sexta-feira, 24 de junho de 2011

Porto Rico, uma colônia dos EUA; gringos queriam o mesmo para Cuba



Em discussão há 30 anos, Nações Unidas não avança no processo de descolonização
 
Por Camila Maciel, da Adital

O Comitê de Descolonização das Nações Unidas (ONU) retomou, nessa segunda-feira (20), o debate sobre a situação de Porto Rico. O Comitê debate anualmente a questão, há pelo menos três décadas, sem que se resolva o pleito dos que querem o fim da centenária relação de dependência dessa ilha com os Estados Unidos (EUA). Diante desse quadro, a Frente Socialista de Porto Rico denuncia a inação do Comitê e o acusa de cumplicidade com os EUA.

A Frente pede que a questão seja discutida no âmbito do Pleno da Assembleia Geral das Nações Unidas. “Seguir postergando essa discussão e intervenção internacional é converter-se em cúmplice de um sistema que continua em seu plano de aniquilar uma nacionalidade com o intuito de manter um enclave econômico-militar no Caribe”, afirma o Comunicado de Imprensa da Frente Socialista.

Este ano, o debate no Comitê está sendo realizado aproximadamente uma semana depois da visita de Barack Obama, presidente dos EUA, a Porto Rico. Durante a visita, o tema veio à tona pelos protestos de movimentos sociais. Eles reivindicaram independência e liberdade para presos políticos que lutam pela descolonização da ilha.

A visita foi a primeira de Obama, após 50 anos da ida de John F. Kennedy. Barack Obama, que estaria fazendo campanha para sua reeleição em 2012, prometeu realizar plebiscito sobre o tema. Os movimentos rechaçam e duvidam de tal postura, já que sequer podem manifestar livremente suas opiniões atualmente, diante da repressão aos independentistas. Oscar López Rivera, por exemplo, é o preso político mais antigo do hemisfério, detido há quase três décadas.

Nesse sentido, o comunicado da Frente Socialista de Porto Rico denunciou também “a criação de um grupo especial do FBI [Departamento Federal de Investigações] para perseguir e deter os lutadores políticos, classificando-os em uma nova categoria de terroristas domésticos, a qual permite às agências repressivas federais dos Estados Unidos violarem nossos direitos e utilizar todos os recursos para perseguir os independentistas”.

O Comitê discute um projeto de resolução, apresentado por Bolívia, Equador, Nicarágua e Venezuela. O projeto enfatiza a urgência de que o governo estadunidense assuma sua responsabilidade de propiciar um processo que permita aos porto-riquenhos exercer seu direito inalienável à autodeterminação. Tal ação de solidariedade desses países é recebida com apreço pelos membros da Frente.

“O projeto de resolução afirma que Porto Rico é e seguirá sendo, por sua cultura, história e tradições e, especialmente, pela inquebrantável vontade de seu povo, uma nação latino-americana e caribenha, com uma identidade nacional própria, que os porto-riquenhos souberam manter mesmo com o processo colonizador ao qual estão submetidos”, afirmou o diplomata cubano, Pedro Núñez Mosquera, com representação no Comitê.

Breve histórico
 
Porto Rico esteve sob colonização espanhola por cerca de 400 anos. Em 1898, o exército estadunidense invadiu a ilha durante a chamada Guerra Hispano-cubano-americana e o território passou a ser colônia norte-americana. Desde então, os porto-riquenhos têm nacionalidade norte-americana. Desde 1952, Porto Rico está sob o status de Estado Livre Associado. Até hoje, parte de sua população a luta pela total desvinculação com os Estados Unidos, mesmo sofrendo intimidações e repressões.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Anti-imperialismo é a essência do movimento de solidariedade

Por José Reinaldo Carvalho no GRABOIS

Quando no início dos anos 1990, o ex-presidente dos Estados Unidos, George Bush, em meio aos acontecimentos que conduziram ao fim da Guerra Fria e à primeira Guerra contra o Iraque, proclamou o advento da chamada Nova Ordem Mundial, estava na verdade anunciando um plano de dominação global cujas conseqüências se abateram sobre a humanidade ao longo das duas últimas décadas.

A proclamação da “nova ordem” visava a estabelecer os meios e modos para percorrer “o novo século americano”. Seguiu-se um período de uso indiscriminado da força bruta, desprezo pela legalidade internacional e pelas instituições multilaterais, militarização crescente das relações internacionais, decisões unilaterais, desprezo às Nações Unidas, dominação unipolar e imposição da primazia dos interesses estadunidenses no mundo.

A posição internacional dos Estados Unidos foi marcada pela denominada guerra infinita ou permanente ao terrorismo, que ao ser identificado não só com organizações e redes informais, mas com Estados nacionais classificados como integrantes do chamado eixo do mal, assumiu todos os contornos de guerras de agressão contra países e povos, sob o pretexto de promover ataques preventivos contra os que eram considerados terroristas ou protetores do terrorismo.

Em decorrência disso, foram desencadeadas as guerras de agressão ao Afeganistão e ao Iraque e de Israel ao Líbano e ao povo palestino. Países independentes, como a Síria, o Irã e a República Popular Democrática da Coréia, por motivações diversas, foram alvo de campanhas e ameaças de agressão. Surgiram novos focos de tensão, com a guerra do Cáucaso, a expansão da Otan para o leste da Europa e a afirmação de novo conceito estratégico desse braço armado do imperialismo que institucionalizou sua presença em conflitos fora da Europa. A militarização se intensificou com a proliferação de bases militares, a criação do Comando Africano (Africom), a competição naval no Oceano Indico e o relançamento da Quarta Frota da Marinha de Guerra dos Estados Unidos na América Latina.

Nada mudou

Com a eleição do novo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em novembro de 2008, a humanidade foi envolvida pela ilusão em uma mudança de rumos na situação internacional, que se traduziria na abertura de uma nova era de paz, convivência democrática entre as nações, segurança, respeito ao direito internacional, vigência dos direitos humanos e restauração do multilateralismo sob a égide de uma Organização das Nações Unidas reformada e pró-ativa na solução pacífica dos conflitos. Tais expectativas foram alimentadas por uma aparatosa propaganda e pela exaltação da capacidade de regeneração e transmutação da superpotência estadunidense.

Mas o movimento pela paz não se deve permitir ilusões. Mesmo considerando as diferenças de métodos e estilos entre os partidos Democrático e Republicano e o perfil distinto do presidente Obama comparativamente ao seu antecessor, devemos analisar os fenômenos com objetividade para procurar entender o que está em curso na realidade dos Estados Unidos e internacional.

O objetivo explícito de Barack Obama, manifestado desde a campanha eleitoral de 2008, é recuperar a liderança mundial dos Estados Unidos, em todos os domínios – político, diplomático econômico, fazendo valer, se necessário, o seu poder militar.

O tempo se encarregou de mostrar que, na prática, com Barack Obama não houve, não há nem haverá mudança essencial na política de guerra do imperialismo norte-americano.

Essencialmente, a situação internacional não registra progressos em favor da paz, no que diz respeito às ações dos Estados Unidos e seus aliados, nem à diminuição das tensões ou focos de conflitos.

As guerras continuam

As chamas da guerra continuam a arder no Iraque sob ocupação das tropas estadunidenses. O anúncio do plano de retirada a longo prazo não contribuiu para estabilizar a situação. A presença de tropas de ocupação e de contingentes mercenários continua a provocar escaramuças militares e incidentes políticos.

O presidente Obama defendeu a continuidade da chamada “guerra ao terrorismo”, deslocando o seu centro para o Afeganistão. Desde o início do seu mandato, tem defendido que os Estados Unidos necessitam de mais tropas e recursos para ganhar a guerra no Afeganistão e confrontar a crescente ameaça da Al Qaeda na fronteira com o Paquistão. A Guerra do Afeganistão, herança maldita do governo de George W. Bush, converteu-se na guerra de Obama.

Líbia: novo front de guerra

Desde o dia 19 de março último, está em curso mais uma guerra do imperialismo norte-americano, de seus aliados da União Europeia e da Otan. É a primeira da Administração Obama, mas a terceira que tem que conduzir, porquanto herdou as guerras do Afeganistão e do Iraque.

Até o momento a aviação da Otan já descarregou mais de cinco mil bombardeios sobre a Líbia, atingindo alvos civis e até a residência do líder do país. Num desses ataques um de seus filhos e três netos foram mortos.

