sábado, 4 de agosto de 2007

A grande disputa pela Ásia Central

Sem alarde, Estados Unidos, Rússia, União Européia e China travam uma intrincada batalha pela região em torno do Mar Cáspio. Rica em petróleo e gás, marcada por regimes instáveis e disputas religiosas, ela pode ser o centro de grandes conflitos no século 21

Régis Genté

No século 19, a expressão "Grande Jogo" tornou-se lendária com Kim, romance de Rudyard Kipling, que fazia alusão a disputa das grandes potências para consolidar seus impérios e desarticular os dos rivais. Na época, o que estava em jogo era chamado de "as Índias", a jóia da coroa britânica cobiçada pela Rússia imperial . A disputa durou um século e acabou em 1907, quando Londres e São Petesburgo entenderam-se sobre a divisão de suas zonas de influência, com a criação de um Estado amortecedor entre elas: o Afeganistão. O acordo valeu até 1991. "Hoje, embora tenham mudado os métodos e as idéias em nome das quais as potências agiam, o objetivo continua o mesmo. Trata-se de colonizar, de um modo ou de outro, a Ásia Central, a fim de neutralizarem-se uns aos outros. O gás e o petróleo são certamente cobiçados por si próprios, mas também funcionam como um modo de influenciar", explicou Muratbek Imanaliev, antigo diplomata do Quirguistão (antiga república soviética, hoje país independente), que preside o Institute for Public Policy em Bichkek, a capital.

Desde a queda da União Soviética, os novos Estados independentes vêem no petróleo um meio de alimentar o orçamento e reforçar sua independência em relação a Moscou. No final dos anos 90, a empresa norte-americana Chevron esteve de olho na bacia petrolífera de Tenguiz, uma das maiores do mundo, situada no oeste do Cazaquistão. Em 1993, passou a controlar 50% de suas reservas. Do outro lado do Cáspio, o presidente do Azerbaijão, Gueidar Aliev assinou, em 1994, o "contrato do século" com empresas petrolíferas estrangeiras, para a exploração do campo Guneshli-Chirag-Azeri.

A Rússia enfureceu-se: o petróleo do Cáspio estava-lhe escapando. Moscou esperava que a convivência com Aliev fosse melhor do que com seu antecessor, o nacionalista anti-russo Alboulfaz Eltchibey, primeiro presidente do Azerbaijão independente, derrotado por um golpe em junho de 1993, alguns dias antes de assinar importantes contratos com as maiores petrolíferas anglo-saxãs. Excelente conhecedor das engrenagens do sistema soviético, Gueidar Aliev, ex-general da KGB e antigo membro da direção do Partido Comunista, negociou, em segredo, com as petrolíferas russas para preparar o terreno de um acordo com Moscou: a Lukoil obteve 10% do consórcio Guneshli-Chirag-Azeri. Leste e oeste começam, então, a explorar as jazidas da zona.

Um novo oleoduto expressa o projeto de dominação de Washington

Nos anos 90, para justificar a penetração na bacia do Cáspio, os Estados Unidos começaram a superestimar as reservas de hidrocarbonetos que a bacia continha. Falavam em 243 bilhões de barris de petróleo. Só perdia para a Arábia Saudita. Hoje, estima-se, para tais reservas contenham apenas 50 bilhões de barris de petróleo e 9,1 trilhões de metros cúbicos de gás — ou seja, 4 a 5% das reservas mundiais. Os Estados Unidos só ousaram blefar porque queriam o gasoduto estratégico conhecido como BTC [1] a qualquer preço. "Eles fizeram de tudo por isso. Tratava-se de prevenir a extensão da influência russa, de torná-la mais difícil. Eu não sei até que ponto sabiam estar exagerando", afirmou Steve Levine, jornalista norte-americano que acompanha o tema desde o começo dos anos 90.

Desde 2002, esse jogo de influências se intensifica. Em favor da "guerra contra o terrorismo", travada no Afeganistão desde os atentados de 11 de setembro, os militares norte-americanos metem os pés na ex-URSS. com a bênção de uma Rússia enfraquecida. Washington instala bases militares no Cazaquistão e no Uzbequistão, promentendo reparti-las assim que a "gangrena islâmica" estivesse erradicada. "Bush utilizou esse engajamento militar maciço na Ásia Central para selar a vitória da Guerra Fria contra a Rússia, conter a influência da China e manter o cerco em torno do Irã", calculou o antigo correspondente de guerra Lutz Kleveman.

Washington também desempenhou um papel determinante nas "revoluções coloridas" da Geórgia (2003), Ucrânia (2004) e Kirguistão (2005), todas grandes derrotas para Moscou. Completamente perdidos com as freqüentes inversões de poder no local, alguns autocratas da região viraram as costas para os EUA e se aproximaram da Rússia ou da China.

Na medida em que Pequim também entra nos negócios da Ásia Central e em que a Europa acelera os projetos de captação de gás do Cáspio — após a guerra do gás russo-ucraniana, de janeiro 2006 — o jogo está, de fato, complicado. Petróleo, segurança, disputas de influência e batalhas ideológicas: é preciso apostar em todos os cenários pra fincar os dardos no "Grande Jogo".

Cobiçado por muitas potências, o gás tem novos preços

No começo, a Rússia tinha uma certa vantagem nesse braço de ferro. Em 1991, controlava todos os oleodutos que permitiam aos novos países independentes escoar petróleo e gás. Mas os antigos burocratas soviéticos ("apparatchiki") que se tornaram presidentes dos novos Estados esforçaram-se para não colocar todos os ovos na cesta russa. Depois do fim da União Soviética, construiu-se meia dúzia de oleodutos que não passavam pelo território do grande irmão. Moscou perdeu sua influência política e econômica.

O exemplo do Turcomenistão é emblemático das relações da Rússia com seu antigo satélite: 40 dos 50 bilhões de m3 de gás que produziu, em 2006, foram vendidos para a Rússia. Sem escolha. Fora um pequeno gasoduto inaugurado em 1997, que o conecta ao Irã, o país dispõe apenas do SAC-4, oleoduto que acaba na Rússia. Uma verdadeira prisão. Em abril de 2003, o presidente russo Vladimir Putin pôde coagir seu homólogo turcomeno, Saparmourad Niazov (falecido no fim de 2006), a assinar um contrato de 25 anos, envolvendo 80 bilhões de m3 por ano, vendidos ao preço irrisório de 44 dólares por mil m3.

No começo, o governo turcomeno tentou cumprir as condições, mas logo parou de entregar o gás. No inverno de 2005, Moscou resignou-se a pagar 65 dólares por mil m3, porque o gás lhe é indispensável, principalmente para servir a população a preços baixos. Em setembro de 2006, a Gazprom, estatal russa de gás, foi mais longe. Assinou com o Turcomenistão um contrato por meio do qual comprometeu-se a pagar 100 dólares por mil m3, no período entre 2007 e 2009. Cinco meses antes (em abril), o falecido ditador turcomeno assinou um documento com o presidente chinês Hu Jintao. Tal compromisso reza que o Turcomenistão deve fornecer à China 30 bilhões de m3 de gás natural por ano, durante 30 anos, a partir de 2009. Para isso, deve construir um gasoduto de 2 mil quilômetros. Foi sem dúvida este o motivo que levou a Gazprom a rever seus preços.

O Turcomenistão quer elevar as apostas? Em abril, de volta da sua primeira visita oficial a Moscou, enquanto presidente, Gurbangouly Berdymoukhammedov convidou a Chevron participar do desenvolvimento do setor energético turcomeno. Seu antecessor jamais teria ousado fazer um convite do tipo a uma grande petrolífera internacional. Além disso, ele não diz "não" aos avanços europeus no "corredor transcáspio". Talvez, ameace fazer com que os ocidentais entrem no seu jogo para que a Gazprom aceite pagar mais. Ele recebe da Europa mais de 250 dólares por mil m3 por seu gás.

Êxitos e fracassos da Rússia, em busca da influência perdida

No entanto, Putin propôs restaurar o SAC-4 e construir outro gasoduto ligando os dois países. "A Rússia quer mostrar aos turcomenos que está pronta a fazer muito por eles. Moscou espera dissuadi-los de negociar com os chineses e com os ocidentais", observou o jornalista russo Arkady Dubnov. "A disputa que Moscou deve travar com o Turcomenistão prova que a Rússia está longe de ser onipotente em relação às antigas repúblicas soviéticas, e que hoje prevalecem o pragmatismo econômico de Putin e de seu entorno", concluiu Dubnov.

