O MINISTRO E A PIPA DO VOVÔ
José Ribamar Bessa Freire
Chamemo-la
de Das Dores, assim, sem vergonha da ênclise. É. Maria Das Dores.
Afinal, precisamos de um nome, de uma cara, de uma história para
identificar a “noiva” do deputado Pedro Novais (PMDB vixe vixe!), atual
ministro do Turismo, na quadrilha junina formada por 15 casais, naquela
animada noite de junho, no Motel Caribe, em São Luís (MA). Das Dores é,
certamente, um bom nome para ser par do chefe da quadrilha, o “noivo” de
80 anos. Detrás de um nome, no entanto, há sempre relatos, dores,
feridas.
Biografemo-la,
então, em busca dessas indeléveis cicatrizes, que tornem a narrativa
mais verossímil. Das Dores, pra todos os efeitos, nasceu em Olho D´Água
das Cunhãs, sendo batizada pelo padre Ribamar na capela de Nossa Senhora
da Conceição da Porta Aberta, em Bacabal. Foi quando a praga do bicudo
infestou as plantações de algodão, arruinando 238 pequenos produtores
rurais, todos eles chamados de Ribamar. Um deles, seu pai, colocou as
tralhas num caminhão, despediu-se do rio Mearim e se mudou de Bacaba´s City para a capital com toda a família.
Sigamo-la
até o bairro de Turu, na periferia de São Luis. Entremos na casa de Das
Dores, que fica na Rua Fé em Deus, bem nos fundos do Motel Caribe, cuja
entrada principal é pela Rua União. Lá, ela ficou conhecida como “a
princesinha do Mearim”, nome também de uma fábrica de sabão local. Foi
lá que um assessor do deputado Pedro Novais a recrutou, juntamente com
sua irmã Ribamarina, para participar do – digamos assim - arrasta-pé
junino realizado no Motel Caribe.
Motel Caribe
Imaginemo-la
– ainda fiel à ênclise - circulando pela pérgula da piscina ou
freqüentando a sauna desse motel de São Luis, que recebe grupos em suas
suítes temáticas com nomes de ilhas caribenhas. A mais cara
é a Bahamas, que tem garagem dupla e custa R$ 98,00 (três horas). Essa
foi justamente a reservada pelo deputado Pedro Novais para a festa que
organizou, em junho do ano passado, segundo informou ao Estadão a gerente do estabelecimento, que se identificou como Sheila.
O motel oferece “pequenos artifícios para apimentar sua relação e sair da rotina”:
dvds eróticos, afrodisíacos, lubrificantes, sabonetes íntimos, cinta
peniana inflável, calcinhas vibratórias, máscaras, chicotes, coleiras,
algemas, vestuários sensuais e afins como o espartilho
Natasha, vendido por 69,90 ou 18 prestações de RS$ 5,54. Nada disso foi
discriminado na nota fiscal nº 7.058 do Motel Caribe, só o valor total
de R$ 2.156,00, pago pela Câmara, depois de apresentada pelo deputado Pedro Novais.
O
escândalo pipocou nos jornais em plenas festas natalinas, porque o
vetusto senhor de 80 anos assumiria dias depois o ministério do Turismo,
bancado pelo clã Sarney, proprietário da Capitania Hereditária do
Maranhão e de sesmarias no Amapá. Como é que um parlamentar paga orgias e
bacanais com o meu, o teu, o nosso dinheiro? Essa pergunta foi feita
por um jornalista importuno ao futuro ministro que respondeu: “Pare de encher o saco, faça o que você quiser”. Seu chefe de gabinete, Flávio Nóbrega, reconheceu que a inclusão da nota fiscal “foi um erro” e providenciou o ressarcimento.
Dessa
forma, no dia 3 de janeiro, Pedro Novais, de 80 anos, tomou posse como
ministro do Turismo, na presença dos caciques do PMDB (vixe, vixe): seu
padrinho José Sarney, presidente do Senado, Roseana Sarney, governadora
do Maranhão, Michel Temer, vice-presidente da República e os colegas de
ministério: Wagner Rossi, da Agricultura e Edison Lobão, de Minas e
Energia. Só gente fina.