Tal como todas as guerras recentes do imperialismo estadunidense e seus aliados contra outras nações, é feita com falsos pretextos e conta com a cumplicidade de uma colossal e poderosa máquina de mentiras – os meios de comunicação, que preparam o terreno com a difusão de argumentos sobre a suposta violação dos direitos humanos, a perpetração de crimes contra a população civil e a desobediência a tratados internacionais.

Na verdade, os bombardeios na Líbia pela Otan fazem parte de uma estratégia global das potências imperialistas para reverter a seu favor os acontecimentos que têm abalado o mundo árabe e todo o Oriente Médio, a partir das vitoriosas rebeliões na Tunísia e no Egito.

Militarização da América Latina

Ultimamente passou para o centro da política do imperialismo norte-americano o aumento da presença militar na América Latina e no Caribe, como demonstram o relançamento da Quarta Frota, no apagar das luzes do governo de George W. Bush e o acordo militar entre os Estados Unidos e a Colômbia que prevê a instalação de sete bases militares da superpotência do Norte nesse país sul-americano. A instalação dessas bases está interrompida em razão de decisão judicial, mas nada indica que esteja revogada.

Os Estados Unidos reativaram a Quarta Frota de sua Marinha de Guerra num momento em que a América Latina ruma para a consolidação de um bloco regional que se caracteriza pelas posturas solidárias, independentes e soberanas, construindo fóruns regionais como o Mercosul, a Unasul, a Alba e o Conselho de Defesa Sul-Americano, afastando-se objetivamente da tutela estadunidense. Hoje a região dá um salto qualitativo em seu processo de integração política e unidade com a criação da Celac – Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos.

A América Latina está vivendo, desde 1998, com a eleição do presidente venezuelano Hugo Chávez, uma etapa inédita em sua história política desde a primeira independência há 200 anos. Ao longo do século 20, a região foi vítima do sistemático intervencionismo norte-americano. Nas décadas de 1960 e 1970 teve lugar o ciclo das ditaduras militares pró-estadunidenses. E nos anos 1980 e 1990, a região foi uma presa econômica, social e politica das engrenagens do neoliberalismo codificado no chamado Consenso de Washington.

Da eleição de Hugo Chávez em 1998 até o momento, ocorreram muitas vitórias políticas eleitorais, fruto da acumulação de forças pelos povos, que levaram ao poder coalizões progressistas. Hoje, boa parte dos países da região são dirigidos por governos democráticos, populares e anti-imperialistas que estão contribuindo para alterar a geopolítica mundial. O sentido mais geral dos fenômenos em curso na região é a formação de uma corrente transformadora e a acumulação de vitórias dos povos e países em termos de independência, soberania, democracia, mecanismos de participação popular, justiça, desenvolvimento e progresso social.

Por isso, para o imperialismo norte-americano, a despeito da retórica do presidente Obama, está no centro das suas preocupações estratégicas recuperar o controle geopolítico da América Latina.

Contra as estratégias belicistas

Em todo este contexto, o movimento pela paz reafirma sua condenação às estratégias guerreiras do imperialismo norte-americano e seus aliados, à militarização e todas as ameaças à paz. Exige a retirada das tropas de ocupação do Iraque e do Afeganistão e a libertação da Palestina, com a criação do seu Estado nacional independente. Manifesta indeclinável solidariedade com os povos latino-americanos na luta por sua independência e soberania, pela democracia e a integração, contra a ingerência do imperialismo estadunidense, contra a Quarta Frota e as bases militares . Luta pelo encerramento da base de Guantânamo, pelo fim do bloqueio a Cuba e pela libertação dos seus cinco heróis encarcerados injustamente nos Estados Unidos.

Internacionalismo e patriotismo

A solidariedade internacional, o internacionalismo dos povos, o internacionalismo de massas é um traço essencial da ética e da linha política dos movimentos populares e progressistas. Temos em Marx, Lênin, José Martí e nos próceres das lutas pela independência em nosso continente as fontes doutrinárias que orientam tal conduta.

O internacionalismo, a solidariedade entre povos, estão intrinsecamente ligados ao patriotismo. Só é internacionalista aquele que ama seu país e luta pela emancipação nacional e social de seu povo. E só é verdadeiramente patriota quem sabe que os combates pela independência nacional não terão conseqüência se não estiverem vinculados com as lutas dos demais povos irmãos.

Não há nenhuma contradição entre o patriotismo e o internacionalismo.

Classes dominantes antinacionais

A partir de determinado momento na história – precisamente entre o final do século 19 e o início do século 20 – o capitalismo se transformou em imperialismo. Ele mudou de fase, transformou-se de capitalismo concorrencial em capitalismo monopolista. Transformou-se de capitalismo nos marcos nacionais em capitalismo que extravasou as fronteiras nacionais. Transformou-se de capitalismo que auferia lucros a partir apenas do investimento de capital nos setores internos da economia em um capitalismo que aufere lucros a partir de investimentos de capitais fora do país. Instaurou-se o mecanismo da exportação de capitais. Deixou de haver um capitalismo cujo lucro máximo era obtido apenas da espoliação da classe operária nacional e passou a obter seu lucro máximo a partir também da exploração dos povos colonizados de uma maneira geral. E até mesmo da dominação de nações inteiras. Foi aí que surgiu o fenômeno do neocolonialismo e do imperialismo.

Em decorrência disso, na atual época histórica na qual predomina o capital financeiro, as classes dominantes locais exercem seu poder por meio das mesmas políticas chamadas globais e dos mesmos mecanismos supranacionais representados pelos dogmas neoliberais que consistem na abertura do mercado, no debilitamento do Estado nacional, nas privatizações etc. Esta é uma razão a mais para sermos internacionalistas. Porque essas políticas da burguesia internacional associada com as burguesias locais em grande medida se uniformizaram, uma vez que são as únicas correspondentes ao estágio atual do capitalismo.

O Brasil é um eloqüente exemplo disso. Vivemos em nosso país, desde a primeira eleição de Lula, um momento político novo e carregado de esperanças na transformação social. Mas, as classes dominantes são as mesmas de sempre. Abandonaram os interesses nacionais, ataram seus destinos aos do imperialismo e ao seu sistema econômico internacionalizado. Nessa medida, a burguesia moopolista-financeira brasileira traiu os interesses nacionais, tornou-se incapaz de conduzir qualquer processo de caráter democrático, ou nacional e soberano.

É por isso que na boca da grande burguesia brasileira, o nacionalismo é letra morta, em suas mãos o patriotismo é uma bandeira esfarrapada. Quando os representantes da grande burguesia brasileira enchem o peito para falar dos valores nacionais, na verdade estão defraudando a consciência popular e a própria consciência nacional. Não é possível ser nacionalista defendendo as políticas que a grande burguesia brasileira defende.

A política das elites nacionais é de aviltamento, fragilização e comprometimento da soberania nacional. O nacionalismo da classe dominante é falso.

Registro histórico

A história registra episódios importantes da solidariedade internacional no Brasil: o combate ao nazi-fascismo, a partir dos anos 1930; a luta para que o Brasil se incorporasse ao esforço de guerra dos aliados, inclusive com o envio de tropas ao front europeu da Segunda Guerra Mundial; a luta pela manutenção da paz no imediato pós-Segunda Guerra; registre-se a intensa, ampla, corajosa e heróica atividade dos lutadores pela paz, organizados pela ramificação brasileira do Conselho Mundial da Paz, precursora do Cebrapaz; a luta contra a intervenção norte-americana na guerra da Coreia (inclusive os Estados Unidos pressionaram o governo brasileiro a enviar tropas para aquele país asiático, pressões que malograram pelas reações negativas que despertaram na opinião pública). As revoluções populares da segunda metade do século 20, nomeadamente a Revolução Chinesa, a Revolução Cubana, a Luta de Libertação Nacional do Vietnã, a Luta anticolonialista na Argélia e nas colônias africanas lusófonas receberam a solidariedade dos movimentos sociais brasileiros.

A propósito, ressalte-se que a segunda metade do século 20 foi marcada por grandes revoluções, grandes acontecimentos no mundo. O século 20 foi o século das lutas por uma nova sociedade, das revoluções anticolonialistas e anti-imperialistas, o século da descolonização da África, da Ásia e da afirmação da consciência nacional na América Latina. Foi um século de grandes acontecimentos revolucionários aos quais a luta do povo brasileiro não esteve alheia.

Anti-imperialismo, conteúdo essencial

O conteúdo fundamental que define a ação internacionalista hoje é o anti-imperialismo. O objetivo central é derrotar as estratégias do imperialismo norte-americano, sua política de guerra, seu conservadorismo atávico, seus dogmas neoliberais, a ofensiva brutal que move contra a paz, a soberania nacional, a democracia e os direitos dos povos.

