domingo, 8 de abril de 2012

Como a Argentina busca a verdade e produz justiça

Se, na economia, o Brasil é o gigante da América do Sul, no terreno da busca da Verdade, da Justiça e da Memória, a Argentina é a referência principal com uma história de busca da verdade, construção da justiça e reconstrução da memória. Em entrevista à Carta Maior, Remo Carlotto, presidente da Comissão de Direitos Humanos e Garantias da Câmara dos Deputados, fala sobre o sentido desses avanços e de outors que estão por vir. Um deles é a responsabilização de civis e grupos empresariais que participaram ativamente do golpe, da repressão e da prática de crimes contra a humanidade.


Porto Alegre - A Argentina é, sem dúvida alguma, o país que mais avançou na América Latina na tarefa de julgamento dos crimes cometidos durante o período ditatorial que assolou o continente. A desmoralização dos militares argentinos após a Guerra das Malvinas contribuiu para isso, é verdade, mas essa não é a parte mais importante dessa história de busca da verdade, construção da justiça e reconstrução da memória. Neste processo, a Argentina inovou e segue inovando em matéria de direito civil, penal e constitucional. Pactos e tratados internacionais de direitos humanos, subscritos pelo país, foram incorporados à Constituição. Além disso, o Congresso argentino tem legislado em matéria civil, introduzindo a figura da desaparição forçada de pessoas no Código Civil e no Código Penal. Agora, prepara-se para fazer o mesmo com a figura do genocídio.

Em vários aspectos, a Argentina está a anos-luz do que ocorre no Brasil nesta matéria. Em entrevista à Carta Maior, o deputado nacional Remo Carlotto, presidente da Comissão de Direitos Humanos e Garantias da Câmara dos Deputados, fala sobre o sentido desses avanços e de outros que estão por vir. Um deles é a responsabilização de civis e grupos empresariais que participaram ativamente do golpe e da repressão. Na entrevista ele cita alguns exemplos:

“(...) A empresa Ford que manteve, em sua fábrica situada nos arredores de Buenos Aires, um centro clandestino de detenção, onde os delegados sindicais dessa fábrica foram torturados. O mesmo ocorreu com a empresa Mercedes Benz. O mesmo ocorreu com a principal empresa açucareira argentina, Ledesma, que utilizou a estrutura da empresa para o sequestro de mais de 300 pessoas. Há processos judiciais em curso onde representantes dessas empresas estão diretamente envolvidos. O diário mais importante da Argentina, o Clarín, adquiriu, junto com outro jornal importante, La Nación, a empresa Papel Prensa, a partir do sequestro e da tortura dos proprietários dessa empresa que produz papel para jornais”.

Carlotto esteve em Porto Alegre participando do 5º Encontro Latinoamericano Memória, Verdade e Justiça. Conhecer a experiência argentina é indispensável para transformar essas palavras em eixos estruturantes de políticas públicas de defesa dos direitos humanos e da democracia. Se, na economia, o Brasil é o gigante da América do Sul, no terreno da busca da Verdade, da Justiça e da Memória, a Argentina é a referência principal.

Carta Maior: O senhor veio a Porto Alegre para participar de um debate sobre o conteúdo e as consequências das sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos, relacionadas a crimes cometidos pelas ditaduras civil-militares do Cone Sul. A Argentina é o país da América Latina que mais avançou neste terreno. Qual a sua avaliação sobre o modo como as sentenças da Corte Americana vem sendo tratadas na região?

Remo Carlotto: A Argentina tem uma característica particular com respeito ao direito interno de aplicação dos pactos e tratados internacionais de direitos humanos subscritos por nosso país. A partir da reforma constitucional de 1994, a Argentina incorporou no artigo 75, inciso 22, da Constituição, todos os pactos e tratados de direitos humanos subscritos até esse momento. Isso significa que a hierarquia que esses pactos e tratados tem no direito interno equivale à ordem constitucional, o que provoca um reordenamento da interpretação jurídica em nosso país, afetando as leis em sua totalidade, não só aquelas que têm a ver especificamente com a aplicação de uma legislação vinculada a um direito em particular.

A partir desse momento, toda legislação do país deve contemplar os pactos e tratados internacionais em matéria de direitos humanos assinados e reconhecidos pelo país. E os pactos e tratados posteriores a 1994 têm um sistema de incorporação que é similar aquele adotado pelos países da região e que envolve a assinatura do tratado e sua ratificação pelo parlamento nacional. Com uma maioria especial (dois terços da composição de ambas as câmaras, de deputados e de senadores), esses pactos podem ser incorporados à ordem constitucional.

Neste sentido, o direito internacional está muito presente na discussão legislativa na Argentina e também na aplicação e na interpretação das leis, o que tem favorecido um tema central neste debate do qual estamos participando , a saber, que não podem existir leis de anistia e de perdão que impeçam o julgamento de crimes contra a humanidade e, no caso da desaparição forçada de pessoas, a imprescritibilidade desses crimes.

Carta Maior: Como é esse debate no interior do Legislativo?

RC: Nós temos acompanhado no Legislativo os atos de reparação por parte do Estado argentino. Além disso, temos legislado em matéria civil, introduzindo a figura da desaparição forçada de pessoas no Código Civil e no Código Penal. Ou seja, na Argentina pode-se julgar e condenar alguém pelo crime de desaparição forçada de pessoas. Hoje estamos debatendo a incorporação da figura do genocídio em nosso código e também temos a tarefa de ratificar as reparações que devem ser feitas pelo Estado para as vítimas da ditadura. Não se trata apenas da reparação de caráter econômico, mas também o reconhecimento, pelo Estado, da prática de crimes. Isso significa uma vinculação de ordem jurídica, mas também uma interpretação e um olhar interdisciplinar sobre as formas de reparação das vítimas, familiares e sobreviventes, por parte do Estado de uma maneira integral. Legislamos ainda em matéria de construção da memória como uma ação pública. Ou seja, o leque de opções e conceitos que vem sendo adotados pelo Estado argentino é amplo.