No
seu discurso de posse, o novo ministro destacou o papel da Empresa
Brasileira de Turismo (Embratur), mas não anunciou, como previam as más
línguas, a criação da Surubatur ou Surubabrás, nem deu um pio sobre o
escândalo.
Quem
tentou encontrar uma explicação foi o deputado Luiz Sérgio, presidente
do PT-RJ (vixe?), que chegou a ser cotado para a pasta do Turismo, mas
acabou assumindo o Ministério das Relações Institucionais. Demonstrando
que é mesmo um especialista em relações apimentadas, ele insinuou que a
pipa do vovô não levanta mais ao justificar: “Dormir num motel não
significa necessariamente fazer amor”. Mas não disse que outras coisas
podem ser feitas com dinheiro público por casais que se encontram num
motel.
Encontro de casais
De
qualquer forma, supunhetemo-lo correto, ainda encliticamente.
Supunhetemos, sem a obliqüidade do pronome, que o novo ministro das
Relações Institucionais tenha razão, que um motel pode funcionar como
uma casa geriátrica de repouso, com direito à massagem especial feita
por fisioterapeutas credenciadas. Ou um lugar para um Encontro de Casais
com Cristo (ECC).
Objetar-se-á,
agora mesocliticamente, que um ECC exige presença de um assistente
eclesial. Ora, isso não é problema pra nossa imaginação. Todos nos
lembramos daquele padre Ribamar que batizou Das Dores. Pois é,
convoquemo-lo para tal tarefa, tornando a hipótese plausível. Juro por
Deus: é preferível imaginar – imaginemo-lo – a realização de um evento
religioso em um motel do que admitir que vivemos numa republiqueta de
merda, onde um deputado organiza orgias com dinheiro publico e ainda é
promovido ao cargo de ministro.
Um
deputado pode fazer o que quiser com o dinheiro ganho com o suor do seu
rosto – suor de seu rosto é uma força de expressão - mas não com o
dinheiro público. Foi por isso que imaginamos a quadrilha de São João. A
quadrilha justifica os gastos com o orçamento da União. Lá vai o
deputado Pedro Novais, o “noivo”, puxando a contradança ao lado da Das
Dores, rodopiando: “lá-ra-lá-ra-la-lá” e comandando: “A Grande
Roda...Caminho da Roça...Preparar para o travessê...lá vem chuva...é
mentira...”
Trata-se
de uma saudável manifestação folclórica de interesse para o turismo
nacional e internacional. A formação da quadrilha é perfeitamente
verossímil, já que a festança foi no mês de junho, que não faltou matuto
e caipira e que para dar maior credibilidade e cor local os personagens
se chamam todos Ribamar, como José Sarney, Ferreira Goulart, esse
locutor que vos fala e todos os maranhenses que se prezam.
O novo ministro, Pedro Novais, ao organizar a quadrilha, revelou seu compromisso com o
turismo. Seu poder de fogo ficou evidente, segundo o noticiário, porque
antes mesmo de assumir, apenas nos quatro últimos dias de 2010, ele
garantiu o repasse de R$ 32 milhões do seu Ministério para obras no
Maranhão. O valor supera a soma de tudo o que foi prometido no mesmo
período para as três principais economias do país: São Paulo, Rio e
Minas. Os coronéis do Maranhão, seus motéis, a família Sarney e Das
Dores agradecem. Tu és Pedro e sobre essa pedra edificarei a rede
de motéis do Maranhão.
No
final do evento, o Motel Caribe solicitou preenchimento de uma ficha de
avaliação: “O que você falaria para seu amigo: recomendo ou não gostei?
Dê uma nota para o atendimento”. Das Dores, desapertando o espartilho
Natasha, deu nota dez e escreveu em observações gerais: “A-mei. De
pai-xão. Com essa festa, o Pedrão Novais se credencia a jogar baralho
com dona Brígida (Cleyde Yáconis) e a ocupar o coração dela no lugar do
Diógenes e do Benedetto. Se até o Totó ressuscitou, por que a pipa do
vovô não pode levantar?”.
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