A tarefa número um dos movimentos sociais no plano internacional é derrotar essas políticas. Tudo o que fizermos para impedir, retardar essa ação imperialista ainda será pouco. Porque este é o principal perigo que afronta a humanidade. E, obviamente, nos atinge de uma maneira ou outra. O Brasil não é uma ilha de bem-estar, conforto e tranquilidade. A nossa índole pacífica e a nossa cordialidade não nos previnem de ataques. O que nos prevenirá e defenderá serão as políticas corretas, as orientações justas, a nossa capacidade de unir o povo e lutar para defender a independência nacional, o progresso social e a paz.

É preciso também derrotar as políticas econômicas do imperialismo, suas orientações neoliberais, a destruição promovida pelas políticas atuais do capitalismo, a degradação do nível de vida dos trabalhadores, do progresso do país, a dilapidação do meio-ambiente. Todas essas são tarefas de dimensões internacionais.

Para derrotar essas políticas, é preciso levantar com a maior energia a voz de protesto dos povos contra as guerras de agressão.

Ligado a isso é que colocamos no centro de nossa atividade internacional a luta pela paz, contra a guerra imperialista. E a luta contra os planos neocolonialistas dos EUA vis-à-vis a América Latina. Por razões históricas e pela trajetória que percorremos como povo e nação desde a proclamação da Independência até hoje, o Brasil faz parte do que se chama de sistema de poder do imperialismo norte-americano. Somos considerados o quintal desse imperialismo. Objetivamente, fazemos parte desse sistema por razões históricas, geográficas e econômicas e pelo comportamento submisso das classes dominantes e dos governos que as representavam. Derrotar essas políticas é uma questão essencial para a trajetória, para a luta da libertação nacional e social do povo brasileiro.

Nesse contexto, é importante defender a soberania nacional, apoiando ao mesmo tempo os processos de integração e unidade continental na América Latina.

Movimentos sociais

Há uma realidade inteiramente nova nos movimentos sociais. Surgiram novas formas de articulação política internacional e de atividade internacionalista. Seguem atuantes o Fórum Social Mundial e suas respectivas ramificações continentais. Seguem atuantes as diferentes Redes, destacadamente a Campanha pela Desmilitarização das Américas, realizam-se as “cumbres” dos povos, paralelas às reuniões de chefes de Estado e de governo e as campanhas continentais. Revitalizam-se organizações que fizeram história, como a Federação Sindical Mundial (FSM), a Federação Mundial das Juventudes Democráticas (FMJD), a Federação Democrática Internacional de Mulheres (Fedim) e o Conselho Mundial da Paz. E surgem importantes movimentos anti-bélicos e de solidariedade contra os povos agredidos ou ameaçados pelo imperialismo. Ultimamente, recobrou fôlego o movimento pela abolição das armas nucleares.

Renascem as lutas

O ambiente de derrota e dispersão que o movimento social, incluído o movimento pela paz, viveu no início dos anos 1990 vai sendo superado. A última década foi marcada por um novo despertar, um renascimento das lutas. E esse renascimento foi implicando também o surgimento de uma série de novas forças políticas e novos movimentos, novas formas de articulação. Além disso, é preciso perceber que os EUA estão sofrendo muitas derrotas nas suas aventuras bélicas e isolados politicamente. É preciso tomar em consideração o cenário latino-americano, palco de importantes transformações políticas. Está aí a olhos vistos a vigência de uma série de governos democráticos, alguns assumidamente revolucionários, anti-imperialistas e socialistas. Mudou totalmente o panorama político no continente e no mundo. Significa que a revolução está batendo na porta? Não, não significa. Mas significa que as condições para lutar, para acumular forças revolucionárias estão melhorando. Estamos atuando num ambiente melhor, num ambiente mais progressista, num ambiente mais propiciador da unidade das forças avançadas.

Portanto, em nossa análise não podemos considerar a ofensiva do imperialismo como o único fator. Os ativistas sociais devem recorrer ao método dialético e perceber as potencialidades revolucionárias que estão despertando, porque, percebendo a incidência dessas novas forças, compreendendo essas potencialidades, poderemos dar passos na luta pela paz, por uma nova ordem mundial e pela conquista de um mundo melhor, de justiça e progresso social.

Penso que a concepção que nos norteia é o anti-imperialismo e a convicção de que o imperialismo não é invencível, será derrotado pela luta dos povos.

Nota: Texto apresentado na Conferência Internacional “A Integração Latino-Americana e a Luta pela Paz”, promovido pelo Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz – Cebrapaz, realizado em São Paulo, em 17 e 18 de junho.

Uma contra-revolução silenciosa em curso na Europa

A nova Governança Europeia visa colocar sob maior vigilância os orçamentos nacionais para reforçar as sanções contra os estados em déficit excessivo e limitar o crescimento dos gastos públicos. O pacto para o euro visa aumentar a flexibilidade do trabalho para evitar aumentos de salários e reduzir os gastos com a proteção social. A Grécia está no seu terceiro plano no espaço de um ano e viu a sua dívida e o seu déficit crescerem ao ritmo do empobrecimento da população. O mesmo destino aguarda a Irlanda, Portugal e Espanha. O artigo é de Thomas Coutrot, Pierre Khalfa, Verveine Angeli e Daniel Rallet, no CARTA MAIOR

Está para ser aprovado no Parlamento Europeu um pacote de seis propostas legislativas para uma nova política econômica da União Europeia. Enquanto isso, os governos europeus subscreveram em março um "pacto para o euro."

Do que se trata? A nova Governança Europeia visa colocar sob maior vigilância os orçamentos nacionais para reforçar as sanções contra os estados em déficit excessivo e limitar o crescimento dos gastos públicos. Uma medida já tomada completa o dispositivo, o"semestre europeu", que pretende apresentar ao Conselho e à Comissão os orçamentos dos estados antes mesmo de serem discutidos pelos parlamentos nacionais. O pacto para o euro, seguindo a proposta Merkel-Sarkozy de estabelecer um pacto de competitividade, visa, nomeadamente, aumentar a flexibilidade do trabalho, para evitar aumentos de salários e reduzir os gastos com a proteção social.

Essas medidas são tomadas em nome de um argumento de aparente bom senso. Os Estados não podem pedir ajuda à União se não houver regras. Mas, na ausência de qualquer debate democrático sobre as políticas econômicas a adoptar, as atuais medidas acabam por enfraquecer os parlamentos nacionais em benefício dos Ministérios das Finanças e da tecno-estrutura europeia. E de que ajuda se trata? Os montantes emprestados pela União são obtidos nos mercados a juros relativamente baixos e emprestados aos Estados que estão em dificuldades a taxas de juros muito mais elevadas. É o povo que paga o preço mais alto com a implementação de planos de austeridade drástica, arruinando qualquer hipótese de recuperação económica. Prova disso é o exemplo patético da Grécia, agora no seu terceiro plano no espaço de um ano, que viu a sua dívida e o seu déficit crescerem ao ritmo do empobrecimento da população. Enquanto isso, os bancos podem continuar a refinanciar-se junto do Banco Central Europeu (BCE) com taxas ridículas, e a emprestar aos estados com juros muito mais altos. Assim, em fevereiro, as taxas a dois anos para a Grécia ultrapassaram os 25%. Não são as pessoas que recebem ajuda, são os bancos e os bancos europeus, em particular!

O mesmo destino aguarda agora a Irlanda, Portugal e a Espanha. Mas todos os países europeus são confrontados com o mesmo tratamento. Os governos, o BCE, a Comissão e o Fundo Monetário Internacional (FMI) usam a purga social como os médicos de Molière usavam a sangria. Numa Europa de economias totalmente integradas, onde os clientes de uns são os fornecedores de outros, tais medidas levam a uma lógica recessiva e, portanto, a uma redução das receitas fiscais que vai alimentar ainda mais os défices. Socialmente desastrosas, são economicamente absurdas.

Mas, dizem-nos, não havia outra opção. É preciso "assegurar os mercados.” Reconhecemos aqui o argumento final, o famoso "Tina", que foi, a seu tempo, empregue por Margaret Thatcher: "There is no alternative." Na verdade não há alternativa, se continuarmos a submeter-nos aos mercados financeiros. Este é o ponto cardeal e o ponto de partida de qualquer política. Como tal, para a votação do Parlamento Europeu marcada para junho, esperamos que os partidos da esquerda europeia se recusem claramente a votar em propostas com consequências dramáticas para a população.