Cabe observar que tudo isso depende de decisões de caráter estritamente político. Um exemplo é a implementação de um processo, em nível parlamentar, para a reversão das leis de impunidade. Tivemos duas delas: a Lei de Obediência Devida, que determinava que os membros das forças de segurança e das forças armadas tinham cumprido ordens e que só as cúpulas eram responsáveis; e a Lei do Ponto Final, que estabelecia um término para a apresentação de ações judiciais relacionadas a crimes da ditadura. Essas duas leis obstruíam o acesso á Justiça. Então, o caminho que se seguiu na ordem parlamentar foi propor a anulação dessas leis, declarando-as absolutamente nulas por contrariarem o direito internacional reconhecido pela Argentina. Isso ocorreu não somente pela reforma constitucional de 1994, mas também pela interpretação do direito internacional que afirma que nenhum tipo de crime ou ato genocida pode ser anistiado ou declarado impune. Posteriormente houve uma ratificação por parte da Corte Suprema reconhecendo a inconstitucionalidade dessas leis.

Avançamos também em outra direção. Tivemos participantes do terrorismo de Estado que foram eleitos parlamentares e o Parlamento acabou impedindo que tomassem posse, declarando a incompatibilidade moral de alguém que participou de tortura e crimes aberrantes ocupar um cargo público de representação popular. Assim, o âmbito parlamentar tem um duplo papel neste processo: um papel de caráter legislativo para adequar toda a legislação nacional aos pactos e tratados internacionais, e um papel eminentemente político que deve acompanhar os processos de julgamento dos responsáveis pelos crimes da última ditadura civil-militar e monitorar o cumprimento desses pactos e acordos. Os países, muitas vezes, subscrevem pactos e tratados internacionais e depois não os cumprem. Por isso, é fundamental desenvolver ferramentas de monitoramento interno.

Carta Maior: Há algum outro país da região que tenha feito essa incorporação constitucional de tratados e pactos internacionais?

RC: As reformas constitucionais realizadas por Equador, Bolívia e Venezuela caminham nesta direção. Não é exatamente a mesma coisa que foi feita na Argentina, mas tomam o direito universal e o sistema interamericano de direitos humanos e o incorporam, artigo por artigo, dentro da própria estrutura da Constituição. Mais do que isso, essas Constituições, no marco da interpretação do Constitucionalismo social latino-americano, apresentam profundos avanços em matéria de garantia de direitos humanos. Esses países seguem um caminho sumamente auspicioso por que avançam também sobre temas específicos e particularidades de sua realidade social e política.

Há um tema de fundo por trás desses avanços. Cada vez que falamos de crimes cometidos pelas ditaduras civil-militares estamos falando da usurpação dos recursos econômicos do Estado por parte de grupos econômicos concentrados em nossos países. Os militares não decidiram, sozinhos, levar adiante ações criminais, só pelo prazer de praticá-las. Eles fizeram isso no marco da implementação de planos econômicos muito direcionados, sob a coordenação dos Estados Unidos e apoiados em uma doutrina de segurança nacional. Essa espoliação das economias de nossos países foi sustentada pela ação repressiva e persecutória por parte das ditaduras.

Carta Maior: Em que consiste precisamente o ponto de vista do Constitucionalismo Social para esses temas?

RC: A prioridade dada à busca da garantia de direitos tem a ver também com a forma pela qual a riqueza é distribuída em nosso país e a forma pela qual se tem acesso à totalidade de direitos. Esse é o ponto de vista do Constitucionalismo social, que considera que os direitos humanos não podem ser dissociados um do outro. A Argentina é um dos cinco países que ratificou o Protocolo Facultativo do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Esse pacto está baseado em quatro pilares – acesso à habitação, à educação, à saúde e ao trabalho -, a partir dos quais se pode demandar judicialmente os Estados para que cumpram e garantam esses direitos. Essa é a concepção que temos sobre a distribuição da riqueza em nosso país.

Então, respondendo sua pergunta, o Constitucionalismo social que está sendo implementado nestes países latino-americanos está diretamente relacionado com um processo distributivo de garantia essencial de direitos que é, em última instância, o que articula a garantia da totalidade de direitos em nossa sociedade.

Carta Maior: Na Argentina, os militares saíram do poder muito desmoralizados e enfraquecidos politicamente, tanto pelo que aconteceu na Guerra das Malvinas, quanto pela crise econômica na qual acabaram mergulhando o país. Aqui no Brasil, ao contrário, os militares saíram relativamente ilesos e hoje ainda tem uma força política grande o suficiente para resistir a uma iniciativa como a Comissão da Verdade. Na sua avaliação, a Corte Interamericana da OEA tornou-se um caminho para superar essa barreira imposta pelos militares e seus aliados civis no Brasil?

RC: Creio que os processos de conhecimento da verdade, de construção da memória e da justiça são processos inexoráveis para nossas sociedades. Não há como impedir que a sociedade saiba a verdade, que saiba o que aconteceu com as pessoas que estão desaparecidas, quem foram os responsáveis. Sem nenhuma dúvida, os instrumentos internacionais, como são a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, têm um papel sumamente importante. Quando ratificamos um pacto ou um tratado internacional, estamos assumindo a responsabilidade perante estes organismos de seguir, por exemplo, as recomendações das sentenças que são proferidas por eles. Para isso, obviamente, é necessário o conhecimento e o esclarecimento do conjunto da população a respeito de seus direitos. Quando falamos de reparação por parte do Estado, estamos falando que a reparação não é só para as vítimas, mas também para o conjunto da sociedade. E isso é assim para que se possa construir uma sociedade com maior qualidade democrática.

