terça-feira, 12 de janeiro de 2010

O pântano argentino: o irresistível desenvolvimento da crise de governabilidade



A queda ou degradação integral do governo kirchnerista seria uma ótima notícia para os norte-americanos, pois enfraqueceria o Brasil e reduziria o espaço político da Venezuela, Equador e Bolívia. A recente crise envolvendo o Banco Central mostra mais uma vez a ação de uma nova direita argentina, uma força heterogênea, quase caótica, sem grandes projetos visíveis, impulsionada pelos grandes meios de comunicação que operam como um “partido midiático” extremista. Sua base social é um agrupamento muito belicoso de classes médias e altas que constituíram uma lumpen-burguesia onde se interconectam redes de negócios legais e ilegais. A análise é de Jorge Beinstein, no sitio  CartaMaior

O ano novo começou mal na Argentina. O conflito causado pela substituição do presidente do Banco Central, Martín Redrado, detonou uma grave crise institucional onde se enfrentam dois grupos que vem endurecendo suas posições. De um lado, uma oposição de direita cada vez mais radicalizada, agora com maioria no poder Legislativo, encabeçada pelo vice-presidente da República e que se estende até os núcleos mais reacionários do Poder Judiciário e das forças de segurança (públicas e privadas). Trata-se de uma força heterogênea, quase caótica, sem grandes projetos visíveis, impulsionada pelos grandes meios de comunicação que operam como uma espécie de “partido midiático” extremista. Sua base social é um agrupamento muito belicoso de classes médias e altas.

Do outro lado encontramos a presidente Cristina Kirchner resistindo desde o poder Executivo com seus aliados parlamentares, sindicais e “sociais”. Seu perfil político é o de um centrismo desenvolvimentista muito contraditório, oscilando entre as camadas populares mais pobres, às quais não se atreve a mobilizar com medidas econômicas e sociais radicais, e os grandes grupos empresariais e outras esferas de poder que busca em vão recuperar para recompor o sistema de governabilidade vigente durante a presidência de Nestor Kirchner.

A este leque de forças locais é necessário incorporar a intervenção dos Estados Unidos que, a partir da chegada de Barak Obama à Casa Branca, mostra-se cada vez mais ativa nos assuntos internos da Argentina. Isso deve ser integrado ao contexto mais amplo da estratégia imperial de reconquista da América Latina, marcada por fatos notórios como o recente golpe de Estado em Honduras, a recriação da IV Frota, as bases militares na Colômbia e outras atividades menos visíveis, mas não menos efetivas, como a reativação de seu aparato de inteligência na região (CIA, DEA, etc) e a conseqüente expansão de operações conspirativas com políticos, militares, empresários, grupos mafiosos, meios de comunicação, etc.

A onda reacionária
Como se sabe, a crise estourou quando o presidente do Banco Central decidiu não acatar um decreto de “necessidade e urgência”, com força de lei, que ordenava colocar uma parte das reservas à disposição de um fundo público destinado ao pagamento da dívida externa. Deste modo, Redrado (apoiando-se na “autonomia” do Banco, imposta nos anos 1990 pelo FMI) desafiava a legalidade e assumia como própria a reivindicação do conjunto da direita: não pagar dívida externa com reservas, mas sim com receitas fiscais, obrigando assim o governo a reduzir o gasto público, o que seguramente teria um impacto negativo sobre o Produto Interno Bruto, o nível de emprego e os salários.

Em uma primeira aproximação, a crise aparece como uma disputa sobre política econômica entre neoliberais partidários do ajuste fiscal e keynesianos partidários da expansão do consumo interno. No entanto, a magnitude da tormenta política em curso obriga a ir mais além do debate econômico. Não existe proporção entre o volume de interesses financeiros afetados e a extrema virulência do enfrentamento. Tampouco se trata de um problema causado pela necessidade de pagar a dívida externa diante de uma situação financeira difícil. Pelo contrário, o Estado tem um importante superávit fiscal e a dívida externa representa atualmente cerca de 40% do Produto Interno Bruto contra 80%, em 2003, quando Nestor Kirchner assumiu a presidência da República.

Para começar a entender o que está ocorrendo é necessário remontarmos ao primeiro semestre de 2008 quando estourou o conflito entre o governo e a burguesia rural. Neste caso também a confrontação apareceu sob o aspecto econômico: o governo tentou estabelecer impostos móveis às exportações agrárias cujos preços internacionais neste momento subiam vertiginosamente; os grandes grupos do agronegócio se opuseram – ainda que estivessem ganhando muito dinheiro, pretendiam ganhar muito mais embolsando a totalidade destes lucros extraordinários. Para surpresa tanto do governo como das próprias elites agrárias, o protesto foi imediatamente respaldado pela quase totalidade dos empresários rurais, inclusive por setores que por sua área de especialização ou inserção regional não tinham interesses materiais concretos no tema. Rapidamente os bloqueios de estradas, muito destacados pelos meios de comunicação, arrastaram a adesão das classes altas e médias urbanas, estruturando-se deste maneira uma maré social reacionária cuja magnitude não tinha precedentes na história argentina dos últimos 50 anos.

Para encontrarmos algo parecido seria necessário remontarmos a 1955, quando uma massiva convergência conservadora de classes médias apoiou o golpe militar oligárquico. A mobilização direitista de 2008 esteve infestada de brotos neofascistas, alusões racistas às classes baixas, insultos ao “governo montonero” (quer dizer, supostamente controlado por ex-guerrilheiros marxistas reciclados), etc.

Essa onda reacionária se prolongou nas eleições legislativas de 2009, onde a direita obteve a vitória (a maioria no Parlamento). Antes e depois deste evento, esteve permanentemente alimentadas pelos meios de comunicação concentrados. Atualmente é difícil diagnosticar se mantém ou não o seu nível de massividade. O conflito se desenrola agora sem a presença de multidões nas ruas. A grande maioria da população observa a situação como a uma briga entre grupos de poder no andar de cima.

Se avaliamos a trajetória, nos dois últimos anos, da confrontação entre uma direita cada vez mais audaciosa e agressiva e um governo crescentemente encurralado não é difícil imaginar um cenário próximo do “golpe de Estado”, não seguindo os velhos esquemas das intervenções militares diretas, nem sequer uma réplica do caso hondurenho (golpe militar com fachada civil), mas sim um leque de novas alternativas onde se combinariam fatores como a manipulação de mecanismos judiciais, o emprego arrasador da arma midiática, a utilização de instrumentos parlamentares, a mobilização de setores sociais reacionários (cuja amplitude é uma forte incógnita), incluindo ações violentas de grupos civis dirigidos por estruturas de segurança policiais ou militares.