É possível – e hoje é indispensável – uma verdadeira ruptura: ela vai consistir não em "tranquilizar os mercados", mas organizar o seu desarmamento sistemático, começando por lhes retirar o primeiro instrumento de chantagem, a possibilidade de especular com as dívidas públicas. Antes da crise, a origem da dívida estava na queda de receitas devida aos benefícios fiscais feitos às famílias mais ricas e às empresas. No momento da crise financeira, os Estados foram forçados a injetar quantidades maciças de liquidez na economia para evitar que o sistema bancário entrasse em colapso e que a recessão se transformasse em depressão. A explosão dos déficits tem, portanto, as suas raízes no comportamento dos operadores financeiros que são a causa da crise.

As dívidas públicas são, em grande parte, ilegítimas e, portanto, uma auditoria pública da dívida permitirá decidir o que será reembolsado ou excluído. O BCE deverá poder, sob supervisão democrática europeia, financiar os déficits públicos conjunturais. Uma reforma fiscal ampla, tanto em nível nacional como europeu, permitirá encontrar espaço de manobra à ação pública. Tais medidas requerem, portanto, vontade política para romper com o domínio dos mercados financeiros sobre a vida econômica e social. Esta vontade política, de momento, não existe. Será preciso impô-la. O presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, falou de uma "revolução silenciosa" a propósito das medidas tomadas pela União Europeia. Preferimos falar de contra-revolução, mas, ao passo que Durão Barroso rejubila, nós só podemos lamentar o quase-silêncio, especialmente da França, sobre estas questões que são, no entanto, capitais. Como gritam os manifestantes da praça Puerta del Sol: "Não é uma crise, é uma ladroagem." Essas políticas encostam a União Europeia à parede: está na hora de inventar outra coisa.

(*) Thomas Coutrot, co-presidente da Attac França; Pierre Khalfa co-presidente da fundação Copérnico; Verveine Angeli, sindicalista; Daniel Rallet, sindicalista. Publicado no jornal francês Libération, em 7 de Junho de 2011.

(*) Tradução de Deolinda Peralta para o Esquerda.net

Catarse - Advogado do estudante que denunciou a Brigada do RS ameaçado

Em uma entrevista exclusiva à Catarse, Onir de Araújo, advogado do estudante Hélder Santos que veio da Bahia para estudar história em Jaguarão - RS, também está sofrendo ameaças devido as denúncias de violência policial e racismo feitas pelo jovem em março deste ano. As denúncias geraram um inquérito militar e o afastamento dos brigadianos envolvidos. Desde então várias pessoas, inclusive o advogado, estão sofrendo ameaças que, segundo as vítimas, partiram dos brigadianos. Assista a reportagem do Coletivo Catarse.
 

Blogueiros cobram banda larga melhor, marco regulatório e internet livre


Carta do II BlogProg – Brasília – Junho de 2011

Desde o I Encontro Nacional dos Blogueir@s Progressistas, em agosto de 2010, em São Paulo, nosso movimento aumentou a sua capacidade de interferência na luta pela democratização da comunicação, e se tornou protagonista da disseminação de informação crítica ao oligopólio midiático.

Ao mesmo tempo, a blogosfera consolidou-se como um espaço fundamental no cenário político brasileiro. É a blogosfera que tem garantido de fato maior pluralidade e diversidade informativas. Tem sido o contraponto às manipulações dos grupos tradicionais de comunicação, cujos interesses são contrários à liberdade de expressão no país.

Este movimento inovador reúne ativistas digitais e atua em rede, de forma horizontal e democrática, num esforço permanente de construir a unidade na diversidade, sem hierarquias ou centralismo.

Na preparação do II Encontro Nacional, isso ficou evidenciado com a realização de 14 encontros estaduais, que mobilizaram aproximadamente 1.800 ativistas digitais, e serviram para identificar os nossos pontos de unidade e para apontar as nossas próximas batalhas.

O que nos une é a democratização da comunicação no país. Isso somente acontecerá a partir de intensa e eficaz mobilização da sociedade brasileira, que não ocorrerá exclusivamente por conta dos governos ou do Congresso Nacional.

Para o nosso movimento, democratizar a comunicação no Brasil significa, entre outras coisas:

a) Aprovar um novo Marco Regulatório dos meios de comunicação. No governo Lula, o então ministro Franklin Martins preparou um projeto que até o momento não foi tornado público. Nosso movimento exige a divulgação imediata desse documento, para que ele possa ser apreciado e debatido pela sociedade. Defendemos,entre outros pontos, que esse marco regulatório contemple o fim da propriedade cruzada dos meios de comunicação privados no Brasil.

b) Aprovar um Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) que atenda ao interesse público, com internet de alta velocidade para todos os brasileiros. Nos últimos tempos, o governo tem-se mostrado hesitante e tem dado sinais de que pode ceder às pressões dos grandes grupos empresariais de telecomunicações, fragilizando o papel que a Telebrás deveria ter no processo. Manifestamos, ainda, nosso apoio à PEC da Banda Larga que tramita no Congresso Nacional (propõe que se inclua, na Constituição, o acesso à internet de alta velocidade entre os direitos fundamentais do cidadão).

c) Ser contra qualquer tipo de censura ou restrição à internet. No Legislativo, continua em tramitação o projeto do senador tucano Eduardo Azeredo de controle e vigilância sobre a internet – batizado de AI-5 Digital. Ao mesmo tempo, governantes e monopólios de comunicação intensificam a perseguição aos blogueiros em várias partes do país, num processo crescente de censura pela via judicial. A blogosfera progressista repudia essas ações autoritárias. Exige a total neutralidade da rede e lança uma campanha nacional de solidariedade aos blogueiros perseguidos e censurados, estabelecendo como meta a criação de um “Fundo de Apoio Jurídico e Político” aos que forem atacados.

d) Lutar pelo encaminhamento imediato do Marco Civil da Internet, pelo poder executivo, ao Congresso Nacional.

e) Fortalecer o movimento da blogosfera progressista, garantindo o seu caráter plural e democrático. Com o objetivo de descentralizar e enraizar ainda mais o movimento, aprovamos:

- III Encontro Nacional na Bahia, em maio de 2012.

A Comissão Organizadora Nacional passará a contar com 15 integrantes:

- Altamiro Borges, Conceição Lemes, Conceição Oliveira, Eduardo Guimarães, Paulo Henrique Amorim, Renato Rovai e Rodrigo Vianna (que já compunham a comissão anterior);

- Leandro Fortes (representante do grupo que organizou o II Encontro em Brasília);

- um representante da Bahia (a definir), indicado pela comissão organizadora local do III Encontro;

- Tica Moreno (suplente – Julieta Palmeira), representante de gênero;

- e mais um representante de cada região do país, indicados a partir das comissões regionais (Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e Norte). As comissões regionais serão formadas por até dois membros de cada estado, e ficarão responsáveis também por organizar os encontros estaduais e estimular a formação de comissões estaduais e locais.

Os blogueir@s reunidos em Brasília sugerem que, no próximo encontro na Bahia, a Comissão Organizadora Nacional passe por uma ampla renovação.

f) Defender o Movimento Nacional de Democratização da Comunicação, no qual nos incluímos, dando total apoio à luta pela legalização das rádios e TVs comunitárias, e exigindo a distribuição democrática e transparente das concessões dos canais de rádio e TV digital.

g) Democratizar a distribuição de verbas públicas de publicidade, que deve ser baseada não apenas em critérios mercadológicos, mas também em mecanismos que garantam a pluralidade e a diversidade. Estabelecer uma política pública de verbas para blogs.

h) Declarar nosso repúdio às emendas aprovadas na Câmara dos Deputados ao projeto de Lei 4.361/04 (Regulamentação das Lan Houses), principais responsáveis pelos acessos à internet no Brasil, garantindo o acesso à rede de 45 milhões de usuários, segundo a ABCID (Associação Brasileira de Centros de Inclusão Digital).

Brasília, 19 de junho de 2011
 
Por Miguel do Rosario no OLEO DO DIABO

A luta dos agricultores em Marabá

Por Elaine Tavares

Mais de sete mil agricultores se manifestam na Transamazônica em Marabá. Uma luta escondida, não divulgada, de uma gente que precisa fazer os maiores sacrifícios para ser ouvida. Enquanto os grandes empresários, os latifundiários e as multinacionais levam o que querem desse governo, os trabalhadores não encontram eco nas suas reivindicações.