A Argentina teve não somente a intervenção da Comissão Interamericana e da Corte Interamericana de Direitos Humanos, mas também a aplicação da justiça universal através das ações do juiz Baltasar Garzon, na Espanha. Esses crimes que queremos esclarecer devem ser considerados como crimes contra a humanidade e, assim, devem ser perseguidos pela totalidade da comunidade internacional. Isso é o que aconteceu na Espanha, o que condicionou fortemente o próprio funcionamento do poder Judiciário em nosso país. O Judiciário avaliou que os crimes que haviam sido cometidos na Argentina deviam ser julgados na Argentina e não em outra jurisdição. Esse elemento também foi fundamental para romper o cerco de impunidade.

É disso que viemos tratar nesse encontro em Porto Alegre que reúne os países da região, parlamentares, procuradores, organizações de direitos humanos e investigadores, debatendo como podemos nos ajudar para romper esse cerco de impunidade em cada um de nossos países. Isso para nós é uma obrigação.

A Argentina é, claramente, o país com o processo mais avançado nesta direção. Queremos contar nossos acertos e fracassos e transmitir as formas pelas quais podemos colaborar para obter essas demandas que consideramos essenciais à democracia. A nossa presidenta da República disse que se os crimes de lesa humanidade não fossem resolvidos na Argentina, o país seria uma sociedade pré-democrática. Na Argentina foi possível reverter um processo de impunidade, no marco do exercício estrito da justiça. Não houve nenhum ato de vingança pessoal nem se fez justiça pelas próprias mãos. Esperou-se pacientemente que a Justiça resolvesse os casos. E quando houve absolvição de alguns responsáveis por crimes, respeitou-se a decisão da Justiça. Esse foi um ato de profunda maturidade do povo argentino.

Os nossos estados devem implementar não somente uma política de memória em relação aos crimes, mas sim para formar e capacitar nossos agentes públicos, educar nossas crianças e adolescentes para a construção do verdadeiro “nunca mais”, que é saber que devemos respeitar irrestritamente o funcionamento democrático em cada um de nossos países e que devemos garantir integralmente os nossos direitos humanos.

Eu tenho um olhar otimista sobre esse quadro. A Argentina começou esse processo de justiça a partir da busca pela verdade. O caminho foi a busca da verdade. Isso desencadeou o resto das ações que acabaram dando início aos julgamentos dos genocidas. Tenho uma visão esperançosa sobre o debate que está ocorrendo no Brasil, no Uruguai, no Paraguai e também no Chile. Parece-me que temos um olhar comum, uma experiência compartilhada comum, consequências da ação do terrorismo de Estado muito similares e, em função disso, devemos ser atores que articulem a reparação que os estados devem fazer. O que não podemos é seguir deixando que as vítimas sejam quem toque isso adiante. Os estados devem assumir a responsabilidade por esse processo.

Carta Maior: O senhor observou que os militares argentinos, assim como ocorreu no Brasil e em outros países sulamericanos, não deram o golpe e cometeram todos os crimes que cometeram simplesmente por que foram movidos por um desejo sádico. Eles tinham uma conexão com setores econômicos civis da sociedade. Há um movimento na Argentina para responsabilizar os representantes de empresas e de setores sociais que apoiaram e foram cúmplices do golpe e de ditadura?

RC: Sem dúvida alguma. Nós dizemos que a ditadura na Argentina foi uma ditadura civil-militar. Isso significa que poderosos grupos econômicos, que denominamos de oligarquia argentina, foram enormemente beneficiados, fundamentalmente a partir da proposta de endividamento feita pelos Estados Unidos durante as décadas de 70 e 80. Neste período, a dívida argentina passou de 7 bilhões de dólares para 40 bilhões de dólares, sem que nenhum investimento fosse feito no país. Foram transferências diretas de recursos aos grupos econômicos mais concentrados. O ministro da Economia da ditadura civil-militar foi Martínez de Hoz, um integrante das direções das empresas mais importantes de nosso país. Mas não foi somente isso que aconteceu. Esses grupos também foram beneficiários econômicos a partir da aplicação do terrorismo de Estado. A implementação do seu programa econômico precisava que as organizações sindicais e sociais fossem desmanteladas.

Além disso, eles foram partícipes diretos da prática de crimes contra a humanidade. Temos o exemplo da empresa Ford que manteve, em sua fábrica situada nos arredores de Buenos Aires, um centro clandestino de detenção, onde os delegados sindicais dessa fábrica foram torturados. O mesmo ocorreu com a empresa Mercedes Benz. O mesmo ocorreu com a principal empresa açucareira argentina, que é a empresa Ledesma, que utilizou a estrutura da empresa para o sequestro de mais de 300 pessoas. Há processos judiciais em curso onde representantes dessas empresas estão diretamente envolvidos. O diário mais importante da Argentina, o Clarín, adquiriu, junto com outro jornal importante, La Nación, a empresa Papel Prensa, a partir do sequestro e da tortura dos proprietários dessa empresa que produz papel para jornais. Ou seja, temos uma enorme quantidade de ações judiciais onde há o envolvimento de empresários em crimes de lesa humanidade.

Nós não acreditamos que os militares atuaram de uma maneira perversa e diabólica para levar adiante uma ação sem sentido. Eles fizeram o que fizeram para gerar terror na população e poder implementar esse processo de transferência de recursos econômicos de um país periférico para uma potência como os Estados Unidos e também para realizar uma transferência econômica interna, dos setores populares para os setores concentrados da economia, o que provocou a devastação do aparato produtivo do país.

Carta Maior: Há aí, sem dúvida, um outro traço em comum às ditaduras que tivemos em nossos países, a participação de grupos empresariais, entre eles grandes grupos de comunicação. Essa é uma outra área onde está ocorrendo uma profunda mudança na Argentina a partir da aprovação da Lei de Medios. Qual o estágio atual desse debate?

