova sociedade que se instaura na Rússia.
Imdb: http://www.imdb.com/title/tt0122591/
Filmow: http://filmow.com/a-voz-solitaria-do-homem-t18675/

Parte 1
Parte 2
Parte 3
Parte 4
Parte 5
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Parte 7
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Parte 9
Parte 10
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O Trompetista e o Suicida


  •  Eugenio Lara no sitio PENSE


  • Difícil imaginar outra modalidade mais universal de comunicação do que a música. Certamente, a comunicação entre os espíritos mais elevados deve ser também por música, como se fosse um concerto, a mente em harmonia, com ritmo, pulsão, beleza: o improviso emocionalmente controlado. Em “Contatos Imediatos do Terceiro Grau”, belo filme de Steven Spielberg, a linguagem musical, universal, foi o meio de contato com os extraterrestres, com poucas notas musicais, minimalistas. Bela sacada!

    A música funciona sempre como catalisador de nossas emoções. Basta ver os hinos entoados durante as antigas batalhas ou na guerra esportiva, nos hinos cantados de modo veemente, agressivo, pelas torcidas organizadas ou mesmo pelas não-organizadas, nos bares, nas quadras, na várzea, nos estádios monumentais: a música nas passeatas, nos festivais, como foi em Woodstock e hoje nos bailes funk, de emos, góticos, em raves, nos pagodes da vida.

    Quantos músicos não foram perseguidos, torturados e mortos por empregarem sua arte musical como ação eficiente de protesto, de denúncia? Lembro-me de meus prediletos Victor Jarra, Geraldo Vandré, Violeta Parra, Taiguara, de tantos músicos outros que ousaram ofertar sua expressão musical a serviço dos direitos humanos, contra a repressão, a violência, o autoritarismo, contra as corporações, o Estado repressor.

    Poderia ficar aqui, ad infinitum, citando variados casos onde a música funciona como fonte inspiradora, de acalanto, consolação, de protesto. Entretanto, escrevo essas palavras iniciais para expressar a profunda emoção lacrimosa que senti ao ver e ouvir na TV o depoimento de um músico radicado em Brasília-DF, um trompetista bastante reconhecido e requisitado, sobre a energia que a música movimenta, sem que nos demos conta disso.

    Refiro-me ao músico paraibano Moisés Alves, em um depoimento comovente sobre a sua costumeira compulsão em tocar seu trompete, tirando dele notas e harmonias sensíveis, alegres, ternas ou tristes, improvisadas. Em meio à apresentação de sua banda Moisés Alves Quinteto, no Clube do Choro de Brasília - Capital do Choro, retransmitida pela TV Senado, ele proferiu um testemunho que vale a pena compartilhar. De modo sincero, expôs a paixão que tem pela música e a necessidade inexplicável em tocar seu instrumento.

    Conta ele que, certa vez, estava no apartamento de um amigo, muito rico, em um imóvel luxuoso, lá mesmo em Brasília, onde mora. Ele pediu ao amigo se poderia tocar, pois estava sentindo uma vontade compulsiva, algo que sempre ocorre com ele. Naquele dia, o desejo foi mais forte...

    Tarde seca e pouco ensolarada, como são as tardes de Brasília no final de inverno. Tocou seu trompete à beira da janela na sala, improvisou um belo solo. Mais ou menos uma hora e meia após a inusitada execução musical, alguém bateu à porta do apartamento. Seu amigo, ao atender, se deparou com um vizinho extasiado, embevecido, querendo saber se era ele mesmo que havia tocado o solo de trompete. Disse-lhe que não, que o solo havia sido obra de um amigo seu, ali presente. Chamou-lhe. O rapaz se apresentou e deu um testemunho marcante e emocionado: “Eu estava prestes a me suicidar quando ouvi aquela música. Parei com meus pensamentos destrutivos e ao ouvir aquele som, desisti da ideia de me matar”.