O “nacionalismo” naval da Folha está furado


Por Brizola Neto no TIJOLACO

Quando a gente fala que a mídia manipula a informação, não está dizendo que ela mente.
Está dizendo que distorce, aumentando um lado, reduzindo o outro.
Vejam o caso da manchete – e mais quase toda uma página  interna da edição de hoje da Folha de S. Paulo.


Aí vem a conta marota.
Como foram compradas 22 plataformas e, destas, só três foram integralmente construídas aqui, tem-se que 3/22 é igual a  13,6%. E então, 87% dão estrangeiras. Arredondando, 90%, não é?
Aí você, pacientemente, lê toda a matéria. A repórter Leila Coimbra jamais escreve a expressão 90%, senão uma vez, para dizer que das  48 plataformas da petroleira privada OSX, 90% serão construídas no Brasil, no estaleiro que o grupo empresarial de Eike Batista está começando a construir no Porto do Açu, em sociedade com a sul-coreana Hyundai Heavy Industries, e que será, segundo os planos, o maior estaleiro das Américas.
Como a empresa já achou e extrai petróleo, é óbvio que ela não iria esperar ficar pronto o estaleiro e que o estaleiro produzisse as plataformas, não é? Até porque, é evidente, um estaleiro não é simples como “fazer um puxadinho” e construir uma plataforma não é fazer um toldo de varanda. Portanto, nada mais natural que, na fase inicial, ela comprasse quatro plataformas em estaleiros que fazem uma atrás da outra.
Mas vá lá, é uma empresa privada e, se a Folha não se incomoda em que a Vale – segundo ela, empresa privada também, embora o estado tenha a maioria das ações do consórcio controlador – faça navios lá fora, é estranho que se incomode com o fato de a OSX fazê-lo. E, como se viu, nem é o caso.
Bom, sobram então, dos 15 equipamentos utilizados no gráfico que ilustra a matéria, 11 equipamentos pertencentes à Petrobras, e só três deles  feitos no exterior: a TLP-61 e os navios-plataforma (FPSO) Santos e Angra dos Reis.
E por que? Os dois FPSO foram comprados porque se destinam aos sistemas definitivos de exploração dos campos de Tupi e Lula, os primeiros do pré-sal. Eles substituem outros, afretados no exterior, que fizeram os testes de longa duração, mas que não têm capacidade de suportar o megavolume – 100 mil barris/dia – que os poços terão na sua operação comercial.  Foi, portanto, uma opção de velocidade na entrada de operação do pré-sal.
Opção que, de forma alguma, substitui ou reduz o empenho da Petrobras em desenvolver a indústria naval e petrolífera nacionais. Tanto que os FPSO apontados como tendo “parte nacional, parte estrangeira” são, na sua maioria, cascos comprados e reformados estruturalmente no exterior – eles têm previsão de ficarem ancorados no poço por 20 anos, não podem vir á terra para pequenos reparos – e convertidos aqui em navios-plataforma. O P-58 está no Estaleiro Estaleiro Rio Grande – que vai fazer oito outros FPSO, chamados “replicantes” – e o P-52 no Estaleiro Atlântico Sul, em Pernambuco. Lá, também, será sendo feito o “Cidade de São Paulo”, que tem apenas o casco importado da China.
Aliás, uma das características comuns a muitos navios-plataforma do tipo FPSO é serem construídos, por opção econômica, a partir de cascos de antigos navios petroleiros de grande capacidade – os chamados VLCC, Very Large Crude Carriers – que não são mais competitivos como navios de longo curso mas que se prestam perfeitamente – por sua enorme capacidade de tanques -  à operação quase estacionária de um navio-plataforma. Daí a necessidade de reforma do casco, em geral em dique seco, para reforçar suas características estruturais. O complexo não é o casco, mas a construção de uma plataforma de petróleo sobre ele.
 
E a TLP-61? É simples, é uma plataforma de um tipo diferente, pioneira no Brasil. E não está sendo feita no exterior, não.  Está sendo feita no Estaleiro Brasfels, em Angra dos Reis.
Mas, como é uma plataforma de outro tipo, diferente de todas já utilizadas pela Petrobras, a execução do projeto implicará a utilização de uma balsa especial para a etapa de mating (acoplamento do casco ao convés). A balsa existente no Brasfels, utilizada na construção de P-52, P-51 e P-56, não se encaixa à P-61, por que a  distância entre  suas colunas é menor do que em plataformas semissubmersíveis, como as que usa a Petrobras.  Assim, a nova balsa será construída no estaleiro da Keppel Fels em Singapura, junto com uma parte do convés e dos topsides da plataforma, que chegam ao estaleiro brasileiro no fim deste ano.
Agora, se a Folha se preocupa tanto com a questão da nossa capacidade de construir aqui plataformas para a exploração de petróleo, ao ponto de dedicar uma capa do caderno de economia à nossa “incapacidade” de fazê-las, porque dedicou, no dia da inauguração da P-52, no início deste mês, a plataforma com maior índice de nacionalização já alcançado (73%), apenas dois parágrafos de uma pequena matéria, como voc~e pode ver na reprodução publicada aí ao lado?
Seria isso o que o neoacadêmico Merval Pereira disse outro dia, desqualificando os blogs, a “capacidade de hierarquizar a notícia” da grande mídia?

Crise na europa derruba empregos e Brasil se torna a nova Meca dos imigrantes

  Por Redação, com BBC - de Londres



imigrantes
Os imigrantes precisam passar por um longo processo de aprovação no país de destino

Entre 2003 e 2007, a Espanha recebeu dezenas de milhares de imigrantes, mas a crise econômica que persiste no país está alterando o fluxo migratório. Sem emprego no presente e sem perspectivas para o futuro, os estrangeiros procuram saídas em outros lugares. E o Brasil virou meta para os latino-americanos de baixa formação. De acordo com quatro relatórios que investigam as respostas dos imigrantes diante da crise, o Brasil aparece entre os três destinos preferidos de sul-americanos hispânicos (junto com Estados Unidos e Argentina) como opção para conseguir emprego.
Uma pesquisa da agência de empregos Randstad revelou que 65% dos imigrantes ilegais na Espanha estão pensando ou decididos a trocar a Europa por outro mercado se não encontrarem trabalho até 2012. Os estudos antecipam um fluxo que já pode ter começado. Em 2010, pela primeira vez nos últimos 35 anos, a Espanha registrou uma taxa de saída de população ativa maior do que a de entrada.
No ano passado, 48 mil imigrantes chegaram e 43 mil estrangeiros retornaram aos seus países de origem, mas 90 mil espanhóis também foram morar no exterior. O ritmo de redução é tão vertiginoso que em cinco anos o fluxo de chegada pode ser praticamente nulo. Pelas previsões da Fundação de Estudos de Economia Aplicada, se a crise se mantiver como agora, em 2014 chegariam apenas 3 mil imigrantes.

Saídas

Josep Oliver, professor de economia da Universidade Autônoma de Barcelona e um dos autores do Anuário de Imigração da Espanha, do Ministério do Interior, disse que “80% dos imigrantes não têm outras saídas além do aeroporto rumo a mercados com melhores opções, como o Brasil, que oferece oportunidades sólidas”. A pesquisa Mobilidade Laboral, da Randstad, indica que a Espanha perdeu interesse para o trabalhador estrangeiro de baixa formação.
A razão é o perfil destes imigrantes, cujos currículos se limitam a ofícios relacionados a áreas que não se reativam, como serviços e construção. O setor de construção foi precisamente o que detonou a crise de desemprego. De 2008 a 2010 quebraram mais de 200 mil empresas do ramo, que davam trabalho a 70% dos imigrantes sul-americanos, segundo dados oficiais.
Os estrangeiros entrevistados na pesquisa responderam que querem sair da Espanha, mas temem crises políticas e econômicas na América Latina e só vêem bonança financeira no Brasil, onde criticam a falta de segurança pública. Mais ainda assim estão convencidos de que se não encontrarem emprego até 2012, o caminho é o aeroporto. Estados Unidos, Brasil ou Argentina, na ordem dos mais votados.