RC: O que está acontecendo na Argentina é que se questionou a hegemonia comunicacional do grupo Clarín, que possui não somente o diário de maior circulação no país, mas também cerca de 70% do serviço de televisão a cabo (em algumas regiões chega a 100%) e mais de 270 emissoras de rádio espalhadas por praticamente todo o território argentino. A situação da comunicação do país foi tema de debate e se sancionou a Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual, que democratiza o acesso à informação, a possibilidade de informar e de ser informado. Essa lei foi aprovada dentro do estrito marco dos direitos humanos, garantindo a democratização da palavra, o conhecimento das realidades locais e regionais. Isso significou, sem dúvida, mexer com o que significa hoje o epicentro das novas estruturas de poder.

Antes se utilizava as estruturas militares para debilitar um governo; hoje se utilizam os meios de comunicação audiovisuais concentrados, que buscam condicionar os governos a partir da difusão e da tergiversação da informação. Isso ocorre em muitos países latino-americanos. Há, praticamente, uma matriz comum. Na Venezuela, essa estrutura midiática provocou um golpe de Estado. Foram fatos extremamente graves.

Para nós, leis de comunicação que garantam a diversidade e a multiplicidade de vozes é a base essencial de onde devemos partir para discutir o que significa a democratização da comunicação. Isso significa também expor esses grupos midiáticos concentrados que manejam a informação pública segundo seus interesses particulares. Eles foram sócios diretos das ditaduras e hoje são sócios de grupos econômicos concentrados para gerar instabilidade em nosso país.

Nós estamos discutindo muito seriamente a responsabilidade que cabe aos meios de comunicação, por exemplo, sobre a tergiversação de informações econômicas para gerar condições de instabilidade econômica em nosso país.

Acreditamos que isso tem a ver com uma responsabilidade de caráter penal, pois não se pode mentir, tergiversar, para provocar desestabilização ou buscar vantagens econômicas. Esse é um debate muito rico. A Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual possibilita que organizações sociais, sindicatos, universidades e os próprios governos estaduais e municipais tenham canais de rádio e TV. Isso abre o panorama para que se tenha a multiplicidade de vozes necessária, reproduzindo nos meios de comunicação a diversidade da realidade que vivemos e não o olhar de uma empresa que tenta condicionar nosso olhar sobre a realidade que vivemos.

O capitalismo e as raízes da desigualdade

Fred Goldstein

Fred Goldstein 
O movimento “Occupy Wall Street” (OWS) fez da desigualdade na sociedade capitalista uma questão que pôs os ricos na defensiva, pelo menos em público. O aumento da desigualdade nos últimos 30 anos e especialmente na última década tem sido comentado ao longo dos anos em vários meios por analistas económicos e mesmo alguns políticos. Contudo, antes do movimento “Occupy Wall Street” levantar o slogan do 1% contra os 99%, esta condição era completamente pacífica e meramente observada como um inevitável facto da vida, mesmo que indesejável (a menos que se pertencesse ao 1%).

