sábado, 14 de maio de 2011

Marcio Pochmann: o que fazer para aperfeiçoar o Estado social


O Estado moderno no Brasil ganhou passos relevantes desde a Revolução de 30. Ademais de reverter a longa trajetória liberal consagrada pelo Estado mínimo, que exercia fundamentalmente o monopólio da violência (concedido às forças policiais e militares), da emissão monetária (unidade monetária e criação de moeda) e da tributação (arrecadação fiscal), houve a construção da ossatura inicial do Estado social.


Por Marcio Pochmann, no Valor Econômico via VERMELHO

De um lado, a atuação do Ministério da Fazenda convergindo com os interesses do capital urbano em meio aos esforços da industrialização nacional enquanto de outro a ação integradora do Ministério do Trabalho orientando a organização do mercado formal de trabalho por meio da garantia dos direitos sociais e trabalhistas.

Sem interromper o curso dessa mesma trajetória, o regime militar (1964-1985) notabilizou-se pelo maior fortalecimento das ações do Ministério da Fazenda (combate à inflação, elevação das exportações, entre outras) simultaneamente ao enfraquecimento do Ministério do Trabalho, mais sensível à repressão de dirigentes sindicais e aplicação da legislação de arrocho salarial.

Em função disso, as medidas de caráter social e trabalhista, como o Funrural e a inclusão dos trabalhadores rurais à Consolidação das Leis do Trabalho, se mostraram incapazes para reduzir a discrepância entre o avanço econômico e a letargia social.

A crise da dívida externa no início da década de 1980 explicitou a intransparência na gestão pública a partir da existência de vários orçamentos públicos (monetário, fiscal, previdência social e das empresas estatais) à margem de qualquer controle democrático. Com a recessão econômica geradora do desemprego e do rebaixamento das condições de trabalho, a desorganização das finanças públicas terminou sendo respondida pelos governos democráticos por meio de um novo patamar para a gestão da economia.

Isto é, a modernização gradual e contínua da atuação do Ministério da Fazenda, com o fim da escandalosa conta-movimento e a criação da Secretaria do Tesouro Nacional, que completa 25 anos de existência. Além disso, a unificação orçamentária e a presença de representantes da sociedade na gestão dos fundos públicos foram confirmadas pela Constituição de 1988.

Ao longo da década de 1990, outras inovações na atuação do Ministério da Fazenda ocorreram em paralelo ao esvaziamento de sua capacidade de coordenação e implementação das políticas industrializantes. Destacam-se, por exemplo, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a definição de metas de superávit fiscal e de inflação. Com base nisso, a sociedade passou a acompanhar e a julgar o desempenho dos governos com base no cumprimento das metas estabelecidas pela equipe econômica.

Não obstante os avanços do regime democrático, a área social não perseguiu o mesmo sentido reorganizativo registrado pela condução econômica dos governos. O Ministério do Trabalho, por exemplo, não recuperou plenamente o seu protagonismo do período pré-regime militar, embora a área social tenha ampliado funções e capacidade de gasto público, ainda que acompanhada de sua maior fragmentação institucional.

O fortalecimento dos grandes complexos do Estado social (saúde, educação, previdência e assistência social) permitiu que a despesa social agregada quase dobrasse em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) durante os últimos 25 anos. Afora a programação por setor de governo, a área social seguiu sem a existência de metas globais, como havia ocorrido na esfera econômica, o que tornou mais difícil à sociedade avaliar a sua capacidade de mudar a realidade nacional.

Por conta disso, a recente decisão do governo Dilma de definir o valor de uma linha nacional de pobreza extrema tem o mérito político de estabelecer as bases do aperfeiçoamento do Estado social no Brasil. Por não ser um mero valor monetário definidor da dimensão dos extremamente pobres, a linha de pobreza extrema estabelece a dimensão multidisciplinar das carências da base da pirâmide social e que precisam ser globalmente atendidas pelas mais diversas políticas públicas.

Em síntese, tem-se a metodologia pela qual deve ser privilegiada a ação do Estado social para atender a adultos analfabetos, crianças sem creches, adolescentes e jovens sem escolas, famílias sem renda e sem emprego, domicílios sem eletricidade, transporte e saneamento, entre outras tantas dimensões da pobreza extrema. A partir de agora, a sociedade tem condições de avaliar a atuação governamental no cumprimento das metas tanto para a economia (inflação e de superávit fiscal) como para a área social (pobreza extrema em suas variadas e complexas formas de manifestação).

Nesse contexto, a seminal experiência de implantação dos territórios de cidadania pelo governo Lula indicou a possibilidade de novos êxitos nas inovadoras ações sociais matriciais. Assim como o trabalhador sem-terra não se contenta mais com o acesso à propriedade fundiária, pois necessita de um conjunto de políticas públicas (posto de saúde, escola, estrada, transporte, energia elétrica, tecnologia, crédito, assistência técnica etc.), o cidadão extremamente pobre precisa contar com uma rede de políticas públicas voltadas à superação plena de sua condição social desfavorável.

A universalização da presença do Estado social para todos os brasileiros, especialmente para aqueles que mais precisam, representa um salto no enfrentamento de uma das mais graves mazelas sociais que atingem mais de 16 milhões de pessoas na condição de extrema pobreza. Isso pressupõe o comando único na estratégia de ações capazes de permitir o cumprimento da meta de superação da pobreza extrema concomitantemente com cronograma e orçamento estabelecidos transparentemente por decisão governamental.

Nesses termos, os programas de transferência de renda introduzidos pela administração federal em sequência às exitosas experiências de Campinas e do Distrito Federal respondem por importante salto organizativo na luta contra a pobreza. O que já fora possível ter sido superado ao final da década de 1970, quando o país ocupava a 8ª posição na economia mundial, encontra-se, agora, diante de uma nova oportunidade — o alcance da superação da pobreza extrema paralelamente ao horizonte de assumir a condição de 5ª economia do mundo.
A atuação precisa e ampla do governo no cumprimento da meta social, monitorada e avaliada pela sociedade, constitui passo significativo no aperfeiçoamento do Estado social brasileiro.

* Marcio Pochmann é presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e professor licenciado da Unicamp

Terrorismo de Estado


Não se combate a ação terrorista, suposta ou verdadeira, com outras ações terroristas. O Estado tem que ter a obrigação de agir seguindo as leis, a Constituição, o direito internacional, aqueles elementos que a humanidade vem construindo ao longo de séculos e que nos permitem a identificação como cidadãos, como países civilizados.


Poucas vezes paramos para refletir sobre um tema que não tem como objeto imediatamente o nosso País, ou nosso Estado. Porém com a realidade da política internacional, discutir a defesa da soberania nacional dos povos e dos direitos humanos, passa a se tratar de algo que tem a ver com qualquer ser humano, tem a ver com as nossas relações cada vez mais globalizadas.

Refiro-me aos acontecimentos que tomaram conta das manchetes, em especial nos últimos dias, quando o presidente da maior potência do mundo levanta de madrugada para anunciar em cadeia de televisão, com um ar triunfalista e ufanista, que o povo americano, através de seu governo, acabava de matar um adversário, um pretenso e suposto adversário, também suposto responsável pelos acontecimentos marcantes naquele 11 de setembro, que destruiu as torres gêmeas em Nova Iorque.