O método tem o inconveniente de ser muitas vezes brutal. Foi por isso que, em 2006, uma crise do gás entre Rússia e Ucrânia atingiu os europeus. O fantasma da interrupção do fornecimento das provisões pairou sobre o velho continente, que importa da Rússia um quarto de gás que utiliza. Contudo, Jérôme Guillet, autor de um relatório sobre as guerras do gás de 2006, relativizou: tais crises são "muito mais um reflexo das disputas travadas entre as poderosas facções do Kremlin ou da Ucrânia que de uma utilização deliberada da ’arma energética’ ".

Primeiro produtor mundial de gás e segundo em petróleo, a Rússia recobrou seu bem-estar financeiro e toma iniciativas estratégicas. Em 15 de março, assinou um acordo com a Bulgária e a Grécia para a construção do oleoduto Burgas-Alexandropolis (BAP). Um verdadeiro concorrente do BTC, e além disso o primeiro duto que o Estado russo controla sobre território europeu. Ainda assim, depois de alguns meses, o petróleo corre pelos 1760 Km do BTC e o gás pelo Bakou-Tbilissi-Erzurum (BTE). A artéria vital da influência ocidental, na ex-URSS, é funcional. Ela produz seus primeiros efeitos políticos.

Hoje, a Geórgia parece um pouco menos dependente do gás russo que, há apenas um ano, era o único que podia importar. Os aumentos absurdos de preço que os russos lhe impuseram – em dois anos, passaram de 55 dólares a 230 dólares por mil m3 – não afetaram tanto a economia georgiana quanto Moscou esperava. Os volumes fornecidos pelo BTE — a título de royalties — e pela Turquia, cedendo a preço de banana a parte do gás que lhe chega pelo mesmo gasoduto, permitiram obter o combustível a um preço médio aceitável.

Azar de Moscou: a tentativa de impor um aumento de preços da mesma ordem ao Azerbaijão, na esperança de que repercutisse sobre as vendas em Tbilisi, provocou a ira do presidente Ilham Aliev. "Isso prova o quanto o BTC [assim como o BTE] é certamente a maior vitória norte-americana na política internacional desses últimos quinze anos. É uma vitória em matéria de contenção da Rússia e de apoio à independência das repúblicas do Cáucaso", especulou Steve Levine. Tais oleodutos oferecem aos Estados Unidos e à Europa a possibilidade de lançar outros projetos para diversificar suas fontes de abastecimento e incluir em seu círculo político os novos Estados independentes da região.

Na prancheta, novos mega-projetos para drenar a enegia do Cáspio

Diversos projetos estão na ordem do dia. O primeiro, o Kazakhstan Caspian Transportation System (KCTS), destina-se a escoar o petróleo de Kashagan, a maior jazida descoberta no mundo nos últimos trinta anos. Deve entrar em produção no final de 2010, e os acionistas do consórcio que o explora — as grandes petrolíferas ocidentais — pretendem transportar seus 1,2 a 1,5 milhões de barris por dia, via um itinerário de sul a oeste atravessando o Cáspio. Está fora de cogitação que o oleoduto passe sob o mar, por causa da oposição russa e iraniana: uma frota de navios petroleiros fará, por isso, a passagem entre o Cazaquistão e o Azerbaijão, onde um novo terminal petrolífero conectará o "sistema" ao BTC. Ali, graças a algumas estações de bombeamento suplementares e ao uso de determinados produtos que dinamizariam a passagem do óleo pelos canos, sua capacidade deverá passar de 1 para 1,8 milhão de barris por dia.

O segundo projeto ainda está no começo: trata-se do "corredor transcaspiano" que servirá para fornecer o gás do Cazaquistão e do Turcomenistão à Europa. "Nós falamos de ’corredor’ e não de gasoduto", explica Faouzi Bensara, conselheiro de energia da Comissão Européia. Ele prossegue: "propomos uma reflexão sobre as soluções tecnológicas alternativas, como encorajar os investidores para que produzam, por exemplo, gás natural liquefeito no Turcomenistão — que poderia ser em seguida transportado por barco até Baku." A União Européia não se vê como um dos atores do "Grande Jogo", explica: "ela é apenas guiada pela demanda. Em breve, vamos precisar de 120 a 150 bilhões de m3 de gás por ano. Nosso objetivo é encontrar fornecedores suplementares e diversificar as fontes de abastecimento. Só isso. As soluções que buscamos serão complementares às já existentes."

Outro grande oleoduto estratégico apoiado por Washington tem pouca chance de sair do papel: é o Turcomenistão-Afeganistão-Paquistão-Índia (TAPI), famoso oleoduto que os Estados Unidos, juntamente com a empresa petrolífera norte-americana Unocal, pretendiam construir com os talebans, na segunda metade dos anos 90. "Esse projeto traz muitos inconvenientes em matéria de segurança, com o retorno dos talebans no Afeganistão. Além disso, muitos experts calculam que as reservas do Turcomenistão não foram corretamente avaliadas", diz o professor Ajay Kumar Patnaik, especialista em Rússia e Ásia Central na Universidade de Jawaharlal Nehru, em Nova Delhi.

Washington defende o TAPI para isolar o Irã e, ao mesmo tempo, enfraquecer a Rússia na Ásia Central. Os Estados Unidos também pretendem integrar o Afeganistão à sua vizinhança fornecendo-lhe meios para aquecer a população e relançar a economia, em troca de sua estabilidade. Com esse objetivo, o departamento de Estado norte-americano reorganizou, em 2005, a divisão que cuida da Ásia do Sul, para fundi-la com a da Ásia Central, a fim de favorecer as relações em todos os níveis na área designada como "Grande Ásia Central"

Quando os interesses do Irã podem se encontrar com os da China

A energia constitui um dos vetores essenciais das relações internas da zona. Daí um certo número de projetos de usinas hidrelétricas, no Tajiquistão, por exemplo, destinadas a alimentar o norte afegão. Mas o conceito geral não é verdadeiramente um consenso. Nova Delhi, principalmente, sente-se longe da Ásia Central e faz corpo mole para entrar no TAPI. O projeto do gasoduto Irã-Paquistão-Índia (IPI), proposto por Teerã, a seduz bem mais. Por enquanto, a lei norte-americana de sações contra o Irã e Líbia (Iran Libya Sanctions Act americana, ILSA) – por meio da qual Washington pune qualquer empresa que invista em petróleo ou em gás em tais países – a impede de apertar o passo.

"O Irã é o maior perdedor do novo Grande Jogo. Não só os oleodutos contornam seu território, como ninguém pode investir nele", constatou Mohammed Reza-Djalili, especialista iraniano em relações internacionais da Ásia Central. "E é justamente de investimentos que o país sente falta. Suas instalações foram construídas em 1970, o que o obriga a importar 40% do que consome de gasolina; não pôde explorar sua porção do Cáspio e sub-explora seu enorme potencial de gás." Além disso é bastante paradoxal que o "Grande Jogo" exclua Teerã, enquanto todos os produtores de hidrocarbonetos na Ásia Central sonham com uma rota para o sul: "Seria a mais econômica e a mais simples tecnicamente", explicou Arnaud Breuillac, diretor de Europa Central e Ásia Continental da Total. "Estamos inseridos em uma lógica de diversificação de nossas vias de exportação. Nesse cenário, optaríamos pela rota sul, pois a região de consumo mais próxima do Cáspio é o norte do Irã."

É por isso que a aproximação com a Organização de Cooperação de Xangai (OCS) representa, segundo Mohamed Reza-Djalili, um colete salva-vidas para a política do Irã na Ásia Central. Por meio dela, Teerã poderia criar laços com a Ásia, principalmente com a China, e ficar mais forte no braço de ferro contra os Estados Unidos."

Por seu lado, a China – explica Thierry Kellner, especialista em China e Ásia Central – persegue três objetivos no "Grande Jogo": segurança, principalmente na província turcófona de Xinjiang, que margeia a Ásia Central; cooperação com seus vizinhos – a fim de impedir que alguma outra potência venha a ser muito importante no espaço centro-asiático; e, enfim, garantir seu abastecimento energético." As diversas compras de ativos do setor petrolífero feitas há alguns anos por Pequim, na Ásia Central, têm feito correr muito petróleo. Em dezembro de 2005, a China já inaugurava um oleoduto ligando Atasu ao Cazaquistão, em Alashnkou, no Xinjiang. "O primeiro contrato do setor petrolífero que Pequim assinou na Ásia foi em 1997", observou Kellner. "A China trabalha a longo prazo. Ela soube estabelecer bases sólidas na Ásia Central, e isso dá resultados hoje."

Disputa entre as potências abre brechas para Estados nacionais

Tal frenesi de compras não tem a ver apenas com as necessidades energéticas de hidrocarbonetos de um país que cresce 10% ao ano. Para Thierry Kellner, isso reflete, também, uma visão geopolítica: "A China não enxerga as coisas em termo de mercado, mesmo que a oferta e a demanda de petróleo sejam globalizadas hoje. Para garantir sua segurança energética, ela se apropria de jazidas e de oleodutos que a abastecem diretamente, ainda que lhe custem muito caro."

