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Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
domingo, 11 de julho de 2010
Multidão sem precedentes de catalães e catalãs manifesta-se pela autodeterminação em Barcelona
sábado, 10 de julho de 2010
A CASA SINISTRA - 1932 - JAMES WHALE
A CASA SINISTRA
1932
JAMES WHALE
1932
JAMES WHALE
SINOPSE
Em busca de abrigo para fugir de uma tempestade, um casal de viajantes é acolhido na velha mansão da estranha família Femm.
JAMES WHALE
O cinema clássico de horror deve muito a James Whale. O britânico entregou alguns dos mais fantásticos filmes da Universal; sem ele não teríamos a imagem que aprendemos a admirar de Boris Karloff como o monstro de Frankenstein, nem a visão diabólica do Dr. Pretorius em A NOIVA DE FRANKENSTEIN ou mesmo a primazia na técnica de O HOMEM INVISÍVEL.
Dono de um requintado estilo a frente de seu tempo e de um trabalho de câmera fluído e único - pesadamente influenciado pelo impressionismo alemão - sua polêmica vida particular é tão interessante como sua vida profissional, portanto, Whale merece um olhar mais profundo que você terá a oportunidade de conferir nesta grande jornada por sua fugaz e brilhante carreira.LEIA A CRITICA NA ÍNTEGRA NESSE SITIO
ELENCO
Boris Karloff
Melvyn Douglas
Charles Laughton
Lilian Bond
Ernest Thesiger
Eva Moore
Raymond Massey
Gloria Stuart
Elspeth Dudgeon
Brember Wills
FICHA:
Título Original: The Old Dark House
País De Origem: EUA
Ano De Lançamento: 1932
Gênero: Terror
Duração: 1h 12Min
Idioma: Inglês
DADOS DO ARQUIVO:
Qualidade: DVDRip
Formato: AVI
Tamanho: 698 MB
Legenda: Português/BR (Separadas)
Servidor: Megaupload
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Israel fecha acordo para impedir que navio com ajuda da Líbia chegue a Gaza
Do sitio OperaMundi
Fontes do Ministério de Assuntos Exteriores de Israel
informaram neste sábado (10/7) à imprensa local que o país chegou a um
acordo com Grécia e Moldávia para impedir que um navio com ajuda
humanitária fretado pela Líbia chegue à Faixa de Gaza.
Segundo as fontes, o ministro de Assuntos Exteriores israelense,
Avigdor Lieberman, conseguiu o acordo com colegas da Grécia, Dimitris
Droutsas, e da Moldávia, Lurie Leanca.Os dois países se comprometeram
com Lieberman a realizar esforços para impedir que o navio, de bandeira
moldávia, abandone o porto grego no qual se encontra, de acordo com os
sites dos jornais israelenses Ha'aretz e Yedioth Ahronoth.O acordo prevê
que o navio deve se comprometer a seguir para o porto egípcio de El
Arish, próximo a Gaza, caso deixe a Grécia.
Na sexta-feira (10/7), a imprensa grega noticiou que um navio
cargueiro fretado por uma organização
islâmica presidida por Saif Gadafi, filho do líder líbio Muammar
Kadafi, estava para zarpar de um porto grego para tentar romper o
bloqueio israelense à Faixa de Gaza.
Leia mais:
Nova embarcação para tentar furar bloqueio da Faixa de Gaza parte da Grécia
Irã enviará embarcação com ajuda humanitária a Gaza
Sob ameaça israelense, Líbano se prepara para enviar ajuda humanitária a Gaza
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Israel também pediu à ONU para que impeça que o navio tente romper o
bloqueio, alegando que já satisfez as exigências internacionais de abrir
a faixa à livre entrada de produtos de consumo.
Em carta ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, a embaixadora
israelense na entidade, Gabriela Shalev, pressiona a comunidade
internacional "a exercer sua influência sobre o governo da Líbia para
que demonstre responsabilidade e impeça a saída do navio".
"Sob o direito internacional, Israel se reserva o direito de impedir
que o navio viole o bloqueio naval imposto à Faixa de Gaza", escreve
Shalev.
Israel impôs um bloqueio à Faixa de Gaza em 2007, quando o movimento
islamita Hamas assumiu o controle desse território e expulsou os
moderados aliados ao presidente da ANP (Autoridade Nacional Palestina),
Mahmoud Abbas. Um ano antes, após a captura do soldado Gilad Shalit por
três milícias palestinas, Israel já tinha imposto medidas restritivas à
livre passagem de pessoas e mercadorias procedentes ou com destino à
Faixa.
No mês passado, o país suspendeu boa parte das restrições por conta
das pressões internacionais pela morte de nove ativistas turcos na
abordagem israelense a um grupo de seis navios que se dirigiam a Gaza
com ajuda humanitária. No entanto, o bloqueio terrestre, marítimo e
aéreo continua, para impedir que armas cheguem às mãos das milícias
palestinas.
Desde os fatos do ataque à frota de seis navios, no último dia 31 de
maio, várias organizações islamitas no Líbano e no Irã anunciaram que
enviarão navios com ajuda humanitária para o território.
sexta-feira, 9 de julho de 2010
Como operar a transição do velho para o novo paradigma
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Leonardo Boff *Adital
Damos por já realizada a demolição crítica do sistema de consumo e de
produção capitalista com a cultura materialista que o acompanha. Ou o
superamos historicamente ou porá em grande risco a espécie humana.
A solução para a crise não pode vir do próprio sistema que a
provocou. Como dizia Einstein:"o pensamento que criou o problema não
pode ser o mesmo que o solucionará". Somos obrigados a pensar diferente
se quisermos ter futuro para nós e para a biosfera. Por mais que se
agravem as crises, como na zona do Euro, a voracidade especulativa não
arrefece.
O dramático de nossa situação reside no fato de que não possuímos
nenhuma alternativa suficientemente vigorosa e elaborada que venha
substituir o atual sistema. Nem por isso, devemos desistir do sonho de
um outro mundo possível e necessário. A sensação que vivenciamos foi bem
expressa pelo pensador italiano Antônio Gramsci: "o velho resiste em
morrer e o novo não consegue nascer".
Mas por todas as partes no mundo há uma vasta semeadura de
alternativas, de estilos novos de convivência, de formas diferentes de
produção e de consumo. Projetam-se sonhos de outro tipo de geosociedade,
mobilizando muitos grupos e movimentos, com a esperança de que algo de
novo poderá eclodir no bojo do velho sistema em erosão. Esse movimento
mundial ganha visibilidade nos Fóruns Sociais Mundiais e recentemente na
Cúpula dos Povos pelos direitos da Mãe Terra, realizada em abril de
2010 em Cochabamba na Bolívia.
A história não é linear. Ela se faz por rupturas provocadas pela
acumulação de energias, de idéias e de projetos que num dado momento
introduzem uma ruptura e então o novo irrompe com vigor a ponto de
ganhar a hegemonia sobre todas as outras forças. Instaura-se então outro
tempo e começa nova história.
Enquanto isso não ocorrer, temos que ser realistas. Por um lado,
devemos buscar alternativas para não ficarmos reféns do velho sistema e,
por outro, somos obrigados a estar dentro dele, continuar a produzir,
não obstante as contradições, para atender as demandas humanas. Caso
contrário, não evitaríamos um colapso coletivo com efeitos dramáticos.
Devemos, portanto, andar sobre as duas pernas: uma no chão do velho
sistema e a outra no novo chão, dando ênfase a este último. O grande
desafio é como processar a transição entre um sistema consumista que
estressa a natureza e sacrifica as pessoas e um sistema de sustentação
de toda vida em harmonia com a Mãe Terra, com respeito aos limites de
cada ecossistema e com uma distribuição equitativa dos bens naturais e
industriais que tivermos produzido. Trocando idéias em Cochabamba com o
conhecido sociólogo belga François Houtart, um dos bons observadores das
atuais transformações, convergimos nestes pontos para a transição do
velho para o novo.
Nossos países do Sul devem em primeiro lugar, lutar, ainda dentro do
sistema vigente, por normas ecológicas e regulações que preservem o mais
possível os bens e os serviços naturais ou trate sua utilização de
forma socialmente responsável.
Em segundo lugar, que os países do grande Sul, especialmente o
Brasil, não sejam reduzidos a meros exportadores de matérias primas, mas
que incorporem tecnologias que dêem valor agregado a seus produtos,
criem inovações tecnologias e orientem a economia para o mercado
interno.
Em terceiro lugar, que exijam dos países importadores que poluam o
menos possível e que contribuam financeiramente para a preservação e
regeneração ecológica dos bens naturais que importam.
Em quarto lugar, que cobrem uma legislação ambiental internacional
mais rigorosa para aqueles que menos respeitam os preceitos de uma
produção ecologicamente sustentável, socialmente justa, aqueles que
relaxam na adaptação e na mitigação dos efeitos do aquecimento global e
que introduzem medidas protecionistas em suas economias.
O mais importante de tudo, no entanto, é formar uma coalizão de
forças a partir de governos, instituições, igrejas, centros de pesquisa e
pensamento, movimentos sociais, ONGs e todo tipo de pessoas ao redor de
valores e princípios coletivamente partilhados, bem expressos na Carta
da Terra, na Declaração dos Direitos da Mãe Terra ou na Declaração
Universal do Bem Comum da Terra e da Humanidade (texto básico do
incipiente projeto da reinvenção da ONU) e no Bem Viver das culturas
originárias das Américas.
Destes valores e princípios se espera a criação de instituições
globais e, quem sabe, se organize a governança planetária que tenha como
propósito preservar a integridade e vitalidade da Mãe Terra, garantir
as condições do sistema-vida, erradicar a fome, as doenças letais e
forjar as condições para uma paz duradoura entre os povos e com a Mãe
Terra.
* Teólogo, filósofo e escritor
quinta-feira, 8 de julho de 2010
Movimentos sociais precisam criar um novo partido contra o Estado
Em entrevista, o jornalista José
Arbex Jr. incita os movimentos sociais brasileiros a criar um
instrumento político que se organize contra o Estado, galvanizando os
excluídos do sistema capitalista e com um programa construído nas bases
Nilton Viana
da Redação do Brasil de Fato
Em
meio à crescente exclusão promovida pelo avanço do capitalismo liberal
nas últimas décadas, o jornalista José Arbex Jr. defende que os
movimentos sociais formem um novo partido no Brasil. Para ele, essas
organizações são as únicas da esquerda que conseguem dialogar com os
setores alijados da economia capitalista, como os sem terra e sem teto.
Esses grupos tendem ser mais e mais massacrados, uma vez que o
neoliberalismo é incapaz de incorporá-los – pelo contrário – na sua
dinâmica. Assim, o Estado assume um caráter cada vez mais repressor e
segregacionista para poder manter uma certa estabilidade social. O que
Arbex propõe, então, é que os movimentos sociais impulsionem um
instrumento político que, aglutinando os excluídos, parta do pressuposto
de que o Estado brasileiro foi construído contra a nação, e coloque a
questão do poder, dando um salto qualitativo em relação à sua condição
atual.
Brasil de Fato – No Brasil, negros, pobres e as comunidades carentes, principalmente dos grandes centros urbanos, têm sido vítimas de todas as formas de violência, principalmente da violência policial, do Estado. Como você avalia esse caos social que o Brasil vive hoje?
José Arbex Jr. – Se você comparar a situação de hoje com a de outubro de 1992, quando ocorreu o massacre do Carandiru [em São Paulo-SP], você vai ver uma diferença muito grande. Naquela ocasião, foram mortos 111 presos e isso provocou uma grande polêmica nacional, um escândalo que a sociedade tratou como um acontecimento inaceitável. Em comparação, hoje, o governador do Rio de Janeiro [Sérgio Cabral – PMDB] exibe triunfalmente a estatística de que a polícia está matando mais de 1.500 pessoas por ano nos morros cariocas – um Carandiru por mês. E isso não provoca nenhuma indignação na sociedade, é como se fosse normal. A polícia, tanto no Rio como em São Paulo, vem usando um expediente que é inconstitucional, que é o mandado de busca coletivo. Ou seja, ela tem o direito de entrar na sua casa não porque você seja suspeito de ter cometido um crime, não porque você seja suspeito de ter ligação com o crime organizado ou algo do tipo, mas simplesmente porque você mora naquele lugar. Seria possível um mandado de busca coletivo no Jardins? Eu não digo nem no bairro, digo em um quarteirão do Jardins, aliás, nem em um quarteirão, um mandado coletivo em um prédio da rua Oscar Freire? Acha que isso seria possível, todos os moradores serem passíveis de ter a polícia dentro de seus apartamentos somente porque moram ali? É óbvio que não. Então temos um Estado que trata alguns brasileiros como portadores de direitos e outros como portadores de direito nenhum. Estamos num processo de terror que atinge especificamente um setor mais numeroso da população, que são os trabalhadores.
A ONU tem divulgado dados que apontam o Brasil com uma das maiores taxas de homicídios do mundo...