Que mundo é esse em que um presidente da República declara abertamente que o poder público matou um suposto terrorista?

No dia anterior a força aérea da OTAN, Organização do Tratado do Atlântico Norte, que é um braço dos Estados Unidos e da União Européia, bombardeou uma casa, matando os netos e o filho do chefe do governo da Líbia, Muamar Kadafi. Isso também em nome de uma guerra santa e em nome de que o País vive uma guerra civil e, ao mesmo tempo, com a pretensa autorização da Organização das Nações Unidas para que a OTAN ou os Estados Unidos passem a ser o parâmetro, a régua do mundo para estabelecer em que guerra civil podem intervir ou em que situação interna de um país podem intervir, sequestrar ou matar.

Apesar de parecer algo muito distante de todos nós, apesar de parecer que esses fatos se esgotam na capa de um jornal, de uma revista, numa manchete de televisão, que mundo é esse em que as relações internacionais acabaram nessa verdadeira carnificina que estamos vendo sustentada e orientada, inclusive, pela própria complacência e conivência das Nações Unidas, que aparentemente legitimam esses fatos?

Já estamos acostumados com os acontecimentos do Afeganistão. Vimos o que ocorreu na guerra do Iraque: após a invasão e a morte de centenas de milhares de pessoas, a imprensa americana passou a dizer que o ex-presidente Bush realmente havia mentido à população sobre os verdadeiros motivos ou sobre as razões que teriam levado àquela invasão.

E a punição? Quem julga esses fatos como legítimos, legais? Como se estabelece esse critério?

É impossível não reconhecer que grande parte das rebeliões que ocorrem no norte da África e no Oriente Médio, além de toda e qualquer rebelião popular, que muitas vezes assumem características chamadas de terroristas, não passam de ações de desespero. Exatamente pela ausência absoluta de uma democracia para regular as relações sociais, as relações entre as pessoas ou o respeito à soberania e à autodeterminação entre os países.

Quando os poderosos se dão ao luxo de matar sem julgamento, sem condenação prévia, sem qualquer critério minimamente de acordo com as mais elementares bases de uma relação internacional e bombardeiam a família de dirigentes, matam os seus filhos e netos, estamos realmente diante de um mundo preocupante, de um mundo em que nós estabelecemos relações que nos levam a uma verdadeira selvageria.

Ora, as grande potências mundiais teriam que ser as primeiras a dar o exemplo. No combate ao terrorismo, no combate a atos isolados ou a atos coletivos, que também são condenáveis. O Estado tem que ter a obrigação de agir seguindo exatamente a observância das leis, da Constituição, do direito internacional, daqueles elementos que a humanidade vem construindo ao longo de séculos e que nos permitem a identificação como cidadãos, como países civilizados.

Essas questões são fundamentais. Quem tem a força, quem tem o poder das grandes potências deve ser o primeiro a dar o exemplo para que as regras, as leis e as normas sejam cumpridas. Não se combate a ação terrorista, suposta ou verdadeira, com outras ações terroristas.

Isso simplesmente estabelece, ou melhor, legaliza um terrorismo de Estado – que é o que estamos vendo ocorrer crescentemente no mundo. Temos, por exemplo, o campo de concentração em Guantánamo, onde as pessoas são presas em qualquer parte do mundo, sem guerra declarada, sem culpa formada, sem decisão transitada em nenhum processo e ali ficam, um ano, dois anos, cinco anos, 10 anos, a critério exclusivo de quem as prendeu, ou seja, a CIA, e o governo dos EUA.

Que regra internacional vai ser observada? Como se pode cobrar depois de um ato insano – como foi o caso do dia 11 de setembro – quando governantes do mesmo país são os maiores terroristas mundiais, a exemplo das ações que desenvolvem nos mais variados cantos do mundo: Guantánamo, Afeganistão, Iraque, Paquistão, e agora na Líbia. Tortura-se em Guantánamo, invade-se militarmente um país soberano, mata-se pessoas e jogam o cadáver ao mar em nome do combate ao terrorismo.

É lamentável a ação de uma figura como Barack Obama, que foi eleito com a expectativa de grandes mudanças, de grandes transformações, não só pela sua origem, pela sua condição de negro num país que, até décadas atrás, era declaradamente racista. Tudo aquilo que prometeu – o retorno imediato das tropas espalhadas pelo mundo, a pacificação do mundo – não foi cumprido. Estamos vendo uma figura lamentável, cada vez mais triste, desse presidente que se transforma, hoje, em refém da velha máquina de guerra, dos velhos imperialistas americanos que controlam uma indústria bélica brutal e que vêem nisso o instrumento e o mecanismo de dominação do mundo.

Pode parecer que essa questão nada tenha a ver com nosso cotidiano, com o nosso dia-a-dia. Porém é impossível, diante dessas manchetes, diante desses acontecimentos, que nós não manifestemos ao menos a nossa opinião, a nossa inconformidade e a nossa indignação com esses comportamentos. Tais atitudes, que não contribuem em nada e não cumprem nenhum papel de recuperação, de qualquer tentativa de caracterizar a nossa civilização como realmente uma civilização e não uma barbárie em que se está transformando o mundo cada vez mais por este tipo de ação.

(*) Deputado estadual (PT) e presidente do PT-RS.

Karl Marx, 193 anos


 
  Karl Marx nasce em 5 de maio de 1818, em Trier, na Renânia, filho de judeus alemães convertidos ao cristianismo. Seu pai era um liberal admirador do Iluminismo e a família Marx tinha como vizinho o alto funcionário do governo da Prússia, barão Ludwig Von Westphalen, culto aristocrata, pai de Jenny, futura esposa do jovem Marx.
Eduardo Mancuso *

“transformar o mundo”, disse Marx, “mudar a vida”, disse Rimbaud – para nós essas duas palavras de ordem são apenas uma.
                                                                                           (André Breton)