Neste último caso deveríamos levar em conta as possíveis intervenções do aparato de inteligência norte-americano que dispõe atualmente de um importante know how em matéria de golpes civis, como as chamadas “revoluções coloridas”, algumas bem sucedidas como a “laranja” na Ucrânia (2204), a que derrotou Milosevic (Iugoslávia, 2000), a das “rosas” (Geórgia, 2003), a das “tulipas” (Kirguistão, 2005), a “do cedro” (Líbano, 2005) e outras fracassadas como a “revolução branca” (Bielorussia, 2006), a “verde” (Irã, 2009) ou a “revolução twitter” (Moldávia, 2009). Em todas essas “revoluções” orquestradas pelo aparato de inteligência dos EUA as convergências entre grupos civis e meios de comunicação golpearam governos considerados “indesejáveis” pelo Império. Tiveram êxito diante de Estados mergulhados em crises profundas; fracassaram quando as estruturas estatais puderam resistir e/ou quando as maiorias populares os enfrentaram.

As raízes
Quais são as raízes dessa avalanche direitista? Ela não pode ser atribuída ao descontentamento das elites empresariais e das classes superiores diante de drásticas redistribuições de renda em favor dos pobres ou a medidas econômicas esquerdizantes ou estatistas que afetem de maneira decisiva os negócios dos grupos dominantes. Pelo contrário, a bonança econômica que marcou os governos dos Kirchner significou grandes lucros para toda classe de grupos capitalistas: financeiros, industriais exportadores ou voltados ao mercado interno, empresas grandes ou pequenas, etc.

A Argentina experimentou altas taxas de crescimento do PIB e enormes superávits fiscais impulsionados por exportações em vertiginosa ascensão. E ainda que o desemprego tenha caído, a estrutura de distribuição da renda nacional, herdada da era neoliberal, não variou de maneira significativa. A governabilidade política permitiu a preservação do sistema que cambaleava entre 2001-2002. As estatizações decididas durante a presidência de Cristina Kirchner foram, na verdade, medidas destinadas mais a preservar o funcionamento do sistema do que a modificá-lo. A estatização da previdência privada, por exemplo, foi precipitada pela crise financeira global e pelo esgotamento de uma estrutura de saque de fundos previdenciários. A estatização da Aerolíneas Argentinas significou tomar posse de uma empresa totalmente liquidada e a ponto de desaparecer.

Se existe alguma pressão, entre as classes altas, é na direção de uma maior concentração de renda, em função de sua própria dinâmica governada pelo parasitismo financeiro global-local que opera como uma espécie de núcleo estratégico central de seus negócios. Neste sentido, a resistência do governo a esta tendência aparece para estas elites como um “intervencionismo insuportável”.

Outro fator decisivo é a crescente agressividade dos EUA acossado pela crise, sabendo que o tempo joga contra seus interesses, que a decadência da unipolaridade imperial pode fazer com que percam por completo suas tradicionais posições de poder na América Latina. Isso já está começando a ocorrer a partir do processo de integração regional, de um Brasil autonomizando-se cada vez mais dos EUA, da persistência da Venezuela chavista, da consolidação de Evo Morales na Bolívia, etc. A Casa Branca embarcou em longa corrida contra o tempo: amplia as operações militares na Ásia e África, herdadas da era Bush, apadrinha o golpe militar em Honduras e outras intervenções na América Latina. A queda ou degradação integral do governo kirchnerista seria uma ótima notícia para os norte-americanos, pois enfraqueceria o Brasil e reduziria o espaço político da Venezuela, Equador e Bolívia.

Mas existe um fenômeno de primeira importância que provavelmente os Kirchner ignoraram e que boa parte da esquerda e do progressismo subestimou: a mudança de natureza da burguesia local, cujos grupos dominantes passaram a constituir uma verdadeira lumpen-burguesia onde se interconectam redes que vinculam negócios financeiros, industriais, agrários e comerciais com negócios ilegais de todo tipo (prostituição, tráfico de drogas e armas, etc.), empresas de segurança privada, máfias policiais e judiciárias, elites políticas e grandes grupos midiáticos. Essa é a mais importante das heranças deixadas pela ditadura, consolidada e expandida durante a era Menem.

A política de direitos humanos do governo não afetou somente a grupos de velhos militares criminosos isolados e ideologicamente derrotados. Ao golpear esses grupos, essa política estava desatando uma dinâmica que feria uma das componentes essenciais da (lumpen) burguesia argentina realmente existente. Quando começamos a desenrolar a trama de grupos midiáticos como o “Clarín” ou não midiáticos, como o grupo Macri, aparecem as vinculações com negócios provenientes da última ditadura, personagens-chave das máfias policiais, etc. Nestes círculos dominantes, a maré crescente de processos judiciais contra ex-repressores pode ser vista talvez em seu começo como uma concessão necessária ao clima esquerdizante herdado dos acontecimentos de 2001-2002 e que, mantida dentro de limites modestos, não afetaria a boa marcha de seus negócios. Mas essa maré cresceu até transformar-se em uma pressão insuportável para essas elites.

Finalmente é necessário constatar que assim como se desenvolveu um processo de humanização cultural democratizante também se desenvolveu, protagonizado pelos grandes meios de comunicação, um contra-processo de caráter autoritário, de criminalização dos pobres, de condenação do progressismo que põe os direitos humanos acima de tudo. Em certo sentido, tratou-se de uma espécie de reivindicação indireta da última ditadura realizada pelos grandes meios de comunicação, centrada na necessidade de empregar métodos expeditivos ante à chamada “insegurança”, à delinqüência social, às desordens nas ruas.

A mesma encontrou um espaço favorável em uma porção importante da população pertencente às classes médias e altas. Muitos membros destes setores não se atrevem a defender a velha e desmoralizada ditadura militar, mas encontraram um novo discurso neofascista que lhes permitiu levantar a cabeça. Essa gente se mobilizou em 2008 em apoio à burguesia rural e contra o governo “esquerdista”, esteve na vanguarda da vitória eleitoral de Mauricio Macri na cidade de Buenos Aires e dos políticos de direita nas eleições parlamentares de 2009.