A ONU considera que o Brasil tem uma das maiores taxas de homicídios do mundo, com algo em torno de 50 mil mortes por ano, e que a polícia e esquadrões da morte são os maiores responsáveis por essa façanha. Morre muito mais gente baleada no Brasil do que no Iraque, na Palestina e em outras áreas conflituosas do planeta. Só para efeito de comparação: os 30 anos de guerra civil entre protestantes e católicos na Irlanda, iniciada em 1968 e considerada de extrema violência, produziram menos de 3 mil mortes, isto é o equivalente a três semanas normais no Brasil. Isso é uma situação permanente, que a mídia acoberta e que está se tornando algo natural. É muito perigoso. Nós sabemos no que dá quando você naturaliza a matança, a segregação do Estado, o terror sobre populações indefesas... Basta olhar a história recente da Alemanha. Isso é muito preocupante e é o traço mais terrível da conjuntura nacional hoje.
E quem são os principais responsáveis por essa situação?
Em primeiro lugar é o Estado. É o Estado que abriu mão de universalizar as leis. As leis são válidas para todos os cidadãos, independentemente de sua religião, cor, raça, de sua conta bancária. Elas são universais e é para isso que o Estado serve – mesmo o burguês –, para tornar as leis universais e não para beneficiar determinados grupos da sociedade. Em segundo lugar, a responsabilidade é de um governo – tanto federal como local – que privilegia o pagamento anual de R$ 200 bilhões de juros para os bancos ao invés de criar uma infraestrutura básica – de educação, saúde, transportes e saneamento básico... – que tornaria decente a vida das pessoas, assegurando-lhes aquilo que a burguesia garantiu, por exemplo, na França, nos Estados Unidos, na Inglaterra. Não estou falando de socialismo, mas de direitos burgueses. Hoje, você tem um governo que destrói cada vez mais o Estado em nome do superávit primário e faz com que a vida de milhões de pessoas que habitam nas periferias seja um inferno total. Os grandes grupos interessados na especulação imobiliária, as empreiteiras e os agentes do capital financeiro e os grupos que controlam o Estado no Brasil fazem configurar esse tipo de política social. Os responsáveis estão muito bem estabelecidos. Com isso, não estou desculpando a bandidagem, não estou dizendo que a periferia tem muito bandido porque não tem a presença do Estado e que a bandidagem se justifica pela ausência do Estado. O que estou dizendo é que evidentemente é muito mais propício o desenvolvimento do crime organizado e da bandidagem numa situação de degradação moral de uma população do que numa situação na qual as pessoas tenham vida digna. As pessoas, numa situação desesperada, veem como saída o narcotráfico, a organização em gangues, porque elas não encontram outra saída; é óbvio. O terror do Estado alimenta o crime e o crime alimenta o terror de Estado.
E a principal vítima desse sistema é a juventude.
Principalmente. Se você pegar os índices de homicídios que o próprio Estado brasileiro divulga, você vai ver que a imensa maioria é de homens entre 16 e 28 anos. Negros, pobres, claro a imensa maioria pobres, morando nestes setores considerados malditos, a chamada periferia. Eu nem gosto de usar o nome periferia porque periferia acabou adquirindo uma conotação pejorativa como se houvesse uma homogeneidade no modo de vida e interesses culturais etc., em todo o Brasil. Quando você fala em periferia, parece que a periferia em São Paulo é igual a do Rio, que é igual a do Recife, de Salvador, de Belém... E não é verdade, cada um desses lugares tem os seus dilemas sociais, culturais, morais, econômicos. São distintos. Mesmo aqui em São Paulo você não pode comparar Jardim Ângela, por exemplo, com Heliópolis. Quer dizer, a periferia é um todo, cinzento, inventado pela mídia para designar uma mancha, que ameaça a estabilidade social, a vida dos cidadãos decentes, que somos nós da classe média, os que vivem no centro urbano, como se houvesse um cordão de ameaça àqueles que são os “bons cristãos”. Mesmo esse termo periferia já é um rótulo que acoberta o assassinato da juventude. Logo, se o cara é assassinado pela polícia, aí você fala: “mas ele é da periferia”... pronto, já está justificado.
Aliás nós temos um movimento muito importante hoje no Brasil que são as Mães de Maio, que são as mães daquelas 600 pessoas (mais ou menos) assassinadas em maio de 2006, que a polícia matou como represália aos ataques do PCC. Entre os assassinados tinham uns jovens entregadores de pizza cujo único crime foi – eles estavam ouvindo música naqueles walkman – não ouvir a sirene da polícia e não parar a moto. Os jovens são assassinados sob o rótulo da periferia, que tornam todos suspeitos. É como na Alemanha nazista, você falava “é judeu”, pronto, estava justificado.
O governo do Rio de Janeiro está construindo muros para isolar os pobres. Como você vê isso?
É o muro da segregação. Os muros agora estão se multiplicando pelo mundo inteiro e são uma decorrência do próprio sistema capitalista, que já não encontra saída para integrar bilhões de seres humanos na economia. Eles não têm como integrá-los. A única forma que encontram para preservar a ordem é criar muros. Mas então você vai me dizer: mas não é um exagero falar em bilhões? Não. Basta analisar as estatísticas recentes da FAO, que é o órgão da ONU para a agricultura, que você vai ver que, pela primeira vez na história da humanidade, o sistema econômico conseguiu produzir a fantástica cifra de 1 bilhão de famintos. Se associar esse 1 bilhão de famintos àqueles chamados subnutridos – que são os que não são famintos porque conseguem o mínimo de calorias necessárias para se manter vivos nas próximas 24 horas –, já são 2 bilhões. E se associar isso à rede extra-econômica para conseguir comida – os subnutridos que roubam para conseguir 1 litro de leite para dar ao fi lho –, teremos metade da humanidade. Bilhões de seres humanos que não são e não serão integrados à economia. A única saída para o sistema é considerá-los descartáveis. E, para isolar os descartáveis, cria muros.
Esse cenário coloca para a esquerda, que tem se mostrado incapaz de organizar essa imensa maioria da população, um desafio muito grande. Como você vê a esquerda brasileira diante desse quadro?
Tenho uma visão muito particular sobre isso. Considero que o MST encontrou historicamente uma maneira de integrar os setores mais excluídos e miseráveis da sociedade brasileira num movimento organizado, que confere aos seus participantes dignidade, consciência política e a oportunidade de assumir os seus próprios destinos como cidadãos. Isso faz do MST o movimento mais importante da história do Brasil, com certeza da história republicana. O MST e boa parte desses movimentos espelhados na sua experiência, como o MTST [sem teto], o MAB [atingidos por barragens] e tantos outros, encontraram uma fórmula de organizar suas bases e, se fizermos uma radiografia daquilo que acontece hoje nos morros urbanos, no campo, em todos os setores que sofrem discriminação, nós vamos descobrir que existe uma boa base de organização. Não acho que existe uma dispersão total.
Agora, o problema é que esses movimentos sociais no seu conjunto precisam dar um salto de qualidade e criar um movimento que aponte concretamente a questão do poder. O momento que vivemos no Brasil provou o esgotamento da fórmula do partido eleitoral do tipo PT para resolver os problemas dos grandes setores de massa no Brasil. O PT não resolveu esse problema, ele chegou ao poder e não fez reforma agrária; conduziu a macroeconomia ao agrado do capital financeiro mundial; e, hoje, uma revista como a Veja e jornais como O Estado de São Paulo afirmam claramente que tanto faz Dilma Rousseff ou José Serra porque os dois vão aplicar a mesma macro-política. Pode ter diferença cosmética, no sentido de que talvez a Dilma seja menos repressiva e prossiga com alguns programas que dão migalhas sociais. Mas isso não resolve os problemas anteriormente apontados. Portanto, acho que os movimentos sociais precisam dar um salto de qualidade e criar uma organização que aponte uma alternativa estratégica, que coloque a questão do poder. É necessário um instrumento político que reúna esses movimentos sociais e aponte uma alternativa de poder. Está na hora de um novo partido no Brasil. Ou de uma frente plural de partidos – partidos ou movimentos sociais. Teria de se pensar uma forma criativa de realizar essa organização, mas que dê um salto qualitativo. Nesses anos todos, os movimentos criaram e construíram direções que são conhecidas nacionalmente e internacionalmente, identificadas com transformações da sociedade, que não se deixaram cooptar por esse processo de participação lucrativa na economia neoliberal, que não aceitaram participar do esquema, direções identificadas com as lutas cotidianas dos trabalhadores brasileiros na cidade e no campo. Essas direções existem, são reconhecidas e elas têm a responsabilidade, na minha opinião, de assumir esse novo momento da história brasileira.
Você está defendendo a criação de um novo instrumento político. Isso significa que os atuais partidos e organizações da esquerda não têm conseguido dar respostas às necessidades da imensa maioria da população e não conseguem enfrentar essa nova realidade brasileira como um instrumento de transformação?
Sem dúvida nenhuma. Historicamente, os partidos brasileiros – incluindo o PT, do qual eu também fazia parte, portanto não estou me excluindo dessa história – foram capazes de atingir uma massa de trabalhadores com carteira assinada, funcionários públicos, operários da grandes metalurgias, da indústria de automóveis etc. e até uma faixa de pequenos comerciantes, uma classe média pauperizada. Até aí esses partidos chegaram. Mas isso constitui uma minoria da população. A grande maioria está hoje na periferia, no campo, no Brasil profundo. E esses setores nunca foram organizados pelos partidos. Eles foram muito mais organizados pela Rede Globo, que chega em qualquer lugar, no ponto extremo da Amazônia, os caras têm uma antena parabólica e vão assistir a novela Viver a Vida. Logo, quem atingiu esses setores? O MST, o MAB, o MTST atingiram. Hoje, temos uma situação na qual os partidos que dizem representar a população não dialogam com esses setores. Ou melhor, dialogam na forma da porrada, do terrorismo de Estado. E, por outro lado, os movimentos sociais que organizam esses setores estão excluídos da esfera do poder. Isso configura uma situação absolutamente intolerável, porque significa que o Estado brasileiro existe para um determinado setor da sociedade e para outro não. Então, os partidos historicamente fracassaram nessa missão e os movimentos sociais foram bem sucedidos em organizar esses setores. Quando eu digo bem sucedidos não significa que o serviço já está feito. Ainda há muita coisa para fazer. E o MST mostrou que o caminho existe. Ou seja, é possível organizar esses setores. Assim, ou os movimentos sociais assumem essa tarefa de dar um salto político e conduzir esses setores que nunca fi zeram parte da vida política brasileira para uma outra saída estratégica na qual eles passem a fazer parte – e devem fazer isso já, urgente – ou o que nós vamos ver é cada vez mais esses setores pagando o preço terrível de não terem uma voz política e serem segregados por muros.
E a ofensiva permanente das elites para criminalizar os movimentos sociais e as lutas, você acha que um instrumento político, tal qual você coloca, ajudaria as organizações nessa batalha? Você acha que um partido político legalizado seria um suporte fundamental frente a esse cenário?
Isso me parece óbvio porque quando a direita faz sua ofensiva ela usa o aparelho de Estado. Por exemplo, montam uma CPI para paralisar o MST, que é obrigado a drenar toda a sua energia para se defender. Assim, o aparelho de Estado monta a ofensiva, conta com o braço armado que é a polícia e o exército, e vem para cima dos movimentos sociais. E cria um consenso social na classe média por meio da mídia. O aparelho de Estado não é neutro, como disse antes ele não universaliza as leis, e é lógico que, se os movimentos sociais não tiverem um instrumento político que coloque concretamente a questão do Estado, essa situação vai se eternizar e conduzirá os movimentos sociais a um desastre absoluto, porque hoje estão numa situação de impotência. Por exemplo, no caso de Belo Monte. Populações inteiras serão expulsas de suas localidades por causa de uma usina, um empreendimento que interessa a meia dúzia de empreiteiras, e estão sem defesa. Eles estão dispostos ao auto-sacrifício para preservar aquelas terras, dizem que irão para as áreas que serão inundadas. Esse pessoal está sem a defesa de um instrumento político, porque não tem um partido que os defenda de uma forma decisiva, que mobilize a população, que seja capaz de articular todos os movimentos sociais em sua defesa. Isso não existe. O PT não é esse partido. Então, se não houver esse salto qualitativo, é óbvio que o neoliberalismo, tendo como instrumento o Estado, vai produzir uma matança, uma criminalização cada vez maior dos movimentos sociais. Aliás, as últimas declarações, tanto do Serra quanto da Dilma, apontam para esse caminho. O tucano multiplica diariamente acusações contra o MST. E a petista, quando visitou os vários agrishow Brasil afora, disse claramente que não apoia invasão de terra, e usou o termo invasão, que é significativo, porque ela sabe que não se trata de ocupação.
Quais elementos políticos centrais devem nortear um novo instrumento dessa natureza, inclusive para não se incorrer em equívocos de tantos outros partidos brasileiros?