Em 1841, após alguns anos na universidade – em Bonn e Berlim – onde conhece a obra filosófica de Hegel, Marx aprova sua tese de doutorado sobre os pensadores gregos Demócrito e Epicuro, mas o reacionário governo prussiano recusa uma cátedra ao jovem doutor. Ele assume então a direção do jornal A Gazeta Renana, mas sua linha editorial democrático radical leva o governo a fechá-lo. Em 1843, casa-se com Jenny e emigra para Paris, onde conhece Engels , mergulha na história da Revolução Francesa e do socialismo e na efervescência das sociedades e dos clubes operários.
Em 1844, Marx colabora na publicação dos Anais Franco-Alemães e redige os Manuscritos econômico-filosóficos, também conhecidos como Manuscritos de Paris. Nessa obra de juventude, Marx define o comunismo como a superação da “pré-história” humana, e faz uma lúcida previsão:
Para superar o pensamento da propriedade privada, basta o comunismo pensado. Para suprimir a propriedade privada efetiva, é necessária uma ação comunista efetiva. A história virá trazê-la, e aquele movimento que já conhecemos em pensamento como um movimento que se supera a si mesmo percorrerá na realidade um processo muito duro e muito extenso.
Em 1845, Marx e Friederich Engels já haviam estabelecido uma sólida amizade e uma parceria política e intelectual que duraria décadas, e que se inicia com a elaboração a quatro mãos de A sagrada família, cujo subtítulo era Crítica de uma crítica crítica (apresentação sarcástica das idéias metafísicas de alguns filósofos idealistas alemães), em que definem a essência da sua concepção humanista e materialista da história: A história nada faz, ela “não possui nenhuma riqueza imensa”, “não trava nenhuma batalha”. É o homem, o homem vivo, real, que faz tudo isto, que possui e luta; a “história” não é uma pessoa à parte, que usa o homem para seus próprios fins particulares; a história nada é senão a atividade do homem que persegue seu objetivo...
Nesse mesmo ano, expulso da França, Marx vai para Bruxelas, Bélgica. Ele escreve, então, as geniais e concisas Teses sobre Feuerbach, breves anotações feitas pelo jovem de 27 anos em seu caderno, marcadas por um humanismo radical e revolucionário que inaugura a filosofia da práxis. Engels as chamou de “germe genial de uma nova concepção do mundo”. Com as Teses sobre Feuerbach, Marx lança as bases de “um novo materialismo”, profundamente dialético e distinto do materialismo vulgar existente até então. Na tese 2, Marx afirma a prática como critério de verdade:
A questão de saber se é preciso conceder ao pensamento humano uma verdade objetiva não é uma questão de teoria, porém uma questão prática. É na prática que o homem deve comprovar a verdade, isto é, a realidade efetiva e a força, o caráter terrestre de seu pensamento.
Na tese 3, a prática revolucionária aparece como síntese da mudança do mundo e da autotransformação:
A doutrina materialista da mudança das circunstâncias e da educação se esquece de que as circunstâncias são mudadas pelos homens e que o próprio educador deve ser educado. (...) A coincidência da mudança das circunstâncias e da atividade humana ou autotransformação só pode ser interpretada e racionalmente compreendida como prática revolucionária.
E conclui suas anotações com a célebre tese 11:
Os filósofos apenas interpretaram o mundo de forma diferente, o que importa é mudá-lo.
Em 1846, Marx e Engels concluem mais um trabalho conjunto, os dois volumes de A ideologia alemã. O manuscrito não foi publicado e ficou entregue “à crítica roedora dos ratos” segundo os próprios autores (sua primeira edição vem a público apenas no século XX). A ideologia alemã apresenta a definição clássica sobre a dominação ideológica:
As idéias da classe dominante são, em cada época, as idéias dominantes; isto é, a classe que é a força material dominante da sociedade é, ao mesmo tempo, sua força espiritual dominante.  A classe que tem à sua disposição os meios de produção material dispõe, ao mesmo tempo, dos meios de produção espiritual, o que faz com que a ela sejam submetidas, ao mesmo tempo e em média, as idéias daqueles aos quais faltam os meios de produção espiritual.
Em 1847, Marx publica A miséria da filosofia, uma crítica da doutrina contida na “filosofia da miséria” do pensador anarquista Proudhon. Segundo Engels  A miséria da filosofia também apresenta “os princípios fundamentais de suas novas concepções históricas e econômicas”; esboça também a teoria sobre o sujeito revolucionário:
De todos os instrumentos de produção, a maior força produtiva é a própria classe revolucionária. (...) A condição de emancipação da classe operária é a abolição de todas as classes (...).  No transcurso de seu desenvolvimento, a classe operária substituirá a antiga sociedade civil por uma associação que exclua as classes e seu antagonismo; e não existirá já em poder político propriamente dito, pois o poder político é, precisamente, a expressão oficial do antagonismo de classe, dentro da sociedade civil. Enquanto isso, o antagonismo entre o proletariado e a burguesia é a luta de uma classe inteira contra outra classe, luta que, levada a sua mais alta expressão, implica numa revolução total.
Marx e Engels ingressam na Liga dos Comunistas (antiga Liga dos Justos, organização de trabalhadores alemães emigrados), e redigem o programa do movimento. O Manifesto do Partido Comunista fica pronto e é editado no início de 1848, pouco antes de explodir as revoluções européias, a Primavera dos Povos, que apesar da derrota abre um novo período da luta de classes em escala internacional. Um espectro ronda a Europa, o espectro do comunismo, assim inicia o mais famoso panfleto político de todos os tempos, que apresenta como pressuposto que a história de todas as sociedades até o presente é a história das lutas de classes, resume a dialética da modernidade com a metáfora tudo que é sólido desmancha no ar, e conclui com a palavra de ordem: Proletários de todos os países, uni-vos!
Antevisão genial da globalização capitalista, o Manifesto é mais atual hoje do que há 150 anos. Para o sociólogo Michael Lowy, a atualidade do Manifesto Comunista se origina de suas qualidades ao mesmo tempo críticas e emancipadoras, isto é, da unidade indissolúvel entre a análise do capitalismo e o chamado à sua destruição, entre o exame lúcido das contradições da sociedade burguesa e a utopia revolucionária de uma sociedade solidária e igualitária.
Ainda em 1848, Marx e Engels voltam para a Alemanha e se instalam em Colônia, onde lançam o jornal Nova Gazeta Renana, mas o processo revolucionário reflui e Marx faz o balanço político do movimento em As lutas de classes na França, no qual conclui que o fim do ciclo das revoluções burguesas abriria a época das revoluções proletárias. Em março de 1850, na Mensagem ao Comitê Central da Liga dos Comunistas, Marx utiliza pela primeira vez o conceito de “revolução permanente” como o processo que levaria “até a conquista do poder estatal pelo proletariado” e “não em um único país, mas em todos os países dominantes do mundo inteiro”.
A partir daí, Marx fixa residência em Londres, onde passa anos na completa miséria, a ponto de algumas vezes não poder ir ao Museu Britânico, onde realiza suas pesquisas, em razão de ser obrigado a penhorar seu casaco de inverno para poder comprar papel e continuar escrevendo. Em 1852, ele escreve outra obra-prima, O dezoito brumário de Luis Bonaparte, sobre o golpe de estado de Napoleão III na França. As suas primeiras linhas são célebres:
Hegel observa, em uma de suas obras, que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa. (...) Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado.
Entre 1857-58, Marx redige vários manuscritos que dão origem aos chamados Grundrisse (Elementos fundamentais para a Crítica da Economia Política), que só serão conhecidos um pouco antes da Segunda Guerra Mundial, publicados pelo Instituto Marx-Engels –Lenin de Moscou, sem maior divulgação. Devido à sua importância na evolução intelectual da obra teórica de Marx, os Grundrisse são considerados por alguns analistas como uma espécie de “elo perdido” entre o “jovem Marx” e a sua obra da maturidade.
Em 1859, Marx publica Contribuição à Crítica da Economia Política, e no seu famoso prefácio resume as linhas gerais da sua concepção materialista da história:
Nas minhas pesquisas, cheguei à conclusão de que as relações jurídicas – assim como as formas de Estado – não podem ser compreendidas por si mesmas, nem pela dita evolução geral do espírito humano, inserindo-se, pelo contrário, nas condições materiais de existência... A conclusão geral a que cheguei e que, uma vez adquirida, serviu de fio condutor dos meus estudos, pode formular-se resumidamente assim: na produção social da sua existência, os homens estabelecem relações determinadas necessárias, independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a um determinado grau de desenvolvimento das forças produtivas materiais. O conjunto dessas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base concreta sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e a qual correspondem determinadas formas de consciência social. O modo de produção da vida material condiciona o desenvolvimento da vida social, política e intelectual em geral. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; é o seu ser social que, inversamente, determina a sua consciência. Em certo estágio de desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes ou, o que é a sua expressão jurídica, com as relações de propriedade no seio das quais se tinham movido até então. De formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas relações transformam-se no seu entrave. Surge então uma época de revolução social.
Durante sua primeira década em Londres, o único rendimento de Marx era como colaborador do jornal Tribuna de Nova York, mas após esse período dificílimo, Engels garante a ele uma ajuda financeira regular, e um grande amigo, o militante comunista Wilhelm Wolf, deixa-lhe uma pequena herança. Marx dedica a ele o primeiro volume de O Capital (1867), que não consegue concluir em vida (Engels edita o volume II em 1885 e o volume III em 1894). Antes de publicar O Capital, Marx termina os três volumes intitulados Teorias da mais-valia, em que analisa criticamente o pensamento teórico sobre a economia política, particularmente o de Adam Smith e David Ricardo.
Em 1864, um congresso realizado em Londres funda a Associação Internacional dos Trabalhadores (Primeira Internacional) e Marx redige o seu Manifesto Inaugural, onde assinala que a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores. Durante o breve período de existência da Internacional, Marx se dedica a sua organização e assume a condição de principal dirigente do Conselho Geral. A derrota da Comuna de Paris, em 1871, quando o povo parisiense toma o poder na capital durante mais de dois meses e implanta um governo democrático revolucionário, mas é esmagado pelo exército francês em um banho de sangue, sela o destino da Internacional. Para Marx, a Comuna é a primeira “ditadura do proletariado” da história (baseada no armamento do povo e no voto direto e universal), e mostra que o governo dos trabalhadores precisa destruir o Estado burguês e erguer um estado controlado democraticamente pelos produtores associados, destinado a desaparecer historicamente junto com a divisão da sociedade em classes sociais. Marx presta homenagem a Comuna de Paris publicando A guerra civil em França, e propõe ao Congresso da Internacional de 1872, realizado na Holanda, a transferência da sede da organização para os Estados Unidos, em razão da repressão generalizada que se segue ao massacre da Comuna; porém, a Primeira Internacional deixa de funcionar em 1876.
A partir da década de 1870, declina a capacidade de trabalho de Marx, em face do agravamento do seu estado de saúde, mas, preocupado com o programa adotado pelos socialistas alemães, em 1875 escreve a Crítica ao Programa de Gotha:
Entre a sociedade capitalista e a sociedade comunista media o período da transformação revolucionária da primeira na segunda. A este período, corresponde também um período político de transição, cujo Estado não pode ser outro que a ditadura revolucionária do proletariado.
Em 1882, no prefácio da edição russa do Manifesto Comunista, Marx realiza uma previsão ao mesmo tempo heterodoxa (para os padrões do socialismo até então) e genial: que uma revolução na Rússia pode constituir-se no sinal para a revolução proletária no Ocidente, de modo que uma complemente a outra. Em 1883, após a morte de sua esposa e de sua filha mais velha, Marx falece e é enterrado no cemitério de Highgate.
Dois séculos depois do desaparecimento do “pensador socialista que maior influência exerceu sobre o pensamento filosófico e social e sobre a própria história da humanidade”, conforme ressalta verbete do Dicionário do Pensamento Marxista; após a social-democracia e o stalinismo terem sido remetidos para a “lata do lixo da história”; e em plena crise sistêmica do capitalismo globalizado, que já ameaça a continuidade da vida humana no planeta; podemos seguramente concordar com o marxista norte-americano Marshall Berman: “Marx está vivo. E vai bem de saúde”.
    