As desigualdades que deram ao OWS o seu grito de guerra são verdadeiramente obscenas e reminiscentes do fosso entre os monarcas da velha ordem e os servos camponeses.
Por um lado, 50 milhões de pessoas vivem de senhas de refeição, 47 milhões são oficialmente pobres, metade da população é classificada como pobre [i], 30 milhões são desempregados ou subempregados e dezenas de milhar de trabalhadores vivem com baixos salários.
Por outro lado, de 2001 a 2006, os 1% do topo conseguiram 53 cêntimos de cada dólar de riqueza criada. De 1979 a 2006, o décimo superior dos 1% (0,1%, ou seja 300 mil pessoas) conseguiu mais do que os outros 180 milhões de pessoas [ii]. Em 2009, enquanto os trabalhadores estavam ainda a ser dispensados em grande número, os executivos das 38 empresas mais importantes ganhavam um total de 140 mil milhões de dólares.[iii]
Estes números são apenas um reflexo da vasta desigualdade de rendimentos entre por um lado os banqueiros, os corretores e os exploradores das corporações e a massa de pessoas por outro. Tornou-se um escândalo, mas ninguém mexeu uma palha para fazer nada contra isto. Por isso, o movimento “Occupy Wall Street” começou a luta em nome dos 99% contra os 1%. E pegou como fogo.
Como a força motriz fundamental do movimento é a luta contra a obscena desigualdade de rendimentos, os marxistas devem apoiá-lo e participar totalmente na luta. Mas, o marxismo deve também estudar esta questão e dar-lhe uma interpretação de classe.
Podemos começar por perguntar o seguinte: o que significa lutar contra a obscena desigualdade da riqueza?
Significa certamente lutar por impostos para os ricos, usando o dinheiro para ajudar os trabalhadores e os oprimidos a sobreviverem à dureza económica do capitalismo. Ao fim e ao cabo, ser desempregado torna um trabalhador tão desigual quanto é possível sê-lo no capitalismo.
Igualdade dentro da classe operária e desigualdade entre classes
Normalmente, quando pensamos em lutar pela igualdade económica, pensamos na luta de ação afirmativa pelo emprego dos negros, dos latinos, dos asiáticos e dos povos nativos. A luta pela igualdade compreende lutar por salário igual e condições de trabalho iguais às dos brancos.
Implica também lutar por pagar igual por trabalho igual às mulheres trabalhadoras, isto é, terem o mesmo salário dos homens para trabalho comparável. E a luta pela igualdade inclui a luta pela garantia de igualdade económica entre trabalhadores normais e lésbias, gays, bi- ou transsexuais ou travestis.
Pedir a igualdade entre os trabalhadores imigrantes e sem documentos e os trabalhadores nascidos nos EUA, especialmente brancos, é uma componente essencial na construção da solidariedade e do avanço da luta de classe de todos os trabalhadores.
De facto, a luta pela igualdade económica dentro da nossa classe e entre oprimidos e opressores é fundamental para aumentar a solidariedade contra os senhores. Desigualdade e divisão no interior da classe trabalhadora é tanto um problema económico, como um perigoso problema político. Quebra a solidariedade e dá força aos patrões e ao seu governo.
Mas, o problema da desigualdade económica global na sociedade capitalista não é fundamentalmente um problema de desigualdade no interior da nossa classe ou entre a classe média e a classe trabalhadora. O problema fundamental da desigualdade massiva é a desigualdade entre a classe dominante capitalista e todas as outras classes, principalmente a classe trabalhadora multinacional.
A desigualdade entre a classe trabalhadora e a classe capitalista está embutida no sistema e está na raiz da questão. A chamada “excessiva” desigualdade entre a classe dominante e o resto da sociedade está constantemente sob ataque, como deve estar. Mas a desigualdade geral entre a classe dominante e todas as outras classes é tida como natural e raramente questionada.
Desigualdade genética do capitalismo
Esta é devida à maneira como o rendimento é distribuído no sistema do lucro. O rendimento da classe capitalista vem do trabalho não-pago dos trabalhadores sob a forma de lucro ou mais-valia. Tudo o que é criado pelos trabalhadores pertence aos patrões. E tudo o que é criado pelos trabalhadores contém tempo de trabalho não-pago. Os patrões vendem os bens e serviços e obtêm dinheiro pelo tempo de trabalho não-pago dos trabalhadores – é isso o lucro. Guardam parte para si próprios e enriquecem. A outra parte é reinvestida de modo a se tornarem mais ricos no próximo ciclo de produção e venda.
O rendimento dos trabalhadores, pelo outro lado, vem da venda da sua força de trabalho ao patrão, explorador. Os trabalhadores recebem vencimentos ou salários dos patrões. A quantia mantém-se sempre algures dentro da gama do que é necessário para sobreviver. Alguns trabalhadores são pagos um pouco melhor e podem dispor de um certo grau de conforto. Muitos trabalhadores, cada vez mais hoje em dia, conseguem apenas o suficiente para viverem uma vida de austeridade, enquanto outros dificilmente conseguem o suficiente para sobreviverem. Os salários no capitalismo são basicamente o que custa a um trabalhador subsistir e manter a família, de modo que os patrões tenham garantida a próxima geração de trabalhadores para explorarem.
Os salários dos trabalhadores ficam sempre dentro de uma estreita gama, quando comparados com o rendimento dos patrões. Nenhum trabalhador consegue alguma vez ficar rico contando com o seu salário, mesmo que bem pago. Mas, a classe capitalista como um todo fica automaticamente mais rica, mesmo que alguns capitalistas individualmente saiam dos negócios e sejam engolidos. Os patrões reinvestem continuamente o seu capital e mantêm vivo o processo em curso de exploração de cada vez mais trabalho.
Os patrões deixam a sua riqueza pessoal aos filhos, assim como o seu capital. Os descendentes, em regra, tornam-se cada vez mais ricos de geração para geração, enquanto os trabalhadores deixam aos filhos as suas magras posses de geração para geração. Os trabalhadores têm de lutar para manterem o que têm através dos altos e baixos das crises capitalistas e do desemprego cíclico.
Como alcançar a igualdade social e económica nestas circunstâncias?
Neste contexto, para o movimento OWS e todos os outros que sejam pela igualdade genuína, surge a questão de saber por qual igualdade exatamente estão a lutar. Se o objetivo final é a reforma do código fiscal, ou a redução do financiamento empresarial na política, ou a regulação da classe capitalista predadora e dos banqueiros avarentos, então o objetivo final limita-se a uma luta por uma forma de desigualdade menos obscena.
Trata-se certamente de um objetivo progressista e deve ser sempre prosseguido como meio de aliviar os trabalhadores e a massa do povo em geral. Mas, seja qual for a maneira de o fazer, se se limita a luta contra a desigualdade a mantê-la no quadro do capitalismo, isso significa lutar por menos desigualdade, mas também por mantê-la e consenti-la. O sistema de exploração de classe gera a extrema desigualdade entre classes.
Distribuição da riqueza e capitalismo