    O pobre suicida, não mais que de repente, começou a ver as coisas sob outro ângulo, mudou seu tônus mental devido àquela música. Deve ter imaginado que, apesar de tudo, de toda a desgraça e desilusão de sua vida, valeria a pena prosseguir, ao curtir aquele som agradável e mavioso. E em seu depoimento, concluiu Moisés: “a música movimenta energias que desconhecemos”.

    Imaginar que os espíritos nos dirigem, como eles mesmo afirmaram a Allan Kardec, sempre me pareceu um exagero, compreensível, ainda mais em uma época anterior à psicanálise, à engenharia genética, à física quântica. Algo bem diferente daquela frase notória do fundador do positivismo, Auguste Comte: “os vivos são sempre e cada vez mais governados necessariamente pelos mortos”. No caso, não se trata de uma imortalidade subjetiva, meramente cultural, como imaginava o grande idealizador da Religião da Humanidade. Trata-se de uma imortalidade dinâmica e objetiva, no dizer do pensador espírita Jaci Regis, pois neste caso, apesar da compulsão costumeira de nosso amigo trompetista, aquele momento foi especial sob o ponto de vista extrafísico. A meu ver, a influência espiritual foi decisiva, muito mais do que um suposto acaso ou algum tipo de sincronicidade, vazia de sentido.

    Eu, no lugar de nosso amigo suicida, se ouvisse um daqueles funks repetitivos e insuportáveis, naquele momento dramático, aí sim reforçaria minha coragem em me matar. Seria a cereja no bolo de meu suicídio voluntário. Por sorte, não era surdo. O que ele ouviu naquele instante foi decisivo, determinante. O amparo espiritual de nosso simpático suicida foi eficiente. Essas coisas acontecem a todo momento. Nós é que em nossa santa ignorância, não percebemos. Porque a vida é muito mais simples e interessante do que imaginamos...


    Eugenio Lara, arquiteto, jornalista e designer gráfico, é fundador e editor do site PENSE - Pensamento Social Espírita [www.viasantos.com/pense], membro-fundador do Centro de Pesquisa e Documentação Espírita (CPDoc) e autor dos livros em edição digital: Racismo e Espiritismo; Milenarismo e Espiritismo; Amélie Boudet, uma Mulher de Verdade - Ensaio Biográfico; Conceito Espírita de Evolução; Os Quatro Espíritos de Kardec e Os Celtas e o Espiritismo.
    E-mail: eugenlara@hotmail.com

    LDB completa 15 anos e divide especialistas em ensino superior



    A última versão da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), sancionada em 1996 e em vigor até hoje, completa 15 anos esta semana. Conhecido como Lei Darcy Ribeiro, em referência ao senador responsável pela relatoria do projeto, o dispositivo tem como tarefa principal orientar o ensino do país, fornecendo as bases jurídicas para efetivação do direito à educação. Vista por alguns especialistas como um avanço, há também quem questione seus termos e sua aplicação ao longo desses anos.
    No campo do ensino superior, as principais divergências se situam entre o ensino privado e o ensino público. Enquanto os defensores das instituições privadas enxergam na LDB uma porta de entrada para sua expansão e diversificação, os apoiadores do ensino público apontam algumas dificuldades para a garantia do acesso universal à formação gratuita e de qualidade.