* Eduardo Mancuso é historiador e do comitê organizador do Forum Social Temático "Justiça social e ambiental" - Porto Alegre 2012.

Uruguai pede “aviso prévio” e revela insatisfação com barreiras comerciais no Mercosul


Jose Mujica: descontente com os parceiros do Mercosul - Foto: Presidencia.gub.uy

Igor Natusch no Sul21

O bloco que surgiu como a oportunidade de revolucionar a relação econômica entre os países do Mercosul dá sinais de estar vivendo um momento no qual o livre comércio não é, no fim das contas, tão livre assim. As barreiras erguidas entre os principais países do Cone Sul dificulta a circulação entre as portas do comércio sul-americano e provoca revolta em países de menor força econômica, que se dizem prejudicados por seus irmãos mais avantajados. O novo capítulo nas tensões dentro do Mercosul ocorreu na última quinta-feira (12), quando o presidente uruguaio José Mujica pediu um aviso prévio de 15 dias úteis antes da adoção de medidas protecionistas por parte dos integrantes do bloco.
Na proposta, solicita-se também que os anúncios devem ir além das tradicionais licenças não automáticas, englobando todos os tipos possíveis de protecionismo. A declaração, aparentemente dotada de um toque de ironia, revela também a insatisfação do Uruguai com o modo como os integrantes do Mercosul, em especial a Argentina e o Brasil, conduzem a relação econômica com os países vizinhos, muitas vezes indo contra o caráter de livre comércio que se espera de um bloco econômico do tipo.
Em fevereiro, medidas protecionistas adotadas pelo governo argentino passaram a dificultar a entrada de 585 produtos fabricados no Uruguai, atingindo especialmente os setores têxtil, plástico e de couro. Em conversas com empresários, Mujica já havia criticado a aplicação de medidas não alfandegárias dentro do bloco econômico – que, somadas com as “dimensões colossais” de Brasil e Argentina, acabam influindo até mesmo na escolha de empresas multinacionais, que acabam ignorando o Uruguai e instalando unidades nos países vizinhos.
Fraquelli: “O Uruguai sempre teve restrições com relação ao Mercosul” - Foto: Divulgação/ FEE

“O Uruguai sempre teve restrições com relação ao Mercosul”, conta Antônio Carlos Fraquelli, economista da FEE. Como exemplo, Fraquelli lembra que o ex-presidente uruguaio Jorge Batlle Ibáñez chegou a sugerir que o país deixasse o Mercosul, estabelecendo a partir daí uma relação comercial bilateral com os EUA. “E Batlle é um colorado, não um blanco. Ou seja, um político menos conservador”, acentua Fraquelli. No contexto uruguaio, portanto, não se trata de uma indignação inédita, diz o economista.
Ciente de que a cutucada de José Mujica podia provocar desconforto em Buenos Aires e Brasília, coube a Sebastián Torres, diretor nacional de Indústrias do Uruguai, explicar com mais detalhes a quais tipos de barreira referem-se o pedido de antecedência do governo uruguaio. A lista inclui cotas, disposições sobre etiquetados, requisitos técnicos, exigência de apresentação de certificados para autorizar a importação, medidas sanitárias e relação critério-valor. Contatado pela reportagem do Sul21, o Itamaraty disse não ter conhecimento das declarações de Mujica e, portanto, não estar preparado para comentar o caso.