Alta formação

O Brasil também aparece como opção para espanhóis de alta formação.Um estudo elaborado pela consultora Adecco e pela Universidade de Navarra indica que os espanhóis com alto grau de formação e que também foram atingidos pela crise colocam o Brasil como um dos seis destinos preferidos para emigrar por emprego. O mercado brasileiro é visto como opção para 55% dos entrevistados, junto com Alemanha, França, Grã-Bretanha, Estados Unidos e Argentina.
O perfil médio dos interessados em cruzar o Atlântico é de homens, entre 25 e 35 anos, com formações em engenharia, arquitetura, informática, medicina, biologia e investigação científica.
– Que engenheiro ou arquiteto não quer ir para o Brasil, de olho nas obras de infraestrutura? Está tudo por fazer, e agora há também recursos, referências de empresas espanholas já estabelecidas e a abertura ao (idioma) espanhol. Essas pessoas entendem que insistir aqui é uma perda de tempo. O Brasil cresce a uma velocidade que nenhum país da Europa pode se comparar – disse o professor de Economia da Universidade de Navarra Sandalio Gómez, autor do relatório apresentado em janeiro.
Os dados do Instituto Nacional de Estatística confirmam a tendência. Até janeiro de 2011, havia 1,8 milhão de espanhóis morando em outros países; 92.260 no Brasil, um aumento de 10.071 pessoas em um ano no território brasileiro.

Problemas

Mas, apesar das oportunidades, o país perde para outros destinos em vários quesitos. Os entrevistados da pesquisa ressaltam insegurança, falta de serviços públicos de qualidade, instabilidade econômica e jurídica para quem quer criar um negócio próprio e a distância de seus lugares de origem como barreiras a levar em consideração. O governo espanhol reforça estas conclusões. A diretora-geral do Departamento de Emigração, (que estuda as condições dos espanhóis em outros países), Pilar Pin, define como impedimentos as carências nos sistemas de seguro-desemprego, rede púbica de saúde e educação e a legislação trabalhista.
Em um relatório oficial apresentado em maio depois de uma visita a Brasília, Pin afirmou que o Brasil tem “enorme potencial com seus iminentes eventos como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos, além de obras para abastecimento de energia, proteção ambiental e turismo”. Apesar disso, o relatório observa: “A legislação de implantação de empresas no Brasil é restritiva demais. Nossos trabalhadores vão com licença de obra. No final do contrato encontram muitas dificuldades para estabelecer-se por conta própria”.
Mesmo assim, segundo o relatório, as autoridades brasileiras calculam que faltam 1,9 milhão de profissionais de alta qualificação. Uma lacuna que os espanhóis poderiam ocupar.

Eleições no Cpers: Sul21 entrevista os três candidatos


Rejane, Simone e Luiz Afonso disputam eleições no Cpers | Foto: Divulgação/Sul21

Vivian Virissimo

Marcada para a próxima terça-feira (28), a eleição para a diretoria do Cpers acontece em meio a um contexto decisivo para os professores. Centrada em torno de temas historicamente caros para a categoria, como melhoria de salários, plano de carreira e alteração na previdência, a disputa mobiliza três chapas.
A atual líder da entidade, Rejane de Olveira, a ex-presidente Simone Goldschmidt, ambas ligadas ao PT, e Luiz Afonso Medeiros, ligado ao PDT, disputam o voto do magistério. O Sul21 encaminhou, por e-mail, seis perguntas para os três candidatos.

Rejane de Oliveira
Chapa 1: “Em frente: para manter e conquistar”

Qual sua posição sobre as alterações na previdência estadual, previstas no pacote encaminhado pelo governador Tarso Genro à Assembleia?
Nós não concordamos, pois as mudanças visam solucionar os ditos problemas financeiros do Estado, retirando direitos dos servidores. Mais uma vez, é sobre os ombros dos trabalhadores que querem jogar os alegados problemas.
Que tipo de repercussão uma mudança no plano de carreira dos professores terá para a categoria e para a melhoria da qualidade do ensino?
Nós defendemos o atual plano de carreira. Ele tem avaliação interna, valoriza a habilitação e a experiência, esta por meio dos triênios. Além disso, não podemos cegar os olhos para o que está acontecendo. O governo tem que cumprir a lei do piso nacional, porém alega dificuldades financeiras. Faz fortes movimentos para reduzir os gastos com os trabalhadores, como cortar o pagamento das RPVs, aumentar a contribuição para a previdência. Ora, neste contexto, mexer no plano de carreira pode significar a perda de boa parte do que conquistamos com o Piso Nacional. E não pode haver melhoria na qualidade de ensino se o estado continuar fechando cada vez mais as torneiras para os educadores. O governador Tarso se comprometeu, tanto no debate entre os candidatos como na negociação com o CPERS em não mexer no plano. Agora vamos ver se é um governador que tem palavra, ou não.
O governador sinaliza com a implantação de um sistema de avaliação dos professores. Qual é sua opinião?
O que não concordamos é que se possa fazer avaliação do educador apenas a partir dos resultados dos alunos. Mesmo pública, uma escola da periferia não tem as mesmas condições de outra em bairro de classe média. Não podemos admitir que professores e funcionários de escola que já sofrem mais para educar em comunidades socialmente vulneráveis venham ser penalizados pelo baixo desempenho que possa ter uma comunidade exposta, por exemplo, a drogas e violência. Não basta dar um giz e um quadro negro para que os educadores mudem a realidade das pessoas. É preciso um bom projeto político pedagógico e formação continuada. É necessário estruturar as escolas, dando condições para a aprendizagem e para o trabalho. Tem que haver bons laboratórios, bibliotecas com acervo adequado, material pedagógico, além de salário digno para que os educadores possam acessar a internet, comprar revistas, livros, jornais e não tenham que trabalhar em três turnos para sobreviver.
Sobre o cumprimento da lei do piso nacional do magistério, quais poderiam ser as estratégias adotadas pelo sindicato para consolidar este direito?
Lei não é só para o povo cumprir. Os governantes também estão sujeitos. Aqui no Rio Grande do Sul fizemos a primeira greve do País em defesa do piso. E é assim, na luta, que garantiremos sua implantação. Vamos continuar cobrando do governo a imediata implantação do piso, ao mesmo tempo em que lutamos contra toda e qualquer retirada de direitos.
Qual deve ser a postura do Cpers em relação à Secretaria da Educação e ao governo estadual?
O CPERS deve ter a mesma postura que teve com governos anteriores: de independência, lutando por uma educação pública de qualidade e colocando sempre professores e funcionários de escola em primeiro lugar.
Por fim, que análise se pode fazer da conjuntura atual da educação pública no Rio Grande do Sul?
Não é possível falar em educação de qualidade sem investimento na escola pública, valorização profissional – que passa pela implementação do piso nacional – projeto político pedagógico debatido com a comunidade escolar, condições de trabalho e formação continuada. A educação precisa de investimentos urgentes e não de cortes. Já está provado que poupar, cortando da educação, só atrasa o estado. Mas, infelizmente, as propostas apresentadas até aqui pelo atual governo sinalizam para a tentativa de reduzir direitos dos educadores, já que o estado terá que cumprir a lei do piso. Nós lutaremos para que seja implementada a lei do piso para professores e funcionários de escola sem que sejam retirados direitos dos educadores.

Simone Goldschmidt
Chapa 2: “Unidos pela Educação”

Qual é sua posição sobre as alterações na previdência estadual previstas no Pacote do governo Tarso?
Não concordamos. A transferência de responsabilidade do pagamento das aposentadorias dos novos servidores para um fundo de previdência capitalizado não garante nada. Além disso, entendemos que alíquota diferenciada é inconstitucional. Os servidores que teriam descontos de 16,5% em seu salário poderiam derrubar facilmente a decisão na Justiça.
Que tipo de repercussão uma mudança no plano de carreira dos professores terá para a categoria e para a qualificação do ensino?
Não propomos e não estamos discutindo mudanças no plano de carreira. Queremos a implantação da lei do piso, que envolve aumento salarial, um terço da carga horária dedicada ao planejamento, além de investimentos na área da educação. Não temos dúvidas que essas ações qualificariam a educação no Rio Grande do Sul e no Brasil.
O governo sinaliza com a implantação de um sistema de avaliação dos professores. Qual é sua opinião?
Não temos problemas com avaliação, mas é preciso refletir sobre os objetivos da avaliação. Se for para valorizar, investir e melhorar as condições de trabalho, podemos realizar um extenso debate sobre o tema. Mas, temos que lembrar que nosso plano de carreira já nos avalia. Sendo assim, basta levar a sério esse instrumento. Se a ideia é avaliar para demitir ou dar prêmios uma vez por ano, somos totalmente contrários. Os prêmios não são salários, não contam para aposentadoria e servem somente para governos “fazerem de conta” que usam os 60% dos recursos do FUNDEB que deveria ser utilizado para pagamento de pessoal.
Sobre o cumprimento da lei do piso nacional, quais poderiam ser as estratégias adotadas pelo sindicato para consolidar esse direito?
Foi aprovado na assembleia do CPERS que o sindicato buscasse negociar com o governo um calendário de implantação do piso. Porém, a atual direção não encaminhou nenhuma proposta. Temos que, primeiramente, buscar nossa reivindicação através do diálogo. Caso não surta efeito, temos várias formas de fazer pressão em favor da categoria. Hoje, vários estados brasileiros (Alagoas, Amapá, Minas Gerais, Santa Catarina, Ceará, Mato Grosso, Rio Grande do Norte e Sergipe) estão em greve pelo cumprimento do piso. Afinal, ele é garantido por lei e, inclusive, já foi confirmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Qual deve ser a postura do CPERS em relação ao Governo do Estado e à Secretaria de Educação?
Uma postura completamente independente e crítica, mas com respeito e busca de negociação para avanços da categoria e da educação. Quando o diálogo não for possível, intensifica-se a mobilização. A pressão tem que vir pela capacidade de aglutinação de forças, com uma intensa valorização da base.
Qual é a análise que se pode fazer da conjuntura atual da educação pública no RS?
A educação, não só no Rio Grande do Sul como no País, sofre as consequências de décadas de descaso. Vemos falta de professores em escolas, muitos contratos emergenciais, necessidade de concursos públicos, além de precariedade na estrutura física de instituições de ensino. Nós exigimos que os governos invistam fortemente na área para que tenhamos uma educação qualificada e que nos deixe orgulhosos de dizermos que somos professores.