Hoje, qualquer articulação política séria no país tem que partir de um pressuposto, tem que ter uma discussão muito séria de que no Brasil a nação se organizou contra o Estado. Isto é uma formulação do professor Istvan Iancson – que faz parte da antiga geração de professores universitários que eram de fato professores universitários. Ele mostra que, no Brasil, durante 400 anos de escravidão houve uma política de Estado destinada a reprimir a imensa maioria da população, composta de povos originários e de escravos trazidos da África. Paralelamente, nunca houve no Brasil nenhum setor da burguesia disposto a produzir um movimento revolucionário semelhante ao que houve na França e outros países, que tinham como objetivos integrar a população trabalhadora ao processo produtivo. Mesmo na história republicana, nos 30 primeiros anos da oligarquia do café com leite; no Estado Novo de Getúlio Vargas, que embora tivesse um projeto nacional, comandou esse projeto na base da outorga de uma estrutura sindical atrelada ao Estado, na qual os trabalhadores jamais foram independentes para construir a sua autonomia do Estado; e na ditadura militar que durou vinte e tantos anos. Quer dizer, temos uma longa história de sucessivas catástrofes que demonstram que, no Brasil, o Estado sempre foi considerado pelas elites como um órgão privado delas. O surgimento do PT e da CUT produziu uma espécie de abalo nessa história, porque, pela primeira vez, você teve a formação de uma central independente, que foi a CUT, e a formação de um partido político que não era um impulsionado a partir das elites e que conseguiu produzir abalos na estrutura do Estado que os partidos tradicionais de trabalhadores como o PC e outros nunca conseguiram produzir. Assim, é inegável que o surgimento do PT e da CUT produziram esse abalo, algo extremamente importante na história do brasileira. Porém, acho que tanto o PT quanto a CUT não levaram até o fi m essa dimensão de que o Estado foi construído contra a nação. E que, simplesmente, participar da atual estrutura do Estado não resolve o problema, porque é um Estado construído contra a nação brasileira.
As estruturas do Estado permanecem inalteradas.
É, continuam inalteradas. Por exemplo, para tornar bem visível o que estou falando, acho equivocado dizer que no Brasil não funciona o sistema de saúde. Ou não funciona o sistema de educação pública. Funciona perfeitamente. Ou alguém acha que em algum momento desse país as elites, que mandam no Estado, pretenderam construir um sistema realmente eficaz e que garantisse saúde e educação de qualidade para a maioria do povo brasileiro? Alguém acha isso? Só se for louco! Então, eu acho que esses sistemas funcionam perfeitamente bem à luz do que é o Estado brasileiro, à luz dos jagunços que mandam nesse país há 500 anos. Assim, se você construir um partido que não coloque na ordem do dia essa questão de que é preciso haver uma revolução que transforme o Estado brasileiro e que crie as condições para que haja uma integração entre Estado e nação, ele vai fracassar como todos os outros partidos. Eu acho que o único partido que teria condições de fazer isso é um partido que nasça das bases – e aí bases eu quero dizer os setores mais excluídos, mais pobres, mais miseráveis da população brasileira, que são os movimentos sociais, os camponeses, os trabalhadores desempregados, os sem teto, os que têm que se virar todo dia para conseguir comida para as próximas 24 horas, os povos originários. Todos eles constituem essa camada social que jamais foi integrada pelo Estado brasileiro e que sabem exatamente o que significa o Estado brasileiro. Então, na minha opinião, embora a experiência do PT e da CUT tenha sido extremamente positiva porque produziu abalos nessa relação do Estado e nação, eles não foram até o fi m. O PT nunca se constituiu de fato como um partido anticapitalista. Nunca se colocou com a tarefa de destruir o capitalismo.
O objetivo desse novo partido contra o Estado brasileiro vai ser o quê? Vai ser um partido socialista, social desenvolvimentista, vai querer desenvolver o capital interno?
Não sei. Não sou a Mãe Diná. Acho que não cabe a uma direção iluminada dizer o que esse partido vai ser. Nesse momento, o que se coloca em primeiro lugar é uma formulação que consiga agregar esse conjunto de movimentos sociais. Isso estabelece uma primeira base de discussão, ou seja, como é que vamos agregar esses movimentos sociais e, a partir das discussões feitas por esses movimentos sociais, dos núcleos de base. Uma discussão programática vai surgir da base. E que tenha necessariamente o seguinte: nós não queremos um partido que se integre ao Estado brasileiro tal como ele existe hoje. Esse é o ponto. O resto a gente discute. Não podemos colocar uma série de pré-condições que funcionariam como obstáculos à formação de um grande partido de base, realmente popular.
Você, como intelectual, imagino que estaria neste partido. Você acredita que outros intelectuais, a universidade, estariam também num partido com esses objetivos? Temos reserva moral na esquerda brasileira que seja capaz de impulsionar um partido dessa natureza?
Claro que temos reserva moral... e prefiro não citar nomes para não cometer injustiças... Mas, se realmente o MST é um movimento de importância histórica no Brasil, logo, é claro que, desse ponto de vista, os dirigentes e porta-vozes do MST estão entre aqueles que podem e devem impulsionar o processo. Acho que o João Pedro Stedile tem um papel particular nisso, por sua visibilidade nacional e internacional. Mas há muita gente boa nos movimentos sociais, nos partidos de esquerda e mesmo dentro do PT que se empolgaria por uma proposta de construção de um poderoso partido anticapitalista no Brasil.
Agora, ao mesmo tempo, acho que esse partido provocaria um susto em um vasto setor da classe média brasileira. Imagina o que vai acontecer no momento em que um partido conseguir juntar o MST, os movimentos que se organizam na periferia, hip hop, as Mães de Maio etc. e começa a dar visibilidade para o Brasil de cara feia. Ou seja, não é o Brasil que vai fazer compra em shopping center. Mesmo dentro da universidade, pessoas que hoje se dizem a favor de uma transformação social fi cariam assustadas quando elas vissem a cara da transformação social. Mas, ao mesmo tempo, isso geraria um efeito fantástico de produzir um senso de auto-estima e de dignidade em dezenas de milhões de brasileiros que hoje estão em baixa porque acham que não têm futuro. Você imagina o que significa para um trabalhador que trabalha 15 horas por dia para ganhar um salário-mínimo e que se afoga na cachaça, de repente, perceber que pode participar de algo desse porte? Isso daria um impulso tremendo à organização política brasileira. Seria algo muito superior ao que está acontecendo hoje na Venezuela com o Hugo Chávez. Superior dado o porte da economia brasileira, o número de habitantes e o poder que teriam esses milhões de trabalhadores organizados, que tem uma tradição de luta negada pela elites, o que é um completo absurdo. Se você pensar desde os Quilombos dos Palmares até o MST, passando pelas Ligas Camponesas, por Canudos, pela Revolta dos Malês e pelo século 19 inteiro de revoltas regionais, esse povo não parou de lutar uma década. Portanto, nós temos uma experiência de combate, uma história de luta. E um partido desse porte teria um poder enorme de galvanizar a nação brasileira. Desde que esse partido não caia no conto de se integrar ao Estado brasileiro tal como ele existe hoje. É um partido que tem que ter o compromisso de ruptura. Sem esse compromisso não conseguiria galvanizar ninguém. E acho que, nesse processo, toda a gente acabaria formulando aquilo que todo mundo diz e anseia, que é um programa para o Brasil feito com base na realidade brasileira e não nas formulações europeias. Não que eu esteja aqui negando Karl Marx ou outro pensador europeu, seria uma estupidez. O que estou dizendo é que justamente a ausência do povão na política é produzir um tipo de pensamento que é muito intelectualizado, muito antenado com concepções de vanguarda que existem na Europa e que foram formuladas na Europa, mas que se ressentem do diálogo com o povão mesmo, que tem sua própria história e que não é a história europeia. É uma outra história. Acho que isso produziria uma transformação na própria universidade. Quer dizer, os intelectuais teriam que responder ao desafio para eles mesmos como intelectuais com um partido desse tipo.
Quem é
José Arbex Jr. é editor especial da revista Caros Amigos, é doutor em história social pela Universidade de São Paulo (USP), professor de jornalismo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), autor de Showrnalismo – A Notícia Como Espetáculo e O Jornalismo Canalha (editora Casa Amarela). Durante os anos de 1980 e 1990, trabalhou no jornal Folha de S. Paulo e, em 2003, foi editor-chefe do Brasil de Fato.
Brasil de Fato – No Brasil, negros, pobres e as comunidades carentes, principalmente dos grandes centros urbanos, têm sido vítimas de todas as formas de violência, principalmente da violência policial, do Estado. Como você avalia esse caos social que o Brasil vive hoje?
José Arbex Jr. – Se você comparar a situação de hoje com a de outubro de 1992, quando ocorreu o massacre do Carandiru [em São Paulo-SP], você vai ver uma diferença muito grande. Naquela ocasião, foram mortos 111 presos e isso provocou uma grande polêmica nacional, um escândalo que a sociedade tratou como um acontecimento inaceitável. Em comparação, hoje, o governador do Rio de Janeiro [Sérgio Cabral – PMDB] exibe triunfalmente a estatística de que a polícia está matando mais de 1.500 pessoas por ano nos morros cariocas – um Carandiru por mês. E isso não provoca nenhuma indignação na sociedade, é como se fosse normal. A polícia, tanto no Rio como em São Paulo, vem usando um expediente que é inconstitucional, que é o mandado de busca coletivo. Ou seja, ela tem o direito de entrar na sua casa não porque você seja suspeito de ter cometido um crime, não porque você seja suspeito de ter ligação com o crime organizado ou algo do tipo, mas simplesmente porque você mora naquele lugar. Seria possível um mandado de busca coletivo no Jardins? Eu não digo nem no bairro, digo em um quarteirão do Jardins, aliás, nem em um quarteirão, um mandado coletivo em um prédio da rua Oscar Freire? Acha que isso seria possível, todos os moradores serem passíveis de ter a polícia dentro de seus apartamentos somente porque moram ali? É óbvio que não. Então temos um Estado que trata alguns brasileiros como portadores de direitos e outros como portadores de direito nenhum. Estamos num processo de terror que atinge especificamente um setor mais numeroso da população, que são os trabalhadores.
A ONU tem divulgado dados que apontam o Brasil com uma das maiores taxas de homicídios do mundo...
A ONU considera que o Brasil tem uma das maiores taxas de homicídios do mundo, com algo em torno de 50 mil mortes por ano, e que a polícia e esquadrões da morte são os maiores responsáveis por essa façanha. Morre muito mais gente baleada no Brasil do que no Iraque, na Palestina e em outras áreas conflituosas do planeta. Só para efeito de comparação: os 30 anos de guerra civil entre protestantes e católicos na Irlanda, iniciada em 1968 e considerada de extrema violência, produziram menos de 3 mil mortes, isto é o equivalente a três semanas normais no Brasil. Isso é uma situação permanente, que a mídia acoberta e que está se tornando algo natural. É muito perigoso. Nós sabemos no que dá quando você naturaliza a matança, a segregação do Estado, o terror sobre populações indefesas... Basta olhar a história recente da Alemanha. Isso é muito preocupante e é o traço mais terrível da conjuntura nacional hoje.
E quem são os principais responsáveis por essa situação?
Em primeiro lugar é o Estado. É o Estado que abriu mão de universalizar as leis. As leis são válidas para todos os cidadãos, independentemente de sua religião, cor, raça, de sua conta bancária. Elas são universais e é para isso que o Estado serve – mesmo o burguês –, para tornar as leis universais e não para beneficiar determinados grupos da sociedade. Em segundo lugar, a responsabilidade é de um governo – tanto federal como local – que privilegia o pagamento anual de R$ 200 bilhões de juros para os bancos ao invés de criar uma infraestrutura básica – de educação, saúde, transportes e saneamento básico... – que tornaria decente a vida das pessoas, assegurando-lhes aquilo que a burguesia garantiu, por exemplo, na França, nos Estados Unidos, na Inglaterra. Não estou falando de socialismo, mas de direitos burgueses. Hoje, você tem um governo que destrói cada vez mais o Estado em nome do superávit primário e faz com que a vida de milhões de pessoas que habitam nas periferias seja um inferno total. Os grandes grupos interessados na especulação imobiliária, as empreiteiras e os agentes do capital financeiro e os grupos que controlam o Estado no Brasil fazem configurar esse tipo de política social. Os responsáveis estão muito bem estabelecidos. Com isso, não estou desculpando a bandidagem, não estou dizendo que a periferia tem muito bandido porque não tem a presença do Estado e que a bandidagem se justifica pela ausência do Estado. O que estou dizendo é que evidentemente é muito mais propício o desenvolvimento do crime organizado e da bandidagem numa situação de degradação moral de uma população do que numa situação na qual as pessoas tenham vida digna. As pessoas, numa situação desesperada, veem como saída o narcotráfico, a organização em gangues, porque elas não encontram outra saída; é óbvio. O terror do Estado alimenta o crime e o crime alimenta o terror de Estado.