    Celso Frauches, especialista em ensino superior privado.
    Para a a professora do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em estrutura e política do ensino superior, Líghia Horodynski-Matsushigue, “a LDB promoveu uma série de aberturas em relação ao ensino superior que, mais tarde, se tornaram deletérias para a educação brasileira como um todo”.
    Já o consultor sênior do Instituto Latino-Americano de Planejamento Institucional (Ilape) e membro da Associação Brasileira das Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Celso Frauches, considera a LDB “uma lei do futuro”, que possibilitou a ampliação da atuação de instituições privadas de ensino superior no país.
    Segundo o doutor em Educação e autor do livro “As reformas do Ensino Superior no Brasil”, Lalo Minto, um dos grandes problemas da LDB foi a flexibilização de vários elementos previstos na Constituição de 1988 que deveriam ter sido objeto de regulamentação. Como exemplos, ele cita a gratuidade do ensino e a diversificação das instituições de ensino superior.
    Enade 2010
    Das 158 instituições de ensino que foram bem avaliadas, 77 são privadas e 81, públicas. Entre os estabelecimentos de ensino com resultado insatisfatório, 640 são privados e 43, públicos.
    “Ao invés de se investir maciçamente em universidades, que eram consideradas caras e ineficientes, a LDB abriu uma brecha para que o ensino crescesse em instituições não-universitárias.” De acordo com ele, isso ajuda a entender o fenômeno da criação e expansão dos diferentes tipos de instituições, como faculdades, centros universitários, faculdades integradas, centros de ensino tecnológico – ocorridos na década seguinte à aprovação da Lei.
    Uma das conseqüências dessa diversificação, aponta Minto, foi a separação entre ensino, pesquisa e extensão. “A indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão já era um problema histórico entre as instituições privadas. A LDB não apenas não alterou essa realidade, como facilitou a ampliação do setor, sem levar em consideração esse princípio.”
    Por outro lado, acrescenta ele, os variados tipos de unidades de ensino produzem também níveis diferenciados de formação. “A formação em instituições não universitárias é algo que se reflete, geralmente, nos postos que essas pessoas vão ocupar no mercado de trabalho.”
    Frauches avalia que essa ampliação foi positiva, pois por não estarem comprometidas com pesquisa e inovação, as instituições que surgiram se focaram em cursos de graduação de qualidade. “E fazem uma prestação de serviço muito boa”, acrescenta.

     Educação a distância 

    Outro aspecto da LDB que alimenta ainda mais a polêmica entre públicas e privadas é a abrangência da educação a distância para o ensino superior.

    Líghia Horodynski-Matsushigue, professora do Instituto de Física da USP.
    Com a aprovação da LDB, a modalidade apresentou um crescimento vertiginoso. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o número de matrículas passou de 5.287, no ano 2000, para 838.125 em 2009.
    Para Líghia, a formação à distância dos profissionais da educação básica já está afetando a forma como eles se colocam diante de uma sala de aula. “Ao contrário do que é feito no resto do mundo, onde a educação a distância é usada somente para algumas matérias e para compor currículos, no Brasil, ela tem formado integralmente alguns profissionais, sobretudo nas áreas de pedagogia e assistência social.”

    Carreira Docente

    O artigo 52 da LDB – que determina a exigência de, no mínimo, um terço de professores com titulação de mestrado ou doutorado e um terço trabalhando em regime integral para que as instituições sejam reconhecidas como universidades – é visto como um avanço por Frauches. Segundo ele, “essa medida obrigou a iniciativa privada a capacitar os professores para mestrado e doutorado”.
    No entanto, afirma Líghia,“sabemos que isso não é cumprido em grande parte do ensino privado”. Segundo ela, muitas vezes a dedicação exclusiva é à instituição e não à pesquisa, como prevê a Lei. Outro fenômeno recorrente nas privadas, indica ela, é substituição de doutores por mestres, possibilitando o pagamento de salários mais baixos.
    Um problema decorrente dessa exigência, segundo Frauches, é que o doutorado não garante uma formação de qualidade para o magistério superior. “Nos programas de doutorado oferecidos hoje raramente há uma disciplina voltada para metodologia do ensino e de aprendizagem. Temos excelentes pesquisadores, mas professores que não dão conta da complexidade de uma sala de aula do ensino superior”, afirma.

    Acompanhe a cronologia da LDB, desde a sua primeira versão em 1961:


    Maria Inês Nassif: Vem aí o ano da Privataria

    2011, o ano em que a mídia demitiu ministros. 2012, o ano da Privataria.
    A imprensa estará muito menos disposta a comprar uma briga durante a CPI da Privataria – quer porque ela começa questionando a lisura de aliados sólidos da mídia hegemônica em 1994, 1998, 2002, 2006 e 2010, quer porque esse tema é uma caixinha de surpresas.

