quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Concentração de renda e agonia da classe média nos EUA

Vivendo no país mais rico do mundo, a classe trabalhadora estadunidense vem comendo o pão que o diabo amassou ao longo das últimas décadas. Os salários reais estão estagnados desde 1973, ou nos últimos 37 anos, ao passo que a renda das famílias mais ricas (1% da população) triplicou, conforme observou o jornalista Edward Luce, do Financial Times, em reportagem intitulada “A agonia da classe média americana”, reproduzida nesta quarta (4) pelo jornal Valor.

A crescente concentração da renda no topo da pirâmide e o arrocho dos salários na base constituem provavelmente as principais características do padrão de reprodução do capitalismo americano no período mencionado, que sucedeu os chamados “anos dourados” do pós-guerra (décadas de 1959 e 1960). Isto impactou fortemente a chamada classe média, conforme revela Luce.

Problema estrutural

A tendência à concentração de maior riqueza num pólo e pobreza noutra foi intensificada nos últimos anos, a tal ponto que “a maioria dos economistas vê a grande estagnação [dos salários] como um problema estrutural – ou seja, inume ao ciclo econômico”.
No último ciclo de expansão da economia, “que começou em janeiro de 2002 e terminou em dezembro de 2007, a renda familiar mediana americana ficou US$ 2 mil menor – a primeira vez em que a maioria dos americanos esteve pior no fim de um ciclo do que no início”.

Sem mobilidade

Observa-se, com isto, “um declínio na mobilidade da renda”, ou seja, “hoje, nos EUA, é menor a chance de passar de um estrato de renda mais baixa para outro mais elevado do que em qualquer outra economia desenvolvida.” O jornalista inglês enxerga no avanço da desigualdade “a crise em fogo lento do capitalismo americano”.

Não surpreende que uma maioria crescente de estadunidenses tem dito, em pesquisas de opinião, acreditar que seus filhos terão um padrão de vida pior do que o deles próprios. O famoso american of way of life (modo de vida americana) já era.

Arrocho e despejo

As coisas pioraram com a recessão iniciada no final de 2007, que destruiu cerca de 9 milhões de empregos, degradou um pouco mais as condições de trabalho e rebaixou salários. Além disto, um grande número de famílias operárias, endividada e sem renda, entrou na fila dos despejos e amargou também a perda das residências.

As políticas públicas em geral contribuíram para aprofundar o fosso social, reforçando a acumulação de riqueza pelas famílias mais ricas e o empobrecimento da massa trabalhadora. O governo Obama não alterou a lógica do sistema.

Economia e política

O processo de achatamento relativo (e mesmo absoluto) dos salários foi paralelo ao avanço do parasitismo econômico dos EUA, traduzido na crescente dependência de capitais estrangeiros para financiar o consumo excessivo de importados e um déficit público explosivo, que é a contrapartida das custosas aventuras militares e de um orçamento bélico que corresponde à metade da despesa mundial com armas e segurança.

Muitos economistas apontam a redução do poder de compra do povo trabalhador como uma das causas da mais recente recessão no país, já que estimulou a superprodução relativa de mercadorias. O baixo consumo das famílias mais pobres reduz as dimensões do mercado interno para a indústria e cria dificuldades adicionais para o comércio e a valorização.

“Durante anos, o problema foi amenizado e parcialmente oculto pela disponibilidade de crédito barato. Americanos de classe média foram ativamente incentivados a se endividar continuamente, oferecendo suas casas em garantia, ou a canibalizar seus fundos de aposentadoria, confiando em que os preços dos imóveis e as bolsas de valores desafiariam permanentemente a gravidade (uma atitude estimulada, entre outros, pela metade ganhadores do Nobel de Economia em todo o mundo). Essa reserva de valor, agora, não existe mais”, sublinou.

O resultado disto foi o acúmulo de dívidas impagáveis, concentradas principalmente no ramo imobiliário, que estouraram com a chamada “crise do subprime”. O fenômeno encontra sua explicação em vários fatores econômicos e políticos, objetivos e subjetivos, entre eles a ascensão da China e outros países considerados emergentes, que teria solapado “os salários no Ocidente” e eliminado “postos de trabalho sem qualificação, semiqualificados e até mesmo qualificados. A indústria agora representa somente 12% dos postos de trabalho nos EUA.”

Também pesou a filosofia neoliberal que guiou a política econômica dos Estados Unidos pelo menos desde a reação conservadora do ex-ator Ronaldo Reagan, “que acelerou o declínio dos sindicatos e reverteu os traços mais progressistas do sistema fiscal americano” ao reduzir a carga tributária das camadas mais ricas. No seio da classe trabalhadora os maiores prejudicados são os imigrantes.

Leia  no sitio vermelho, de onde retiramos o artigo,  a íntegra da reportagem publicada pelo jornal Valor:

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