Investir na Ásia Central constitui também para os chineses um modo de se envolver nos negócios da região para – dizem eles – contribuir com a sua segurança. Pequim engaja-se no OCS para federar os Estados-membros em torno de temas que lhes são caros, como a luta contra o terrorismo ou a cooperação econômica e energética. Além disso, a organização forma um bloco capaz de se solidarizar fortemente, em caso de desestabilização da zona ou se os Estados Unidos ganharem influência ao ponto de ameaçar os poderes locais. A onda de "revoluções coloridas" no espaço soviético, desde 2003, também levou a tomar uma posição mais clara em relação a Washington. Em julho de 2005, por exemplo, seus seis membros apoiavam o Uzbequistão quando o país exigiu o fechamento da base aérea norte-americana de Karshi-Khanabad, aberta durante a guerra contra o Afeganistão.

O "Grande Jogo" determina os negócios nas repúblicas da Ásia Central e do Cáucaso, que apostam na concorrência — tanto política quanto econômica — entre as grandes potências. Elas ganham um pouco de independência, na medida que podem dizer "não" a uma capital do mundo, para se voltar voltar em direção a outra. Isso as leva freqüentemente a escolher sua dependência. "Apostando nessas brechas, as repúblicas tomam posições cada vez mais divergentes ", constata Imanaliev, o antigo diplomata do Quirguistão. Assim, enquanto o Cazaquistão abre sua economia para o mundo, o Uzbequistão fecha a sua; enquanto a Geórgia no fundo faz o jogo norte-americano, o Turcomenistão mantém uma profunda desconfiança em relação a Washington. Para além dessas diferenças, o "Grande Jogo" lhes permite serem menos coagidas a seguir a via imposta por um dos grandes. Se, por exemplo, o discurso democrático do ocidente contraria os interesses dos dirigentes centro-asiáticos ou caucasianos, eles podem, a qualquer momento, virar-lhe as costas, pois Pequim e Moscou não são tão exigentes nesses casos.

Washington ou Bruxelas também não são tão exigentes assim. Os imperativos estratégicos os conduzem freqüentemente a relegar os direitos do homem a segundo plano, o que desacredita consideravelmente os valores ditos "ocidentais" – que os poderes da região vêm apenas como uma arma ideológica. Desde 2003, para silenciar as críticas, seus dirigentes afiam, mês após mês, um discurso sobre sua própria maneira, "oriental", de construir para si a democracia. Até lá, a corrupção reina no "Grande Jogo": a arca do tesouro do petróleo e do gás, que são riquezas nacionais, em geral ainda escapam ao controle democrático dos habitantes destes países.

Tradução: Patrícia Andrade
pat.patricia@voila.fr



[1] Segundo maior oleoduto do mundo, o BTC transporta óleo por 1776 quilômetros, entre Baku (Azerbaijão), Tbilisi (Geórgia) e Ceyhan (Turquia). Foi inaugurado em 2006. Construído e mantido por um consórcio de empresas petroleiras ocidentais (liderado pela British Petroleum, permite escoar óleo da bacia do Mar Cáspio para a Europa, sem passar por território russo. Na mesma época, com traçado semelhante e idênticas finalidades, foi construído o gasoduto BTE, que permite transportás gás entre Baku, Tblisi e Erzerum, também na Turquia

Estados Unidos, território sagrado?

Decidida a construir um “escudo anti-mísseis” que poderia tornar o país potência nuclear única, a Casa Branca volta a agitar o cenário internacional. Mas a proposta é antiga, de eficácia duvidosa, e pode estar baseada numa visão messiânica sobre o papel dos EUA no mundo

Olivier Zajec

Em um relatório de informações parlamentares, a Assembléia Nacional Francesa analisou os projetos norte-americanos de defesa anti-míssil no dia 28 de março de 2001 [1]. Publicado seis meses antes da destruição das torres gêmeas de Nova York, o documento interpretou tais projetos como algo baseado mais em uma “teologia política” do que em uma “análise estratégica”. Essa teologia seria dotada de uma trindade que podia ser identificada como: o fantasma da segurança absoluta dos Estados Unidos, o mito da fronteira (no caso, a fronteira tecnológica); uma dicotomia bons-maus. O relatório denunciava: “O império do mal não é mais um Estado chamado União Soviética, mas uma categoria relativamente flutuante de Estados: hoje a Coréia do Norte, o Iraque ou o Irã; amanhã, talvez outros”.

No início de 2007, o anúncio da próxima instalação de elementos do programa norte-americano “Missile Defense” (Defesa contra mísseis) na Europa reintroduziu as especulações sobre o significado do programa. Os interceptores da Polônia e os radares tchecos levaram Moscou a reagir, inquietaram os “velhos europeus” e marginalizaram a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), deixando-a repentinamente em situação muito embaraçosa.

Os comentários da imprensa concentram-se, principalmente, nas reações russas — pretexto para inúmeros paralelos históricos que ressuscitam a guerra fria. No entanto, o cerne da discussão é outro. Por exemplo, as pistas lançadas pelo relatório parlamentar francês de 2001. Obsessão pela invulnerabilidade, tropismo da fronteira e “moralização” da política internacional: em que medida essa interpretação ideológica explica a eterna volta da defesa anti-míssil norte-americana, apesar dos questionamentos logo após 11 de setembro?

Uma idéia acalentada deste o lançamento do Sputnik

A defesa anti-míssil nasce em 1957, a partir de uma tomada de consciência brutal: a vulnerabilidade dos Estados Unidos. O primeiro Sputinik começa suas órbitas em volta do planeta. Traumatizados com o célebre sinal, que ressoa como um sino, os Estados Unidos deixam de pensar que constituem uma ilha inatingível: esse sucesso espacial abre, aos soviéticos, a possibilidade de atingir o território norte-americano com a ajuda de mísseis balísticos intercontinentais.

Desde 1957, o programa de defesa “Nike Zeus” prevê interceptores de longo alcance com carga nuclear, capazes de destruir, no ar, os mísseis que visem atingir os Estados Unidos. John Fitzgerald Kennedy, eleito em 1960, com a idéia de um “atraso norte-americano” em matéria de balística (a defasagem do míssil), foi o primeiro presidente a engajar resolutamente seu país num programa de aperfeiçoamento dos mísseis balísticos intercontinentais [2] e, ao mesmo tempo, na via da defesa anti-mísseis. O programa “Sentinel” (Sentinela), de 1966, calculava instalar silos de mísseis interceptores em volta das cidades norte-americanas, protegendo os grandes centros populacionais — alvos prováveis dos soviéticos. Vinte e cinco locais de defesa foram previstos, dotados de mísseis (também com ogiva nuclear) para destruir os mísseis inimigos de um lado e de outro da camada atmosférica.

Diante da reação muito negativa de cidadãos norte-americanos, que não concebiam viver com armas nucleares à sua porta, o “Sentinel” foi transformado em “Safeguard” (Salvaguarda), em 1974. Era um programa “derivado”, que não mais protegia os centros urbanos, mas os locais de lançamento de mísseis intercontinentais. Nos anos 1970, o Vietnã fez um rombo nos orçamentos, e diante do custo do projeto, um só lugar foi determinado para o “Safeguard”. Por sua vez, a URSS construiu silos de defesa anti-míssil em volta de Moscou. Ao contrário dos Estados Unidos, não houve a menor reação da população para impedir esse projeto e a instalação dos mísseis Galosh.

O tratado de mísseis antibalísticos (ABM, sigla em inglês para Anti-Ballistic Missile) [3], de 1972, paralisou os progressos paralelos anti-mísseis russos e norte-americanos por razões de equilíbrio estratégico. No entanto, desde 1976, o sistema norte-americano foi abandonado por motivos de política interna, orçamento e eficácia técnica, enquanto o sistema instalado em volta de Moscou, ainda que pouco efetivo, permaneceu. Essa primeira corrida anti-míssil resultou, na a derrota dos Estados Unidos. O jovem secretário da Defesa dos EUA que, na época, teve de se conformar com a anulação do “Safeguard” chama-se Donald Rumsfeld. Desde então, para Washington, a ação ofensiva, com a melhora dos mísseis intercontinentais, passou a marginalizar a ação defensiva. Esse panorama alterou-se em 23 de março de 1983.