Brincando com fogo?
A crise atual pode vir a ter sérias repercussões econômicas. É o que esperam muitos dirigentes políticos da direita que sonham em se apoderar do governo em meio ao caos e/ou a passividade popular. A paralisia do Banco Central ou sua transformação em uma trincheira opositora poderia desordenar por completo o sistema monetário, degradar o conjunto da economia, o que, somado a um tsunami midiático, converteria o governo em uma presa fácil.

Em tese existe a possibilidade de que o governo, encurralado pela direita, busque desesperadamente ampliar sua base popular multiplicando medidas de redistribuição de renda junto às classes baixas, estatizações, etc. A direita acredita cada vez menos nesta possibilidade, o que a torna mais audaciosa, mais segura de sua impunidade. Ela considera que os Kirchner estão demasiado aferrados ao “país burguês”, por razões psicológica, ideológicas e pelos interesses que representam, para que essa alternativa de ruptura passe por suas cabeças. Uma sucessão de fatos concretos parece dar-lhe razão. Afinal, Martín Redrado foi designado como presidente do Banco Central por Nestor Kirchner e confirmado depois por Cristina Kirchner. Agora, eles “descobrem” que se trata de um neoliberal reacionário e buscam substituí-lo por algum outro neoliberal ou bom amigo dos interesses financeiros.

Também existe a possibilidade que o caos buscado pela direita ou as medidas econômicas que ela seguramente tomará caso conquiste o governo desatem uma gigantesca onda de protestos sociais, fazendo ruir a governabilidade e reinstalando em uma escala ampliada o fantasma popular de 2001-2002. Mas essa direita considera cada vez menos provável a concretização dessa ameaça. Ela está cada vez mais convencida de que os meios de comunicação combinados com um sistema de repressão pontual - não ostensivo, mas enérgico - podem controlar as classes baixas. É muito provável que essas elites degradadas, lançadas em uma cruzada irracional, estejam atravessando uma séria crise de percepção.


(*) Economista argentino, professor na Universidade de Buenos Aires. É autor, entre outros livros, de "Capitalismo senil, a grande crise da economia global".

Tradução: Katarina Peixoto

Capitalismo e outras coisas de crianças



Vídeo que nos convida a olhar de uma forma diferente para o mundo em que vivemos e a questionar algumas das mais básicas premissas da vida no Capitalismo. Escrito e apresentado por Paddy Joe Shannon, produzido pelo Partido Socialista da Grã-Bretanha, com tradução e legendas de Glauber Ataide.

Eduardo Guimarães: Onde e como organizar a mídia alternativa?

Eduardo Guimarães: www.patrialatina.com.br

















Notadamente nos últimos dois anos, vêm ocorrendo tentativas esparsas de se organizar minimamente a mídia “alternativa”, o que seja ela, a Blogosfera , sites jornalísticos e algumas revistas, de menor tiragem e de poucos recursos, ditos "de esquerda", o que inclui a Carta Capital, a Caros Amigos, a Fórum e a Revista do Brasil, entre o que conta.
 
A dificuldade para se lograr tal feito explica o fato de o Brasil ter essa situação esdrúxula de só existirem grandes meios de comunicação de direita. Por que não podemos ter grandes jornais de esquerda como na França, na Itália ou nos Estados Unidos? Na França há o Libération ou L’Humanité, na Itália, L’Unità, ligado ao ex-Partido Comunista, e o independente Il Manifesto; nos Estados Unidos, há o socialista The Nation e, na Grã-Bretanha, The Independent.
 
Mas e no Brasil, o que temos? Folha, Globo, Estadão, Correio Brasiliense, Jornal do Brasil, Zero Hora... E por aí vai. Televisões? Todas de direita. Rádios e tevês? Entre as que têm grande alcance, todas de direita. Sobram à esquerda as revistas supra-mencionadas e os sites e blogs, e essa é a mídia alternativa que se pretende organizar.
 
Aí vem a questão: organizar como? Já surgiu a idéia de um portal de internet, mas ninguém vai querer abrir mão de seu vôo solo para escrever de graça, com obrigação a cumprir. É diferente de fazer um blog, onde você decide o que e quando vai publicar sem ter que respeitar prazos e quaisquer outras imposições que um veículo como um portal de internet exigiria.
 
Como se não bastasse essa dificuldade, não há dinheiro. Ninguém constrói hoje um portal de internet sem muito, muito dinheiro. Um jornalista da Record me disse que o recém-criado portal de Internet R7, da Igreja Universal, conta com uma redação de uma centena e meia de jornalistas e recursos ilimitados para produzir conteúdo. Estamos falando, pois, de milhões de reais.
 
Outro dia li acho que foi o blogueiro Ricardo Kotscho dizendo que o Brasil tem mais “colunas” do que a Grécia antiga, pois estamos confinados a opinar e opinar, ou reproduzir conteúdo dos grandes veículos. Por falta de dinheiro.
 
Então onde e como organizar essa mídia “alternativa”?, perguntará o leitor.
 
Quando se fala em “organizar”, o sentido é ao pé da letra. Formar uma organização nacional dos veículos que, por conta de sua linha ideológica (e este é o fato crucial), sofrem boicote de um empresariado que acredita que comunistas comem criancinhas, e que é aquele que poderia investir em uma fatia do mercado para jornalismo totalmente desatendida no Brasil.
 
Diante disso tudo, nesta quinta-feira estive reunido com o “Publisher” de um dos mais conhecidos e respeitados veículos da mídia “alternativa”, alguém que não recebe nome aqui porque não gosta de aparecer. Essa pessoa se propõe a encabeçar os esforços para se criar uma associação nacional desses veículos, entre os quais estaria este blog. Trata-se de uma tentativa de avançar até onde for possível.
 
Estamos vivendo um momento complicado, os que nadam contra a corrente da falta de recursos para fazer jornalismo cidadão, ou seja, sem lucrar nada. O ano eleitoral e a possibilidade de continuar fora do poder enlouqueceu a direita, que começa a adotar um nível de radicalização com ameaças de todo tipo aos que já começam a incomodar mesmo trabalhando de forma artesanal e sem recursos financeiros.
 
Fontes de financiamento, apoio jurídico, venda de espaços para publicidade, entre outros, seriam preocupação dessa associação. Ela teria força e representatividade, pois esses milhares de leitores deste, daquele e daquele outro blog, site ou pequena revista, juntos constituiriam um grande público.
 