E a principal vítima desse sistema é a juventude.
Principalmente. Se você pegar os índices de homicídios que o próprio Estado brasileiro divulga, você vai ver que a imensa maioria é de homens entre 16 e 28 anos. Negros, pobres, claro a imensa maioria pobres, morando nestes setores considerados malditos, a chamada periferia. Eu nem gosto de usar o nome periferia porque periferia acabou adquirindo uma conotação pejorativa como se houvesse uma homogeneidade no modo de vida e interesses culturais etc., em todo o Brasil. Quando você fala em periferia, parece que a periferia em São Paulo é igual a do Rio, que é igual a do Recife, de Salvador, de Belém... E não é verdade, cada um desses lugares tem os seus dilemas sociais, culturais, morais, econômicos. São distintos. Mesmo aqui em São Paulo você não pode comparar Jardim Ângela, por exemplo, com Heliópolis. Quer dizer, a periferia é um todo, cinzento, inventado pela mídia para designar uma mancha, que ameaça a estabilidade social, a vida dos cidadãos decentes, que somos nós da classe média, os que vivem no centro urbano, como se houvesse um cordão de ameaça àqueles que são os “bons cristãos”. Mesmo esse termo periferia já é um rótulo que acoberta o assassinato da juventude. Logo, se o cara é assassinado pela polícia, aí você fala: “mas ele é da periferia”... pronto, já está justificado.
Aliás nós temos um movimento muito importante hoje no Brasil que são as Mães de Maio, que são as mães daquelas 600 pessoas (mais ou menos) assassinadas em maio de 2006, que a polícia matou como represália aos ataques do PCC. Entre os assassinados tinham uns jovens entregadores de pizza cujo único crime foi – eles estavam ouvindo música naqueles walkman – não ouvir a sirene da polícia e não parar a moto. Os jovens são assassinados sob o rótulo da periferia, que tornam todos suspeitos. É como na Alemanha nazista, você falava “é judeu”, pronto, estava justificado.
O governo do Rio de Janeiro está construindo muros para isolar os pobres. Como você vê isso?
É o muro da segregação. Os muros agora estão se multiplicando pelo mundo inteiro e são uma decorrência do próprio sistema capitalista, que já não encontra saída para integrar bilhões de seres humanos na economia. Eles não têm como integrá-los. A única forma que encontram para preservar a ordem é criar muros. Mas então você vai me dizer: mas não é um exagero falar em bilhões? Não. Basta analisar as estatísticas recentes da FAO, que é o órgão da ONU para a agricultura, que você vai ver que, pela primeira vez na história da humanidade, o sistema econômico conseguiu produzir a fantástica cifra de 1 bilhão de famintos. Se associar esse 1 bilhão de famintos àqueles chamados subnutridos – que são os que não são famintos porque conseguem o mínimo de calorias necessárias para se manter vivos nas próximas 24 horas –, já são 2 bilhões. E se associar isso à rede extra-econômica para conseguir comida – os subnutridos que roubam para conseguir 1 litro de leite para dar ao fi lho –, teremos metade da humanidade. Bilhões de seres humanos que não são e não serão integrados à economia. A única saída para o sistema é considerá-los descartáveis. E, para isolar os descartáveis, cria muros.
Esse cenário coloca para a esquerda, que tem se mostrado incapaz de organizar essa imensa maioria da população, um desafio muito grande. Como você vê a esquerda brasileira diante desse quadro?
Tenho uma visão muito particular sobre isso. Considero que o MST encontrou historicamente uma maneira de integrar os setores mais excluídos e miseráveis da sociedade brasileira num movimento organizado, que confere aos seus participantes dignidade, consciência política e a oportunidade de assumir os seus próprios destinos como cidadãos. Isso faz do MST o movimento mais importante da história do Brasil, com certeza da história republicana. O MST e boa parte desses movimentos espelhados na sua experiência, como o MTST [sem teto], o MAB [atingidos por barragens] e tantos outros, encontraram uma fórmula de organizar suas bases e, se fizermos uma radiografia daquilo que acontece hoje nos morros urbanos, no campo, em todos os setores que sofrem discriminação, nós vamos descobrir que existe uma boa base de organização. Não acho que existe uma dispersão total.
Agora, o problema é que esses movimentos sociais no seu conjunto precisam dar um salto de qualidade e criar um movimento que aponte concretamente a questão do poder. O momento que vivemos no Brasil provou o esgotamento da fórmula do partido eleitoral do tipo PT para resolver os problemas dos grandes setores de massa no Brasil. O PT não resolveu esse problema, ele chegou ao poder e não fez reforma agrária; conduziu a macroeconomia ao agrado do capital financeiro mundial; e, hoje, uma revista como a Veja e jornais como O Estado de São Paulo afirmam claramente que tanto faz Dilma Rousseff ou José Serra porque os dois vão aplicar a mesma macro-política. Pode ter diferença cosmética, no sentido de que talvez a Dilma seja menos repressiva e prossiga com alguns programas que dão migalhas sociais. Mas isso não resolve os problemas anteriormente apontados. Portanto, acho que os movimentos sociais precisam dar um salto de qualidade e criar uma organização que aponte uma alternativa estratégica, que coloque a questão do poder. É necessário um instrumento político que reúna esses movimentos sociais e aponte uma alternativa de poder. Está na hora de um novo partido no Brasil. Ou de uma frente plural de partidos – partidos ou movimentos sociais. Teria de se pensar uma forma criativa de realizar essa organização, mas que dê um salto qualitativo. Nesses anos todos, os movimentos criaram e construíram direções que são conhecidas nacionalmente e internacionalmente, identificadas com transformações da sociedade, que não se deixaram cooptar por esse processo de participação lucrativa na economia neoliberal, que não aceitaram participar do esquema, direções identificadas com as lutas cotidianas dos trabalhadores brasileiros na cidade e no campo. Essas direções existem, são reconhecidas e elas têm a responsabilidade, na minha opinião, de assumir esse novo momento da história brasileira.
Você está defendendo a criação de um novo instrumento político. Isso significa que os atuais partidos e organizações da esquerda não têm conseguido dar respostas às necessidades da imensa maioria da população e não conseguem enfrentar essa nova realidade brasileira como um instrumento de transformação?
Sem dúvida nenhuma. Historicamente, os partidos brasileiros – incluindo o PT, do qual eu também fazia parte, portanto não estou me excluindo dessa história – foram capazes de atingir uma massa de trabalhadores com carteira assinada, funcionários públicos, operários da grandes metalurgias, da indústria de automóveis etc. e até uma faixa de pequenos comerciantes, uma classe média pauperizada. Até aí esses partidos chegaram. Mas isso constitui uma minoria da população. A grande maioria está hoje na periferia, no campo, no Brasil profundo. E esses setores nunca foram organizados pelos partidos. Eles foram muito mais organizados pela Rede Globo, que chega em qualquer lugar, no ponto extremo da Amazônia, os caras têm uma antena parabólica e vão assistir a novela Viver a Vida. Logo, quem atingiu esses setores? O MST, o MAB, o MTST atingiram. Hoje, temos uma situação na qual os partidos que dizem representar a população não dialogam com esses setores. Ou melhor, dialogam na forma da porrada, do terrorismo de Estado. E, por outro lado, os movimentos sociais que organizam esses setores estão excluídos da esfera do poder. Isso configura uma situação absolutamente intolerável, porque significa que o Estado brasileiro existe para um determinado setor da sociedade e para outro não. Então, os partidos historicamente fracassaram nessa missão e os movimentos sociais foram bem sucedidos em organizar esses setores. Quando eu digo bem sucedidos não significa que o serviço já está feito. Ainda há muita coisa para fazer. E o MST mostrou que o caminho existe. Ou seja, é possível organizar esses setores. Assim, ou os movimentos sociais assumem essa tarefa de dar um salto político e conduzir esses setores que nunca fi zeram parte da vida política brasileira para uma outra saída estratégica na qual eles passem a fazer parte – e devem fazer isso já, urgente – ou o que nós vamos ver é cada vez mais esses setores pagando o preço terrível de não terem uma voz política e serem segregados por muros.
E a ofensiva permanente das elites para criminalizar os movimentos sociais e as lutas, você acha que um instrumento político, tal qual você coloca, ajudaria as organizações nessa batalha? Você acha que um partido político legalizado seria um suporte fundamental frente a esse cenário?
Isso me parece óbvio porque quando a direita faz sua ofensiva ela usa o aparelho de Estado. Por exemplo, montam uma CPI para paralisar o MST, que é obrigado a drenar toda a sua energia para se defender. Assim, o aparelho de Estado monta a ofensiva, conta com o braço armado que é a polícia e o exército, e vem para cima dos movimentos sociais. E cria um consenso social na classe média por meio da mídia. O aparelho de Estado não é neutro, como disse antes ele não universaliza as leis, e é lógico que, se os movimentos sociais não tiverem um instrumento político que coloque concretamente a questão do Estado, essa situação vai se eternizar e conduzirá os movimentos sociais a um desastre absoluto, porque hoje estão numa situação de impotência. Por exemplo, no caso de Belo Monte. Populações inteiras serão expulsas de suas localidades por causa de uma usina, um empreendimento que interessa a meia dúzia de empreiteiras, e estão sem defesa. Eles estão dispostos ao auto-sacrifício para preservar aquelas terras, dizem que irão para as áreas que serão inundadas. Esse pessoal está sem a defesa de um instrumento político, porque não tem um partido que os defenda de uma forma decisiva, que mobilize a população, que seja capaz de articular todos os movimentos sociais em sua defesa. Isso não existe. O PT não é esse partido. Então, se não houver esse salto qualitativo, é óbvio que o neoliberalismo, tendo como instrumento o Estado, vai produzir uma matança, uma criminalização cada vez maior dos movimentos sociais. Aliás, as últimas declarações, tanto do Serra quanto da Dilma, apontam para esse caminho. O tucano multiplica diariamente acusações contra o MST. E a petista, quando visitou os vários agrishow Brasil afora, disse claramente que não apoia invasão de terra, e usou o termo invasão, que é significativo, porque ela sabe que não se trata de ocupação.
Quais elementos políticos centrais devem nortear um novo instrumento dessa natureza, inclusive para não se incorrer em equívocos de tantos outros partidos brasileiros?
Hoje, qualquer articulação política séria no país tem que partir de um pressuposto, tem que ter uma discussão muito séria de que no Brasil a nação se organizou contra o Estado. Isto é uma formulação do professor Istvan Iancson – que faz parte da antiga geração de professores universitários que eram de fato professores universitários. Ele mostra que, no Brasil, durante 400 anos de escravidão houve uma política de Estado destinada a reprimir a imensa maioria da população, composta de povos originários e de escravos trazidos da África. Paralelamente, nunca houve no Brasil nenhum setor da burguesia disposto a produzir um movimento revolucionário semelhante ao que houve na França e outros países, que tinham como objetivos integrar a população trabalhadora ao processo produtivo. Mesmo na história republicana, nos 30 primeiros anos da oligarquia do café com leite; no Estado Novo de Getúlio Vargas, que embora tivesse um projeto nacional, comandou esse projeto na base da outorga de uma estrutura sindical atrelada ao Estado, na qual os trabalhadores jamais foram independentes para construir a sua autonomia do Estado; e na ditadura militar que durou vinte e tantos anos. Quer dizer, temos uma longa história de sucessivas catástrofes que demonstram que, no Brasil, o Estado sempre foi considerado pelas elites como um órgão privado delas. O surgimento do PT e da CUT produziu uma espécie de abalo nessa história, porque, pela primeira vez, você teve a formação de uma central independente, que foi a CUT, e a formação de um partido político que não era um impulsionado a partir das elites e que conseguiu produzir abalos na estrutura do Estado que os partidos tradicionais de trabalhadores como o PC e outros nunca conseguiram produzir. Assim, é inegável que o surgimento do PT e da CUT produziram esse abalo, algo extremamente importante na história do brasileira. Porém, acho que tanto o PT quanto a CUT não levaram até o fi m essa dimensão de que o Estado foi construído contra a nação. E que, simplesmente, participar da atual estrutura do Estado não resolve o problema, porque é um Estado construído contra a nação brasileira.
As estruturas do Estado permanecem inalteradas.