Com Regan e Rumsfeld a proposta tem duas sobre-vidas

Naquele dia, no discurso em que oficializou a Iniciativa de Defesa Estratégica (SDI, sigla em inglês para Strategic Defense Initiative), conhecida como “guerra das estrelas”, o presidente Ronald Reagan anunciou sua ambição de marginalizar as armas nucleares “obsoletas e ineficazes”. A maneira: uma defesa anti-míssil global, baseada em satélites e lasers espaciais, capazes de interceptar qualquer tiro de mísseis balísticos intercontinentais com carga nuclear proveniente da União Soviética (URSS) [4]. Tal discurso marcou a memória coletiva em virtude da corrida armamentista a que ele desencadeava e da asfixia que provocou na União Soviética, deixando-a de joelhos. Entretanto, é preciso matizar. Na época, como se viu, a URSS era um pouco mais avançada que os Estados Unidos em matéria de anti-mísseis. Além disso, a ambição da SDI seria revista e reduzida muito rapidamente. Em 1987, já se tratava apenas de proteger os locais de lançamento de mísseis, em caso de um primeiro ataque russo.

Em 1991, a SDI foi rebatizada de Proteção Global contra Ataques Limitados, e o número de alvos a interceptar, reduzido. A mesma lógica que, em 1976, havia levado ao abandono do programa “Safeguard” se reproduziu: a SDI foi rapidamente alterada. O National Missile Defense Act (Lei de Defesa Nacional contra Mísseis) concentrou, a partir de então, os esforços nacionais em uma defesa anti-míssil operacional nos campos de combate, capaz de interceptar foguetes de curto alcance lançados pelos "Estados-vilões". Tirou-se lição da primeira Guerra do Golfo (1990-1991) e dos ataques de Scuds iraquianos, particularmente contra Israel. A defesa anti-míssil operacional substituiu, então, a defesa anti-míssil territorial (ou seja, intercontinental, baseada em uma oposição entre as duas superpotências).

Entre 1957 a 1991, somente a URSS conseguiu desenvolver um sistema de defesa anti-míssil intercontinental efetivo. Nos Estados Unidos, sucederam-se programas apoiados em declarações políticas reverberantes, mas nenhum desembocou em um sistema operacional generalizado e coerente.

Eleito em 1992, o presidente William Clinton chancelou a passagem da defesa territorial para a defesa operacional, rebatizando a muito reaganiana Iniciativa de Defesa Estratégica com o nome de Organização da Defesa Anti-míssil Balístico, menos ideológico. No entanto, foi sob sua presidência que apareceu, pela terceira vez, o tema anti-míssil, fruto de uma relação de forças entre uma presidência democrata enfraquecida e, a partir de 1995, um Congresso republicano vencedor no plano das idéias. O elemento-chave sobre o qual o Congresso se apoiou foi a publicação, em 1998, do relatório de uma comissão parlamentar presidida por Donald Rumsfeld. O documento reavaliou a ameaça balística mundial baseando-se não mais nas intenções dos atores, mas em suas capacidades.

Uma visão messiânica do território norte-americano

No mesmo ano, os testes nucleares paquistaneses e indianos, o disparo de um míssil Taepo-Dong I norte-coreano e de um míssil iraniano validaram a análise da comissão Rumsfeld, colocando os democratas na defensiva. Capitalizando esse êxito e chegando ao poder em 2000, o presidente George W. Bush deu à defesa anti-míssil um novo impulso. A sistematização do conceito pelos norte-americanos, assim como sua extensão geográfica ampliando as chances de interceptar os projéteis dos adversários em fase de lançamento são, desde então, os sinais visíveis dessa terceira saga anti-míssil na história estratégica norte-americana.

A idéia da defesa anti-míssil não data, portanto, do segundo mandato de Bush. A certeza da invulnerabilidade de seu território, abençoado pela geografia, sempre fundamentou o sentimento de segurança dos Estados Unidos, que o providencialismo de seus fundadores assimilou muito cedo a uma Jerusalém terrestre. Nessa visão, qualquer atentado ao território norte-americano não constitui apenas uma afronta, mas uma profanação do tabernáculo da liberdade. Quem o comete é sacrílego, que será julgado em algum tipo de inferno. Nessa hipótese de guerra punitiva, a estratégia dos EUA baseia-se, ao mesmo tempo, em uma preferência pela ofensiva influenciada pelo general Antoine-Henri de Jomini [5] e no postulado de aniquilação estratégica do adversário.

Na verdade, a tríade dos meios nucleares — submarinos lançadores de projéteis, mísseis balísticos intercontinentais e bombardeiros estratégicos — permite aos Estados Unidos atingir praticamente todo o globo. Mas de que vale esse potencial ofensivo se a invulnerabilidade do santuário — o território dos Estados Unidos — não está mais assegurada? Tendo anulado a profanação de Pearl Harbour por meio do fogo nuclear lançado sobre Hiroshima, os Estados Unidos vivenciaram, desde os anos 1950, a capacidade balística nuclear russa, que poderia atingir seu território, como uma nova heresia que contrariaria seu destino indiscutível. Heresia ainda mais dolorosa porque, segundo a postura de dissuasão adotada pelos Estados Unidos, a defesa do país apóia-se na certeza de destruição mútua e se julga capaz de deter qualquer possibilidade de desencadeamento apocalíptico. É uma casuística nuclear perversa que volta, na mentalidade norte-americana, a compor de maneira inaceitável com o Mal.

Diversas teorias tentam, há quarenta anos, superar esta vulnerabilidade. Oskar Morgenstern, criador da teoria dos jogos, defendeu, em 1959, em The Question of National Defense (A Questão da Defesa Nacional), a ofensiva aplicada à estratégia nuclear. Bernard Brodie respondeu ao publicar, no mesmo ano, La stratégie à l’âge des missiles [6] (A estratégia na era dos mísseis). Segundo ele, a Destruição Mútua Garantida (MAD, sigla em inglês para Mutual Assurance Destruction), que “levou a segurança dos Estados Unidos a depender da capacidade do Kremlin de continuar racional”, é inaceitável por razões morais [7]. Dessa necessidade metafísica de uma melhor distribuição entre o ataque e a defesa decorre o imperativo categórico da defesa anti-míssil, necessidade moral da qual a psique norte-americana se vê constantemente acompanhada.

Construir seu próprio escudo: alternativa para a Europa?

A data do debate de 1959, entre Brodie e Morgenstern — dois anos antes de o presidente Kennedy chegar ao poder — é importante. Comportar-se “moralmente” na era nuclear não significa considerar a vulnerabilidade norte-americana uma fatalidade. É significativo que os estadunidenses citem o célebre sermão de 1630, A model of Christian Charity (Um modelo de caridade cristã). Nele, o pastor puritano John Whintrop emprega uma expressão que teria um destino surpreendente. Longe de Maquiavel, ele descreve os Estados Unidos como uma “cidade na colina”— City upon the Hill —, centro regenerador do mundo, obrigado a se comportar moralmente para a edificação das nações. Onze dias antes de tomar posse, Kennedy citou esse sermão [8]. Várias vezes, Ronald Reagan fez o mesmo. Há um forte indício de que o lançamento de programas anti-mísseis esteja relacionado a essas duas presidências “morais” [9].

Os projetos atuais reiteram o ciclo. Em um discurso em 2000, que precedeu sua eleição, Bush salientou seu objetivo de reduzir o número de mísseis nucleares ofensivos até “o menor número possível compatível com nossa segurança nacional” [10]. No mesmo ano, o secretário da Defesa, Donald Rumsfeld, declarou, durante uma viagem à Europa, que continuar a defesa anti-míssil era “uma questão moral” e não tecnológica [11]. O lançamento de uma revisão nuclear (Nuclear Review) pelo próprio presidente Bush, no início de seu primeiro mandato, [12] pareceu um exame de consciência nacional que reiterou as purificações rituais realizadas por Kennedy e Reagan na época em que eram presidentes.

O relatório parlamentar francês de 2001, apontando uma “teologia política” como fundamento da defesa anti-míssil norte-americana, forneceu uma das chaves do debate. O primado da metafísica providencialista na psique norte-americana e a história sempre reiniciada dos programas de Defesa contra mísseis, desde 1957, levam a pensar que nada fará Washington desistir do movimento novamente iniciado. Resta uma pergunta para o velho continente: “Defesa contra mísseis” norte-americana na Europa ou “Defesa contra mísseis” européia? Essa é a verdadeira escolha a ser feita.

Tradução: Wanda Brant
wbrant@globo.com



[1] Relatório de informações nº 2961 sobre os projetos norte-americanos de defesa anti-míssil, registrado no dia 28 de março de 2001, na Assembléia Nacional.

[2] Entre outras coisas, aumento do número de mísseis Polaris e aquisição de novos aviões de bombardeio estratégicos.

[3] Os Estados Unidos anunciaram sua saída do tratado, efetivada em junho de 2002.

[4] Ler, de Norman Spinrad, “Quand ‘la guerre des étoiles’ devient réalité”, Le Monde diplomatique, edição francesa, julho de 1999.

[5] Militar e historiador, participou do estado-maior de Napoleão. Escreveu várias obras sobre teoria militar, entre as quais cabe destacar Précis de l’art de la guerre (1839).