Tenho dado minha contribuição para a integração da mídia “alternativa” na medida do possível. Em breve, colocarei outro anúncio gratuito neste blog para outra importante revista. Muitos dos sites e blogs “linkados” aqui dizem que o Cidadania lhes remeteu milhares de leitores. E há a militância política na ONG Movimento dos Sem Mídia e o comprometimento com este espaço que já nem me pertence mais.
 
Se puder contribuir também para essa associação, contribuirei. Acho que o Brasil precisa ter pluralidade no espectro ideológico de sua imprensa. Essa situação de só a direita poder falar para muitos de uma só vez precisa mudar, e só mudará se cada blogueiro, se cada editor de site ou revista de esquerda se dispuser a colaborar.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O retorno às origens...

Os novos sacerdotes e Abya Yala


Tal e qual os “selvagens” povos da mesoamérica, os povos contemporâneos empreendem guerras de busca de prisioneiros a serem oferecidos aos deuses. Não há como esconder. Até mesmo nas grandes catástrofes se vê a boca sangrenta do capital




Desde os anos 70 que das entranhas da América baixa assoma o que hoje conhecemos como “o novo movimento indígena”. Diz-se novo apenas porque apresenta outra configuração, uma vez que desde a invasão, em 1492, as comunidades originárias sempre resistiram à violência, à morte e à destruição de suas vidas e culturas. E esse “novo” momento começa quando em boa parte dos países latino-americanos as ditaduras calavam a voz de estudantes, sindicalistas e lutadores sociais. Naqueles dias, no final dos anos 60, os povos originários começaram a se reunir e discutir suas demandas. Pequenos encontros, outros um pouco mais expressivos e, a cada ano, ia crescendo a articulação continental. No México, problemas relacionados à questão da terra levaram povos de várias etnias a realizar um congresso em 1974, que acabou sendo um marco nesta reorganização. Na Bolívia os aymaras e quéchuas também se organizavam e realizavam encontros, no Equador, Guatemala, Colômbia, enfim, em vários pontos do continente se debatiam e se discutiam os problemas relacionados ao território, aos direitos, à saúde, educação, etc...
Nos anos 80 esta organização se fortalece, sai do âmbito da briga por melhorias dentro da ordem, e em alguns países os indígenas decidem fazer a luta efetiva. Não mais palavras ou pedidos, mas ações concretas. Foi assim no Equador em 1990, quando os originários ocuparam igrejas e prédios públicos no centro histórico exigindo seus direitos. Em 1994, quatro anos depois, a luta explodiu com os zapatistas e sua voz armada, enfrentando 12 dias de combate contra o exército mexicano, os aymara na Bolívia com a guerra da água (2000) e a expulsão de Sanchez de Lozada (2003), os originários do Equador derrubando presidentes (2005). Hoje, passada a primeira década do século XXI, é inegável a organização e as conquistas dos povos originários em toda América Latina. Já foram realizados quatro grandes encontros intercontinentais, dois países já incorporaram nas suas Constituições o Estado Plurinacional, que garante aos indígenas o direito de organizar sua vida segundo seus costumes, e ninguém mais concebe a vida sem a participação das gentes originárias. Mesmo no Brasil, onde as lutas indígenas ainda se travam completamente à margem da grande mídia, cresce a organização e a avançam as conquistas.

O preconceito

Mas, apesar de toda esta luta e das sucessivas conquistas dos povos originários em toda América Latina, o preconceito e o racismo ainda são os grandes entraves para que as gentes passem a respeitar as demandas dos indígenas como legítimas e necessárias. É que ao longo dos séculos os países do continente foram dominados por uma elite criolla (gente branca ou mestiça nascida na América), que sequer chegou a cogitar ter ao seu lado, no comando da vida latino-america, os legítimos donos da terra de Abya Yala. O próprio Bolívar, quando volta do Haiti e incorpora as reivindicações negras e indígenas, é rechaçado pelos seus generais, que acabam por vencê-lo. Enquanto Bolívar agoniza de tuberculose, derrotado na sua concepção de estado, a nova América Latina que emerge das lutas de independência fica entregue a esta elite predadora, que se apropria das terras comunais, que rouba o indígena e o submete ao que José Carlos Mariategui chamou de “gamonalismo”, sistema de domínio dos latifundiários no qual não pode haver a redenção dos povos originários.
O foi justamente Mariategui, nos anos 30 do século XX, o primeiro a afirmar que as reivindicações dos originários precisavam sair do cultural e converterem-se em econômicas e políticas. Segundo ele, a questão indígena deveria ser encarada com uma solução social, ou seja, o centro não deveria ser racial ou moral, mas sim a propriedade da terra. Sem resolver isso, nada mudaria. De qualquer forma, a voz do marxista peruano não foi suficiente para que as elites latino-americanas mudassem sua maneira de encarar o clamor indígena e, ao longo dos anos que se seguiram, foi reforçado o preconceito, com a idéia de que o índio é preguiçoso, sujo, bêbado e com isso, seguiu aumentando o racismo que se perpetua indelével em toda a sociedade.
É por isso que nas escolas da maioria dos países latino-americanos as crianças sabem muito mais dos egípcios do que dos maias, assim como conhecem em profundidade a vida dos povos europeus enquanto sequer sabem onde vivem os caraíbas, os chibchas, os arauak, os tupinambás, os guarani. Suas formas de organizar a vida, então, são absolutamente desconhecidas e o que é falado não foge do folclore ou das aberrações.