    Maria Inês Nassif, na Carta Maior

    Em 2005, quando começaram a aparecer resultados da política de compensação de renda do governo de Luiz Inácio Lula da Silva – a melhoria na distribuição de renda e o avanço do eleitorado “lulista” nas populações mais pobres, antes facilmente capturáveis pelo voto conservador –, eles eram mensuráveis. Renda é renda, voto é voto. Isso permitia a antevisão da mudança que se prenunciava. Tinha o rosto de uma política, de pessoas que ascendiam ao mercado de consumo e da decadência das elites políticas tradicionais em redutos de votos “do atraso”. Um balanço do que foi 2011, pela profusão de caminhos e possibilidades que se abriram, torna menos óbvia a sensação de que o mundo caminha, e o Brasil caminha também, e até melhor. O país está andando com relativa desenvoltura. Não que vá chegar ao que era (no passado) o Primeiro Mundo num passe de mágicas, mas com certeza a algo melhor do que as experiências que acumulou ao longo da sua pobre história.
    O perfil político do governo Dilma é mais difuso, mas não se pode negar que tenha estilo próprio, e sorte. As ofensivas da mídia tradicional contra o seu ministério permitirão a ela, no próximo ano, fazer um gabinete como credora de praticamente todos os partidos da coalizão governamental. No início do governo, os partidos tinham teoricamente poder sobre ela, uma presidenta que chegou ao Planalto sem fazer vestibular em outras eleições. Na reforma ministerial, ela passa a ter maior poder de impor nomes do que os partidos aliados, inclusive o PT. Do ponto de vista da eficiência da máquina pública – e este é o perfil da presidenta – ela ganha muito num ano em que os partidos estarão mais ocupados com as questões municipais e em que o governo federal precisa agilidade para recuperar o ritmo de crescimento e fazer as obras para a Copa do Mundo.
    Sorte ou arte, o distanciamento de Dilma das denúncias contra os seus ministros, o fato de não segurar ninguém e, especialmente, seu estilo de manter o pé no acelerador das políticas públicas independentemente se o ministro da pasta é o candidato a ser derrubado pela imprensa, não a contaminaram com os malfeitos atribuídos a subalternos. Prova é a popularidade registrada no último mês do ano.
    Mais sorte que arte, a reforma ministerial começa no momento em que a grande mídia, que derrubou um a um sete ministros de Dilma, se meteu na enrascada de lidar com muito pouca arte no episódio do livro “A Privataria Tucana”, do jornalista Amaury Ribeiro Jr. Passou recibo numa denúncia fundamentada e grave. Envolve venda (ou doação) do patrimônio público, lavagem de dinheiro – e, na prática, a arrogância de um projeto político que, fundamentado na ideia de redução do Estado, incorporou como estratégia a “construção” de uma “burguesia moderna”, escolhida a dedo por uma elite iluminada, e tecida especialmente para redimir o país da velha oligarquia, mas em aliança com ela própria. Os beneficiários foram os salvadores liberais, príncipes da nova era. O livro “Cabeças de Planilha”, de Luís Nassif, e o de Amaury, são complementares. O ciclo brasileiro do neoliberalismo tucano é desvendado em dois volumes “malditos” pela grande imprensa e provado por muitas novas fortunas. Na teoria. Na prática, isso é apenas a ponta do iceberg, como disse Ribeiro Jr. no debate de ontem (20), realizado pelo Centro de Estudos Barão de Itararé, no Sindicato dos Bancários: se o “Privataria” virar CPI, José Serra, família e amigos serão apenas o começo.