Licenças não automáticas para veículos dividem Brasil e Argentina

Não é apenas na relação com países menos influentes dentro do Mercosul, como Uruguai e Paraguai, que as aparentes contradições do modelo se fazem sentir. O Brasil determinou nessa sexta-feira (13) que as licenças para a entrada de veículos importados no país não serão mais concedidas de forma automáticas, podendo demorar até dois meses. A medida está sendo interpretada por alguns analistas como uma retaliação ao comportamento protecionista da Argentina.
Presidencia/AR
Cristina Kirchner, presidente da Argentina - Foto: Presidencia/AR

Em resposta, a ministra da Indústria da Argentina, Débora Giorgi, enviou uma carta ao colega brasileiro Fernando Pimentel, na qual garante a “inexistência de um impacto negativo sobre as exportações do Brasil à Argentina” no que toca às medidas adotadas pelo governo de Cristina Kirchner. Acrescentando que desde 2003 a Argentina manifesta preocupação com o “persistente e crescente déficit comercial” entre os dois países, Débora Giorgi conclui dizendo que o Brasil tem imposto dificuldades à entrada de vários produtos argentinos no mercado nacional, de forma que não se justificariam as críticas feitas pelo setor privado brasileiro.
De acordo com o economista Antônio Carlos Fraquelli, as discordâncias se acentuam na medida em que o Mercosul não é nem mesmo um bloco econômico, ao menos não aos moldes europeus. “Trata-se de uma iniciativa para integrar mercados”, explica. Falta, segundo ele, mecanismos existentes no modelo da Europa, como a adoção de institutos monetários ou de um Banco Central do Mercosul. De qualquer modo, o economista da FEE acredita que o Mercado Comum do Sul já viveu momentos mais complicados. “O Mercosul nasceu quando Brasil e Paraguai, por exemplo, tinham que lidar com inflações altíssimas”, relembra. Apesar das barreiras internas, a corrente de comércio cresce dentro do Mercosul, de acordo com Fraquelli, especialmente em função da presença de produtos de origem chinesa no continente.
A própria situação dos países mais fortes do bloco parece ser um sinal de que o Mercosul vai estar subjugado, mesmo que temporariamente, aos interesses dos principais atores econômicos da região. “O Brasil, no momento, está às voltas com os índices de inflação”, diz o economista da FEE. “A Argentina, por sua vez, está encarando uma guerra para controlar a dívida pública, entrou em conflito com os produtores rurais, maquia a própria inflação. São países que estão, nesse momento, preocupados com os próprios problemas. O Mercosul, para eles, fica meio que em standby. E países como o Uruguai e o Paraguai acabam ficando em uma situação de menor relevância no Cone Sul”.
A definição a respeito do pedido uruguaio deve ficar para a cúpula do Mercosul que se realizará em Assunção (Paraguai), no final de junho. A ideia da cúpula, que era celebrar os 20 anos do Mercosul, deve ficar para trás – afinal, o que conta agora é aparar as arestas e diminuir tensões, em nome da continuidade do bloco econômico do Cone Sul.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

A intolerância é desumanização

 
Do blog de Manuela D'Ávila
 
Porto Alegre tem como uma de suas marcas, a defesa da garantia e da promoção dos Direitos Humanos. A capital gaúcha – terra do Fórum Social Mundial e da participação popular – deu mais uma vez, ontem, prova dessa marca. Cerca de 850 pessoas participaram da atividade que recebeu o sociólogo e professor português, Boaventura de Souza Santos, reconhecido internacionalmente pelo trabalho nesta área.

A deputada Manuela d`Ávila, presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, ressaltou a importância de um evento como esse em Porto Alegre. “Temos trabalho junto à CDHM no combate a todas as formas de intolerância. Esse mal atinge milhões de brasileiros que sofrem com o preconceito descabido e com a intolerância de uma pequena parte da nossa sociedade. Ouvir o professor Boaventura mais uma vez reforça nossa luta e nosso trabalho”, disse. Manuela afirmou, também, que "mais do que mudar e criar leis, é preciso mudar a cultura do nosso povo, ou seja, a cultura que ainda valoriza a intolerância e que nos faz vivermos casos de violência exacerbada".
O professor Boaventura falou sobre as diferentes manifestações de intolerância e, também, sobre as formas de fascismo existentes ainda hoje. Disse ele, ainda, que "quando a democracia deixa de ser uma bandeira apenas do povo e passa a ser item do Banco Mundial é preciso refletir. Tantos possuidores de direitos que não os exercem, às vezes destroem a democracia mantendo-a. Isso porque o conceito de democracia é insuficiente”.
Sobre os entraves no exercício da democracia, o professor lembrou que a cidadania é um conjunto de direitos que a gente tem por fazermos parte de um Estado Nação. Na democracia, portanto, temos o poder partilhado. “Hoje, nos vemos, porém, que as instituições estão a perder capacidades de atuação”. Para Boaventura, o nosso tempo é um tempo complexo e contraditório. “O neoliberalismo é uma forma antissocial do capitalismo”, disse.
Para o sociólogo, as maiores manifestações de democracia vieram antes das instituições, revoluções e participação popular. Além disso, trouxe para a discussão a questão das redes sociais, que ocupam cada vez mais espaços no cotidiano das pessoas. Para Boaventura, esse espaço existe e torna-se cada vez mais importante porque as instituições são insuficientes.
Intolerância – sobre a intolerância, Boaventura afirmou que tolerar é muito pouco. Não podemos apenas "suportar". Precisarmos conviver com a diferença, ouvir, aprender com ela. Para exemplificar, o sociólogo trouxe a questão dos paquistaneses. “Quem pode dizer aos paquistaneses que a democracia ocidental é perfeita? Que os direitos existem de fato? Apenas o imperialismo norte-americano tem essa ‘coragem’, coragem de interferir em uma realidade cuja cultura é absolutamente diferente”, lembrou. Isso é intolerância, é não respeitar o diferente.