Os sacrifícios humanos

E, ainda assim, desconhecendo, o povo que pensa o mundo (os chamados intelectuais) insiste em dizer que é impossível transladar as formas de viver dos originários para o nosso tempo. E mais, ainda há aqueles que buscam nos costumes mais lúgubres dos antigos os exemplos para respaldar isso. “Veja os maias. Eram uns sanguinários. Faziam sacrifícios humanos, assim como também os mexicas, os olmecas, teotihuacanos, astecas etc... Vamos voltar a sacrificar pessoas a um deus que exige sangue? É isso que se quer com a volta das culturas índias?” Este argumento nos faz refletir sobre os costumes antigos e os de agora. Sim, é verdade. Os maias e os demais povos que habitavam a mesoamérica realizavam sacrifícios humanos. Seus deuses eram implacáveis e era por isso que faziam incursões guerreiras. Buscavam prisioneiros para alimentar os deuses. Isso pode ser visto com bastante crueza no filme de Mel Gibson, Apokalipto, o qual narra a saga de um jovem capturado pelos maias e mostra com riqueza de detalhes os rituais de sacrifício.
Para os maias, assim como para os demais povos da região, a religião era um contrato entre deuses e homens. Os primeiros ajudavam no trabalho, davam alimentos e segurança, mas exigiam pagamento antecipado. Por isso havia o ritual de “abrir a boca”, chamado assim porque o sangue dos sacrificados era usado para untar a boca do grande deus. Enquanto entregavam o pagamento aos deuses, os sacerdotes pediam saúde, filhos, prosperidade, água e temporais para que a vida florescesse, força para enfrentar os inimigos, folga e descanso.
Naquela complexa sociedade que inventou o zero no século III a.C - bem antes dos hindus que só chegaram a ele no século VIII depois de cristo ou da Europa que só o conheceu na Idade Média - que cultivava o milho e construía gigantescas pirâmides com degraus, muito mais espetaculares que as egípcias, quem detinha o poder sobre a vida e a morte eram os sacerdotes. Os homens comuns não podiam interpretar a vontade dos deuses, só os sacerdotes eram capazes e por isso tinham o domínio dos rituais, do ensino e da vida. Eles decidiam quem vivia ou morria, eles eram os que repassavam as ordens dos deuses e mesmo os reis eram obrigados a seguir seus conselhos. Então reverbera nos ouvidos a pergunta: “Vamos querer essa barbárie outra vez?”

Os sacerdotes atuais

Desde a pergunta do amigo intelectual passo em revista os tempos modernos. Nos livros que se escrevem aos borbotões e que vem, sobretudo, da Europa, fala-se de uma pós-modernidade, de um tempo de fins, de fragmentações, de vazios. Conta-se de um tempo anômico, sem normas. Diz-se que houve uma época em que no mundo ocidental a norma era revelada, emanava de deus. Depois, com o iluminismo, a norma passa a ser uma construção humana. É o homem quem é o centro da vida. E hoje, não há mais normas. Tudo é válido. Existe apenas o fluxo, fluido e líquido. Mas, uma olhada mais apurada revela que o fluxo, dito sem forma e sem lei, está sim submetido a uma razão bem específica: é a do mercado capitalista. Este é o grande deus sanguinário, cuja boca aberta está borbulhante do sangue das vítimas que, implacavelmente, seguem sendo oferecidas.
Tal e qual os “selvagens” povos da mesoamérica, os povos contemporâneos empreendem guerras de busca de prisioneiros a serem oferecidos aos deuses, no geral travadas com pastas pretas e bem trajados homens e mulheres, representantes das agências financiadoras internacionais. Ou mesmo com guerreiros tradicionais como é o caso das invasões estadunidenses. Nações inteiras são capturadas e submetidas. Milhões de pessoas são sacrificadas todos os dias nas “bocas abertas” do capital. Uma zapeada nos programas dominicais da televisão brasileira e isso salta aos olhos. Não há como esconder. Até mesmo nas grandes catástrofes se vê a boca sangrenta do capital, quando as gentes são soterradas por estarem vivendo em áreas de risco, ou por serem expulsas do centro da cidade, ou por estarem entregues à especulação da natureza.
Os maias e os demais povos realizavam estes sacrifícios em momentos rituais, sempre acreditando que o resultado seria o bem de toda a comunidade. Exatamente como pontificam os novos sacerdotes do sistema capitalista. É preciso que alguns se sacrifiquem para que a vida de todos melhore. Primeiro crescer o bolo para depois repartir. Se a pessoa trabalhar muito, ela chega lá. Não são estes os mantras que a televisão, sede da mais-valia ideológica, passa todos os dias? Pois, então, onde está o barbarismo dos maias? Não é exatamente igual ao que vemos hoje?
Por todo o planeta economistas e políticos vomitam suas fórmulas sobre crescimento, desenvolvimento, modernidade. Há que privatizar, há que enxugar, cortar gastos públicos, diminuir o estado. Há que criminalizar os movimentos sociais, há que prender aqueles que se opõem a marcha inexorável do capital, há que eliminar terroristas, hereges, subversivos. Há que invadir países, há que roubar riquezas naturais, há que destruir todas as resistências. Nas telas de TV estes novos sacerdotes aparecem como aqueles que são os únicos capazes de interpretar a vontade dos deuses. Ao povo comum isso está vetado, tal e qual no tempo dos maias. E se alguém se arvora a querer dizer: “mas não é assim, pode ser diferente”, lá vem o garrote e o punhal. Elimina-se e entrega-se à boca aberta do grande Murdoch ( que pode ser o antigo deus babilônico ou o magnata da mídia).
É por conta disso que talvez seja bom pensar bem e refletir se os povos originários eram mesmo os bárbaros ou sanguinários. Eles estavam seguindo sua vida, evoluindo no conhecimento da natureza e certamente chegariam a avanços se não tivessem sido invadidos e exterminados. Não sei se seriam melhores ou piores que as gentes de hoje, não sei se seguiriam realizando sacrifícios humanos ou sustentando uma casta sacerdotal poderosa. Mas uma coisa me bate a certeza. Seria diferente. A considerar o respeito que tinham pela natureza, a sabedoria que carregavam de que o que acontece a terra acontece também aos filhos da terra, os propósitos comunitários que sustentavam a vida das civilizações mais avançadas, como a dos incas, dos aymaras, quéchuas, não tenho dúvidas de que encontrariam uma forma mais respeitosa de organizar a vida.
Um exemplo disso pode-se observar no povo Shuar, do Equador, que hoje luta para preservar suas águas, entendendo que elas são sagradas, ou os Mapuche, que querem preservar as araucárias onde vivem seus deuses. Também se pode ver nos originários que ocupam o território brasileiro, de sociedades menos complexas, mas igualmente respeitosas com a vida que vive. Estas comunidades todas que conseguiram ao longo dos séculos manterem vivas as memórias coletivas de sua cultura são as que estão na ponta da luta pela preservação dos recursos naturais. Elas sabem que o deus desse tempo é um deus de destruição. Ele não protege o milho, não dá força, não manda águas e temporais para que a vida floresça. Ao contrário, este ídolo de boca aberta cria o transgênico, destrói a semente, faz assomar o tsunami, joga bombas, arrasa tudo onde pisa, desfaz as comunidades.