Luiz Afonso Medeiros
Chapa 3: “Muda Cpers – Educação Já”

Qual é sua posição sobre as alterações na previdência estadual previstas no Pacote do governo Tarso?
Somos radicalmente contra o pacote. Consultados que fomos por nosso partido sobre nossa posição em relação ao pacote informamos da nossa posição e sugerimos que o PDT aproveitasse a ocasião para abandonar a base de apoio do governo, pois este pacote fere o compromisso do PDT em relaçao a defesa dos funcionários públicos.
Que tipo de repercussão uma mudança no plano de carreira dos professores terá para a categoria e para a qualificação do ensino?
Somos a favor da implantação imediata do piso nacional, ele junto com nosso plano de carreira garantirão uma inegável melhoria na auto-estima do professor e com certeza isto na qualidade do ensino no nosso Estado.
O governo sinaliza com a implantação de um sistema de avaliação dos professores. Qual é sua opinião?
Nós educadores não podemos ter preconceito contra avaliação, pois isto é um dos nossos fundamentos profissionais. Da mesma forma que avaliamos nossos alunos não podemos ter receios de sermos avaliados.
Sobre o cumprimento da lei do piso, quais poderiam ser as estratégias adotadas pelo sindicato para consolidar esse direito?
O piso nacional é uma lei de autoria do senador Cristóvam Buarque, o Coordenador Nacional do Educaçao Já, nosso movimento,
vamos com a sua força e credibilidade e nossa histórica tradição de mobilização e luta pressionar o governo Tarso a cumprir sua palavra empenhada na campanha eleitoral.
Qual deve ser a postura do CPERS em relação ao Governo do Estado e à Secretaria de Educação?
De absoluta independência, com capacidade de diálago e firmeza na defesa dos nossos interesses.
Qual é a análise que se pode fazer da conjuntura atual da educação pública no RS?
Temos tudo neste momento para darmos um salto de qualidade na educação pública do nosso Estado. Até porque os atuais dirigentes educacionais têm postura e prática democrática. O governo anterior, especialmente no período em que a secretaria foi dirigida de forma autoritária, prepotente e tecnocrática, a partir de falsas premissas e conceitos, retrocedeu. A substituição da então secretaria mostrou o equívoco do governo em patrocinar este método de gestão, que só angariou antipatias, críticas e mal estar entre nós educadores, este período rivalizou com um período até hoje é abominado por todos os educadores que foi o periodo do calendário rotativo, de triste memória a todos professores e comunidade escolar.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

O efeito Al Jazeera


Em poucos anos, a rede de televisão Al Jazeera alterou profundamente a paisagem midiática nos países árabes e criou um espaço público transnacional, transformando-se num protagonista decisivo das mudanças drásticas que vêm abalando a região desde o final do ano passado
por Mohammed El Oifi no LeMondeDiplomatique-Brasil
No dia 2 de março, em discurso perante os membros da comissão das relações exteriores do Senado estadunidense, Hillary Clinton pronunciou as palavras que o emir do Qatar e os dirigentes da Al Jazeera esperavam desde 2001. Os Estados Unidos, explicou a secretária de Estado, “estão perdendo a guerra da informação” no mundo por causa dos grandes canais de TV privados norte-americanos “que difundem milhões de spots publicitários e debates entre especialistas”, ao passo que “a audiência da Al Jazeera nos Estados Unidos vem crescendo porque ela oferece verdadeiras informações”. E Hillary acrescentou, dirigindo-se precisamente aos senadores: “Gostem disso ou não, [a Al Jazeera] é realmente poderosa”.Ela está no processo de “mudar as mentes e os comportamentos”.1
Ainda que motivada por interesses específicos – Hillary Clinton estava defendendo o orçamento de seu ministério –, tal reconhecimento do papel e do impacto internacional da Al Jazeera adquire uma ressonância particular dentro do contexto das transformações atuais do mundo árabe. No plano regional, o canal impôs seu ritmo e suas regras de funcionamento no contexto midiático, marginalizando dessa forma alguns de seus concorrentes de língua árabe e perturbando o jogo dos outros. Nesse sentido, o desafio lançado ao vivo a seus empregadores por Hafez Al-Mirazi, o apresentador-estrela do canal saudita Al-Arabiya, o principal concorrente da Al Jazeera,2 reveste-se de um significado de peso. Ao comentar a queda do regime de Hosni Mubarak, o jornalista egípcio lamentou que o veículo para o qual ele trabalhava não se atrevia a “dizer uma palavra sequer a respeito do rei Abdala e do regime saudita”. Ele concluiu seu discurso com um ultimato: “Se nós não podemos expressar nossa opinião, é melhor parar com tudo. No próximo programa, faremos uma experiência: falaremos a respeito do impacto[da revolução no Egito]sobre a Arábia Saudita. Se der certo, a Al-Arabiya é mesmo um canal independente; se não, eu agradeço e me despeço de todos vocês”.3 Aquela foi sua última aparição no canal controlado pelos interesses sauditas. Sua revolta revela o impasse no qual desembocou a estratégia midiática de Riad e a incapacidade dos responsáveis se adaptarem às novas realidades políticas. Mas esse episódio também anuncia o retorno do Egito, emancipado da tutela paralisante do presidente Hosni Mubarak, ao jogo midiático árabe, o que constituirá provavelmente o principal evento na região ao longo dos próximos anos.
Desde sua fundação, em novembro de 1996, o canal de informação 24 horas Al Jazeera revolucionou o sistema midiático regional, transformando sua estrutura e suas regras de funcionamento e questionando o equilíbrio de forças políticas que o sustenta.4 Não faltam aqueles que lhe atribuem um papel mais importante que o das redes sociais no processo que desencadeou as revoltas que abalam o mundo árabe. Assim, segundo Julian Assange, o cofundador do WikiLeaks, as redes Twitter e Facebook “exerceram de fato um papel, mas este não é comparável àquele da Al Jazeera”.5
 
