Escrito por Milton Temer no Correio da Cidadania | |
A forma desmesurada com que os telejornais – não só no Brasil, mas
também a normalmente discreta e isenta BBC, assim como os
norte-americanos – entraram na divulgação da prisão de Ratko Mladic,
comandante do exército sérvio durante a guerra dos Bálcãs, obriga uma
reflexão mais séria sobre o tema.
Ratko Mladic não é um raio em céu azul de uma região até então
tranqüila; não é um genocida psicopata que aparece do nada e desanda a
eliminar populações. Ele é produto de uma tradição de confrontos
religiosos e étnicos que marcou a região durante o século XX, com
exceção do período em que Tito, vivo, consolidou a Iugoslávia unificada.
E Tito tinha essa força política por conta de uma liderança forjada em
duas frentes violentíssimas durante a II Guerra Mundial. Croata,
comandava a guerrilha comunista de resistência à invasão nazi-fascista
dos exércitos de Hitler e Mussolini, cujos regimes tinham ampla
aceitação entre seus compatriotas. Resistência de massa, quem fazia eram
os sérvios, que já lutavam contra os nazistas organizando o pós-guerra
socialista, distintamente dos maquisards franceses e dos partigiani
italianos. Por isso, inclusive, sempre teve total independência em
relação aos movimentos de Stalin, o que não ocorria com comunistas
franceses e italianos.
Os problemas começam com a morte de Tito em 1980. Ao invés de uma chefia
de Estado, com um presidente ou um primeiro-ministro eleito pelo voto
direto de todos os iugoslavos, os sérvios – preocupados com a manutenção
da Iugoslávia unificada – abriram mão dessa disputa, onde teriam ampla
vantagem pela sua superioridade populacional sobre todas as outras
etnias e nações juntas. Propuseram e avalizaram uma rotatividade entre
todas as representações. Cada mandato teria presidente de uma das
etnias.
Não funcionou, porque Croácia e Eslovênia – as que tinham aberto as
portas dos Bálcãs ao nazi-fascismo da II Guerra – se empenharam no
descompromisso com o regime socialista auto-gestionário, começando a
buscar seus contatos e seus apoios entre as potências ocidentais.
Com o fim da União Soviética, soltam as amarras e partem para a
separação, com hostilidade às populações sérvias em seus territórios,
contra o que o governo sérvio reage.
Vale ressaltar aqui que, se o genocídio nos Bálcãs tem data inicial de
ocorrência, se deu contra os sérvios na II Guerra Mundial – na ordem de
350 mil mortos – sob as botas da milícia fascista croata, os sustachi,
que concorriam em ferocidade com as tropas das SS. Tinha por que temer a
ação croata contra os seus que viviam na região.
Diante da reação sérvia, a OTAN entra no jogo, bombardeando brutalmente a
Bósnia. Daí em diante, foi o Deus nos acuda. Todos contra todos, muito
embora sobre os sérvios – por seu passado sempre pró-Rússia, dos czares
ou dos sovietes – terminem por cair todas as acusações desse bizarro
Tribunal de Haia, que sempre opera na direção dos interesses do
Departamento de Estado americano e do Pentágono, sem que seja sequer
reconhecido pelos Estados Unidos.
Nesse contexto, se os sérvios são levados ao banco dos réus, em todos os
lados – inclusive nos comandos da OTAN –, têm de ser buscados os
criminosos de guerra nessa sofrida região, caso se queira alguma justiça
com isenção.
Como ilustração, sugiro que se busque no portal da GloboNews a
reportagem exibida pelo Jornal das 6, de 26 de maio, em que Silvio
Bocanera entrevista civis de uma região onde Mladic é tratado como
herói. Apavorante para os habitantes, conforme revelam ao vivo as
entrevistas de rua, é a ameaça dos bombardeios da OTAN sobre populações
civis locais.
Milton Temer é jornalista.
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Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
quarta-feira, 1 de junho de 2011
Quem é criminoso de guerra nos Bálcãs?
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