Abya Yala é o novo

Hoje, a humanidade está colocada diante de um grande desafio. O modelo de desenvolvimento apresentado como revelação divina por políticos e economistas está esgotando os recursos e destruindo a vida. Mudar a maneira de viver no mundo é uma necessidade bioética. Não há escolhas. As pessoas “comuns”, a quem se lhes diz vedada a capacidade de interpretar as falas dos deuses precisam saber que isso não é verdade. Cada ser humano neste mundo sabe onde lhe aperta o calo. Os que vivem na pobreza, na miséria, na dor, devem saber que isso não é por conta de um “castigo de deus”. Não. A miséria de milhões só existe porque ela garante a riqueza de uns muito poucos. Esse é o dogma da teologia capitalista. Para que um viva, outro tem de morrer.
Mas, por todo o planeta existem culturas, comunidades, seres, que sabem que há formas outras de organizar a vida, nas quais as pessoas dividem o que tem e todos podem viver com dignidade. Não há os muito ricos, nem os muito pobres. Todos cuidam da terra, das riquezas e distribuem os bens. Isso é possível e real. E, agora, diante das catástrofes, mudanças climáticas, degelos, furacões, tsunamis, ou é isso ou é o fim.
Os maias, estes mesmos chamados de sanguinários, eram extraordinários astrônomos e criaram no seu tempo um intricado calendário no qual previram uma mudança radical da vida que viriam no ano de 2012. Claro que não é a bobagem hollywoodiana que andou pelos cinemas nestes dias de verão. A profecia é clara: a humanidade deve escolher entre perecer por conta da estúpida exploração dos recursos naturais, ou viver em harmonia com o universo. Parece uma coisa boba, conversa de “velhos hippies”, utopias descabeçadas. Mas, os maias sabiam que o sol era uma entidade viva, conheciam seus segredos, e amavam a terra. Hoje, observando como o sistema-mundo capitalista organiza a vida e todas as conseqüências que daí decorrem, talvez “descabeçado” seja não entender que as coisas precisem mudar. Já basta de entregar nossa gente à boca aberta do sanguinário deus.
Abya Yala desperta e se agiganta. Os movimentos originários caminham na direção da preservação da sua cultura e mais, apresentam novas liras para novas canções. Não querem a volta a um passado perdido. Querem um futuro de paz, de respeito à natureza, de cuidado com a mãe-terra, de solidariedade, de cooperação. Avançam na construção de um outro tipo de estado que garanta o nacional/popular, mas também o pluricultural. Não querem separação, mas direito de governar junto. Propõe um passo além, dialeticamente, ao projeto generoso de Bolívar. Uma pátria grande, na qual as etnias, as culturas, as comunidades, sejam ouvidas, respeitadas e participem da esfera do poder. Uma coisa nova, abyayálica, típica do nosso espaço geográfico, mesclado de tantas culturas.

A "revolta da elite branca"...

As ideias demoníacas dos direitos humanos

Poucas vezes uma iniciativa foi tão atacada pela direita e suas corporações de mídia quanto o Programa Nacional de Direitos Humanos. Mas não sem razão. Uma proposta como, por exemplo, a cobrança de impostos sobre grandes fortunas é realmente de arrepiar os cabelos de quem sempre os deitou sobre a riqueza nacional – ainda que esta medida esteja prevista na Constituição Federal e seja adotada pelos países que mais progrediram no mundo.


Propor um maior controle sobre a esculhambação e as mutretas que envolvem as concessões de rádio e tv só pode ser um escândalo para aqueles que fazem fortuna ao se arvorarem proprietários do espectro eletromagnético que pertence a todo o povo brasileiro.


Fiscalizar os latifúndios num país em que 1% de senhores feudais controla quase metade das terras só pode ser comparado à criação de um “demônio”, no dizer da senadora Kátia Abreu, do DEM, partido que tem suas raízes na golpista UDN.


Deve mesmo ser demoníaca a ideia de garantir direitos aos gays, lésbicas, travestis e toda essa gente que ofende pelo único pecado de ser diferente. Assim como só pode ser obra do capeta a proposta de ampliar a participação direta do povo via plebiscitos, referendos, leis e vetos populares. Por que as massas deveriam decidir diretamente os seus destinos, se sempre, desde o genocídio inaugural, são vistas como mão-de-obra barata e mal qualificada?


Poucas vezes na história desse país uma iniciativa de um governo foi tão bombardeada pela mídia, tanto em intensidade quanto na sua duração. Há pelo menos 15 dias rádios, jornais e tvs de todo o país partem para o ataque escancarado daqueles que defendem uma proposta democrática para o Brasil.


Para isso, omitem informações, descontextualizam fatos e até mesmo mentem. Um bom exemplo é a surrada versão de que o que se pretende com a Comissão da Verdade é rever a Lei de Anistia. Mentira. O que existe é uma solicitação da OAB ao Supremo Tribunal Federal sobre dispositivos de interpretação contraditória. A Constituição Federal, por exemplo, considera que a prática da tortura não pode ser objeto de graça ou anistia. Tratados internacionais estabelecem que crimes de lesa-humanidade, como a tortura, são imprescritíveis. Comissões de Verdade funcionaram ou funcionam muito bem em outros países, e isto é sistematicamente escondido por meios de comunicação.


Mas não é só isso. O fato de a Secretaria de Direitos Humanos só aparecer nas corporações de mídia nesse contexto é, por si só, bastante revelador dos propósitos das corporações de mídia. É como se não houvesse políticas públicas de defesa dos direitos das crianças e adolescentes, de pessoas com deficiência, idosos, LGBT, além dos programas de proteção a pessoas ameaçadas, combate ao trabalho escravo e até uma Ouvidoria-geral da cidadania. Iniciativas que poderiam ser potencializadas pela visibilidade que lhe negam.


E assim funciona a velha lógica do sistema: os ataques da direita identificam os demônios para que sejam esconjurados por sua mídia. Mas até que isso tem sua serventia. Revela a urgência da democratização dos meios de comunicação de massa e deixa os inimigos da democracia completamente expostos – todos com cara de santo, naturalmente.



Marcelo Salles, jornalista, é coordenador da Caros Amigos no Rio de Janeiro e editor do Fazendo Media(www.fazendomedia.com)

Esta no portal vermelho....