 
FIM DO MONOPÓLIO SAUDITA

Os veículos de comunicação árabes singularizam-se pela existência – tornada possível por uma língua comum – de uma esfera compartilhada que transcende os Estados e os públicos nacionais, e cuja gênese remonta ao final do século XIX. As rivalidades interárabes passaram pelo controle desse espaço público, um campo no qual os países do Golfo, entre outros a Arábia Saudita e o Qatar, tomaram a iniciativa. Após a saída de cena do Egito, em decorrência da morte em 1970 do presidente Gamal Abdel Nasser, e do Iraque, em consequência da invasão do Kuait em 1990, a Arábia Saudita assumiu o controle da maior parte dos veículos de comunicação pan-árabes. Em meados dos anos 1990, o lançamento da Al Jazeera pelo emir do Qatar, o xeque Hamad bin Khalifa al-Thani, caracterizou o fim do monopólio saudita.
Em função da escolha do local para estabelecê-la, das modalidades de recrutamento de seus jornalistas e de suas opções ideológicas, a Al Jazeera introduziu uma tripla ruptura em relação à fórmula saudita. Até então, dominava a ideia segundo a qual apenas os veículos árabes instalados no exterior podiam gozar de uma liberdade relativa. A emigração de uma parte da imprensa libanesa rumo à Europa após o advento da guerra civil, em 1975, havia reforçado essa tese. O império midiático saudita estava radicado em Londres e na Itália, e tirava proveito da presença maciça de jornalistas árabes, sobretudo libaneses, que se tornaram os aliados – alguns dirão os mercenários – dos emires sauditas. A Al Jazeera pôs em xeque esse pressuposto, demonstrando que um veículo de comunicação pan-árabe instalado num país da região podia beneficiar-se de uma grande liberdade. Progressivamente, os veículos sauditas começaram a retornar para a região, entre outros para os Emirados Árabes Unidos – mas não para a Arábia Saudita.
Para motivar a simpatia e a identificação do público, os criadores da Al Jazeera quiseram que o conjunto dos funcionários do canal fosse representativo das diversas nações árabes; com isso, estava encerrada a era de dominação dos jornalistas libaneses e das estruturas sauditas.
De modo previsível, as dissensões no âmbito das equipes jornalísticas são frequentes, conforme demonstra a demissão coletiva de cinco apresentadoras do canal ocorrida no dia 25 de maio de 2010. Alguns veículos de comunicação árabes repercutidos pela imprensa internacional enfatizaram a existência de práticas de assédio moral, além da vontade do canal de impor um código de vestimenta rigoroso.6 Segundo explica uma das jornalistas demitidas, Joumana Namnour, as verdadeiras razões dessa revolta nada têm a ver com o modo de se vestir, sendo de ordem profissional,7 pois as apresentadoras achavam lastimável o pouco poder que lhes era dado. Assim como, por exemplo, nenhum dos numerosos programas políticos do canal é atribuído a uma mulher.
Um exame minucioso da identidade ideológica da Al Jazeera e de sua linha editorial revela a prevalência de um equilíbrio sutil entre três tendências: pan-árabe, islamizante e liberal.
O sucesso da Al Jazeera, o interesse e até mesmo a paixão que ela suscita nos públicos de língua árabe podem ser explicados não apenas pela maneira inovadora com a qual ela aborda a atualidade, mas também pela liberalidade em seus procedimentos. Ao dar a palavra à oposição, em cada país árabe, para comentar as verdades oficiais, a Al Jazeera oferece aos telespectadores verdadeiros debates contraditórios. A diversidade dos participantes, tanto do ponto de vista de sua nacionalidade, de sua sensibilidade ideológica e política quanto de seu local de residência, permitiu a circulação das ideias e dos pontos de vista, promovendo a abolição das fronteiras nacionais e driblando todas as censuras. Assim, o canal participou de maneira decisiva da formação de um espaço público árabe transnacional.8 Estruturado por canais de TV por satélite e por jornais pan-árabes, aos quais se acrescentam a internet, os blogs e as redes sociais, esse espaço tornou-se um centro de gestação onde se formam opiniões e preferências políticas a respeito de todas as questões que agitam a região.
Esse pluralismo, decorrente da multiplicação dos meios de informação transfronteiriços criados por Estados concorrentes, quer pela Arábia Saudita (Al-Arabiya), pelos Estados Unidos (Al-Hurra) ou pelo Irã (Al-Alam), resultou numa configuração político-midiática inédita na qual se sobrepõem uma esfera midiática pluralista relativamente livre e regimes políticos nacionais autoritários. Exacerbada pela audácia e influência da Al Jazeera, essa contradição exerceu uma pressão constante sobre poderes desestabilizados por essa circulação da informação. A maturação dos processos revolucionários no mundo árabe deve muito a essa tensão entre a ordem política e a ordem midiática.
Em razão do caráter artificial e até mesmo da inexistência de estruturas partidárias e sindicais suscetíveis a organizar o debate público, a Al Jazeera deixou progressivamente de ser um canal de TV ordinário. Ao longo dos últimos dez anos, foi na sua tela que foram debatidas todas as grandes questões que interessam aos povos da região. Ela passou a ser objeto de disputa em todos os conflitos, como, por exemplo, no Afeganistão e na Palestina.
Daqui para frente, quer ela emane do interior,9 quer do exterior do mundo árabe,10 a crítica das orientações do canal é parte integrante do jogo político no Oriente Médio. Na maioria dos casos, ela objetiva pôr na defensiva o governo do Qatar, pressupondo que a linha editorial da TV nada mais é do que a tradução midiática da diplomacia do Estado do Qatar. No entanto, tudo indica – nem que seja por sua cobertura das revoluções desses últimos meses – que a Al Jazeera tornou-se um fenômeno árabe, um espelho da evolução regional que extrapola muito amplamente a vontade de Doha.
 
TRATAMENTO MILITANTE DAS REVOLUÇÕES

Embora a Al Jazeera seja popular, ela não deixa de ser um canal controverso por razões que, aliás, não raro revelam ser contraditórias. Alguns deploram sua abertura para os israelenses (ela foi o primeiro canal por satélite a entrevistar dirigentes do Estado hebreu), outros, suas “tendências islâmicas”. Seu “antiamericanismo” é contrabalançado pela presença no Qatar do comando da 5ª Frota estadunidense, o que faz do emirado uma das ferramentas de domínio que os Estados Unidos exercem sobre o Oriente Médio.
Sua cobertura militante das revoluções árabes, sobretudo na Líbia e no Iêmen, e seu apoio à intervenção militar da Otan foram denunciados como sendo uma ingerência nos assuntos internos dos países árabes. A ausência da oposição saudita ou qatariana em sua programação, sua timidez ao abordar os eventos ocorridos no Bahrein,11 além de sua crítica incipiente da intervenção das forças sauditas e aliadas nesse reino são interpretadas como uma vontade de preservar o status quo no Golfo. Mostra da sensibilidade da Al Jazeera às evoluções regionais foi anúncio, no final de abril, da demissão do responsável pelo escritório do canal em Beiruth, Ghassan Ben Jeddou, por divergências com relação à cobertura da Líbia e da Síria, que ele julgava muito parcial.
A tese dos detratores que apresentavam o canal como uma mera “oficina islâmica” foi abalada por sua abordagem favorável das revoltas nos países na África do Norte e no Oriente Médio, nas quais os islâmicos são quase invisíveis. Além disso, o lançamento da Al Jazeera em inglês, em 2006, contribuiu para desmentir a imagem construída pelas traduções parciais e os trechos fora de contexto difundidos pelo Instituto de Pesquisa sobre a Mídia do Oriente Médio (MEMRI – Middle East Media Research Institute), com o objetivo de apresentar a Al Jazeera como um veículo de comunicação antiocidental e até mesmo antissemita.12


Ilustração: Scott Peterson / Getty Images

1 Cf. “Hillary Clinton, ‘Viewership of Al Jazeera is going up in the United States because it’s real news’”, YouTube.com, 2 de março de 2011.
2 Mohammed El Oifi, “Le face-à-face Al-Arabiya/Al-Jazeera: un duel diplomatico-médiatique”, Revue Moyen-Orient, n.6, Paris, junho de 2010.
3 Programa Studio Al Qahira, Al Arabiya, 12 de fevereiro de 2011.
4 Yves Gonzalez-Quijano e Tourya Guaaybess (dir.), Les Arabes parlent aux Arabes: La révolution de l’information dans le monde arabe, Actes Sud, Arles,2009.
5 Le Monde, 11 de março de 2011.
6 Ver artigo do jornal saudita Al Hayat publicado em 30 de maio de 2010, http://international.daralhayat.com/internationalarticle/146817.
7 Ver http://wn.com/Talk_of_the_Town__Joumana_Nammour (consultado em 21 de abril de 2011).
8 Mohammed El Oifi, “Influence without power: Al Jazeera and the Arab public sphere”. In: Mohamed Zayani, The Al Jazeera Phenomenon Critical Perspectives on New Arab Media, Pluto Press, Londres,2005.
9 Mamoun Fandy, (Un)Civil War of Words: Media and Politics in the Arab World,  Praeger Security International, 2007.
10 Zvi Mazel, “Al Jazeera et le Qatar: le sombre empire des Frères musulmans?”, Controverse, www.controverses.fr Paris, n.13, março de 2010.
11 Ler “Al Jazeera a perdu sa fièvre révolutionnaire au Bahreïn”, 13 de abril de 2011.
12 Ler “Désinformation à l’israélienne”, Le Monde diplomatique, setembro de 2005.