[6] Bernard Brodie, Strategy in the Missile Age. Princeton University Press, 1959.

[7] “É preciso ter uma fé extraordinária na tecnologia ou perder a esperança em soluções de mudança, para depender somente de defesas ativas”. "Strategy in the Missile Age", citado por Jean-Philippe Baulon em Soixante ans de défense contre les missiles balistiques, Institut de stratégie comparée, Paris, 2005.

[8] Discurso do presidente John F. Kennedy diante do Tribunal Geral do Estado, Massachusetts, Boston, 9 de janeiro de 1961.

[9] “Não seria melhor salvar vidas do que vingá-las?”, afirmou Ronald Reagan, no seu discurso pela TV, em 23 de março de 1983).

[10] “Press Conference on Security Matters at the National Press Club”, Federal News Service, Washington, 23 de maio de 2000.

[11] Citado, por Ivo Daadler e Karla Nieting, em La stratégie de défense antimissile des Etats-Unis, Annuaire français des relations internationales, Paris, 2002.

[12] O objetivo dessa revisão era uma possível redução das ogivas nucleares americanas de 7.500 para 2.500.

Começa Campanha para doação de livros para a Biblioteca do MST

Adital -

De agosto a dezembro de 2007, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra vai mobilizar-se na Campanha de Solidariedade com as Bibliotecas do MST, sob o lema "Apóie a Reforma Agrária, doe livros!". A Campanha tem como padrinho o professor Antonio Cândido. Sua finalidade é construir Bibliotecas Populares nas áreas dos assentamentos e acampamentos, e ampliar o acervo de mais de 40 bibliotecas já existentes em suas escolas e centros de formação. "Uma Campanha sem limitações, nem em quantidade, nem em áreas de conhecimento", destacam no comunicado.

Para o professor da Universidade de São Paulo (USP) e crítico literário, Antonio Cândido, o MST está promovendo uma campanha admirável para a elevação do nível cultural do trabalhador rural brasileiro. "Essa elevação é fundamental para que eles possam reivindicar seus direitos da melhor maneira possível, e para isso é indispensável que conte com instrumento de instrução, o principal dos quais é o livro", afirma.

As doações podem consistir em livros, mapas e audiovisuais, incluindo películas, discos e Cds, e podem ser feitas através dos responsáveis de cada estado. Abaixo, segue a lista dos responsáveis pela campanha e como localizá-los. Se você é de um estado ou país no qual a Campanha ainda não está se desenvolvendo, você pode fazer a doação entrando em contacto através do correio eletrônico: campanhabiblioteca@enff.org.br, ou com a Secretaria do MST em seu estado.

Segundo o MST, o movimento fundou escolas itinerantes, construiu mais de duas mil escolas de educação primária, além de cursos de educação de jovens e adultos, ensino secundário e técnico. "Hoje podemos orgulharmo-nos dos 5 mil jovens inscritos em cursos e pós-graduações em diversos convênios com universidades e dos mais de 17.500 adultos no processo de alfabetização, tanto como nos orgulhamos dos assentamentos que conquistamos", declaram.

O MST ressalta a importância da solidariedade na luta pela Reforma Agrária e aponta o exemplo da construção da Escola Nacional Florestan Fernandes, Guararema (SP), como símbolo do encontro de dois esforços: a solidariedade e o desejo de aprender. "Estamos convencidos de que esse grande esforço coletivo recolherá não só milhares de livros para nossos jovens, crianças, mulheres e homens do campo, mas também que possibilitará uma vida mais humana, mais plena e livre. E uma pátria mais justa e soberana!", disseram.


Contactos para a Campanha de doação de livros:

1. São Paulo - Rosana Santos - rosanamst@yahjoo.com.br; Secretaria Estadual SP: mstsp@mst.org.br. Tel.: (11) 3663-1064 e Secretaria Nacional do MST: secgeral@mst.org.br. Tel. (11) 3361 - 3866, com Andrea Francine.

2. Rio de Janeiro - Mariana Duque - marianaduque@mst.org.br; Secretaria Estadual RJ: secretariamst.rj@gmail.com. Tel.: (21) 2240-8496.

3. Minas Gerais - Sueli Maria - sucachoeira@yahoo.com.br; Secretaria Estadual MG: mstmg@mst.org.br. Tel.: (31)3222 - 3879.

4. Rio Grande do Sul - Cedenir Engelmann - cedernire@yahoo.com.br; Secretaria Estadual RS: mstrs@mst.org.br. Tel.: (51) 3221 - 9022.

5. Paraná - Rodrigo Cordeiro ou Edilson- microbiosdomst@yahoo.com.br; Secretaria Estadual PR: mstpr@mst.org.br. Tel.: (41) 3324-7000.

6. Pernambuco - Alexsandra Rodrigues - lecamst@yahoo.com.br; Secretaria Estadual PE: mstpebr@gmail.com ou acape.pe@gmail.com. Tel.: (81) 3722- 3136.

7. Ceará - Erivando Barbosa ou Vera Lucia- erivandobarbosa@yahoo.com.br; Secretaria Estadual CE: mstce@terra.com.br. Tel.: (85) 3257-5630 ou 3472-6089.

8. Brasília - Janderson Barros- jandersonmst@yahoo.com.br; Secretaria Estadual DF: arcamst@terra.com.br. Tel.: (61) 3322- 5035.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Noam Chomsky: "EUA são um poderoso Estado terrorista"


Dele, o jornal inglês The Guardian escreveu: "Noam Chomsky está ao lado de Marx, Shakespeare e a Bíblia como uma das dez mais citadas fontes nas ciências humanas - e é o único autor, entre eles, ainda vivo." O New York Times, com quem trava batalhas há décadas, chamou-o "o mais importante intelectual vivo."


O pensador americano Noam Chomsky

Mas Noam Avram Chomsky dificilmente é uma unanimidade. Nem quer ser: a polêmica parece parte essencial desse lingüista que abraçou o pensamento político e insistiu em teses tão provocativas como a defesa do regime sanguinário de Pol Pot na Camboja e a afirmativa de que os mortos do World Trade Center foram poucos em comparação com os provocados por governos americanos no Terceiro Mundo.

Chomsky nasceu na Filadélfia em 7 de dezembro de 1928. Na Universidade da Pensilvânia estudou lingüística, matemática e filosofia. Desde 1955, é professor do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, ocupando uma cátedra de Língua Moderna e Lingüística. Casou-se com Carol Schatz, professora da Universidade de Harvard, em 1949, e tem dois filhos.

Fez sua reputação inicial na lingüística, tendo aprendido alguns dos seus princípios históricos com o pai, um erudito do hebraico. Seus trabalhos na gramática generativa, que derivaram do seu interesse pela lógica moderna e pelos fundamentos da matemática, deram-lhe fama.

Sempre se interessou pela política, e suas tendências para o socialismo são resultado do que chama de "a comunidade judaica radical de Nova York". Desde 1965, tornou-se um dos principais críticos da política externa latino-americana. Seu livro O Poder Americano e os Novos Mandarins foi considerado um dos ataques mais substanciais ao envolvimento americano no Vietnã.

Hoje, Chomsky é a voz mais respeitada da esquerda acadêmica e intelectual. Mesmo sendo um radical nada convencional. Produziu um substancial volume de teoria política própria e defende a busca da verdade e do conhecimento nos negócios humanos de acordo com um conjunto simples e universal de princípios morais. Escreve de jeito claro, fala com o público especializado e com o leitor em geral.

Pode-se dizer que é um herdeiro da Nova Esquerda dos anos 1960. No seu livro mais famoso da época, O Poder Americano e os Novos Mandarins, ele disse que os Estados Unidos precisavam de "uma espécie de desnazificação", insinuando que o país estava caindo no fascismo.

Chomsky é autor de, entre outros, O Governo no Futuro, Poder e Terrorismo, Contendo a Democracia e 11 de Setembro. Seu último livro publicado no Brasil é Rumo a uma Nova Guerra Fria (Record, 644 págs), uma coletânea de ensaios dos anos 1970 e 1980. A filósofa Márcia Tiburi entrevistou o pensador americano para a revista Cult. Veja abaixo parte do depoimento.

Devido à sua crítica ao terrorismo, o senhor já foi acusado de, ao contrário, fazer a apologia do terrorismo. O senhor considera que há alguma chance de combater o discurso da ideologia conservadora, que evita o sentido da crítica por meio da confusão de seu conteúdo, como se não tivesse entendido o que ele significa?
O único modo de lidar com o fanatismo ideológico é ignorá-lo e concentrar a atenção em pessoas que têm a mente suficientemente aberta para dar importância a evidências e argumentos. Há dois aspectos no que eu escrevi sobre o terrorismo desde 1981, quando o governo Reagan ocupou o poder declarando que uma "guerra ao terror" seria o foco da política externa dos Estados Unidos, uma "guerra" que foi redeclarada por George Bush em 11 de setembro de 2001.