O flagelo da recessão nos EUA: 85 mil desempregados em dezembro

Umberto Martins *

Os capitalistas norte-americanos destruíram 85 mil postos de trabalho em dezembro, segundo dados do governo divulgados nesta sexta-feira (8). A informação oficial, que coincide com estatísticas divulgadas na quinta (7) pela empresa que processa a folha de pagamentos do setor privado no país (ADP), caiu como uma ducha de água fria no ânimo do governo e de investidores e analistas que apostavam na recuperação do mercado de trabalho e esperavam um corte bem menor (de 8 mil vagas).

É um claro sinal de que o fundo do poço da crise que perturba a maior economia capitalista do mundo ainda não foi alcançado. A recessão teve início há mais de dois anos, em dezembro de 2007, na sequencia da bolha imobiliária, que começou a murchar em 2006. Desde então, 7,7 milhões de trabalhadores e trabalhadoras foram acrescentadas ao exército de desempregados, que já conta cerca de 17 milhões. Somente no ano passado, as demissões líquidas (ou seja, descontadas as admissões) somaram 4,2 milhões.

Efeitos desiguais

A taxa de desemprego aberto, calculada pelo governo, subiu de 4,6% para 10% no período. A realidade do mercado de trabalho é mais trágica do que o índice oficial de desocupados sugere. Este considera apenas os assalariados que procuraram emprego ao longo dos 30 dias anteriores à pesquisa. Já os que vivem à base de “bico” e os desempregados no desalento (aqueles que desistiram de procurar um novo posto de trabalho durante a crise) são ignorados. Se fossem levados em conta, a taxa subiria a 17,3%, segundo os especialistas.

Os números não deixam margem a dúvidas: esta é a mais grave crise do capitalismo americano desde a Grande Depressão que atravessou os anos 1930 e contribuiu fortemente para ascender o pavio da Segunda Guerra Mundial. Todo mundo padeceu e padece as conseqüências das tormentas provenientes do poderoso império, embora de forma desigual.

Os países que compõem o chamado BRIC – China, Índia, Brasil e Rússia, com exceção desta última -, sofreram menos. Tendo o desempenho do PIB por critério, o Brasil praticamente perdeu o ano de 2009, que terminou com taxa de crescimento próxima de zero. Mas a economia nacional já está em franca recuperação, com um mercado de trabalho bem aquecido. O comportamento da China, que tem a segunda maior economia do planeta, foi muito melhor. O país mais uma vez surpreendeu o mundo ao exibir uma taxa de crescimento de cerca de 8% (ano passado), tendo um papel essencial no amortecimento da crise mundial, especialmente no Brasil, de quem se tornou o maior parceiro comercial, desbancando o decadente império do norte.

Alimento para a crise

As demissões nos EUA em dezembro atingiram a construção civil, a indústria manufatureira e o comércio atacadista, segundo as informações divulgadas pelo Departamento do Trabalho. É um cenário desesperador para a classe trabalhadora, que embora não seja a responsável pela crise do capitalismo é quem acaba pagando sua salgada conta. Isto ocorre em função da condição subalterna que trabalhadores e trabalhadoras ocupam no processo de produção e reprodução do capital e das relações sociais (e de poder) estabelecidas no interior do sistema, fundadas no monopólio privado dos meios de produção e na apropriação (pelos capitalistas) da riqueza produzida, em detrimento dos produtores.

O desemprego não é apenas um flagelo para trabalhadores despojados dos meios de produção, que necessitam vender sua força de trabalho para sobreviver. É uma espécie de câncer para as economias, uma doença que impede a recuperação da produção e realimenta a recessão ao deprimir o consumo do povo e, por consequência, o comércio e a indústria. Por esta e outras razões, apesar da euforia irracional das bolsas, enquanto o mercado de trabalho não reagir positivamente é bobagem falar em recuperação.

Ilusões reformistas

Imaginava-se que a eleição de Obama aliviaria o sofrimento da classe operária. Foi uma vã esperança reformista. O novo presidente não teve peito para enfrentar Wall Street. O governo que dirige destinou trilhões de dólares aos banqueiros, a pretexto de salvar o corrompido sistema financeiro da completa bancarrota. Pouco ou nada fez pelos trabalhadores, que continuam sofrendo com as demissões em massa e as execuções hipotecárias.

A verdade, que transparece nos fatos, é que os interesses da oligarquia financeira continuam soberanos na definição da política (interna e externa) dos EUA, uma política imperialista que, por definição, é antissocial, antagônica aos interesses dos povos (inclusive o norte-americano) e da própria humanidade.

O caminho para superar os impasses revelados pela crise mundial do capitalismo é o da luta enérgica e sem fronteiras contra o sistema capitalista e imperialista. O socialismo é uma necessidade histórica candente.

* Jornalista, membro da Secretaria Sindical Nacional do

domingo, 10 de janeiro de 2010

Chiapas, México...

Libertados, os paramilitares voltam a Chiapas

12 anos do massacre da etnia tzotil, segue a impunidade, com o agravante de que os 30 paramilitares presos foram libertados, alguns deles assassinos confessos dos 45 tzotziles que rezavam em uma igreja.


Gloria Muñoz Ramírez
Desinformémonos
Acteal, Chiapas
Créditos: BrasilDeFato


chiapas

No dia 22 de dezembro de 2009, completam-se 12 anos do massacre em Acteal, comunidade dos Altos de Chiapas, da etnia tzotil. Mais um ano de impunidade, agora, com o agravante de que os 30 paramilitares que haviam sido presos foram libertados, alguns deles assassinos confessos dos 45 tzotziles (18 crianças, 22 mulheres e 6 homens) que estavam rezando em uma igreja.

É novembro, e, na comunidade, as crianças brincam no campo construído em cima do cemitério onde estão enterradas as vítimas. Acteal mudou sua fisionomia ao longo desses anos. O centro de toda comunidade está marcado pelo pesadelo do dia 22 de dezembro de 1997. A neblina nos Altos vai e vem. O ambiente frio como de costume, está carregado pela recente notícia da libertação de um segundo grupo de nove paramilitares que, assim como os 20 libertados em agosto deste ano, são responsáveis pela matança, segundo informações de Las Abeja, associação próxima à igreja à qual pertenciam todas as vítimas.