O facto é que a desigualdade na distribuição é um resultado do sistema de produção pelo lucro. Ora, conforme os marxistas mostram, as relações de distribuição decorrem das relações de produção. O que determina a distribuição da riqueza social é a propriedade privada dos meios de produção e serviços. Nenhuma redistribuição da riqueza no capitalismo, quer através de despesa estatal, quer de acordos com sindicatos ou qualquer outro método, consegue ultrapassar a desigualdade de classe que resulta do direito dos capitalistas a possuírem não só os meios de produção, como todos os produtos da produção.
Neste sentido, é útil uma análise escrita por Karl Marx em 1847. Marx tentava desmontar o argumento de que o trabalho e o capital têm um interesse comum no crescimento do capitalismo. O ensaio “Trabalho assalariado e capital” foi escrito com base em lições a trabalhadores alemães com consciência de classe que primeiro conseguiram organizar-se. Escreveu Marx:
“Vimos portanto que mesmo a situação mais favorável para a classe operária, designadamente o mais rápido crescimento do capital, por muito que melhore a vida material do trabalhador não elimina o antagonismo entre os seus interesses e os do capitalista. Lucro e salário continuam como antes em proporção inversa.
“Se o capital cresce rapidamente, os salários podem crescer, mas o lucro do capital cresce desproporcionadamente mais depressa. A posição material do trabalhador melhorou, mas à custa da sua posição social. O abismo social que o separa do capitalista alargou-se.
“Finalmente dizer que ‘a condição mais favorável para o salário-trabalho é o crescimento mais rápido do capital produtivo’ é o mesmo que dizer: quanto mais depressa a classe trabalhadora multiplicar e aumentar o poder do seu inimigo e a riqueza de quem reina sobre a sua classe, mais favoráveis serão as condições sob as quais será permitido lidar com a multiplicação da riqueza burguesa e com o aumento de poder do capital, contentando-se assim com forjar para si as cadeias douradas pelas quais a burguesia a arrasta no seu caminho.” (Marxist Internet Archive).
Muito do ensaio de Marx é dedicado a mostrar que, independentemente das condições relativas de que os trabalhadores dispõem no sistema de exploração capitalista, quer sejam mais bem ou menos bem pagos e mesmo quando estão em boa posição negocial porque o patrão precisa deles para continuar a aumentar a produção, os trabalhadores perdem constantemente terreno em relação aos capitalistas, cuja riqueza aumenta imensamente. Por isso, está inscrito no próprio sistema de exploração o aumento sistemático da desigualdade entre as classes. Além disso, a classe trabalhadora está na melhor das hipóteses limitada para sempre a tentar “forjar as cadeias douradas pelas quais a burguesia a arrasta no seu caminho.”
Marx então continua, mostrando que a chamada prosperidade dos trabalhadores é uma mentira, porque os patrões utilizam todos os meios para baixarem os ordenados, mesmo nos chamados “bons tempos”.
O capitalismo na era da revolução técnico-científica e da globalização imperialista expandiu-se e evoluiu por saltos e descontinuidades desde os tempos de Marx. As classes trabalhadoras dos países imperialistas estão num caminho descendente, com os salários a baixar. Estão a perder terreno não só em termos relativos, mas também absolutos.
Os trabalhadores já não progridem nem lentamente no seu modo de vida, enquanto os capitalistas continuam em frente. Os salários estão a baixar. As condições estão a piorar. Os patrões arquitetaram uma competição salarial mundial entre os trabalhadores nos centros do capitalismo e as centenas de milhões de trabalhadores dos países de baixos salários. Os patrões usaram a deslocalização associada à tecnologia e à exploração dos trabalhadores imigrantes para promoverem esta competição. O exército global de reserva de desempregados e subempregados aumentou para centenas de milhões. Os trabalhadores estão sob pressão em todos os continentes.
Nos EUA, os salários têm descido desde os anos setenta (Perry L. Weed, “Inequality, the Middle Class & the Fading American Dream” – “Desigualdade, a Classe Média e o Fim do Sonho Americano”). A grande desigualdade que vemos hoje resulta do declínio absoluto dos salários. A parte de leão da nova riqueza vai para os financeiros e os donos das corporações em quantidades crescentes de mais-valia (trabalho não-pago) sob a forma de dinheiro.
É urgente procurar inverter o declínio absoluto das condições do proletariado e dos oprimidos. A luta contra o aumento obsceno da desigualdade tem que continuar e crescer.
A riqueza das empresas cria riqueza pessoal extrema
É importante notar que a obscena desigualdade no rendimento pessoal não é nada comparada com a riqueza das empresas, controlada não pelos 1% mas pela pequena fração deles que se sentam nos gabinetes de diretor dos bancos e das gigantescas corporações transnacionais. Foi a isto que Lenine chamou capital financeiro – o pequeno grupo de grandes empresas que controlam biliões de riqueza empresarial e a maior parte da produção da riqueza mundial.
Um estudo recente mostra que 147 corporações dominam 40% da riqueza empresarial mundial” (“Financial world dominated by a few deep pockets,” “O mundo financeiro dominado por alguns bolsos cheios,” ScienceNews, 24 Set., 2011). A propriedade privada e o controle de uma vasta riqueza financeira e empresarial pelo topo da classe dominante são o que está por detrás da imensa riqueza pessoal concedida aos administradores da lista dos 500 da Fortune e aos ricaços mundiais (grandes administradores e grandes acionistas do capital e da finança).
A questão é então: vamos parar a luta para a redução da desigualdade no capitalismo, vamos lutar para ajudar a forjar as “cadeias douradas” com as quais o capital arrasta o trabalho, ou vamos levar a luta contra a desigualdade até às últimas consequências e lutar para quebrar as cadeias da dominação de classe de uma vez? A desigualdade entre classes só pode ser abolida libertando-nos da classe capitalista de uma vez e do sistema de exploração sobre o qual toda a obscena riqueza está erigida.
[i] “Census data: Half of U.S. poor or low income,” [“Dados do censo: metade dos americanos são pobres ou de baixo rendimento”] Associated Press, Dez. 15.
[ii] Jacob S. Hacker e Paul Pierson, “Winner-Take-All Politics” [“A política do quem-ganha-apanha-tudo”] (New York: Simon & Schuster, Kindle Edition, 2010), p. 3.
[iii] Perry L. Weed, “Inequality, the Middle Class & the Fading American Dream,” [“Desigualdade, a Classe Média e o Fim do Sonho Americano”] Economy in Crisis online, Fev. 12, 2011.
Próxima 2ª Parte: Como a natureza da distribuição da riqueza decorre do modo de produção e Controle da riqueza empresarial: a fonte de riqueza pessoal extrema.
Extraído do anexo do próximo livro “Capitalism at a Dead End” [“O Capitalismo num Beco sem Saída”] de Fred Goldstein. Goldstein é também autor de “Low-Wage Capitalism” [“Capitalismo dos Pobres”]
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Tradução: Jorge Vasconcelos