É, continuam inalteradas. Por exemplo, para tornar bem visível o que estou falando, acho equivocado dizer que no Brasil não funciona o sistema de saúde. Ou não funciona o sistema de educação pública. Funciona perfeitamente. Ou alguém acha que em algum momento desse país as elites, que mandam no Estado, pretenderam construir um sistema realmente eficaz e que garantisse saúde e educação de qualidade para a maioria do povo brasileiro? Alguém acha isso? Só se for louco! Então, eu acho que esses sistemas funcionam perfeitamente bem à luz do que é o Estado brasileiro, à luz dos jagunços que mandam nesse país há 500 anos. Assim, se você construir um partido que não coloque na ordem do dia essa questão de que é preciso haver uma revolução que transforme o Estado brasileiro e que crie as condições para que haja uma integração entre Estado e nação, ele vai fracassar como todos os outros partidos. Eu acho que o único partido que teria condições de fazer isso é um partido que nasça das bases – e aí bases eu quero dizer os setores mais excluídos, mais pobres, mais miseráveis da população brasileira, que são os movimentos sociais, os camponeses, os trabalhadores desempregados, os sem teto, os que têm que se virar todo dia para conseguir comida para as próximas 24 horas, os povos originários. Todos eles constituem essa camada social que jamais foi integrada pelo Estado brasileiro e que sabem exatamente o que significa o Estado brasileiro. Então, na minha opinião, embora a experiência do PT e da CUT tenha sido extremamente positiva porque produziu abalos nessa relação do Estado e nação, eles não foram até o fi m. O PT nunca se constituiu de fato como um partido anticapitalista. Nunca se colocou com a tarefa de destruir o capitalismo.
O objetivo desse novo partido contra o Estado brasileiro vai ser o quê? Vai ser um partido socialista, social desenvolvimentista, vai querer desenvolver o capital interno?
Não sei. Não sou a Mãe Diná. Acho que não cabe a uma direção iluminada dizer o que esse partido vai ser. Nesse momento, o que se coloca em primeiro lugar é uma formulação que consiga agregar esse conjunto de movimentos sociais. Isso estabelece uma primeira base de discussão, ou seja, como é que vamos agregar esses movimentos sociais e, a partir das discussões feitas por esses movimentos sociais, dos núcleos de base. Uma discussão programática vai surgir da base. E que tenha necessariamente o seguinte: nós não queremos um partido que se integre ao Estado brasileiro tal como ele existe hoje. Esse é o ponto. O resto a gente discute. Não podemos colocar uma série de pré-condições que funcionariam como obstáculos à formação de um grande partido de base, realmente popular.
Você, como intelectual, imagino que estaria neste partido. Você acredita que outros intelectuais, a universidade, estariam também num partido com esses objetivos? Temos reserva moral na esquerda brasileira que seja capaz de impulsionar um partido dessa natureza?
Claro que temos reserva moral... e prefiro não citar nomes para não cometer injustiças... Mas, se realmente o MST é um movimento de importância histórica no Brasil, logo, é claro que, desse ponto de vista, os dirigentes e porta-vozes do MST estão entre aqueles que podem e devem impulsionar o processo. Acho que o João Pedro Stedile tem um papel particular nisso, por sua visibilidade nacional e internacional. Mas há muita gente boa nos movimentos sociais, nos partidos de esquerda e mesmo dentro do PT que se empolgaria por uma proposta de construção de um poderoso partido anticapitalista no Brasil.
Agora, ao mesmo tempo, acho que esse partido provocaria um susto em um vasto setor da classe média brasileira. Imagina o que vai acontecer no momento em que um partido conseguir juntar o MST, os movimentos que se organizam na periferia, hip hop, as Mães de Maio etc. e começa a dar visibilidade para o Brasil de cara feia. Ou seja, não é o Brasil que vai fazer compra em shopping center. Mesmo dentro da universidade, pessoas que hoje se dizem a favor de uma transformação social fi cariam assustadas quando elas vissem a cara da transformação social. Mas, ao mesmo tempo, isso geraria um efeito fantástico de produzir um senso de auto-estima e de dignidade em dezenas de milhões de brasileiros que hoje estão em baixa porque acham que não têm futuro. Você imagina o que significa para um trabalhador que trabalha 15 horas por dia para ganhar um salário-mínimo e que se afoga na cachaça, de repente, perceber que pode participar de algo desse porte? Isso daria um impulso tremendo à organização política brasileira. Seria algo muito superior ao que está acontecendo hoje na Venezuela com o Hugo Chávez. Superior dado o porte da economia brasileira, o número de habitantes e o poder que teriam esses milhões de trabalhadores organizados, que tem uma tradição de luta negada pela elites, o que é um completo absurdo. Se você pensar desde os Quilombos dos Palmares até o MST, passando pelas Ligas Camponesas, por Canudos, pela Revolta dos Malês e pelo século 19 inteiro de revoltas regionais, esse povo não parou de lutar uma década. Portanto, nós temos uma experiência de combate, uma história de luta. E um partido desse porte teria um poder enorme de galvanizar a nação brasileira. Desde que esse partido não caia no conto de se integrar ao Estado brasileiro tal como ele existe hoje. É um partido que tem que ter o compromisso de ruptura. Sem esse compromisso não conseguiria galvanizar ninguém. E acho que, nesse processo, toda a gente acabaria formulando aquilo que todo mundo diz e anseia, que é um programa para o Brasil feito com base na realidade brasileira e não nas formulações europeias. Não que eu esteja aqui negando Karl Marx ou outro pensador europeu, seria uma estupidez. O que estou dizendo é que justamente a ausência do povão na política é produzir um tipo de pensamento que é muito intelectualizado, muito antenado com concepções de vanguarda que existem na Europa e que foram formuladas na Europa, mas que se ressentem do diálogo com o povão mesmo, que tem sua própria história e que não é a história europeia. É uma outra história. Acho que isso produziria uma transformação na própria universidade. Quer dizer, os intelectuais teriam que responder ao desafio para eles mesmos como intelectuais com um partido desse tipo.
Quem é
José Arbex Jr. é editor especial da revista Caros Amigos, é doutor em história social pela Universidade de São Paulo (USP), professor de jornalismo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), autor de Showrnalismo – A Notícia Como Espetáculo e O Jornalismo Canalha (editora Casa Amarela). Durante os anos de 1980 e 1990, trabalhou no jornal Folha de S. Paulo e, em 2003, foi editor-chefe do Brasil de Fato.
quarta-feira, 7 de julho de 2010
O time multi-culti da Alemanha
Herr Cacau, brasileiro naturalizado alemão, é apenas um
dos 11 atletas com ascendência estrangeira (Foto: Ina
FassBender/Reuters)
Por Flavio Aguiar
Num país em crise, com a economia sendo “passada a ferro” pelas
regras do FMI num clima recessivo, em que os direitos sociais estão
passando por uma poda sem precedentes, em que o presidente renunciou
recentemente e a eleição indireta do novo foi um pesadelo para o
governo, em que a popularidade do governo e dos seus partidos está lá
embaixo, de repente o futebol, a seleção nacional e a Copa do Mundo
passaram a ser uma milagrosa tábua de salvação.
Estamos falando, como estávamos acostumados, do Brasil? Não, da
Alemanha.
Mas há mais nisso do que pensa a nossa vã filosofia. É que a seleção
germânica passou por uma mudança de caráter das mais significativas.
O futebol alemão – o da sua seleção em particular – sempre foi
associado a um blindado de artilharia – um Panzer, para ser mais exato.
Troncudo, carrancoso, eficiente como um capitalista protestante e
conservador como um bispo católico do partido de Bento XVI e, sobretudo,
germânico, profundamente germânico: assim era o retrato do time alemão
tradicional.
De repente, o que se vê? O time alemão jogando aberto, bonito,
rápido, um time jovem de gente bonita. E sem o ex-capitão Ballack, o
que, no meu entender deu-lhe mais mobilidade e jinga. Jinga? É, jinga.
Não estou com aqueles que querem crucificar Dunga e o nosso time. Mas
que faltou jinga, faltou, sobretudo naquele segundo tempo contra os
holandeses em que fomos derrotados por uma laranja... mecânica. É um
time que jogou certinho, só certinho. Só que o nosso, no segundo tempo,
fez tudo errado. Desmanchou-se em campo.
Enquanto isso os lépidos e faceiros germânicos deram uma lição ímpar
“a los hermanos de más Allá Del Plata”.
Pois vejam só: lépidos, faceiros e... coloridos! Não só o futebol
deles é colorido: o time é colorido. Foi isso que mudou no time alemão:
antes ele era um filme em louro e branco; no máximo havia uma cabeleira
(sempre curta) morena que vinha lá dos fundos da Baviera. Agora, te tudo
quanto é cor. Tem até uma cor que se chama Cacau – Herr Cacau – e que
veio do Brasil. Tudo começou em 2004 quando, depois de um desempenho
fraco no campeonato europeu, a Federação Alemã de Futebol decidiu
"abrir" o time para os seus "oriundi".
11 dos 23 jogadores que a Alemanha despachou para a África do Sul têm
ascendência próxima ou nasceram em terra estrangeira. Além do Claudemir
Jerônimo Barreto – o Cacau, veja só:
Miroslav Klose, Lukas Podolski e Piotr Trochowski vieram da Polônia.
Mesut Özil, do Werder Bremen, é de ascendência turca, é muçulmano e
recita o Corão antes de cada jogo.
Serdar Tasci também é de ascendência turca.
Mario Gómez tem o pai espanhol.
Sami Khedira tem o pai da Tunísia.
Dennis Aogo tem o pai nigeriano.
Jerome Boateng nasceu em Gana, filho de pai ganes e mãe alemã. Jogou
contra o irmão, que era da seleção de Gana.
Marko Manin é sérvio de origem.
O time alemão está sendo descrito como o “retrato de uma nova
Alemanha”.
Mas nem tudo são flores para o sucesso desse time que, vença ou perca
a Copa, já marcou um gol pela integração.
É verdade que os bairros turcos de Berlim estão cobertos por
bandeiras alemãs e da Turquia. O comerciante Youssef Bassal (relato do Berliner
Zeitung), no bairro de Neukölln, resolveu pendurar um bandeirão
alemão de 20 metros na fachada do prédio onde tem sua loja de telefonia
celular. A bandeira já foi rasgada (duas vezes) por anônimos – mas que
se dizem de esquerda, deixando mensagens alegando que aquilo é
“nacionalismo” alemão. De esquerda? Sinceramente, para mim isso é
racismo disfarçado.
Em compensação, há grupos neonazis que, pela internet, têm repudiado a
seleção alemã. Outros dizem pejorativamente que ela é uma seleção da
ONU, não da Alemanha. Mas o caso mais curioso é o daqueles que dizem que
só torcem pela Alemanha quando os jogadores alemães puro-sangue tocam
na bola...
Mas enquanto isso a maioria dos alemães, venham de onde vierem, se
divertem a mil com os jogos – pelo menos até aqui, numa trajetória que
foi empanada mas não cortada pela derrota para a Sérvia.
Dentre os mais velhos, há quem não goste desse embandeiramento geral
das cidades, pois isso lhes traz recordações desagradáveis do passado.
Mas para os mais jovens, em geral, é uma festa.
A gente vê que de fato há uma nova Alemanha nascendo. Não das cinzas,
mas entre as cinzas, sejam as eventuais do vulcão islandês, sejam as
ameaçadoras da crise econômica e do pacote depre/regre/ssivo que sobre
ela se abate.
Eric Clapton - 2009
MP3 256 Kbps CBR | Blues | 91.27 MB
01. I've Got A Rock N' Roll Heart
02. Shes Waiting
03. Its In The Way That You Use It
04. Bad Love
05. Tears In Heaven
06. My Fathers Eyes
07. Miss You
08. Forever Man
09. Pretending
10. Layla
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terça-feira, 6 de julho de 2010
Em defesa de Dunga e de Jorginho....
Dunga
e Jorginho: só o tempo mostrará..
Por Dil no blog egora
O próximo técnico da seleção brasileira terá pela frente uma tarefa
dificílima: Manter o excelente padrão que Dunga e Jorginho deram ao time
durante os 4 anos que estiveram a serviço da seleção brasileira. Nesse
período a seleção, que lhes fora entregue esfacelada pelo fracasso de
2006 e sem os principais craques, conseguiu reunir os atributos daquilo
que se espera de um verdadeiro e vitorioso time de futebol: Tornou-se
super competitiva, com regularidade, equilibrada – tomando poucos gols e
fazendo muitos . Conseguiu ainda bater adversários históricos como
Portugal, Inglaterra e Itália, fazer do nosso maior rival, a Argentina,
um freguês de carteira com duas goleadas, ganhar as competições e, de
quebra, conseguir a melhor preparação em uma eliminatória com a
classificação garantida com duas rodadas de antecedência.
Isso, meus amigos, podem ter certeza que não é fácil. A coisa mais difícil no futebol é dar padrão e consistência a um time por um bom período, e talvez a coisa quase impossível no futebol é conseguir esse feito sem ter a disposição a fartura de craques que outros treinadores já tiveram. Nesse ponto Dunga merece todo o reconhecimento. Que trabalho!