    A “Privataria” tem muito a ver com a conjuntura e com o esporte preferido da imprensa este ano, o “ministro no alvo”. Até a edição do livro, a imprensa mantinha o seu poder de agendamento e derrubava ministros por quilo; Dilma fingia indiferença e dava a cabeça do escolhido. A grande mídia exultou de poder: depois de derrubar um presidente, nos anos 90, passou a definir gabinetes, em 2011, sem ter sido eleito e sem participar do governo de coalizão da mandatária do país. A ideologia conservadora segundo a qual a política é intrinsicamente suja, e a democracia uma obra de ignorantes, resolveu o fato de que a popularidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizimou a oposição institucional, em 2010, e a criação do PSD jogou as cinzas fora, terceirizando a política: a mídia assumiu, sem constrangimentos, o papel de partido político. No ano de 2011, a única oposição do país foi a mídia tradicional. As pequenas legendas de esquerda sequer fizeram barulho, por falta de condições, inclusive internas (parece que o P-SOL levou do PT apenas uma vocação atávica para dissidências internas; e o PT, ao institucionalizar-se, livrou-se um pouco dela – aliás, nem tanto, vide o último capítulo do livro do Amaury Ribeiro Jr.).
    Quando a presidenta Dilma Rousseff começar a escolher seus novos ministros, e se fizer isso logo, a grande mídia ainda estará sob o impacto do contrangimento. Dilma ganhou, sem imaginar, um presente de Papai Noel. A imprensa estará muito menos disposta a comprar uma briga durante a CPI da Privataria – quer porque ela começa questionando a lisura de aliados sólidos da mídia hegemônica em 1994, 1998, 2002, 2006 e 2010, quer porque esse tema é uma caixinha de surpresas.
    Isso não chega a ser uma crise que a democracia não tenha condições de lidar. Na CPI dos Anões do Orçamento, que atingiu o Congresso, os partidos viveram intensamente a crise e, até por instinto de sobrevivência, cortaram na própria carne (em alguns casos, com a ajuda da imprensa, jogaram fora a água da bacia com alguns inocentes junto). A CPI pode ser uma boa chance de o Brasil fazer um acerto com a história de suas elites.
    E, mais do que isso, um debate sério, de fato, sobre um sistema político que mantém no poder elites decadentes e é facilmente capturado por interesses privados. Pode dar uma boa mão para o debate sobre a transparência do Estado e sobre uma verdadeira separação da política e do poder econômico. 2012 pode ser bom para a reforma política, apesar de ter eleições municipais. Pode ser o ano em que o Brasil começará a discutir a corrupção do seu sistema político como gente grande. Cansou essa brincadeira de o tema da corrupção ser usado apenas como slogan eleitoral. O Brasil já está maduro para discutir e resolver esse sério problema estrutural da vida política brasileira.