Sebastián Pérez Vázquez, presidente da mesa diretora da Associação Civil Las Abejas, afirma que os paramilitares continuam armados nas comunidades. “Atualmente tem muitas armas de paramilitares nas comunidades de Puebla, Yaxchemel, Los Chorros, Kanolal, La Esperanza e Acteal. As denúncias vêm sendo feitas há mais de 11 anos e a situação segue igual. Chiapas continua sendo um campo de batalha com mortos, desaparecidos, presos... As terras continuam sendo ocupadas por paramilitares. Estão dadas as condições para novas violências”.

Entrevistado na sede da associação, no centro do povoado, Pérez Vázquez alerta que, ao contrário do que preveem as indicações jurídicas que proíbem o retorno dos ex-detentos para a região, “ao menos dois deles já estão aqui”.

Mariano Luna Ruiz, sobrevivente do massacre, acrescenta: “Queremos a justiça, mas o governo não a faz. Nossa denúncia não é mentira, é a pura verdade. Sou testemunha disso, vimos àqueles que nos mataram. Mataram minha esposa, Juana Pérez Pérez, meu filho, meu cunhado, minha irmã e meus sobrinhos. Ficamos sabendo que já libertaram 29 pessoas e não queremos que nenhuma delas retorne aqui para a comunidade. Sabemos que foram eles que as mataram, e isso ainda me causa muita dor, mesmo depois de 12 anos. Não vamos parar de denunciar e de falar... que culpa tinha minha mulher?”.

María Vázquez Gómez, outra testemunha e sobrevivente, protesta: “Foram mortos minha mãe, meus irmãos e sobrinhos. São meus irmãos e companheiros que estão mortos. Estamos muito incomodados com o fato de os paramilitares terem sido libertados. Ainda hoje nos dói bastante, ficamos indignados quando soubemos que a Suprema Corte os libertaria... Estivemos lá e não nos levaram em consideração. Não voltaremos a ver nossos mortos, mas os familiares dos paramilitares, sim, voltarão a encontrá-los”.

Sete franguinhos para cada família
O líder da Las Abejas destaca que a atual estratégia do governo de Chiapas é dividir as comunidades. “Há menos de um mês vieram aqui pessoas do governo para nos oferecer bicicletas. Queriam entrar aqui para fazer seu palanque e queriam trazer uma Virgem de Guadalupe para Las Abejas. Aqui não estávamos sabendo de nada e recusamos a entrega. A esposa do governador veio para entregar sete franguinhos para cada família. Isso é uma clara provocação para dividir as comunidades. Agora mesmo, enquanto conversamos, a esposa do governador está aqui perto entregando coisas. Como é possível acreditar que vamos transformar a justiça com franguinhos?”, questiona, indignado, Pérez Vázquez.

Em portugal, como no Brasil a proposta da social democracia(PSDB) é a mesma...

A OFENSIVA CONTRA
A FUNÇÃO PÚBLICA E O SERVIÇO PÚBLICO [1]
Pedro Carvalho

Neste texto de enorme interesse para todos os trabalhadores e não apenas os da função pública, o autor, Pedro Carvalho desmonta a falácia neoliberal que o governo PS de José Sócrates levou a um extremo onde a direita tradicional não conseguiu chegar.
A desqualificação dos serviços, através da diminuição de recursos, meios e funcionários, é sempre o primeiro passo para justificar para a privatização ou mesmo encerramento do serviço.
E o encerramento de serviços implica na grande maioria dos casos um contributo para acelerar a desertificação de uma determinada localidade ou região. Por outro lado, questões de eficiência e qualidade muitas vezes foram levantadas para justificar o encerramento de centros de saúde, maternidades ou urgências, ou noutros casos, a relação custo/benefício na manutenção de um determinado serviço, quando logo após o encerramento o serviço passa a ser garantido por privados.leia aqui na integra...

poesia revolucionaria...

Não cultives a fraqueza

Vive o fraco na fraqueza
o bom na sua bondade
vive o firme na firmeza
lutando por liberdade.


Não cultives a fraqueza,
procura sempre ser forte,
que o homem que tem firmeza
não se rende nem à morte.


Educa a tua vontade
faz-te firme: em decisões,
que não terá liberdade
quem não fizer revoluções.


Se queres o mundo melhor
vem cá pôr a tua pedra,
quem da luta fica fora
neste jogo nunca medra.


Francisco Miguel Duarte,
Poeta popular nascido no Alentejo,
Operário sapateiro, filho de camponeses


Homenageando o centenário do seu nascimento.
Com o apoio de "Caderno Vermelho"

sábado, 9 de janeiro de 2010

O futebol e a barbarie...


Por Rafael Pirrho, em Joanesburgo

Antes que se coloque tudo no mesmo saco, é preciso dizer que o ataque à delegação de Togo, em Angola, não tem chance de se repetir na Copa do Mundo. A África do Sul possui um leque de problemas sérios, incluindo a violência urbana, mas entre eles não estão grupos terroristas ou separatistas. Além disso, aqui há mais estrutura e experiência em grandes eventos, ao contrário de Angola.
O problema é explicar isso àqueles que já se acostumaram a ver os 53 países africanos como um só. Se há crise em um deles, é comum que todos recebam o mesmo rótulo. Por isso, não há como negar que, embora esta seja uma análise equivocada, o que aconteceu em Angola respinga na Copa da África do Sul.

Mas a barbárie mancha, sobretudo, a imagem de crescimento que Angola tenta construir. O país é, ao lado da Nigéria, o maior exportador de petróleo da África, mas engatinha em questões básicas como segurança e infraestrutura. Tem grandes riquezas naturais, mas ainda sofre para controlar seu próprio território.
Cabinda, local do atentado contra a seleção togolesa, é uma reunião de todas essas características. De lá saem cerca de 80% da larga exportação de petróleo angolano, mas, por isso mesmo, esta é uma região instável, repleta de interesses econômicos. Ao colocar a cidade (homônima da província) como sede da Copa Africana, Angola queria mostrar que a situação por lá estava sob controle. Apostou alto e perdeu.
Perderam também os milhões de angolanos que esperavam com ansiedade por esta Copa Africana. Nas últimas semanas, uma enxurrada de propagandas na TV mostravam como o país já respirava o torneio. Angola convidou Pelé e Eusébio, festejou as presenças de Drogba e Eto’o, sonhou com um inédito título continental, mas acabou atingida em cheio pelos tiros em Cabinda. Os terroristas conseguiram acertar o alvo ao exporem ao mundo as fragilidades do país.