A desigualdade global tem de acabar | | |
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Os pobres têm subsidiado os ricos desde há muito tempo. Um maior envolvimento do estado na actividade económica é agora necessário. O mais importante é que o sistema financeiro internacional fracassou em encontrar duas exigências óbvias: prever instabilidades e crises e transferir recursos das economias ricas para as pobres. A análise é da economista indiana Jayati Ghosh. Artigo publicado originalmente no jornal britânico The Guardian, em 24 de Outubro de 2008, traduzido por Carta Maior. Agora todo mundo reconhece a necessidade de reformar o regime económico internacional. Mas a ideia não deveria simplesmente ser consertar um sistema que está obviamente quebrado: precisamos mudá-lo para um modelo melhor. Porque a arquitectura financeira fracassou em alguns aspectos muito importantes. O mais importante é que o sistema financeiro internacional fracassou em encontrar duas exigências óbvias: prever instabilidades e crises e transferir recursos das economias ricas para as pobres. Não apenas experimentamos uma volatilidade muito maior e a propensão ao derretimento financeiro em mercados emergentes e agora até mesmo nos países industrializados, mas mesmo os períodos de expansão económica estiveram baseados no subsídio global dos países ricos pelos países pobres. Esses fracassos globais são tão imensos que constituem razão suficiente para abandonar este sistema. Mas eis outros fracassos associados em que o regime esteve implicado no interior das economias nacionais: ele encorajou a pró-ciclicidade; tornou impossível regular os sistemas financeiros nacionais; encorajou bolhas e o fervor especulativo no lugar do investimento produtivo para crescimento futuro; permitiu a proliferação de transacções paralelas através de paraísos fiscais e da perda de controle nacional; reduziu o papel crucial do desenvolvimento do crédito directo. Por isso nós claramente necessitamos de um novo sistema, mesmo que com os mesmos objectivos do original Bretton Woods: assegurar a estabilidade das transacções financeiras através da cooperação monetária internacional; encorajar a expansão do comércio internacional de um modo estável e promover o desenvolvimento com a facilitação do investimento produtivo. Para alcançar isso no actual contexto, quatro elementos são cruciais. Em primeiro lugar, a crença na auto-regulação, sustentada com a classificação de risco por agências como modo adequado de administrar um sistema financeiro se desmanchou no ar. Não há alternativa, portanto, a uma sistemática regulação estatal da finança. Segundo, uma vez que os actores privados vão inevitavelmente tentar contornar a regulação, o coração do sistema financeiro - bancos - deve ser protegido, e isso só é possível através da apropriação social. Portanto, algum grau de socialização dos bancos (e não somente socialização dos riscos inerentes à finança) também é inevitável. Nos países em desenvolvimento também é importante porque isso permite o controle público do crédito, sem o qual nenhum país foi industrializado. Em terceiro, para superar os efeitos perversos desta crise na economia real, estímulo fiscal é essencial tanto em países desenvolvidos como naqueles em vias de desenvolvimento. O aumento do gasto público é necessário para prevenir que a actividade e económica e o emprego caiam abruptamente, para coordenar os efeitos da mudança climática e promover tecnologias verdes e para que o projecto de desenvolvimento do sul do planeta avance. Quarto, precisamos de um sistema económico internacional que sustente isso, o que em outras palavras significa que o fluxo de capitais deve ser controlado e regulado, pois assim ele não desestabiliza nenhuma dessas estratégias. Pode-se argumentar que um sistema internacional desses, baseado na regulação estatal, reduzirá a possibilidade dos países em desenvolvimento terem acesso ao capital de que tanto se precisa para a expansão das suas economias. Mas esta percepção é errada, porque na verdade o actual sistema liberalizado não propiciou uma rede de transferência de recursos para o mundo em desenvolvimento. Nos últimos 6 anos, houve uma rede de recursos financeiros flutuantes de todas as regiões desenvolvidas do planeta para o norte, especialmente para os EUA, e mesmo com o aumento do lucro global, as disparidades aumentaram. E no interior dos países, a ideia de que a finança desregulada poderia pôr mais recursos nas mãos dos pobres (como nos empréstimos subprime) mostrou-se insustentável. Portanto, um maior envolvimento do estado na actividade económica é agora tanto necessário como desejável. O tempo para arguir se isso é ou não o caso já passou. Agora, deveríamos estar a pensar em como tornar esse envolvimento mais democrático e responsável, no interior dos nossos países e internacionalmente. Tradução: Katarina Peixoto Jayati Ghosh é economista e professora, especialista em globalização, finança internacional, padrão de emprego nos países em desenvolvimento, política macroeconómica e questões relativas a género e desenvolvimento. É professora na JNU - Jawaharlal Nehru University e é uma das fundadoras da Economic Research Foundation em Nova Deli, uma fundação sem fins lucrativos especializada em investigação em desenvolvimento económico. Publicou, com C.P.Chandrasekhar "Crisis as Conquest: Learning from East Asia" (2001) e "The Marke that Failed: A Decade of Neoliberal Economic Reforms in India" (2002). Foi a autora principal do West Bengal Humam Development Report, com o qual ganhou o Prémio UNPD (United Nations Development Program) em análise.
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