Fascismo – O Fascismo social é, segundo Boaventura, o resultado da grande concentração de renda, da discriminação sexual, étnica, racial e da desigualdade. Não é nada que se possa comparar a democracia. Segundo o professor, “a intolerância é o poder de veto sobre a vida”. Ele lembrou, ainda, que o apartheid social também é um tipo de fascismo, o social. ”Condomínios fechados de um lado, violência nas zonas selvagens das cidades de outro. Entre esses lados, existe um a apartheid social. De um lado matam jovens negros nas favelas, do outro, carregam moças para atravessar a rua”, citou.
Para Boaventura, outros tipos de fascismo devem ser combatidos. O fascismo territorial (porque há espaços em que Estado não chegou e em que não se permite a entrada do estado), o fascismo do capitalismo financeiro (que submete economias de países à imposições de poucos poderosos), e o fascismo da intolerância.
Este, segundo Boaventura, é fenômeno diferente dos demais. “A desigualdade combina em par com o preconceito. Diferenciação social, hierárquica, de religião, orientação sexual... Isso é intolerância. Isso é uma teia de desigualdade. E precisamos lutar contra isso com força”.
O professor disse, ainda, que "a intolerância é desumanização. Ela existe porque tem três pilares: preconceito, interesse e ideologia. Estas formas estão aumentando sistematicamente. É a guerra de todos contra todos, a guerra do medo, da insegurança.  É importante pensarmos que a intolerância desmoraliza e que traz em si uma arrogância explícita. Tolerar é muito pouco. Precisamos enriquecimento mútuo: reconhecemos a diferença e enriquecemos com ela”, defendeu.
O mundo não tem receitas. “Não há ideia universal. Há, sim, ideias incompletas que podem, unidas, construir uma possibilidade”, finalizou Boaventura.

Uma análise marxista do Sistema Único de Saúde do Brasil


Esse artigo tem como objetivo geral fazer uma análise crítica da já literariamente surrada saúde pública brasileira, fazendo um esboço geral de seu funcionamento, optando por fazê-lo através de um ponto de vista que tem como base o paradigma marxista.

Por ROSANGELA ALVARENGA LIMA no CORREIO DO BRASIL

Mais especificamente, tentar-se-á mostrar como a essência do SUS difere-se bruscamente da aparência socialmente percebida, assim como a maneira como tal aparência é mantida.
As maneiras como os homens se relacionam e se organizam para a utilização de suas habilidades e ferramentas para dominar as consequências natureza, e retirar da mesma aquilo que necessitam para satisfazer as suas necessidades materiais e históricas; são chamadas por Marx de modos de produção. Em tal processo define-se, também, a maneira que se estruturará a produção e a distribuição de posses e meios de propriedade numa sociedade. Consequentemente, segundo o autor, estabelecer-se-á como ocorrerá a divisão do trabalho e o acesso aos meios de produção, ou seja, quem tem ou não tem acesso a eles e, por conseguinte, determinar as classes sociais.
Conforme o supracitado, este artigo abordará, mais especificamente, a produção e a distribuição de um bem singular: a saúde . Assim como, tentará elucidar a maneira como os homens se organizam no combate a perigos metabólicos (venenos, doenças, síndromes ambientais, etc.). Partindo da hipótese levantada pelo próprio autor de que só existem duas classes sociais: a que tem acesso aos meios de produção e a que não tem; a análise crítica concentrar-se-á na maneira como o Estado, enquanto um dos donos dos meios de produção de saúde controla a distribuição desse bem.
A sua escolha se dá pelo fato de que, apesar de haver outros membros na classe possuidora de tais meios, o proprietário em questão é, indubitavelmente, o maior dentre eles, já que a maioria da população (de não possuidores) depende dele para ter acesso à saúde. Não seria exagero afirmar que o Estado detém o monopólio de sua produção, ou que, ao menos, opera em ampla vantagem em relação aos demais membros de sua classe.
Embora seja óbvia a importância da saúde para o ser humano de um modo geral, a sua relevância para o modo de produção capitalista é inestimável. Isso se dá pelo fato de ela ser um dos fatores que determinam o preço e a reprodução da mais crucial das mercadorias capitalistas: a força de trabalho.
Para Marx, o preço dela varia, como em toda mercadoria, de acordo com o tempo necessário para a sua fabricação e tudo que é necessário para manter aquele que a realiza. Isso corresponde a todos os meios (objetos e mercadorias) necessários para a subsistência do trabalhador, para seu sustento, conservação e substituição (reprodução), dado o fato de que os trabalhadores são mortais. A inegabilidade de que a saúde é um desses meios é inquestionável. Além do mais, ela afeta outras etapas do sistema produtivo.
O tempo de trabalho, ou seja, o “tempo que requer todo trabalho executado em grau médio de habilidade e intensidade e nas condições ordinárias em relação ao meio social convencionado”, afeta diretamente a produtividade. Quanto menor o tempo de trabalho necessário e, por conseguinte, menor o valor da mercadoria, maior é a produtividade do sistema.
A produtividade, por sua vez, resulta e depende da soma da habilidade média dos trabalhadores com a eficácia dos meios de produção (aparatos, máquinas e ferramentas em geral) e com circunstâncias puramente naturais. Este último fator pode se manifestar na forma de perigos metabólicos (epidemias, contaminações, doenças do trabalho, etc.) que estão diretamente relacionados à obtenção de saúde. Isso também afetaria diretamente a média da habilidade dos trabalhadores; supondo que eles produziriam menos, pior ou até mesmo não produziriam.
Quando se trata de garantir todos os meios necessários para a subsistência daquele que realiza a força de trabalho (o trabalhador), para seu sustento, conservação e substituição (reprodução), dado o fato de que ele é mortal; não se pode negar que a saúde é um desses meios. Agora resta saber se ela é um objeto útil ou uma mercadoria.
O que distingue uma mercadoria de outros objetos é o fato de que ela possui um valor de uso, uma utilidade baseada em suas qualidades naturais. Tal valor de uso é diferente daquele dos demais objetos, pois a mercadoria não tem utilidade para aquele que a produz e sim para outros. O seu produtor deseja convertê-la em outra mercadoria diferente. Assim que termina a transação, a nova mercadoria torna-se um objeto útil para satisfazer as suas necessidades.

O analfabeto político, de Bertold Bretch

Bancada religiosa impede votação do projeto que criminalizaria homofobia no Brasil


Marta Suplicy, relatora do projeto, espera obter um texto de consenso - Wilson Dias/ABr