O primeiro é que eu uso a definição oficial de terrorismo dos governos dos Estados Unidos e do Reino Unido. Isso é considerado um escândalo, porque se usamos essas definições, significa diretamente que os Estados Unidos são um poderoso Estado terrorista, e o Reino Unido não fica muito atrás. A conclusão, claro, é inaceitável.

Como a lógica é impecável, e a base factual não está em dúvida, a reação-padrão dos que fazem a apologia do terror do Ocidente é de pura irracionalidade. Uma das reações é a que você descreveu: fingir que a condenação consistente de todos os tipos de terror é uma apologia para o terror deles contra nós, o único tipo que pode ser discutido dentro do sistema doutrinário.

O segundo aspecto do que escrevo sobre o assunto é que, ao discutir o terror deles, eu acompanho de perto as análises dos principais especialistas em terrorismo islâmico do mundo acadêmico, da inteligência dos Estados Unidos e do jornalismo, como Fawaz Gerges, Michael Scheuer e Jason Burke. Isso também é considerado um escândalo, porque eles fazem análises sérias, e é muito mais conveniente fazer poses heróicas diante das câmeras e falar de "fascismo islâmico", "guerra de civilizações" etc.

Quanto ao discurso ideológico conservador, vale a pena ter em mente que algumas das mais extremas e irracionais defesas da agenda política nesses pontos é produzida por pessoas que se definem como liberais e social-democratas. Independente de sua origem, há alguma maneira de confrontar o discurso ideológico?

Sim, há uma maneira muito simples: tentar dizer a verdade. Não arranca aplausos da elite intelectual, mas é assim que ela reage normalmente às revelações sobre a natureza e o exercício do poder. O que importa é o público em geral, que é capaz de se libertar das doutrinas e buscar compreensão.

Seus textos e entrevistas, de um modo ou de outro, defendem a necessidade da reflexão, da análise, do pensamento lúcido capaz de perceber os motivos e o que o senhor - numa entrevista a John Junkerman em 2002 - chamou "componentes de legitimidade" das ações terroristas, ou seja, o que leva à sua existência e possibilidade de que se repitam. Seria, essa ausência de reflexão, algo semelhante ao que Hannah Arendt chamou "vazio do pensamento" e que levava à banalidade do mal? Seria essa, para o senhor, uma idéia atual?
Acredito que existe uma similaridade, mas as idéias são simples e diretas. Não vejo necessidade de ocultá-las em uma retórica arrogante e pretensiosa.

O senhor considera que a humanidade vive atualmente um otimismo inconseqüente? O senhor acredita em algum argumento básico, que pode fazer com que os desatentos reflitam sobre o estado atual da política internacional e das questões relativas à natureza como o aquecimento global, sem parecer apologia do pessimismo? É possível refletir hoje sem usar esse termo?
Não apenas acho que é possível, sei que é possível, por experiência e pela história. Todos nós sabemos. Confrontar o poder, a repressão e a injustiça nunca foi fácil, mas muitas tarefas foram realizadas e o sucesso não foi pequeno. As lutas de muitos anos nos deixaram um legado de liberdade que é raro em padrões históricos comparativos.

Podemos optar por usar esse legado para carregar a luta para a frente ou podemos decidir abandonar a esperança, acreditando que o pior vai acontecer. Essa escolha é comum no decorrer da história. Felizmente, muitas pessoas não abandonaram a esperança, e não há razão para fazê-lo hoje.

Considerando que a vida e a morte dos "sem-poder" é decidida soberanamente a cada dia na política interna e externa das nações, o senhor considera que podemos escapar da biopolítica que a política se tornou?
Sim. Novamente, podemos escolher o caminho fácil do desespero, mas é uma escolha, não uma necessidade. Aqueles que fizerem essa escolha não terão a gratidão das pessoas que sofrem hoje ou das futuras gerações.

O senhor considera que os intelectuais têm um papel específico diante da atual ordem internacional e das questões nacionais e regionais que envolvem o poder?
As pessoas são chamadas de "intelectuais" se possuem um determinado grau de privilégio e decidem usar sua oportunidade na arena pública. É fato que o privilégio traz oportunidade, e é um truísmo moral que a oportunidade traga responsabilidade.

Portanto, aqueles que são chamados de "intelectuais" têm responsabilidades claras. Como são eles que escrevem a história, o papel histórico dos intelectuais parece muito atraente: corajosos, honrados, defensores da verdade e da justiça etc. A história real é um pouco diferente.

O fundador da moderna teoria das relações internacionais, Hans Morgenthau, lamentou o que chamou de nossa "subserviência conformista aos que estão no poder", referindo-se às classes intelectuais. A descrição dele tem um mérito considerável - agora e no passado. Há exceções, é claro, e muitas vezes sofreram por sua integridade - o quanto, depende da natureza da sociedade. Mas a responsabilidade permanece.

Resgatar o coração

A técnica é importante para resolver o problema do aquecimento global, mas não é tudo e nem o principal. Parafraseando Galileo Galilei, podemos dizer: "a ciência nos ensina como funciona o céu, mas não nos ensina como se vai ao céu".

Seguramente a crise ecológica global exige soluções técnicas, pois podem impedir que o aquecimento global ultrapasse 2 graus Celsius, o que seria desastroso para toda a biosfera. Mas a técnica não é tudo e nem o principal. Parafraseando Galileo Galilei, podemos dizer: "a ciência nos ensina como funciona o céu, mas não nos ensina como se vai ao céu". Da mesma forma, a ciência nos indica como funcionam as coisas, mas por si mesma não tem condições de nos dizer se elas são boas ou ruins. Para isso, temos que recorrer a critérios éticos, aos quais a própria prática científica está submetida. Até que ponto, apenas soluções técnicas equilibram Gaia a ponto de ela continuar a nos querer sobre ela e ainda garantir os suprimentos vitais para os demais seres vivos? Será que ela vai identificar e assimilar as intervenções que faremos nela ou as rejeitará?

As intervenções técnicas têm que se adequar a um novo paradigma de produção menos agressivo, de distribuição mais equitativa, de um consumo responsável e de uma absorção dos rejeitos que não danifique os ecossistemas. Para isso precisamos resgatar uma dimensão, profundamente descurada pela modernidade. Esta se construiu sobre a razão analítica e instrumental, a tecnociência, que buscava, como método, o distanciamento mais severo possível entre o sujeito e o objeto. Tudo que vinha do sujeito como emoções, afetos, sensibilidade, numa palavra, o pathos, obscurecia o olhar analítico sobre o objeto. Tais dimensões deveriam ser postas sob suspeição, serem controladas e até recalcadas.

Ocorre que a própria ciência superou esta posição reducionista seja pela mecânica quântica de Bohr/Heisenberg seja pela biologia à la Maturana/Varela, seja por fim pela tradição psicanalítica, reforçada pela filosofia da existência (Heidegger, Sartre e outros). Estas correntes evidenciaram o envolvimento inevitável do sujeito com o objeto. Objetividade total é uma ilusão. No conhecimento há sempre interesses do sujeito. Mais ainda, nos convenceram de que a estrutura de base do ser humano não é a razão, mas o afeto e a sensibilidade.

Daniel Goleman trouxe a prova empírica com seu texto a Inteligência emocional que a emoção precede à razão. Isso se torna mais compreensível se pensarmos que nós humanos não somos simplesmente animais racionais, mas mamíferos racionais. Quando há 125 milhões de anos surgiram os mamíferos, irrompeu o cérebro límbico, responsável pelo afeto, pelo cuidado e pela amorização. A mãe concebe e carrega dentro de si a cria e depois de nascida a cerca de cuidados e de afagos. Somente nos últimos 3-4 milhões de anos surgiu o neocortex e com ele a razão abstrata, o conceito e a linguagem racional.

O grande desafio atual é conferir centralidade ao que é mais ancestral em nós, o afeto e a sensibilidade. Numa palavra, importa resgatar o coração. Nele está o nosso centro, nossa capacidade de sentir em profundidade, a sede dos afetos e o nicho dos valores. Com isso não desbancamos a razão, mas a incorporamos como imprescindível para o discernimento e a priorização dos afetos, sem substitui-los. Hoje se não aprendermos a sentir a Terra como Gaia, não a amarmos como amamos nossa mãe e não cuidarmos dela como cuidamos de nossos filhos e filhas, dificilmente a salvaremos.

Sem a sensibilidade, a operação da tecnociência será insuficiente. Mas uma ciência com consciência e com sentido ético pode encontrar saídas libertadoras para nossa crise.