Para fazer uma comparação nada melhor que lembrar das últimas copas, de pelos menos 30 anos pra cá:
Copa de 82: Um período de vacas gordas, tínhamos craques caindo da árvore no futebol brasileiro, a equipe jogava no talento deles, mas o treinador, desde a preparação, desde o último treino na Toca da Raposa, quando os reservas chegaram a golear por 8 a 2 (!) jamais conseguiu corrigir os erros de cobertura da defesa, o que deixava o Brasil sempre exposto lá atrás...Já na primeira partida contra a URSS, a vulnerabilidade era evidente, mas o talento de Éder, Sócrates e cia, e a boa ajuda do juiz nos fez virar aquele marcador. Resistimos na copa até onde deu no talento de nossos craques, mas sucumbimos em erros pré- anunciados que “gritavam e não eram ouvidos.”
Copa de 86: Ainda uma época de ouro, tivemos troca de técnico, corte por indisciplina do atacante titular que estava no auge e a consequente saída de Leandro. A questão da não escalação de Falcão, onde foi alegada contusão e que depois foi revelada pelo próprio jogador como uma farsa - já que estava de saída para o Nápoli a convite de Maradona e perdera a inscrição em função do fim do prazo para inscrição de estrangeiros. Perdemos nos pênaltis (2 vezes na mesma partida!) sendo a última de forma displicente. Tudo fruto de uma preparação confusa.
Copa de 90: Essa eu prefiro resumir. Era craque pra tudo quanto é lado e um treinador inseguro que chegou ao cúmulo de reunir o grupo antes da última partida e pedir conselhos para alterar ou não o sistema de jogo. Esse fato, revelado por Taffarel quase 20 anos depois e confirmado por outros jogadores, é o cúmulo do anti profissionalismo.
Copa de 94: O trauma de 90 fez com que a CBF buscasse alguém que tivesse identificação com a seleção. A escolha recaiu sobre Falcão, resultado: Convocações polêmicas e 18 meses de um trabalho inconstante e inexpressivo. Foi tirado para entrada da dupla Parreira-Zagallo, que conseguiu montar um time com muita dificuldade, perdendo Copa América e tendo seríssimos problemas para classificá-lo. Perdemos para Bolívia de 2 a 1 estávamos quase ameaçados de, pela primeira vez, ficar fora da Copa do Mundo, quando finalmente Romário imposto na marra pelas circunstâncias, faz seus dois gols no Maracanã e salva a pele de Parreira, que já estava por um triz..A partir daí a equipe entrava nas partidas de mãos dadas, se uniu em torno de lideranças como Ricardo Rocha, Dunga, Taffarel e Jorginho, e se fechou num projeto até a busca suada daquele título.
Copa de 98: Uma péssima preparação. Dessa vez Zagallo era o treinador e convocou mais de 800 jogadores, não tinha time. Na ultima partida no Maracanã os jogadores foram vaiados pelo péssimo futebol apresentado. Quem não se lembra de “Raí pede pra sair e Cafu vai tomar...”. A desorganização era tamanha que no primeiro jogo da Copa o treinador troca metade do meio campo. Sai Raí e Leonardo e entra Rivaldo e Geovanni. E no segundo jogo? Muda tudo, sai Giovanni e entra Leonardo que fez uma copa muito discreta..No talento absurdo de Rivaldo e no auge do fenômeno fomos chegando até desmoronarmos pra França, num episódio até hoje mal explicado mas que não justifica a desorientação evidente do técnico demonstrada durante quatro anos
Copa de 2002: Talvez a pior preparação da história da seleção brasileira. Entra Leão e só faz bobagem, depois vem Luxemburgo e consegue piorar. Com Felipão fizemos uma péssima eliminatória, perdemos pro Paraguai, pro Equador, fomos goleados pelo Chile.. Na copa das Confederações não ganhamos uma e ainda perdemos para a Austrália (!) A Copa América, então, foi um desastre, goleados pela Bolívia e sofrendo a mais vexatória derrota do Brasil quando perdemos de 2x0 para seleção de Honduras. Eu nunca vi uma seleção brasileira tão bagunçada e sem padrão de jogo. Na Copa do Mundo, mais uma vez no talento absurdo de craques como Rivaldo e Ronaldo, numa conjuntura favorável, com grandes times caindo, com arbitragens generosas, e uma boa dose de sorte, chegamos lá e fomos campeões. Apesar da péssima preparação o treinador teve méritos, sem dúvida, mas os fatos mostram (não sou eu que estou dizendo) que seu trabalho foi inconsistente e teve que contar com outros fatores para conseguir o êxito.
Copa de 2006: Talvez a segunda pior preparação da história da seleção brasileira. O Brasil também não vinha bem nas eliminatórias. Ganha a Copa América num erro de arbitragem e na bomba de Adriano, depois estréia perdendo do México na Copa das Confederações, e empata com Japão (que ainda tem um gol mal anulado) quando, de repente, surge novamente um salvador para Parreira: Perdendo para Alemanha, Adriano (o Romário de 2006), solta duas bombaças e muda o placar. Na final, o Brasil ganha da Argentina na melhor partida da seleção desde a Escócia na Copa de 82. Criou-se ali a ilusão do “quadrado mágico”, que depois iria ainda empatar com a Bolívia e novamente empatar com o time do Sevilla. Resultado: A bagunça generalizada, jogadores obesos, fanfarrões, um time com erros que não eram corrigidos, treinador dormindo LITERALMENTE no banco na hora do jogo, e saímos de forma melancólica.
Esse histórico é apenas para mostrar que o trabalho realizado por Dunga e Jorginho foi da maior competência e que fez a seleção chegar muito bem preparada, como nunca antes, numa copa do mundo. Perdemos o jogo em falhas individuais e não coletivas. Não houve o “queijo suíço” de 82, não houve a displicência de 86 e muito menos a falta de comando de 90 e nem o descaso de 2006. Foram erros individuais de jogadores (Julio César e Juan) que não erraram nunca nesses 4 anos. São humanos, acontece. Fora isso, o time era bom mas não era imbatível e perdeu numa partida de futebol normal e para a Holanda que também era um grande time; bem diferente por exemplo da Argentina que foi esfacelada de 4 pela Alemanha e poderia ter sido de mais...
O título não veio? Ok, mas é bom não esquecermos que em duas ocasiões com a seleção dirigida por aquele que a imprensa considera “mestre”, e que tinha em suas mãos um manancial de craques, ele também não veio.
Outros técnicos ganharam e ele não? Novamente ok, mas não podemos nos esquecer jamais que Copa do Mundo é talvez o local mais propício para as vicissitudes e muitas vezes até o imponderável, que futebol é o esporte onde a justiça e a lógica não andam de mãos dadas. O histórico acima está aí pra provar isso.
A mídia leiga, movida pelo rancor, quer nos fazer crer que Dunga não tinha qualquer valor; agora, como era de se esperar, está execrando ele de todas as formas, se vingando do jeito que pode - até estampar a cabeça dele numa lata de lixo, fizeram, como nunca fizeram com nenhum outro treinador.
Tudo bem, sabíamos que seria assim. Só que agora, meus amigos, não tem jeito, eles criaram uma situação tão absurda de execração humana e super exigência que fará com que o próximo técnico da seleção seja obrigado a manter o bom trabalho de Dunga e Jorginho, o que não será nada fácil.
Pra terminar, é preciso registrar que Dunga e Jorginho, mesmo não tendo ganho essa copa do mundo, são ídolos, tetracampeões, exemplos de caráter, de trabalho sério, bem feito e, acima de tudo, sabem muito de futebol. E assim como hoje cada vez mais e mais pessoas reconhecem o valor da seleção de 94, num futuro breve, inexoravelmente, irão também reconhecer, mesmo com uma ou outra crítica procedente, o bom trabalho feito por essa dupla. O tempo mostrará.
Isso, meus amigos, podem ter certeza que não é fácil. A coisa mais difícil no futebol é dar padrão e consistência a um time por um bom período, e talvez a coisa quase impossível no futebol é conseguir esse feito sem ter a disposição a fartura de craques que outros treinadores já tiveram. Nesse ponto Dunga merece todo o reconhecimento. Que trabalho!
Para fazer uma comparação nada melhor que lembrar das últimas copas, de pelos menos 30 anos pra cá:
Copa de 82: Um período de vacas gordas, tínhamos craques caindo da árvore no futebol brasileiro, a equipe jogava no talento deles, mas o treinador, desde a preparação, desde o último treino na Toca da Raposa, quando os reservas chegaram a golear por 8 a 2 (!) jamais conseguiu corrigir os erros de cobertura da defesa, o que deixava o Brasil sempre exposto lá atrás...Já na primeira partida contra a URSS, a vulnerabilidade era evidente, mas o talento de Éder, Sócrates e cia, e a boa ajuda do juiz nos fez virar aquele marcador. Resistimos na copa até onde deu no talento de nossos craques, mas sucumbimos em erros pré- anunciados que “gritavam e não eram ouvidos.”
Copa de 86: Ainda uma época de ouro, tivemos troca de técnico, corte por indisciplina do atacante titular que estava no auge e a consequente saída de Leandro. A questão da não escalação de Falcão, onde foi alegada contusão e que depois foi revelada pelo próprio jogador como uma farsa - já que estava de saída para o Nápoli a convite de Maradona e perdera a inscrição em função do fim do prazo para inscrição de estrangeiros. Perdemos nos pênaltis (2 vezes na mesma partida!) sendo a última de forma displicente. Tudo fruto de uma preparação confusa.
Copa de 90: Essa eu prefiro resumir. Era craque pra tudo quanto é lado e um treinador inseguro que chegou ao cúmulo de reunir o grupo antes da última partida e pedir conselhos para alterar ou não o sistema de jogo. Esse fato, revelado por Taffarel quase 20 anos depois e confirmado por outros jogadores, é o cúmulo do anti profissionalismo.
Copa de 94: O trauma de 90 fez com que a CBF buscasse alguém que tivesse identificação com a seleção. A escolha recaiu sobre Falcão, resultado: Convocações polêmicas e 18 meses de um trabalho inconstante e inexpressivo. Foi tirado para entrada da dupla Parreira-Zagallo, que conseguiu montar um time com muita dificuldade, perdendo Copa América e tendo seríssimos problemas para classificá-lo. Perdemos para Bolívia de 2 a 1 estávamos quase ameaçados de, pela primeira vez, ficar fora da Copa do Mundo, quando finalmente Romário imposto na marra pelas circunstâncias, faz seus dois gols no Maracanã e salva a pele de Parreira, que já estava por um triz..A partir daí a equipe entrava nas partidas de mãos dadas, se uniu em torno de lideranças como Ricardo Rocha, Dunga, Taffarel e Jorginho, e se fechou num projeto até a busca suada daquele título.
Copa de 98: Uma péssima preparação. Dessa vez Zagallo era o treinador e convocou mais de 800 jogadores, não tinha time. Na ultima partida no Maracanã os jogadores foram vaiados pelo péssimo futebol apresentado. Quem não se lembra de “Raí pede pra sair e Cafu vai tomar...”. A desorganização era tamanha que no primeiro jogo da Copa o treinador troca metade do meio campo. Sai Raí e Leonardo e entra Rivaldo e Geovanni. E no segundo jogo? Muda tudo, sai Giovanni e entra Leonardo que fez uma copa muito discreta..No talento absurdo de Rivaldo e no auge do fenômeno fomos chegando até desmoronarmos pra França, num episódio até hoje mal explicado mas que não justifica a desorientação evidente do técnico demonstrada durante quatro anos
Copa de 2002: Talvez a pior preparação da história da seleção brasileira. Entra Leão e só faz bobagem, depois vem Luxemburgo e consegue piorar. Com Felipão fizemos uma péssima eliminatória, perdemos pro Paraguai, pro Equador, fomos goleados pelo Chile.. Na copa das Confederações não ganhamos uma e ainda perdemos para a Austrália (!) A Copa América, então, foi um desastre, goleados pela Bolívia e sofrendo a mais vexatória derrota do Brasil quando perdemos de 2x0 para seleção de Honduras. Eu nunca vi uma seleção brasileira tão bagunçada e sem padrão de jogo. Na Copa do Mundo, mais uma vez no talento absurdo de craques como Rivaldo e Ronaldo, numa conjuntura favorável, com grandes times caindo, com arbitragens generosas, e uma boa dose de sorte, chegamos lá e fomos campeões. Apesar da péssima preparação o treinador teve méritos, sem dúvida, mas os fatos mostram (não sou eu que estou dizendo) que seu trabalho foi inconsistente e teve que contar com outros fatores para conseguir o êxito.
Copa de 2006: Talvez a segunda pior preparação da história da seleção brasileira. O Brasil também não vinha bem nas eliminatórias. Ganha a Copa América num erro de arbitragem e na bomba de Adriano, depois estréia perdendo do México na Copa das Confederações, e empata com Japão (que ainda tem um gol mal anulado) quando, de repente, surge novamente um salvador para Parreira: Perdendo para Alemanha, Adriano (o Romário de 2006), solta duas bombaças e muda o placar. Na final, o Brasil ganha da Argentina na melhor partida da seleção desde a Escócia na Copa de 82. Criou-se ali a ilusão do “quadrado mágico”, que depois iria ainda empatar com a Bolívia e novamente empatar com o time do Sevilla. Resultado: A bagunça generalizada, jogadores obesos, fanfarrões, um time com erros que não eram corrigidos, treinador dormindo LITERALMENTE no banco na hora do jogo, e saímos de forma melancólica.