sábado, 7 de abril de 2012

Os movimentos sociais e os processos revolucionários na AL: uma crítica aos pós-modernistas


070412_AL-pos-modernaPCB - [Edmilson Costa] Os anos 90 do século passado e os primeiros dez anos deste século foram marcados por intenso debate entre as forças de esquerda sobre o papel dos movimentos sociais, das minorias, das lutas de gênero e das vanguardas políticas nos processos de transformação econômica, social e política da sociedade. Colocou-se na ordem do dia a discussão sobre novas palavras de ordem, novos agentes políticos e sociais, novas formas de luta, novas concepções sobre a ação prática política.

Esses temas e concepções ocuparam o vazio político nesse período em funções de uma série de fenômenos que ocorreram na década de 80 e 90, como a queda do Muro de Berlim, o colapso da União Soviética e dos países do Leste Europeu, o refluxo do movimento sindical, a redução das lutas operárias nos principais centros capitalistas, a perda de protagonismo dos partidos revolucionários, especialmente dos comunistas,além da ofensiva da ideologia neoliberal em todas as partes do mundo, sob o comando das forças mais reacionárias do capital.
A conjuntura de derrota das forças progressistas favoreceu a todo tipo modismo teórico e fetiche ideológico. Sob diversos pretextos, certas forças políticas, inclusive alguns companheiros de esquerda, começaram a questionar a centralidade do trabalho na vida social, o papel dos partidos políticos como vanguarda dos processos de transformações sociais e políticas, a atualidade da luta de classes como instrumento de mudança da história e o próprio socialismo-comunismo como processo que leva à emancipação humana.
Esse movimento teórico e político envolveu forças difusas, mas influentes junto à juventude e vários movimentos sociais. O objetivo era desconstruir o discurso dos partidos políticos revolucionários, do movimento sindical e do próprio marxismo, como síntese teórica da revolução. Para estas forças, os discursos de temas abrangentes, como a igualdade, o socialismo, a emancipação humana, os valores históricos do proletariado, as soluções coletivas contra a opressão humana, eram coisa do passado e produto de um mundo que já existia mais.
No lugar desses velhos temas, tornava-se necessário colocar um novo discurso, como forma de forma a reconhecer a fragmentação da realidade e do conhecimento, a constatação da diferença, a emergências de novos sujeitos sociais, com características, valores e reivindicações específicas, como os movimentos sociais, de gênero, raça, etnia, etc, e novas formas de formas de luta, inclusive com renúncia à tomada do poder.
O condensamento desse ecletismo conservador, dessa matriz teórica diluidora, pode ser expresso no que se convencionou chamar de pós-modernismo. Essa é a fonte teórica inspiradora de todos os modismos teóricos e fetiches que se tornou moda as duas últimas décadas. Quais são os principais supostos teóricos dos pós-modernistas, que tanta influência tiveram nesses anos de vazio político? Vamos nos ater a três vertentes fundamentais que norteiam os fundamentos dessa corrente teórica.
1) O fim da centralidade do trabalho. Um dos temas mais destacados pelos pós-modernistas é o fato de que as tecnologias da informação, a reestruturação produtiva e a inserção acelerada de ciência no processo produtivo tornaram obsoleto o conceito de classe operária e proletariado, até mesmo porque esses atores estão se tornando residuais num mundo globalizado onde impera a robótica, a internet e a informática avançada. Alguns desses teóricos chegaram a dar adeus ao proletariado, que seria um conceito típico da segunda revolução industrial. Prova disso, seria a constatação de que a classe operária está diminuindo em todo o mundo e, por isso mesmo, perdeu o protagonismo para outros movimentos emergentes no capitalismo globalizado.
Os teóricos pós-modernistas se comportam como o caçador que vê apenas as árvores mas não consegue enxergar a floresta. Olham o mundo a partir de uma perspectiva da Europa ou Estados Unidos. Por isso, não conseguem compreender que o capital possui uma extraordinária mobilidade, em função da busca permanente por valorização. Por isso, são incapazes de perceber que o proletariado está crescendo de maneira expressiva em termos mundiais, com o deslocamento de milhares de indústrias dos EUA e da Europa para a Ásia, processo que está incorporando ao mundo do trabalho centenas de milhões de trabalhadores na China, na Índia e em toda a Ásia, num movimento que está mudando a conjuntura mundial.
Não conseguem entender que o próprio capitalismo é uma contradição em processo, pois quanto mais se moderniza, quanto mais insere ciência na produção, mais amplia sua composição orgânica e, consequentemente, mais pressiona as taxas de lucro para baixo. Por isso, o capitalismo não pode existir sem seu contraponto, o proletariado. Se o capitalismo automatizasse todas suas fábricas o sistema entraria em colapso, pois os robôs são até mais disciplinados que os seres humanos, são capazes de trabalhar sem descanso, não reivindicam salário, nem fazem greve, mas também tem seu calcanhar de Aquiles: não consomem. Se não tem consumidores, os capitalistas não têm para quem vender suas mercadorias. Ou seja, antes de uma automatização total, o sistema entraria em colapso em função de suas próprias contradições.
2) O fim da centralidade da luta de classes. Outro dos argumentos dos teóricos pós-modernos é a alegação de que a luta de classes é coisa do passado. Afinal, dizem, se o proletariado está se reduzindo aceleradamente, não existe mais identidade de classe e, portanto, não teria sentido se falar em luta de classes. Nessa perspectiva, dizem, a reestruturação produtiva pode ser considerada uma espécie de dobre de finados que veio sepultar os velhos agentes do passado, como o movimento sindical. Prova disso, é que os sindicatos perderam o protagonismo e agora agonizam em todo o mundo. E o principal representante teórico do mundo do trabalho, o marxismo, também estaria ultrapassado, em função de sua visão monolítica do mundo.
Novamente, os teóricos pós-modernistas também não compreendem a história e confundem sua submissão ideológica à ordem capitalista com a realidade dos trabalhadores. A luta de classes sempre existiu desde que as classes se constituíram na humanidade e continuará sua trajetória enquanto existir a exploração de um ser humano por outro. Não porque os marxistas querem, mas porque a realidade a impõe. Nos tempos de refluxo as lutas sociais diminuem, parece que os trabalhadores estão passivos e os capitalistas imaginam que conseguiram disciplinar para sempre os trabalhadores.