Rachel Duarte no Sul21

A pressão da bancada evangélica impediu a votação, na Comissão de Direitos Humanos do Senado, do projeto de lei complementar 122/06 que criminaliza os atos de homofobia. Ele seria votado hoje (12) na Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado. Em uma sessão que ao final contou com troca de xingamentos e ofensas entre o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) e a senadora Marinor Brito (PSOL-PA), o projeto foi retirado de pauta sem previsão de retorno, a pedido da própria relatora, senadora Marta Suplicy (PT-SP). A senadora espera chegar a um texto de consenso.
Antes do término da discussão — encerrada a pedido do senador Humberto Costa (PT-PE) –. parlamentares se manifestaram sobre o assunto. A polêmica girou em torno de dois temas: a punição de crimes resultantes de discriminação por orientação sexual e o direito à liberdade de expressão e à liberdade religiosa, assegurados pela Constituição.
Ao salientar a necessidade de acabar com os preconceitos, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) afirmou ser preciso aprovar um projeto de consenso que estabeleça a punição para ações contra homossexuais, mas que garanta a liberdade de manifestação de pensamento fundada na liberdade de crença. “Talvez seja a hora de esgotamos todos os diálogos necessários e possíveis e que deixe claro que o Estado regulamenta a criminalização de preconceito, mas que o Estado não se meta na ‘pecamização’ de qualquer coisa. É preciso esgotar as conversas para que o texto final não crie outro preconceito, o preconceito contra as igrejas, contra as crenças”, disse.
Magno Malta (PR-ES) elogiou a decisão de adiar o debate e defendeu a realização de audiências públicas para ouvir todos os segmentos da sociedade que querem se manifestar sobre o assunto, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), os religiosos (católicos e evangélicos), e homossexuais. Ele informou que apresentaria requerimento com esse propósito. Segundo o parlamentar, o projeto de autoria da deputada Iara Bernardi (PT-SP) apresenta uma “série de inconstitucionalidades” desde sua origem e define uma série de privilégios para os homossexuais.
Segundo a relatora, Marta Suplicy (PT-SP), uma modificação feita no texto da proposta preserva a liberdade religiosa. A mudança excluiu do alcance da lei “os casos de manifestação pacífica de pensamento fundada na liberdade de consciência e de crença”. O texto final exclui do alcance das punições “os casos de manifestação pacífica de pensamento fundada na liberdade de consciência e de crença”. E argumentou: “Quando me colocaram que o problema não era a intolerância e o preconceito, e sim uma questão de liberdade de expressão dentro de templos e igrejas, aceitei. A liberdade está preservada”.
A proposta do PL 122/06 modifica a Lei de Racismo para criminalizar também os atos de homofobia, estendendo a eles as mesmas punições impostas aos crimes de preconceito racial. O projeto pune com reclusão de um a três anos condutas discriminatórias, como recusar o atendimento a gays em bares e restaurantes e reprimir trocas de afeto em locais públicos, como beijos ou abraços. O item mais polêmico pune com prisão, de um a três anos, e multa aqueles que induzirem ou incitarem a discriminação ou preconceito contra os homossexuais.
Para atender às reivindicações da bancada evangélica, Marta incluiu uma emenda permitindo que todas religiões e credos exerçam sua fé, dentro de seus dogmas, desde que não incitem a violência. “O que temos na fé é o amor e o respeito ao cidadão. Me colocaram que o problema não era intolerância nem preconceito, mas liberdade de expressão dentro de templos e igrejas. O que impede agora a votação? O que, além da intolerância, do preconceito, vai impedir a compreensão dessa lei?”, questionou Marta.
Ao deixar a reunião, o senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) afirmou que a proposta extrapola os direitos à religião, garantidos pela Constituição, ao punir não apenas as ações, mas também as expressões de pensamento. “Ninguém é a favor de que os homossexuais sofram agressões psicológicas ou físicas. Agora, a proposta extrapola pelo fato de não querer punir os fatos, mas punir as expressões do pensamento e as palavras”, afirmou.

Como fica com a retirada?

Márcia Kalume /Ag.Senado

Apesar de ter pedido a retirada da proposta da pauta da CDH, Marta Suplicy disse que o Senado não pode mais “caminhar na contramão”. “Como é que a Comissão de Diretos Humanos não vota uma lei que protege milhares de pessoas?” questionou.
O presidente da Associação Brasileira de Lésbicas,Gays,Bissexuais,Travestis e Transsexuais (ABGLT), Toni Reis, está confiante que o PL122/06 seja aprovado e diz que a proposta tem maioria no Congresso Nacional. “Está bem costurado. Será só uma questão de tempo”, disse. Segundo ele, a maioria dos parlamentares e senadores sabem que a intenção do projeto não tem a intenção de “acabar com as igrejas, mas de garantir o respeito às minorias”. Ele disse que o Brasil está atrasado na regulamentação da lei que criminaliza a homofobia em relação a outros 53 países. “O Brasil está sendo reconhecido internacionalmente sobre tantos aspectos, temos que nos tornar uma potência também em direitos humanos. Propor um plebiscito para aceitar os homossexuais é um absurdo. A Constituição Federal diz que todos são iguais perante a lei”, falou.
Segundo ele, diferente do Supremo Tribunal Federal, que considerou legal a união homoafetiva na última semana, o Congresso Nacional tem setores “retrógrados que não sabem interpretar a lei”.

Representação contra Bolsonaro 

J.Freitas/Ag.Senado

Durante uma entrevista em que a senadora Marta Suplicy (PTSP) explicava os motivos da retirada do PL nº 122 da pauta do dia da Comissão de Direitos Humanos, o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) criava tumulto exibindo para as câmeras um folder que, que classificou de “plano nacional da vergonha”. “O governo está distribuindo nas escolas de primeiro grau uma cartilha estimulando nossas crianças a serem gays”, afirmou o deputado. A senadora Marinor Brito (PSol/PA) reagiu às agressões e à tentativa de intimidação durante a entrevista, e exigiu que ele se retirasse com os panfletos, que pregam a violência contra homossexuais.
Na discussão, Bolsonaro demonstrou uma atitude recorrente de misoginia. Marinor afirma que a atitude do deputado é desrespeitosa e que se sentiu ofendida em sua feminilidade.
Na semana que vem, o PSOL entrará com representação na Corregedoria da Câmara dos Deputados. Além disso, a senadora entrará com uma ação penal na justiça, pelos crimes de injúria e danos morais.

*Com informações da Agência Senado e de assessorias dos senadores.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Jerônimo vive!

Escrito por Mário Maestri   no Correio da Cidadania
 
Talvez se deveu à pele escura de ambos ou a terem feito a cavalaria yankee de bobo por longos anos. O certo é que o codinome dado a Bin Laden, quando da operação para assassiná-lo, terminou prestando-lhe uma enorme homenagem – além de registrar o racismo da administração de Barack Hussein Obama II.
 
Em 1851, Goyaałé, Jerônimo, teve sua família massacrada pelo exército estadunidense. A seguir, por vinte anos, protagonizou resistência heróica, criativa e legendária à ocupação das terras apaches. Em 1886, após render-se com os poucos e últimos seguidores, viveu o resto da vida como semi-prisioneiro, ditando a um funcionário estadunidense um fulgurante relato de sua vida.  
Osama bin Mohammed bin Awad bin Laden foi filho de uma das mais ricas famílias sauditas. Integralista fervoroso, partiu em jihad contra a revolução socialista, laica e democrática afegã, no que foi apoiado pelos Estados Unidos. A vitória das forças integralistas sustidas pela Arábia Saudita, pelo Paquistão e, sobretudo, pelos grandes Estados imperialistas originou o reinado talibã na região.
 
Principalmente desde os anos 1950, o fundamentalismo foi apoiado pelo grande capital mundial, com destaque para a Inglaterra e os Estados Unidos, na luta contra o pan-nacionalismo e o socialismo árabe. A partir de 1989, com a dissolução da URSS e reconversão capitalista dos Estados socialistas, o integralismo acolheu fortemente os anseios confusos de libertação nacional e social de vastas populações muçulmanas.
 
Com o fim da primeira guerra do Afeganistão, Bin Laden envolveu-se com grupos que se esforçavam para ocupar o vazio político-ideológico árabe e muçulmano, propondo ordem assentada no integralismo. Estranhos e refratários a qualquer visão social de mundo, esses grupos orientaram-se para a luta terrorista, despreocupados, opostos e incapazes de impulsionar a organização popular, sobretudo independente.
 