Copiado de: AgenciaCartaMaior

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Os dois lobos



'Uma noite, um velho índio Cherokee contou ao seu neto sobre uma batalha que acontece dentro das pessoas.
Ele disse, "Meu filho, a batalha é entre dois "lobos" dentro de todos nós.
Um é o Mau. É a raiva, inveja, ciúme, tristeza, desgosto, cobiça,arrogância, pena de si mesmo, culpa, ressentimento, inferioridade,mentiras, orgulho falso, superioridade e ego.
O outro é Bom. É alegria,paz, esperança, serenidade, humildade, bondade, benevolência, empatia,generosidade, verdade, compaixão e fé.
"O neto pensou naquilo por alguns minutos e perguntou ao seu avô:
"Qual lobo vence?"
O velho Cherokee simplesmente respondeu,
...O que você alimenta....
picture by Michael Parkes
Copiado de:AmigosDoFreud
Alzheimer

Drauzio Varela

A doença de Alzheimer (Alois Alzheimer, neurologista alemão que primeiro descreveu essa patologia) provoca progressiva e inexorável deterioração das funções cerebrais, como perda de memória, da linguagem, da razão e da habilidade de cuidar de si próprio.
Cerca de 10% das pessoas com mais de 65 anos e 25% com mais de 85 anos podem apresentar algum sintoma dessa enfermidade e são inúmeros os casos que evoluem para demência. Feito o diagnóstico, o tempo médio de sobrevida varia de 8 a 10 anos.

Sintomas

·Estágio I (forma inicial) – alterações na memória, personalidade e habilidades espaciais e visuais;


·Estágio II (forma moderada) – dificuldade para falar, realizar tarefas simples e coordenar movimentos; agitação e insônia;

·Estágio III ( forma grave) – resistência à execução de tarefas diárias, incontinência urinária e fecal, dificuldade para comer, deficiência motora progressiva;

·Estágio IV (terminal) – restrição ao leito, mutismo, dor à deglutição, infecções intercorrentes.

Diagnóstico

Não há um teste diagnóstico definitivo para a doença de Alzheimer. A doença só pode ser realmente diagnosticada na autopsia. Médicos baseiam o diagnóstico no levantamento minucioso do histórico pessoal e familiar, em testes psicológicos e por exclusão de outros tipos de doenças mentais. Mesmo assim, estima-se que o diagnóstico possa estar equivocado em 10% dos casos.


Tratamento

Até o momento, a doença permanece sem cura. O objetivo do tratamento é minorar os sintomas. Atualmente, estão sendo desenvolvidos medicamentos que, embora em fase experimental, sugerem a possibilidade de controlar a doença.


Recomendações

Cuidar de doentes de Alzheimer é desgastante. Procurar ajuda com familiares e/ou profissionais pode ser uma medida absolutamente necessária.

Algumas medidas podem facilitar a vida dos doentes e de quem cuida deles:

·Fazer o portador de Alzheimer usar uma pulseira, colar ou outro adereço qualquer com dados de identificação (nome, endereço, telefone, etc.) e as palavras “Memória Prejudicada”, porque um dos primeiros sintomas é o paciente perder a noção do lugar onde se encontra;

·Estabelecer uma rotina diária e ajudar o doente a cumpri-la. Espalhar lembretes pela casa (apague a luz, feche a torneira, desligue a TV, etc.) pode ajudá-lo bastante;

·Simplificar a rotina do dia-a-dia de tal maneira que o paciente possa continuar envolvido com ela;

·Encorajar a pessoa a vestir-se, comer, ir ao banheiro, tomar banho por sua própria conta. Quando não consegue mais tomar banho sozinha, por exemplo, pode ainda atender a orientações simples como: “Tire os sapatos. Tire a camisa, as calças. Agora entre no chuveiro”;

·Limitar suas opções de escolha. Em vez de oferecer vários sabores de sorvete, ofereça apenas dois tipos;

·Certificar-se de que o doente está recebendo uma dieta balanceada e praticando atividades físicas de acordo com suas possibilidades;

·Eliminar o álcool e o cigarro, pois agravam o desgaste mental;

·Estimular o convívio familiar e social do doente;

·Reorganizar a casa afastando objetos e situações que possam representar perigo. Tenha o mesmo cuidado com o paciente de Alzheimer que você tem com crianças;

·Conscientizar-se da evolução progressiva da doença. Habilidades perdidas jamais serão recuperadas;

·Providenciar ajuda profissional e/ou familiar e/ou de amigos, quando o trabalho com o paciente estiver sobrecarregando quem cuida dele.

Causas

Não se conhece a causa específica da doença de Alzheimer. Parece haver certa predisposição genética para seu aparecimento. Nesses casos, ela pode desenvolver-se precocemente, por volta dos 50 anos.

Pesquisadores levantam a hipótese de que algum vírus e a deficiência de certas enzimas e proteínas estejam envolvidos na etiologia da doença. Outros especulam que a exposição ao alumínio e seu depósito no cérebro possam contribuir para a instalação do quadro, mas não foi estabelecida nenhuma relação segura de causa e efeito a respeito disso.

Egberto Gismonti - Academia De Danças [1981]


Nasceu em uma família de músicos em Carmo, pequena cidade do interior do estado do Rio, filho de pai libanês e mãe italiana. Desde cedo freqüentou o Conservatório, estudando piano. Se interessou pela pesquisa da música popular e folclórica brasileira, chegando a passar uma temporada vivendo com os índios no Xingu. Em 1968 participou do Festival da TV Globo com a música "O Sonho", defendida por Os Três Moraes.No V Festival Internacional da Canção, em 1970, concorreu com "Mercador de Serpentes". No final da década de 60 foi para a Europa, onde teve aulas de piano com a renomada professora Nadia Boulanger. Fez shows na Europa e lançou, no Brasil, em 1969 o primeiro LP, "Egberto Gismonti". No início dos anos 70 alternou entre o Brasil e a Europa, gravando discos lá e cá. Do disco "Egberto Gismonti", de 1973, destacaram-se algumas faixas, em parceria com Geraldo Carneiro: "Tango", "Encontro no Bar" e "Luzes da Ribalta". Por influência do choro, passou a se interessar pelos diferentes tipos de violão e instrumentos de corda, e começou a aprender o instrumento, passando depois para o violão de 8 cordas, por volta de 1973. Por essa época começou também a estudar diferentes instrumentos, principalmente flautas e kalimbas. Foi um dos primeiros músicos brasileiros a dominar sintetizadores. Depois concentrou sua carreira no exterior, gravando discos premiados com o percussionista brasileiro também radicado fora do Brasil Naná Vasconcelos ("Dança das Cabeças", de 1976), e com outros instrumentistas, como Charlie Haden e Jan Garbarek.Gravou 15 discos entre 1977 e 1993 para o selo norueguês ECM, dez dos quais lançados no Brasil pela BMG em 1995. Através de seu selo Carmo, recomprou seu repertório inicial, e é um dos raros compositores brasileiros donos de seu próprio acervo. Recentemente sua obra passou a ser gravada maciçamente por outros instrumentistas. Algumas peças do disco "Alma", de 1987, tornaram-se hits, como "Palhaço" e "Loro".


Faixas:
1 Palácio das pinturas
(Egberto Gismonti)
2 Jardim de prazeres
(Geraldo Carneiro - Egberto Gismonti)
3 Celebração de núpcias
(Egberto Gismonti)
4 A porta encantada
(Egberto Gismonti)
5 Scheherazade
(Geraldo Carneiro - Egberto Gismonti)
6 Bodas de prata
(Geraldo Carneiro - Egberto Gismonti)
7 Quatro cantos
(Geraldo Carneiro - Egberto Gismonti)
8 Vila Rica 1720
(Geraldo Carneiro - Egberto Gismonti)
9 Continuidade dos parques
(Egberto Gismonti)
10 Conforme a altura do Sol
(Egberto Gismonti)
11 Conforme a altura da lua
(Egberto Gismonti)

Celso Blues Boy - Ao Vivo [1991]




Ficha Técnica:

Guitarrista carioca, começou a tocar profissionalmente na década de 70, acompanhando Raul Seixas e Sá & Guarabyra. Montou a banda Legião Estrangeira em 1976, com a qual se apresentava em bares e casas de show. Passou a ser mais conhecido a partir de 1980, quando mandou uma fita para a Rádio Fluminense, no Rio, voltada para o repertório roqueiro. Gravou o primeiro disco em 1984, "Som na Guitarra", que incluía seu maior sucesso: "Aumenta que Isso Aí É Rock'n Roll". Um dos primeiros a cantar blues em português, escolheu o nome artístico em homenagem ao ídolo B.B. King, um dos pais do gênero. Com nove discos gravados, continua se apresentando freqüentemente.