Esse histórico é apenas para mostrar que o trabalho realizado por Dunga e Jorginho foi da maior competência e que fez a seleção chegar muito bem preparada, como nunca antes, numa copa do mundo. Perdemos o jogo em falhas individuais e não coletivas. Não houve o “queijo suíço” de 82, não houve a displicência de 86 e muito menos a falta de comando de 90 e nem o descaso de 2006. Foram erros individuais de jogadores (Julio César e Juan) que não erraram nunca nesses 4 anos. São humanos, acontece. Fora isso, o time era bom mas não era imbatível e perdeu numa partida de futebol normal e para a Holanda que também era um grande time; bem diferente por exemplo da Argentina que foi esfacelada de 4 pela Alemanha e poderia ter sido de mais...
O título não veio? Ok, mas é bom não esquecermos que em duas ocasiões com a seleção dirigida por aquele que a imprensa considera “mestre”, e que tinha em suas mãos um manancial de craques, ele também não veio.
Outros técnicos ganharam e ele não? Novamente ok, mas não podemos nos esquecer jamais que Copa do Mundo é talvez o local mais propício para as vicissitudes e muitas vezes até o imponderável, que futebol é o esporte onde a justiça e a lógica não andam de mãos dadas. O histórico acima está aí pra provar isso.
A mídia leiga, movida pelo rancor, quer nos fazer crer que Dunga não tinha qualquer valor; agora, como era de se esperar, está execrando ele de todas as formas, se vingando do jeito que pode - até estampar a cabeça dele numa lata de lixo, fizeram, como nunca fizeram com nenhum outro treinador.
Tudo bem, sabíamos que seria assim. Só que agora, meus amigos, não tem jeito, eles criaram uma situação tão absurda de execração humana e super exigência que fará com que o próximo técnico da seleção seja obrigado a manter o bom trabalho de Dunga e Jorginho, o que não será nada fácil.
Pra terminar, é preciso registrar que Dunga e Jorginho, mesmo não tendo ganho essa copa do mundo, são ídolos, tetracampeões, exemplos de caráter, de trabalho sério, bem feito e, acima de tudo, sabem muito de futebol. E assim como hoje cada vez mais e mais pessoas reconhecem o valor da seleção de 94, num futuro breve, inexoravelmente, irão também reconhecer, mesmo com uma ou outra crítica procedente, o bom trabalho feito por essa dupla. O tempo mostrará.
E no Brasil os torturadores continuam impunes...
Depoimento de Videla é repudiado por críticos da ditadura militar argentina
Vinte e sete anos após o fim da ditadura militar
argentina (1976-1983), o ex-ditador Jorge Rafael Videla senta mais uma
vez no banco dos réus. Acostumado a manter-se calado durante os
julgamentos, ontem (5/7), numa atitude inédita, Videla assumiu e
defendeu os crimes cometidos no período. O fato provocou revolta entre
ex-presos políticos, familiares de desaparecidos e políticos argentinos.
“Ver Videla me causa uma rejeição visceral, pois ele é o símbolo da
pior ditadura”, disse o deputado portenho, Aníbal Ibarra, ex-prefeito de
Buenos Aires, que foi secretário do julgamento das Juntas Militares.
Videla e outros 24 acusados respondem pelo fuzilamento em 1976 de 30
detidos em uma prisão da província de Córdoba.
Carlos Arco/Efe (02/07/2010)
Jorge Videla e o general Luciano Benjamín Menéndezacompanham início do julgamento
Na sessão de ontem, Videla não negou as acusações imputadas. “Assumo minha responsabilidade na guerra interna, meus subordinados se limitaram a cumprir minhas ordens”, afirmou diante do tribunal de Córdoba.
Segundo a imprensa local, os outros réus pediram para deixar a sala durante o depoimento do ex-ditador, que se comportou de forma “fria, como se estivesse justificando os crimes cometidos”, detalhou em uma reportagem publicada no Clarín a jornalista Marta Platía.
Após a declaração de Videla, a presidente da Associação das Mães da Praça de Maio, Hebe de Bonafini, disse que “repudia a divulgação permanente das palavras do genocida”.
“Em vez de passar o que Videla disse, para que os jovens saibam o que aconteceu durante a ditadura, as Mães acreditam que é preciso mostrar o que ele fez”, afirmou, por meio de um comunicado. Segundo Hebe, as palavras de Videla são “repugnantes”, pois o ex-ditador quer justificar a tortura, os fuzilamentos, sequestros e destruição de famílias.
Leia mais:
Especial: Memórias do passado de terror
Esma: Por dentro da escola de tortura argentina
Argentina julga primeiro presidente da ditadura militar
Videla assume culpa por crimes na ditadura argentina
Hoje na História: Golpe militar instaura ditadura na Argentina
Ex-ditadores argentinos serão julgados em setembro por roubo de bebês
Desde sexta-feira (2/7), o ex-ditador, 84 anos, está sendo julgado por crimes de violação de direitos humanos, como assassinato, tortura, sequestro e prisão arbitrária. Essa foi a primeira vez que o ex-ditador deu uma declaração pública após a redemocratização, segundo o promotor Julio César Strassera, que acompanha o julgamento de ex-repressores.
Na avaliação do promotor Carlos Gonella, no depoimento de Videla está “evidente a cumplicidade com o terrorismo de Estado”.
“Estamos diante de um julgamento paradigmático do que foi o terrorismo de Estado e o que é importante é que vai ficar em evidência o consentimento que houve entre setores da sociedade civil que atuaram junto com aquele governo”, afirmou Gonella, citado pelo site Diário do Julgamento, criado pela associação Hijos da filial de Córdoba para reunir e divulgar o material do processo.
Ficha
Videla encabeçou o golpe de estado de 24 de março de 1976 que substituiu a então presidente Isabelita Perón por uma junta militar, formada por ele, representando o Exército, o almirante Emilio Eduardo Massera da Marinha e o brigadeiro general Orlando Ramón Agosti pela Força Aérea, dando início ao “Processo de Reorganização Nacional”.
Hoje, devem ser ouvidos os outros 24 réus. Depois, serão apresentadas provas e documentos, além de testemunhos de ex-presos e familiares. Segundo o Ministério Público da Argentina, desde 2003, 625 pessoas foram processadas por violações de direitos humanos cometidas na ditaduras. Destas, 53 foram condenadas.
O ex-ditador, que também enfrenta acusações na Itália, na Espanha, na França e na Alemanha pelas mortes de civis na Argentina, chegou a ficar em cadeias militares e em prisão domiciliar, mas agora está em uma cela comum. Com o ex-ditador já condenado à prisão perpétua, o julgamento que começa nesta sexta não pode elevar seu tempo na cadeia, mas as famílias das vítimas consideram que uma possível condenação pode ajudar a superar as mortes.
Fonte: Opera Mundi
Carlos Arco/Efe (02/07/2010)
Jorge Videla e o general Luciano Benjamín Menéndezacompanham início do julgamento
Na sessão de ontem, Videla não negou as acusações imputadas. “Assumo minha responsabilidade na guerra interna, meus subordinados se limitaram a cumprir minhas ordens”, afirmou diante do tribunal de Córdoba.
Segundo a imprensa local, os outros réus pediram para deixar a sala durante o depoimento do ex-ditador, que se comportou de forma “fria, como se estivesse justificando os crimes cometidos”, detalhou em uma reportagem publicada no Clarín a jornalista Marta Platía.
Após a declaração de Videla, a presidente da Associação das Mães da Praça de Maio, Hebe de Bonafini, disse que “repudia a divulgação permanente das palavras do genocida”.
“Em vez de passar o que Videla disse, para que os jovens saibam o que aconteceu durante a ditadura, as Mães acreditam que é preciso mostrar o que ele fez”, afirmou, por meio de um comunicado. Segundo Hebe, as palavras de Videla são “repugnantes”, pois o ex-ditador quer justificar a tortura, os fuzilamentos, sequestros e destruição de famílias.
Leia mais:
Especial: Memórias do passado de terror
Esma: Por dentro da escola de tortura argentina
Argentina julga primeiro presidente da ditadura militar
Videla assume culpa por crimes na ditadura argentina
Hoje na História: Golpe militar instaura ditadura na Argentina
Ex-ditadores argentinos serão julgados em setembro por roubo de bebês
Desde sexta-feira (2/7), o ex-ditador, 84 anos, está sendo julgado por crimes de violação de direitos humanos, como assassinato, tortura, sequestro e prisão arbitrária. Essa foi a primeira vez que o ex-ditador deu uma declaração pública após a redemocratização, segundo o promotor Julio César Strassera, que acompanha o julgamento de ex-repressores.
Na avaliação do promotor Carlos Gonella, no depoimento de Videla está “evidente a cumplicidade com o terrorismo de Estado”.
“Estamos diante de um julgamento paradigmático do que foi o terrorismo de Estado e o que é importante é que vai ficar em evidência o consentimento que houve entre setores da sociedade civil que atuaram junto com aquele governo”, afirmou Gonella, citado pelo site Diário do Julgamento, criado pela associação Hijos da filial de Córdoba para reunir e divulgar o material do processo.
Ficha
Videla encabeçou o golpe de estado de 24 de março de 1976 que substituiu a então presidente Isabelita Perón por uma junta militar, formada por ele, representando o Exército, o almirante Emilio Eduardo Massera da Marinha e o brigadeiro general Orlando Ramón Agosti pela Força Aérea, dando início ao “Processo de Reorganização Nacional”.
Hoje, devem ser ouvidos os outros 24 réus. Depois, serão apresentadas provas e documentos, além de testemunhos de ex-presos e familiares. Segundo o Ministério Público da Argentina, desde 2003, 625 pessoas foram processadas por violações de direitos humanos cometidas na ditaduras. Destas, 53 foram condenadas.
O ex-ditador, que também enfrenta acusações na Itália, na Espanha, na França e na Alemanha pelas mortes de civis na Argentina, chegou a ficar em cadeias militares e em prisão domiciliar, mas agora está em uma cela comum. Com o ex-ditador já condenado à prisão perpétua, o julgamento que começa nesta sexta não pode elevar seu tempo na cadeia, mas as famílias das vítimas consideram que uma possível condenação pode ajudar a superar as mortes.
Fonte: Opera Mundi
EUA: a receita certa para uma economia doente
O aumento da desigualdade está no centro
da atual crise econômica nos EUA. E como esse aumento na desigualdade
não é um processo natural, mas o resultado de uma política consciente,
pode ser revertido. Alguns dos remédios são bem conhecidos. Restaurar
alguma disciplina aos pagamentos dos executivos seria um grande passo
inicial. Os pacotes do FED e do Tesouro foram vendidos como necessários
para salvar a economia, mas foram majoritariamente destinados ao resgate
do Goldmann Sachs, Citigroup e de outras grandes instituições
financeiras. O artigo é de Dean Baker.
Dean Baker - The Nation
As raízes desta crise econômica estão muito
vinculadas ao crescimento da desigualdade das últimas três décadas. Isso
se torna claro quando reconhecemos que o tumor financeiro é um aspecto
menor da crise geral, e que sua causa principal é o desequilíbrio criado
pela bolha imobiliária.
A crise financeira produziu muito drama e manchetes, assim como tivemos de assistir ao secretário do Tesouro, ao presidente do Federal Reserve e aos executivos de bancos colapsados acordados nas noites de fins de semana preparando juntos pacotes de resgate. Contudo, esse show era apenas uma nota de pé de página para nós, que não trabalhamos nesses bancos ou que não temos grandes quantias de ativos depositados neles. Os pacotes do FED e do Tesouro foram vendidos como necessários para salvar a economia, mas foram majoritariamente destinados ao resgate do Goldmann Sachs, Citigroup e de outras grandes instituições financeiras.
No pior cenário, os grandes bancos sofreriam uma intervenção do FED e do FDIC, levando a mais incerteza nos mercados financeiros e a uma maré de processos. Isso provavelmente teria resultado numa queda mais aguda do que aquela que experienciamos, mas certamente não a uma segunda Grande Depressão, que os políticos ameaçaram que iria ocorrer, caso não vomitássemos o dinheiro para salvar os bancos.
A primeira Grande Depressão não foi simplesmente o resultado de um erro político no início da crise bancária. Foi causada por dez anos de respostas políticas inadequadas. Se o governo tivesse buscado suficientemente um estímulo agressivo nos marcos dos anos 30, poderia ter restaurado a economia do pleno emprego muito antes de a Segunda Guerra Mundial forçar esse estímulo ao país. Da mesma maneira, fracassar no resgate dos bancos no outono de 2008 não teria necessitado dez anos de política estúpida; uma segunda Grande Depressão jamais foi considerada por eles.