    (*) Colunista política, editora da Carta Maior em São Paulo.

    sábado, 24 de dezembro de 2011

    O Evangelho Segundo São Mateus (Pier Paolo Pasolini, 1964)


    Sinopse: O filme segue de maneira fiel aos textos de Mateus todas as etapas da vida de Cristo, de seu nascimento à ressurreição. O Cristo pasoliniano, no entanto, é um Cristo revolucionário, mais humano que divino, com muitos traços de doçura e que reage com raiva à hipocrisia e à falsidade dos homens.










    Créditos: Sétimo Projetor

    Direção: Pier Paolo Pasolini
    Roteiro: Pier Paolo Pasolini
    Título Original: Il Vangelo Secondo Matteo
    Origem: Itália/França
    Duração: 131 min
    Idioma: Italiano
    Legendas: Português
    Formato: rmvb
    Tamanho: 498 MB
    Servidor: Rapidshare
    Crítica: O Evangelho Segundo São Mateus, por Luiz Carlos Oliveira Jr.

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    Natal de Jesus na pessoa dos pobres


    Sacerdote


    Jesus nasceu pobre, na periferia, distante dos palácios, das riquezas. Como pobre, sentiu as dores do povo oprimido, injustiçado, ferido na sua dignidade de pessoa humana. Aliás, toda sua vida foi voltada para os pobres. Basta ver o sermão da montanha.
    É natal! Muita luz, muita festa, muita música e muito enfeite. Na noite de natal, haverá muitos banquetes, muita comilança. Nas mansões, o clima é de grande festa. Cada um com sua roupa caríssima, elegância fora do comum. Tudo é encantador, maravilhoso, emocionante: Comidas, bebidas, músicas, desfiles de modas. Porém, o Jesus pobre, esfarrapado e humilhado, na pessoa dos famintos, doentes, presos, injustiçados, não será o centro da festa. Para essa gente, esse Jesus não existe.
    É natal! Na noite de natal, milhares de crianças vão morrer de frio, de sede, de fome...; Muitos irmãos nossos vão clamar, no seu mais profundo silêncio, por justiça, por dignidade, por vida.
    É natal! No dia do nascimento de Jesus pobre, esfarrapado, milhões de seres humanos estarão gritando: socorro! Falta pão na nossa mesa.
    É natal! Neste dia, muitos animais de estimação estarão com suas roupas novas, de marcas, banhados e cheirosos, comendo comida especial, mas as criancinhas preferidas de Jesus vão dormir chorando pedindo um pouco de pão.
    É natal! Aqui no sertão paraibano, neste dia de natal, os clamores dos pobres por justiça social, por dignidade, por liberdade, por pão e água chegam aos ouvidos de Deus.
    É natal! Em Pedra Branca, onde moro, vejo tantos pais e mães clamando pelos seus filhos: roupa ,alimento, remédio, cadeira de roda, água ,dignidade.
    É natal! Os pobres comem um pouco de feijão, arroz e um pedaço de carne, enquanto os ricos se deleitam com suas comidas caríssimas. Então, é natal dos pobres e dos ricos?
    É natal! Políticos, sem escrúpulos, aumentam seu próprio salário. Enquanto o povão sobrevive graças a um famigerado salário mínimo.
    É natal! Relativismo religioso, secularismo, absolutização do poder, do ter; abandono dos valores evangélicos.
    É natal! Alienação política, terrorismo político-cultural, reacionarismo religioso, relativismo ético-moral, consumismo, idolatria do mercado. É natal dos endinheirados, dos consumistas.
    É natal! Desprezo à pessoa humana, fome, miséria, sede, guerra, desemprego, injustiça social. Quanta hipocrisia na noite de natal!
    É natal! Tantas vezes cristãos compromissados com o reino de Deus, com a justiça social são vítimas de calúnias, difamações, de violência.
    É natal! O padre quando luta para que o povo de sua comunidade viva com dignidade passa a ser vítima dos poderosos e de seus comandados.
    É natal! Quando o padre fala de anjos, de coisas do outro mundo, leva o povo ao delírio psíquico, é santo, é padre dez; quando fala das injustiças que agridem a dignidade da pessoa humana, e chama, em nome da fé, a lutar contra esse mal, logo é tachado de demônio, de desobediente à Igreja.
    É natal! Quando o padre vive só de louvar a Deus é rotulado de padre verdadeiro; quando faz o povo tomar consciência dos seus direitos inalienáveis , alguns dizem: vamos fazer abaixo assinado para tirá-lo, ele é perigoso.
    É natal! Milhares de pessoas, no meu sertão, bem no vale do piancó, gritam: bebemos água imprópria para o consumo humano.
    É natal! Milhares de estudantes, no vale do piancó, clamam: por que na nossa região não há um campus da UFCG E UEPB? Temos o direito de fazer um curso superior, mas nos é negado este sagrado direito.
    É natal! No meu sertão paraibano, quantas pessoas clamando por assistência-médico-hospital com dignidade.
    É natal! No vale do piancó, as pessoas que desejam uma consulta médica ou odontológica têm que pegar a fila ainda de madrugada. Só assim, conseguem uma ficha. Imagine acordar-se de madrugada para conseguir uma ficha.
    É natal! Corrupção nas esferas públicas reina neste Brasil. E os pobres sofrem as terríveis consequências.
    É natal! Quando uma autoridade, seja quem for, tenta combater a corrupção existente neste País, passa a ser destratada, caluniada, sofre reprimenda por parte dos seus superiores.
    É natal! Muitas orações, muitas celebrações, muitos louvores, muitos aplausos para Jesus, muitas mensagens de felicitações, muitas confraternizações, porém, pouca sensibilidade humano-cristã diante dos sofrimentos de tantos irmãos nossos, vítimas da fome, da miséria, da sede...
    E o natal? Na criança faminta, no doente mal atendido nos hospitais, na pessoa desempregada, nos agredidos em sua dignidade de pessoa humana, nos pobres, nos favelados, nos sem vez e voz. Então é natal de Jesus na pessoa dos pobres!
    É natal em cada Belém deste recanto paraibano.

    sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

    O movimento social e seu protagonismo

      Waldemar Rossi   no CORREIO DA CIDADANIA

    Como indicava a movimentação popular nos últimos meses de 2010, o ano que finda começou quente. Em várias partes do planeta, povos se manifestaram, e se manifestam, seja contra sistemas políticos autoritários, seja contra os ataques do poder econômico sobre os direitos trabalhistas ou contra a economia popular. Mais especificamente, na Europa unificada pelo euro, tanto na Grécia quanto na Itália as ruas foram ocupadas pelo povo, enfrentando governantes por conta de suas políticas econômicas, polícias violentas e a opinião da mídia conservadora.

    Isto não quer dizer que o capital financeiro esteja sendo derrotado. Por enquanto sua vitória sobre os povos é significativa. Governos fazem acordos com o poder político e econômico europeu e continuam impondo pesadas perdas sociais e econômicas às suas populações. Porém, nada está sedimentado e o melhor exemplo nos vem da Grécia com a população não dando tréguas aos seus governantes. Tudo indica que ao menos Itália, Espanha, Irlanda e Portugal terão um novo ano muito “aquecido”, apesar do inverno. É possível até que outros povos europeus venham a se indispor contra os governos da Alemanha e França devido às exigências impostas à Grécia e à Itália, cujos governos se submetem às exigências dos banqueiros credores.

    As últimas notícias mostram que o clima poderá esquentar também por conta da nova estrutura que vem sendo montada para tentar salvar a Europa unificada em torno do euro, novamente por imposição da Alemanha e França. Tudo leva a crer, por isso, que outros países sofrerão as mesmas pressões da política econômica franco-alemã, com as respectivas reações dos setores prejudicados.

    Países do Oriente Médio e do norte da África continuaram com suas convulsões intermináveis. Sabe-se que por trás disso tudo estão os interesses capitalistas sobre a enorme reserva de petróleo daquela área. Ditadores foram e são protegidos enquanto servem aos interesses das nações consumidoras do “ouro negro”, mas entram em crise quando não mais servem aos interesses dos seus protetores. E o povo vem pagando o preço com suas vidas. O despertar da consciência popular vem resultando em revoltas coletivas, com quedas de governos, mas também com derramamento de sangue e perdas de milhares de vidas de gente do povo. Acontecimentos já esperados pelo histórico recente da região.

    O que quase ninguém esperava eram as reações populares nos Estados Unidos, que atingem o vizinho Canadá. Desde as várias manifestações dos mais pobres, passando pelo movimento estudantil (omitidos pela grande imprensa brasileira), chegando aos protestos do movimento Ocupy Wall Street contra os grandes banqueiros larápios. Os fatos mostram que o norte está como o clima do planeta: em aquecimento.

    No caso do Brasil, a mobilização começou por onde menos se esperava: a construção civil. Já nos primeiros meses do ano, as obras da barragem do Jirau e Santo António foram alvo de uma greve que mobilizou mais de três mil operários contra o grau da exploração das condições de trabalho e de alojamento praticada pelas grandes empreiteiras responsáveis pelas obras superfaturadas. Tal fato inesperado forçou o governo Dilma a enviar pessoas de sua inteira confiança para jogar água na fervura, uma vez que os representantes das centrais sindicais disputavam apenas o controle do movimento, mas não conseguiam demover os trabalhadores e convencê-los a retornar ao trabalho. Daí para frente foram greves nos estádios de futebol, que estão sendo construídos ou em reformas, e que se espalharam também para outras obras faraônicas financiadas pelo PAC (dinheiro do povo em favor das empreiteiras).

