quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Por que as relações da Petrobras com o Irã irritam a Flórida


Quando o governador da Flórida, Charlie Crist, liderou uma missão comercial ao Brasil no mês passado, só se falava em melhorar os laços comerciais com o maior parceiro comercial do estado. "Deus abençoe o querido Brasil", disse Crist aos seus anfitriões, elogiando o programa mundialmente famoso de biocombustíveis do país.

Por David Adams, no St. Petersburg Times



Por isso é que foi uma surpresa, no último dia de Crist no Brasil, quando ele abruptamente anunciou o cancelamento de uma reunião com executivos da gigante estatal de energia Petrobras.

"Vamos continuar a seguir o caminho moral e prudente de não fazer negócios com empresas que patrocinam o terror e estabelecer um exemplo para todos outros Estados e nações", disse ele, citando uma nova lei da Flórida que exige que o fundo de pensão do estado evite empresas que façam negócios com o Irã e o Sudão.

Na época, a equipe de Crist disse que o gesto era inteiramente simbólico. A Petrobras tem modestos US$ 35 milhões (cerca de R$ 70 milhões) investidos em uma empresa de perfuração de petróleo iraniana - e eles acreditavam que a Flórida não tinha investimentos na Petrobras.

Os executivos da empresa foram surpreendidos pela bronca de um político em sua mera segunda viagem ao exterior que parecia o final de uma saga. Agora, o St. Petersburg Times descobriu que o fundo de pensão da Flórida tem US$ 111.919.435 (cerca de R$ 224 milhões) em ações da Petrobras, de acordo com a Administração do Conselho Estatal, que administra os investimentos do Estado.

"Conversei com o fundo antes de me reunir com a Petrobras, para ver qual quantia poderia ser afetada. Talvez tenha passado despercebido", disse George LeMieux, então chefe de gabinete de Crist. O erro de cálculo pode ter sérias repercussões para o relacionamento entre a Petrobras e o estado.

Sob a lei da Flórida, a Petrobras tem até setembro de 2008 para cortar laços com o Irã antes das autoridades serem forçadas a retirar o investimento de US$ 112 milhões. Que efeito tal retirada teria nas relações entre o Brasil e a Flórida não está claro.Crist, entretanto, via a Petrobras, maior distribuidora e vendedora de biocombustíveis, como potencial sócia em seus planos de promover a energia renovável.

"A Petrobras é uma empresa com a qual, de uma forma ou de outra, os interesses americanos terão que lidar", disse Jorge Pinon, ex-executivo da Amoco na América Latina, hoje no Centro de Estudos do Hemisfério da Universidade de Miami. "Ainda vamos precisar do Brasil se passarmos para o E10", acrescentou, referindo-se à gasolina misturada com etanol, que está pegando nos EUA, mas continua difícil de se encontrar na Flórida.

Ascensão

Nos últimos anos, a Petrobras emergiu como uma das maiores empresas de petróleo e gás com importante participação em combustível renovável. Uma descoberta gigantesca de petróleo off-shore, anunciada no mês passado, pode elevar o Brasil para o número oito na lista de maiores exportadores.

Só nos dois últimos anos, sua subsidiária americana, Petrobras America, tornou-se importante agente na perfuração na Costa do Golfo. "Em breve, a Petrobras vai se tornar uma das maiores produtoras de petróleo no Golfo do México", disse Pinon.

Apesar de o fundo de pensão da Flórida não poder investir na Petrobras sob as atuais circunstâncias, isso não impediria a gigante brasileira de investir na Flórida, de acordo com LeMieux. A Petrobras expressou interesse em entrar nesse mercado de varejo de combustível. "Estamos tentando fazer uma declaração com nossos investimentos. É realmente o único ponto de alavancagem que o Estado tem", disse LeMieux.

A participação de US$ 112 milhões de Flórida na empresa é pequena diante de seu valor de mercado de US$ 75 bilhões (aproximadamente R$ 150 bilhões). Ela registrou lucros de US$ 12 bilhões (em torno de R$ 24 bilhões) em 2005. O investimento da Petrobras no Irã também é minúsculo se comparado com outras empresas de energia internacionais, limitado a serviços de perfuração de US$ 35 milhões no Golfo Pérsico, com a estatal National Iranian Oil Co.

O contrato foi assinado no dia 14 de julho de 2004, bem antes da recente aumento da preocupação sobre as ambições nucleares do Irã, dizem funcionários da Petrobras. O contrato deve expirar no dia 14 de janeiro.

"A Petrobras é internacionalmente reconhecida por suas atividades responsáveis em todo o mundo e nunca patrocinaria o terror", declarou a empresa, observando que recebeu amplos elogios por sua administração eficiente e transparente.

Crist já sabia dos laços da Petrobras no Irã dois meses antes da viagem, admitem membros da equipe. "Há dois meses, o gabinete tomou maiores passos para se afastar de investimentos no Irã, e uma lista de empresas foi fornecida ao governador", disse a porta-voz do governador, Erin Isaac. "Durante a visita, ele me chamou e pediu que a reunião fosse cancelada imediatamente."

As autoridades brasileiras, entretanto, dizem que a ação do governador as tomou quase totalmente de surpresa. Apesar de terem recebido notícia da mudança da agenda do governador, só receberam explicações no último dia de Crist no Brasil. O consulado brasileiro em Miami presumiu que a mudança tivesse a ver com os planos de Crist de viajar para a Argentina naquele mesmo dia.

O cônsul geral do Brasil em Miami, João Almino, contatou o escritório do governador para expressar a "surpresa" de seu governo com a decisão de Crist e a linguagem usada na declaração de 7 de novembro. O Brasil respeita o direito da Flórida de regular seu fundo de pensão, mas nega que a Petrobras esteja associada com o terrorismo, disseram as autoridades.

O Brasil se considera um aliado no combate ao terrorismo, disse Rafael Vidal, vice-cônsul geral do Brasil em Miami. "Estamos jogando do mesmo lado", disse ele. LeMieux disse que esperava que a Petrobras cortasse seus laços com o Irã quando seu contrato expirasse em janeiro. "Para que tudo dê certo."

Fonte: The NYT News Service



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