Também é importante desfazer a afirmação de que a retração econômica está sendo perpetrada pela falta de boa vontade dos bancos em emprestar, por conta de seu capital fraco. Essa história não se encaixa nos fatos. A posição de capital de muitos bancos cautelosos está simplesmente bem, e ainda assim eles não estão se esforçando para emprestar e roubar participação em mercado de competidores sequelados. Do mesmo modo, grandes firmas não têm problema em levantar agora capital a custos muito baixos. Ainda assim a Wall-Mart e a Starbucks não estão correndo para ganhar às expensas dos pequenos negócios que não podem emprestar dos bancos. O problema é simplesmente que os consumidores estão sem dinheiro algum: bancos saudáveis não estão emprestando e companhias ricas e endinheiradas não estão expandindo seus negócios, porque a fraca demanda torna qualquer investimento arriscado.
Em resumo, a história da fraqueza econômica sendo resultante de um sistema bancário quebrado é uma completa fabricação. Essa é uma história boa se sua intenção é pegar mais dinheiro para os bancos. Não é uma boa história se o seu objetivo é trazer a economia de volta ao pleno emprego.
A história real é uma simples história da explosão de uma bolha imobiliária. Com o seu auge em 2006, a riqueza criada pela bolha e a bolha menor, de imóveis não residenciais estavam gerando mais de um trilhão de dólares por ano em demanda. Isso tomou a forma de mais de 500 bilhões de dólares em demandas de construções excessivas, com construtores apressados em concluir projetos que lideram os preços inflados da bolha. E também levou a mais 500 bilhões de dólares em consumo adicional, enquanto as pessoas gastaram 8 trilhões de dólares baseados no valor da bolha dos empréstimos de tipo home equity gerados.
Por mais que os economistas gostem de fingir serem magos, eles não têm pouca dificuldade em alocar 1 trilhão de dólares anuais em demanda. O pacote de estímulo de 2009 da administração Obama talvez tenha sido um terço disso, e já era grande o suficiente.
Isso nos leva à questão de por que, em primeiro lugar, tivemos a bolha financeira, o que nos conduz diretamente à questão da desigualdade. Nas três décadas subsequentes à Segunda Guerra Mundial, não houve qualquer bolha relevante na economia. O crescimento da produtividade foi traduzido no crescimento dos salários, que por sua vez legou a mais consumo. O crescimento da demanda levou a mais investimento, crescimento da produtividade e dos salários.
Esse círculo virtuoso foi quebrado na era das políticas de Reagan que visavam a enfraquecer o poder do trabalhador comum. Os salários deixaram de estar vinculados ao crescimento da produtividade, eliminando a ligação automática entre crescimento da produtividade e da demanda. Isso levou a economia a exceder sua capacidade, o que foi plenamente realizado nos anos 90, com a demanda gerada pela bolha de ações e nos anos 2000, com a demanda gerada pela bolha imobiliária.
Se as mudanças institucionais da era Reagan não tivessem enfraquecido o poder de barganha dos trabalhadores, essas bolhas não teriam sido possíveis. A demanda teria sido acompanhada da capacidade de produção da economia. O FED não teria sentido a necessidade de baixar as taxas de juros para sustentar a demanda. Mais ainda, se o FED tivesse qualquer preocupação com a inflação, a qual nesse ambiente teria sido liderada pelo crescimento de salário, jamais teria baixado as taxas de juros, como o fez nos anos 90 e ainda mais na década passada. A queda na taxa de juros sozinha não pode ser culpada pelas bolhas de ações e imobiliária, mas é seguro dizer que essas bolhas não poderiam ter sido ampliadas num ambiente de altas taxas de juros.
Em resumo, o aumento da desigualdade está no centro da atual crise econômica. E como esse aumento na desigualdade não é um processo natural, mas o resultado de uma política consciente, pode ser revertido. Alguns dos remédios são bem conhecidos. Restaurar alguma disciplina aos pagamentos dos executivos seria um grande passo inicial. Uma maneira de fazê-lo seria mudar as regras da governança corporativa e exigir que esses pacotes de compensação fossem aprovados pelos acionistas, onde só os votos diretamente lançados [sem procuração] contariam.
Uma pequena taxa sobre especulação financeira seria um caminho longo para a moderação dos salários multimilionários em Wall Street. A cotação das taxas sendo discutida no Congresso aumentaria os custos dos negócios ao nível do fim dos anos 80 ou início dos 90, mas dariam uma pequena mordida nos lucros dos negócios de curto prazo em que a turma de Wall Street se excede.
Comércio e política de imigração tem sido estruturados para pôr os trabalhadores de baixa formação em competição direta por baixos salários, no mundo em desenvolvimento, pressionando então seus salários para baixo. Nós podemos em vez disso reestruturar o comércio e a política de imigração de maneira a sujeitar profissionais altamente bem remunerados (doutores, advogados, dentistas, etc) para que desempenhem todo o seu potencial em níveis de competição internacional. Isso ajudaria a diminuir os salários dos 2 ou 3% melhor remunerados na distribuição dos salários. E também aumentaria os salários reais para o resto da força de trabalho, ao baixar os preços dos bens e serviços produzidos por esses profissionais.
Finalmente, os sindicatos têm sido há muito a maior força na redução da desigualdade. O que quer que possa ser feito para proteger o direito de organização e que permita aos trabalhadores a opção de organizar sindicatos ajudará a reduzir a desigualdade.
Não é a dificuldade em desenvolver políticas de redução da desigualdade que tem nos levado a uma crise econômica. O problema é ter vontade política para isso.
Dean Baker é codiretor do Center for Economic and Policy Research (CEPR) http://www.cepr.net/ . É autor de Plunder and Blunder: The Rise and Fall of the Bubble e de False Profits: Recovering From the Bubble Economy
Tradução: Katarina Peixoto
A crise financeira produziu muito drama e manchetes, assim como tivemos de assistir ao secretário do Tesouro, ao presidente do Federal Reserve e aos executivos de bancos colapsados acordados nas noites de fins de semana preparando juntos pacotes de resgate. Contudo, esse show era apenas uma nota de pé de página para nós, que não trabalhamos nesses bancos ou que não temos grandes quantias de ativos depositados neles. Os pacotes do FED e do Tesouro foram vendidos como necessários para salvar a economia, mas foram majoritariamente destinados ao resgate do Goldmann Sachs, Citigroup e de outras grandes instituições financeiras.
No pior cenário, os grandes bancos sofreriam uma intervenção do FED e do FDIC, levando a mais incerteza nos mercados financeiros e a uma maré de processos. Isso provavelmente teria resultado numa queda mais aguda do que aquela que experienciamos, mas certamente não a uma segunda Grande Depressão, que os políticos ameaçaram que iria ocorrer, caso não vomitássemos o dinheiro para salvar os bancos.
A primeira Grande Depressão não foi simplesmente o resultado de um erro político no início da crise bancária. Foi causada por dez anos de respostas políticas inadequadas. Se o governo tivesse buscado suficientemente um estímulo agressivo nos marcos dos anos 30, poderia ter restaurado a economia do pleno emprego muito antes de a Segunda Guerra Mundial forçar esse estímulo ao país. Da mesma maneira, fracassar no resgate dos bancos no outono de 2008 não teria necessitado dez anos de política estúpida; uma segunda Grande Depressão jamais foi considerada por eles.
Também é importante desfazer a afirmação de que a retração econômica está sendo perpetrada pela falta de boa vontade dos bancos em emprestar, por conta de seu capital fraco. Essa história não se encaixa nos fatos. A posição de capital de muitos bancos cautelosos está simplesmente bem, e ainda assim eles não estão se esforçando para emprestar e roubar participação em mercado de competidores sequelados. Do mesmo modo, grandes firmas não têm problema em levantar agora capital a custos muito baixos. Ainda assim a Wall-Mart e a Starbucks não estão correndo para ganhar às expensas dos pequenos negócios que não podem emprestar dos bancos. O problema é simplesmente que os consumidores estão sem dinheiro algum: bancos saudáveis não estão emprestando e companhias ricas e endinheiradas não estão expandindo seus negócios, porque a fraca demanda torna qualquer investimento arriscado.
Em resumo, a história da fraqueza econômica sendo resultante de um sistema bancário quebrado é uma completa fabricação. Essa é uma história boa se sua intenção é pegar mais dinheiro para os bancos. Não é uma boa história se o seu objetivo é trazer a economia de volta ao pleno emprego.
A história real é uma simples história da explosão de uma bolha imobiliária. Com o seu auge em 2006, a riqueza criada pela bolha e a bolha menor, de imóveis não residenciais estavam gerando mais de um trilhão de dólares por ano em demanda. Isso tomou a forma de mais de 500 bilhões de dólares em demandas de construções excessivas, com construtores apressados em concluir projetos que lideram os preços inflados da bolha. E também levou a mais 500 bilhões de dólares em consumo adicional, enquanto as pessoas gastaram 8 trilhões de dólares baseados no valor da bolha dos empréstimos de tipo home equity gerados.
Por mais que os economistas gostem de fingir serem magos, eles não têm pouca dificuldade em alocar 1 trilhão de dólares anuais em demanda. O pacote de estímulo de 2009 da administração Obama talvez tenha sido um terço disso, e já era grande o suficiente.
Isso nos leva à questão de por que, em primeiro lugar, tivemos a bolha financeira, o que nos conduz diretamente à questão da desigualdade. Nas três décadas subsequentes à Segunda Guerra Mundial, não houve qualquer bolha relevante na economia. O crescimento da produtividade foi traduzido no crescimento dos salários, que por sua vez legou a mais consumo. O crescimento da demanda levou a mais investimento, crescimento da produtividade e dos salários.
Esse círculo virtuoso foi quebrado na era das políticas de Reagan que visavam a enfraquecer o poder do trabalhador comum. Os salários deixaram de estar vinculados ao crescimento da produtividade, eliminando a ligação automática entre crescimento da produtividade e da demanda. Isso levou a economia a exceder sua capacidade, o que foi plenamente realizado nos anos 90, com a demanda gerada pela bolha de ações e nos anos 2000, com a demanda gerada pela bolha imobiliária.
Se as mudanças institucionais da era Reagan não tivessem enfraquecido o poder de barganha dos trabalhadores, essas bolhas não teriam sido possíveis. A demanda teria sido acompanhada da capacidade de produção da economia. O FED não teria sentido a necessidade de baixar as taxas de juros para sustentar a demanda. Mais ainda, se o FED tivesse qualquer preocupação com a inflação, a qual nesse ambiente teria sido liderada pelo crescimento de salário, jamais teria baixado as taxas de juros, como o fez nos anos 90 e ainda mais na década passada. A queda na taxa de juros sozinha não pode ser culpada pelas bolhas de ações e imobiliária, mas é seguro dizer que essas bolhas não poderiam ter sido ampliadas num ambiente de altas taxas de juros.
Em resumo, o aumento da desigualdade está no centro da atual crise econômica. E como esse aumento na desigualdade não é um processo natural, mas o resultado de uma política consciente, pode ser revertido. Alguns dos remédios são bem conhecidos. Restaurar alguma disciplina aos pagamentos dos executivos seria um grande passo inicial. Uma maneira de fazê-lo seria mudar as regras da governança corporativa e exigir que esses pacotes de compensação fossem aprovados pelos acionistas, onde só os votos diretamente lançados [sem procuração] contariam.
Uma pequena taxa sobre especulação financeira seria um caminho longo para a moderação dos salários multimilionários em Wall Street. A cotação das taxas sendo discutida no Congresso aumentaria os custos dos negócios ao nível do fim dos anos 80 ou início dos 90, mas dariam uma pequena mordida nos lucros dos negócios de curto prazo em que a turma de Wall Street se excede.
Comércio e política de imigração tem sido estruturados para pôr os trabalhadores de baixa formação em competição direta por baixos salários, no mundo em desenvolvimento, pressionando então seus salários para baixo. Nós podemos em vez disso reestruturar o comércio e a política de imigração de maneira a sujeitar profissionais altamente bem remunerados (doutores, advogados, dentistas, etc) para que desempenhem todo o seu potencial em níveis de competição internacional. Isso ajudaria a diminuir os salários dos 2 ou 3% melhor remunerados na distribuição dos salários. E também aumentaria os salários reais para o resto da força de trabalho, ao baixar os preços dos bens e serviços produzidos por esses profissionais.
Finalmente, os sindicatos têm sido há muito a maior força na redução da desigualdade. O que quer que possa ser feito para proteger o direito de organização e que permita aos trabalhadores a opção de organizar sindicatos ajudará a reduzir a desigualdade.
Não é a dificuldade em desenvolver políticas de redução da desigualdade que tem nos levado a uma crise econômica. O problema é ter vontade política para isso.
Dean Baker é codiretor do Center for Economic and Policy Research (CEPR) http://www.cepr.net/ . É autor de Plunder and Blunder: The Rise and Fall of the Bubble e de False Profits: Recovering From the Bubble Economy
Tradução: Katarina Peixoto
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