    Ou seja, os operários da construção civil foram a alavanca de tantas outras manifestações que se desenrolaram no país: Correios, bancários, metalúrgicos, ferroviários, químicos, petroleiros, servidores públicos municipais, federais e estaduais. Entretanto, são os professores que vêm dando as cartas na contestação crescente à política educacional brasileira. Em vários estados os trabalhadores do ensino resolveram sair do marasmo reinante, começando a questionar não apenas salários medíocres e aviltantes, mas também a qualidade do ensino praticado no Brasil a partir da ditadura militar e aprofundada por todos os governos eleitos pelo povo. A educação vem sendo tão duramente rebaixada no país que todas as avaliações internas e externas a colocam como das piores entre as ruins. E isso está mexendo com a consciência dos educadores.

    Outro aspecto positivo nessas manifestações tem sido o apoio de alunos aos movimentos dos seus professores, apesar da total apatia e ausência da UNE, comandada pelo PC do B há muitos anos. Portanto, nota negativa para a direção da UNE pactuada com o governo federal e responsável pela desmobilização estudantil no país inteiro.

    Merecem destaque também as várias manifestações populares em defesa da moradia popular, contra o criminoso Código Florestal, contra as barragens destruidoras do meio ambiente, contra a política financeira para as obras da Copa e das Olimpíadas. Entre as nações indígenas brasileiras percebe-se o crescimento da resistência aos constantes crimes contra elas praticados por latifundiários, mineradoras, desmatadores e empreiteiras encarregadas pela construção de barragens - Belo Monte, por exemplo. Pode ser que as nações indígenas ainda venham a ter algum sucesso em suas lutas contra o sistemático extermínio a que vêm sendo submetidas há mais de 500 anos, cujos criminosos restam impunes pela conivência dos governantes. Os trabalhadores sem terras não desanimam de lutar pela Reforma Agrária, tantas vezes prometida por políticos mentirosos e sem escrúpulos. Infelizmente, devido à corrupção reinante em nossa “Justiça”, centenas de trabalhadores rurais sem terra já perderam suas vidas e, em sua imensa maioria, os criminosos continuam impunes. Mas as lutas pela terra continuam.

    Apesar dos avanços das mobilizações populares, fica evidente a falta de organizações capazes de unificar tantas lutas do povo. As forças de esquerdas que ainda resistem não conseguem ter um projeto para uma política unificadora dos vários movimentos. Ainda estamos no estágio de franco-atiradores, cada setor lutando desesperadamente em defesa dos seus interesses particulares. E isto ainda nos enfraquece, permitindo que o capital e os políticos inescrupulosos (poucos se salvam, como vemos a cada dia pelas informações) deitem e rolem sobre os interesses e a própria vida do povo. A falta de política e de instrumentos unificadores permite, por exemplo, que governos municipais, estaduais e federal soneguem o dinheiro público destinado à educação e à saúde públicas, desviando-o para obras sem real interesse popular, que favorecem o capital sempre ávido por lucros e mais lucros, obras sempre marcadas pela corrupção.

    Tais limitações revelam que estamos apenas no reinício das mobilizações populares necessárias e com força para impor mudanças profundas nas estruturas política, econômica, social e cultural que tanto almejamos. Estando em fase de retomada das mobilizações semelhantes às dos fins dos anos 70 e das décadas de 80 e 90, podemos esperar que haja a devida evolução e que os setores sociais busquem logo mais construir um novo processo, agora mais coletivo que antes, que permita ao povo assumir seu papel de protagonista na construção de uma nova sociedade, justa, fraterna e realmente participativa.

    Missão histórica para as atuais e futuras gerações. Que o ano de 2012 seja, portanto, mais “quente” e organizado que 2011.

    Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.