Faixas:
Quatro frases que fazem crescer o nariz do Pinóquio

Eduardo Galeano

1. Somos todos culpáveis pela ruína do planeta

A saúde do mundo está um asco. 'Somos todos responsáveis', clamam a vozes de alarme universal, e esta generalização absolve: se todos nós somos responsáveis, ninguém o é. Tais como coelhos, reproduzem-se os novos tecnocratas do meio ambiente. É a taxa de natalidade mais alta do mundo: os peritos geram peritos e mais peritos, que se ocupam em envolver o tema no papel celofane da ambiguidade. Eles fabricam a brumosa linguagem da exortações ao 'sacrifício de todos' nas declarações dos governos e nos solenes acordos internacionais que ninguém cumpre. Estas cataratas de palavras – inundação que ameaçam converter-se numa catástrofe ecológica comparável ao buraco do ozono – não se desencadeiam gratuitamente. A linguagem oficial afoga a realidade para conceder impunidade à sociedade de consumo, a qual é imposta como modelo em nome do desenvolvimento e das grandes empresas que lhes extraem o sumo. Mas as estatísticas confessam. Os dados ocultos debaixo do palavrório revelam que 20 por cento da humanidade comete 80 por cento das agressões contra a natureza, crime a que os assassinos chamam suicídio e é a humanidade inteira quem paga as consequências da degradação da terra, da intoxicação do ar, do envenenamento da água, do enlouquecimento do clima e da dilapidação dos recursos naturais não renováveis. A senhora Harlem Bruntland, que dirige o governo da Noruega, comprovou recentemente que se os 7 mil milhões de habitantes do planeta consumissem o mesmo que os países desenvolvidos do Ocidente, "fariam falta 10 planetas como o nosso para satisfazer todas as suas necessidades". Uma experiência impossível. Mas os governantes dos países do Sul que prometem a entrada no Primeiro Mundo, passaporte mágico que tornará ricos e felizes todos nós, não deveriam apenas ser processados por roubo. Não estão apenas a gozar-nos, não: além disso esses governantes estão a cometer o delito de apologia do crime. Porque este sistema de vida que se apresenta como paraíso, fundado na exploração do próximo e na aniquilação da natureza, é o que nos está a enfermar o corpo, a envenenar a alma e a deixar-nos sem mundo.

2. É verde o que se pinta de verde

Agora os gigantes da indústria química fazem a sua publicidade em cor verde, e o Banco Mundial lava a sua imagem repetindo a palavra ecologia a cada página dos seus relatórios e tingindo de verde os seus empréstimos. "Nas condições dos nossos empréstimos há normais ambientais estritas", esclarece o presidente do supremo banco do mundo. Somos todos ecologistas, até que alguma medida concreta limite a liberdade de contaminação. Quando o Parlamento do Uruguai aprovou uma tímida lei de defesa do meio ambiente, as empresas que lançam veneno para o ar e apodrecem as águas sacaram subitamente a sua recém comprada máscara verde e gritaram a sua verdade em termos que poderiam ser assim resumidos: "os defensores da natureza são advogados da pobreza, dedicados a sabotar o desenvolvimento económico e a espantar o investimento estrangeiro". O Banco Mundial, em contrapartida, é o principal promotor da riqueza, do desenvolvimento e do investimento estrangeiro. Talvez por reunir tantas virtudes, o Banco manejará, junto à ONU, o recém criado Fundo para o Meio Ambiente Mundial. Este imposto sobre a má consciência disporá de pouco dinheiro, 100 vezes menos do que haviam pedido os ecologistas, para financiar projectos que não destruam a natureza. Intenção inquestionável, conclusão inevitável: se esses projectos requerem um fundo especial, o Banco Mundial está a admitir, de facto, que todos os seus demais projectos fazem um fraco favor ao meio ambiente. O Banco se chama Mundial, assim como o Fundo Monetário se chama Internacional, mas estes irmãos gémeos vivem, cobram e decidem em Washington. Quem paga, manda, e a numerosa tecnocracia jamais cospe no prato onde come. Sendo, como é, o principal credor do chamado Terceiro Mundo, o Banco Mundial governa nossos países cativos que a título de serviço da dívida pagam aos seus credores externos 250 mil dólares por minutos, e lhes impõe a sua política económica em função do dinheiro que concede e promete. A divinização do mercado, que compra cada vez menos e paga cada vez pior, permite estufar de quinquilharias as grandes cidades do mundo, drogadas pela religião do consumo, enquanto os campos se esgotam, apodrecem as águas que os alimentam e uma crosta seca cobre desertos que antes foram florestas.

3. Entre o capital e o trabalho, a ecologia é neutra

Pode-se dizer tudo de Al Capone, mas ele era um cavalheiro: o bom Al sempre enviava flores aos velórios das suas vítimas. As empresas gigantes da indústria química, petrolífera e automobilística pagaram boa parte das despesas da Eco 92. A conferência internacional que no Rio de Janeiro se ocupou da agonia do planeta. E essa conferência, chamada Cimeira da Terra, não condenou as transnacionais que produzem poluição e dela vivem, e nem sequer pronunciou uma palavra contra a ilimitada liberdade de comércio que torna possível a venda de veneno. No grande baile de máscaras do fim do milénio, até a indústria química veste-se de verde. A angústia ecológica perturba o sono dos maiores laboratórios do mundo, que para ajudar a natureza estão a inventar novos cultivos biotecnológicos. Mas estes desvelos científicos não se propõem encontrar plantas mais resistentes às pragas sem ajuda química, procuram sim novas plantas capazes de resistir aos praguicidas e herbicidas que esses mesmos laboratórios produzem. Das 10 maiores empresas de sementes do mundo, seis fabricam pesticidas (Sandoz, Ciba-Geigy, Dekalb, Pfiezer, Upjohn, Shell, ICI). A indústria química não tem tendências masoquistas. A recuperação do planeta ou o que nos resta dele implica a denúncia da impunidade do dinheiro e a liberdade humana. A ecologia neutral, que se parece antes com a jardinagem, faz-se cúmplice da injustiça de um mundo onde a comida sã, a água limpa, o ar puro e o silêncio não sã direitos de todos e sim privilégios dos poucos que podem pagá-los. Chico Mendes, operário da borracha, caiu assassinado em fins de 1988, na Amazónia brasileira, por crer naquilo que acreditava: que a militância ecológica não pode ser divorciada da luta social. Chico acreditava que a floresta amazónica não poderá ser salva enquanto não se fizer a reforma agrária no Brasil. Cinco anos depois do crime, os bispos brasileiros denunciaram que mais de 100 trabalhadores rurais morrem assassinados a cada ano na luta pela terra, e calcularam que quatro milhões de camponeses sem trabalho vão para as cidades abandonando as plantações do interior. Adaptando os números de cada país, a declaração dos bispos retrata toda a América Latina. As grandes cidades latino-americanas, inchadas até rebentar pela invasão incessante de exilados do campo, são uma catástrofe ecológica: uma catástrofe que não se pode entender nem mudar dentro dos limites da ecologia, surda perante o clamor social e cega perante o compromisso político.

4. A natureza está fora de nós.

Nos seus 10 mandamentos, Deus esqueceu de mencionar a natureza. Dentre as ordens que nos enviou do monte Sinai, o Senhor teria podido acrescentar, por exemplo: "Honrarás a natureza da qual fazes parte". Mas isso não lhe ocorreu. Há cinco séculos, quando a América foi apresada pelo mercado mundial, a civilização invasora confundiu a ecologia com a idolatria. A comunhão com a natureza era pecado. E merecia castigo. Segundo as crónicas da Conquista, os índios nómadas que usavam cascas para se vestirem jamais descascavam o tronco inteiro, para não aniquilar a árvore, e os índios sedentários plantavam cultivos diversos e com períodos de descanso, para não cansar a terra. A civilização que vinha impor as devastadoras monoculturas de exportação não podia entender as culturas integradas na natureza, e confundiu-as com a vocação demoníaca ou a ignorância. Para a civilização que se diz ser ocidental e cristã, a natureza era uma besta feroz que era preciso domar e castigar a fim de que funcionasse como uma máquina, posta ao nosso serviço desde sempre e para sempre. A natureza, que era eterna, devia-nos escravatura. Muito recentemente soubemos que a natureza se cansa, como nós, seus filhos, e soubemos que, como nós, pode morrer assassinada. Já não se fala em submeter a natureza, agora até os seus verdugos dizem que há que protegê-la. Mas tanto num como noutro caso, natureza submetida e natureza protegida, ela está fora de nós. A civilização que confunde os relógios com o tempo, o crescimento com o desenvolvimento e o grandote com a grandeza, também confunde a natureza com a paisagem, enquanto o mundo, labirinto sem centro, dedica-se a romper o seu próprio céu.

O original encontra-se em http://www.resumenlatinoamericano.org

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