Ao financiar os ataques às embaixadas USA na África, em 1998, ao navio de guerra estadunidense em 2000 e, acima de tudo, ao reivindicar politicamente o ataque às Torres Gêmeas, em 2001, Bin Laden tornou-se o mais célebre terrorista e a grande justificativa imperialista para a "guerra ao terror" que impulsionaria a apropriação das grandes reservas petrolíferas. Em 2003, fortalecido junto à população estadunidense pelo ataque terrorista, Bush II lançou seus exércitos na carnificina que conquistaria os campos petrolíferos iraquianos.
 
Após o 11 de setembro de 2001, consagrados pela grande mídia, Bin Laden e sua organização entrariam em crescente eclipse que levaria ao seu assassinato, em mansão fortificada, em 1º de maio, nas proximidades de Abbottabad, praticamente desarmado, cercado quase apenas por familiares. Sobrevivia então devido à quase certa proteção do exército e dos serviços de inteligência paquistaneses.
 
Portanto, uma confusão ofensiva. Jerônimo, o verdadeiro, dormia com o fuzil ao lado e jamais foi surpreendido. Mesmo na derrota, mostrou-se o mais digno braço armado do povo apache na luta contra os seus algozes.
 
Mário Maestri é professor do curso e do programa de pós-graduação em História da UPF.
E-mail: maestri@via-rs.net
 

Há 30 anos, morria Bob Marley, ícone do reggae


Há exatos 30 anos, morria Bob Marley. Considerado o expoente mais alto do reggae, ele tinha apenas 36 anos de idade quando faleceu, vítima de um câncer detectado quatro anos antes. Deixou a vida para assumir na história o papel de ícone.


Três décadas após a sua morte, o "rei do reggae" continua a ser recordado um pouco por todo o mundo, sendo uma constante fonte de inspiração para dezenas de novos artistas. Músicas como No Woman No Cry, Could You Be Loved ou I Shot The Sheriff hoje fazem parte de um repertório coletivo da música internacional.

Poucos gêneros musicais dispõem de uma figura central, tão próxima quanto possível da unanimidade, como acontece com o reggae. Bob Marley foi coroado nesse feudo, como o foram Elvis Presley no rock e Michael Jackson no pop.

Acontece que nem todo aquele que se considera roqueiro gosta do som pioneiro e antiquado do rei do rock; e no pop, onde a infidelidade e a amnésia são gerais, Jackson passou uma década no ostracismo e só foi recuperado graças à tradicional necrofilia da indústria fonográfica.

Com Marley é diferente: ele pode não se o favorito de todos, mas é quase onipresente nas coleções de fãs, no repertório de bandas não-autorais e no setlist de festas que se dedicam ao gênero jamaicano.

Para além do gênio musical, sua figura, com enormes dreadlocks e um charuto de marijuana (erva de uso religioso pelos rastafaris) sempre na ponta dos dedos, se tornou quase tão forte quanto a do médico revolucionário Che Guevara e sua boina estrelada, o popstar pacifista John Lennon e seus óculos de aros redondinhos e superguitarrista Jimi Hendrix e seu instrumento canhoto.

O mais conhecido rosto do movimento espiritual Rastafari, defensor de uma mensagem de paz, liberdade e emancipação, denunciador da pobreza, da repressão e da realidade social da Jamaica, Marley deixou, em vida, 14 álbuns – 12 de estúdio e dois ao vivo –, bem como um legado no reggae que permanece sólido até hoje, com mais de 200 milhões de discos vendidos.

Legend”, lançado originalmente em 1984, continua a ser o álbum mais vendido da história do reggae. Já “Exodus” (1977) foi eleito pela revista Time como um dos melhores álbuns do século 20.

Último registro

A saúde abalada o fez parar os shows, encerrando abruptamente a turnê do disco Uprising (1980), em 23 de setembro de 1980, no palco do Stanley Theatre, em Pittsburgh (Pensilvânia, EUA). É justamente o registro em áudio desta última performance em palco o primeiro produto escolhido pela gravadora da família Marley, Tuff Gong, para marcar a efeméride das três décadas de morte do jamaicano mais famoso do planeta.

Live Forever surge como mais um ótimo registro do carisma de Bob Marley nos palcos. Se apresenta agora como principal rival do clássico Live (1975), seu primeiro disco ao vivo lançado no auge do estouro mundial, num momento em que quase todo mundo do pop estava gravando reggae naqueles anos, até ícones roqueiros como Rolling Stones e Bob Dylan.

Além da ótima performance do protagonista, o som da maior parte do CD é fiel às qualidades dos Wailers como banda, com grande destaque para os irmãos Carlton e Aston ‘Family Man’ Barrett, que formavam o alicerce rítmico absolutamente poderoso e infalível com sua bateria e baixo, onde nem o uso de tantans eletrônicos que na época tinham virado febre na disco-music e new-wave, tiram o brilho. Marley brinca com as divisões de outro hit de sua lavra, Is This Love, que encerra a parte de ótimo som do registro.

O repertório é bem equilibrado entre temas de guerrilha, mensagens positivas, hinos de fé no rastafarianismo, flertes com a africanidade e canções românticas

Herança

Mas nem só de álbuns é feito o legado de Marley. Com 11 filhos legítimos e mais uns três a usar o seu sobrenome (embora não reconhecidos pela família), seria de esperar que algum iria fazer carreira na música. Não foi um, foram vários.

David ‘Ziggy’ Marley, atualmente com 42 anos, canta como o pai e passa mensagens de paz através das letras das suas músicas. Tem um extenso repertório que vem desde 1985 e já ganhou cinco Grammy Awards. É ativista e líder de uma ONG.

Damian ‘Jr. Gong’ Marley, de 33 anos, é o filho mais novo de Bob. Já ganhou três Grammys. Stephen, 38 anos, faz parte da banda do irmão mais velho, Ziggy, e foi produtor dos três álbuns solo de Damian. Da banda – os Melody Makers – fazem também parte Cedella e Sharon, duas das filhas de Bob.

Julian Marley, 36 anos, também é músico. Tem três álbuns editados. Ky-Mani andou uns tempos dividido entre o futebol e a música, acabando por se render à arte. O seu som, para além de reggae, tem base no hip-hop e sons mais urbanos.

Conexão Brasil

Bob Marley esteve no Brasil uma única vez, em março de 1980. No Rio de Janeiro, ele jogou uma partida de futebol ao lado de Chico Buarque, Toquinho, Moraes Moreira e o craque tricampeão Paulo César. Mas, se infelizmente não passou pela Bahia, vale lembrar que dois artistas da terra já estavam antenados ao jamaicano. Em 1971, no exílio em Londres, Caetano Veloso foi o primeiro brasileiro a citar o reggae em Nine out of Ten, do disco Transa.

Oito anos depois, Gilberto Gil lançou Não Chore Mais, versão para No Woman No Cry, de Bob, que virou um hino da anistia no Brasil. “Bob foi um dos grandes intérpretes dessa consciência de exclusão, de desigualdade”, lembra Gil, que em 2002 gravou Kaya N'Gan Daya, com músicas de Bob. “Foi o último artista a quem dediquei atenção profunda. Hoje ainda é das coisas que mais gosto de ouvir”.

Com agências