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Leonardo Boff * Adital
Séculos de guerras, de confrontos, de lutas entre povos e de conflitos
de classe nos estão deixando uma amarga lição. Este método primário e
reducionista não nos fez mais humanos, nem nos aproximou mais uns dos
outros e muito menos nos trouxe a tão ansiada paz. Vivemos em permanente
estado de sítio e cheios de medo. Alcançamos um patamar histórico que,
nas palavras da Carta da Terra, "nos conclama a um novo começo". Isto
requer uma pedagogia, fundada numa nova consciência e numa visão
includente dos problemas econômicos, sociais, culturais e espirituais
que nos desafiam.
Esta nova consciência, fruto da mundialização, das ciências da Terra
e da vida e também da ecologia nos está mostrando um caminho a seguir:
entender que todas as coisas são interdependentes e que mesmo as
oposições não estão fora de um Todo dinâmico e aberto. Por isso, não
cabe separar mas compor, incluir ao invés de excluir, reconhecer, sim,
as diferenças mas também buscar as convergências e no lugar do
ganha-perde, buscar o ganha-ganha.
Tal perspectiva holística vem infuenciando os processos
educativos. Temos um mestre inolvidável, Paulo Freire, que nos ensinou a
dialética da inclusão e a colocar o "e" onde antes púnhamos o "ou".
Devemos aprender a dizer "sim" a tudo aquilo que nos faz crescer no
pequeno e no grande.
Frei Clodovis Boff acumulou muita experiência trabalhando com os
pobres no Acre e no Rio de Janeiro. Na esteira de Paulo Freire,
entregou-nos um livrinho que se tornou um clássico: "Como trabalhar com o
povo". E agora face aos desafios da nova situação do mundo, elaborou um
pequeno decálogo daquilo que poderia ser uma pedagogia renovada. Vale a
pena transcrevê-lo e considerá-lo pois nos pode ajudar e muito.
1."Sim ao processo de conscientização, ao despertar da consciência crítica e ao uso da razão analítica (cabeça). Mas sim também à razão sensível (coração) onde se enraizam os valores e de onde se alimentam o imaginário e todas as utopias.
2. Sim ao "sujeito coletivo" ou social, ao "nós" criador de história ("ninguém liberta ninguém, nos libertamos juntos"). Mas também sim à subjetividade de cada um, ao "eu biográfico", ao "sujeito individual" com suas referências e sonhos.
3. Sim à "praxis política", transformadora das estruturas e geradora de novas relações sociais, de um novo "sistema". Mas sim
também à "prática cultural" (simbólica, artística e religiosa),
"transfiguradora" do mundo e criadora de novos sentidos ou,
simplesmente, de um novo "mundo vital".
4. Sim à ação "macro" ou societária (em particular à "ação revolucionária"), aquela que age sobre as estruturas. Mas sim também à ação "micro", local e comunitária ("revolução molecular") como base e ponto de partida do processo estrutural.
5. Sim à articulação das forças sociais sob a forma de "estruturas unificadoras" e centralizadas. Mas sim
também à articulação em "rede", na qual por uma ação decentralizada,
cada nó se torna centro de criação, de iniciativas e de intervenções.
6. Sim à "crítica" dos mecanismos de opressão, à denúncia das injustiças e ao "trabalho do negativo". Mas sim também às propostas "alternativas", às ações positivas que instauram o "novo" e anunciam um futuro diferente.
7. Sim ao "projeto histórico", ao "programa político" concreto que aponta para uma "nova sociedade". Mas sim também às "utopias", aos sonhos da "fantasia criadora", à busca de uma vida diferente, em fim, de "um mundo novo".
8. Sim à "luta", ao trabalho, ao esforço para progredir, sim à seriedade do engajamento. Mas sim também à "gratuidade" assim como se manifesta no jogo, no tempo livre, ou simplesmente, na alegria de viver.
9. Sim ao ideal de ser "cidadão", de ser "militante" e "lutador", sim a quem se entrega, cheio de entusiasmo e coragem, à causa da humanização do mundo. Mas também sim à figura do "animador", do "companheiro", do "amigo", em palavras pobres, sim a quem é rico de humanidade, de liberdade e de amor.
10. Sim a uma concepção "analítica" e científica da sociedade e de suas estruturas econômicas e políticas. Mas sim
também à visão "sistêmica" e "holística"da realidade, vista como
totalidade viva, integrada dialeticamente em suas várias dimensões:
pessoal, de gênero, social, ecológica, planetária, cósmica e
transcendente."
* Teólogo, filósofo e escritor