Nessa conjuntura, o discurso do fim da luta de classe, da passividade dos trabalhadores, chega a influenciar muita gente, afinal, quem não tem uma perspectiva histórica do mundo se atém apenas à superfície dos fenômenos, à aparência das coisas. Mas nos momentos de crise do capitalismo, esse discurso se torna inteiramente inadequado, entra em choque com a realidade, uma vez que a crise coloca a luta de classes naordem do dia com uma atualidade extraordinária, para desespero daqueles que imaginavam o seu fim.
Se observarmos a realidade atual, onde o sistema capitalismo enfrenta sua maior crise desde a Grande Depressão, poderemos facilmente constatar e emergência da luta de classes em praticamente todas as partes do mundo. É só observar as insurreições no Oriente Médio, na África, as lutas na América Latina, as greves e mobilizações na Europa. Além disso, a crise também tornou o marxismo mais atual do que nunca. Mesmo os capitalistas estão lendo O Capital para tentar entender o que está ocorrendo no mundo.
3) As vanguardas políticas não têm mais nenhum papel a desempenhar no mundo globalizado. O terceiro dos argumentos-chave dos teóricos pós-modernistas é o fato de os partidos revolucionários, especialmente os comunistas, não têm mais nenhum papel a desempenhar no mundo atual. A ação política agora deve ser comandada pelos movimentos sociais, pelos movimentos de gênero, minorias étnicas, de raças, sexuais, etc, que são vítimas de "opressões específicas". Isso porque os partidos seriam organizações autoproclamatórias, autoritárias, portadoras de um fetiche autorealizável, que é a revolução socialista.Essas instituições, portadoras de um discurso utópico de emancipação humana, estão também definhando em todo o mundo porque não estariam entendendo a realidade do mundo globalizado.
Mais uma vez os teóricos pós-modernistas não conseguem compreender a totalidade da vida social. Por isso, vêem o mundo sem unidade, fragmentado e disperso. Não entendem que, por trás da "opressãoespecífica" que atinge os movimentos sociais e de gênero, etnia, raça, sexual, está o grande capital apropriando a mais-valia de todos, independentemente de raça, sexo ou orientação religiosa . Não compreendem que os movimentos, por sua própria natureza, têm limites institucionais e de representatividade.
Um sindicato, por mais combativo que seja, deve representar os interesses dos trabalhadores que representa. Da mesma forma que uma entidade estudantil, uma organização de moradores, de mulheres ou dehomosexuais tem como objetivo defender os interesses específicos de seus representados, atuam nos limites institucionais da ordem burguesa. Somente o partido político revolucionário, que se propõe a derrotar a ordem capitalista e que junta em suas fileiras todos esses segmentos sociais, possui condições para entender a totalidade da luta política e lançar propostas globais para a transformação da sociedade.
A prática das lutas sociais
Se observarmos as lutas sociais que foram realizadas nos últimos anos, poderemos constatar facilmente que grande parte delas foram derrotadas exatamente porque não existiam vanguardas com capacidade de conduzir e orientar essas lutas para a radicalidade da luta de classes e a emancipação do proletariado. Não se trata aqui de negar a importância das lutas específicas ou dos movimentos sociais. Pelo contrário, são fundamentais para qualquer processo de mudança, servem também como aprendizado da luta dos trabalhadores, mas deixadas por si mesmas, apenas com seu conteúdo espontaneísta, não tem condições de realizaras transformações da sociedade e terminam se esvaziando e sendo derrotadas pelo capital.
O teatro de operações é mais ou menos o seguinte: após um momento de euforia e mobilização os movimentos sociais são capazes de realizar proezas impressionantes, como desacreditar a velha ordem, desafiar as classes dominantes, mas num segundo momento a euforia se esgota em si mesma sem atingir os objetivos por falta de perspectivas. A América Latina é um importante posto de observação para constatarmos essahipótese, mas também em várias partes do mundo os exemplos são férteis para verificarmos a necessidades de vanguardas políticas.
A Bolívia, por exemplo, foi palco de várias insurreições populares contra governos neoliberais. As massas se sublevaram, foram às ruas aos milhões, derrubaram os governos conservadores, mas o máximo que conseguiram foi eleger um presidente progressista que é fustigado a todo momento pelo capital e não consegue realizar plenamente nem o próprio programa a que se propôs no período das eleições.
No Equador, ocorreram também várias insurreições populares. Em uma delas, os movimentos conquistaram o poder e o entregaram a um militar que depois os traiu e agora é um personagem conservador na política do País. Posteriormente, no bojo de outra insurreição, conseguiram eleger um presidente progressista, mas este não consegue implementar um programa transformador porque o capital não lhe dá trégua. Recentemente quase foi deposto por um setor militar sublevado.
Na Argentina, em função da crise econômica herdada do governo neoliberal de Menem, as massas também se sublevaram aos milhões em várias regiões do País. Em um período curto o País mudou três vezes de presidente. O resultado da sublevação popular foi a eleição de Nestor Kirchner e, posteriormente, de sua companheira, Cristina Kirchner. Nesses anos de poder, os Kirchner também não realizaram nenhuma mudança de fundo. O capitalismo seguiu seu curso como se nada tivesse acontecido.
Mais recentemente, duas grandes insurreições populares derrubaram os governos conservadores da Tunísia, do Egito e do Iêmen. Milhares de pessoas se sublevaram durante vários dias, centenas de pessoas morreram, os ditadores deixaram o poder, mas os movimentos sociais, sem vanguarda política, não conseguiram seus objetivos. Setores da burguesia local encabeçaram a formação de novos governos e os trabalhadores mais uma vez deixaram escapar de suas mãos a revolução.
No Brasil, um grande movimento social, o Movimento dos Sem Terra (MST) enfrentou com bravura os governos neoliberais, tendo como norte a bandeira da reforma agrária. Organizou um movimento original e de massas, com base social em todo o País, especialmente entre a população mais pobre da cidade e do campo. O MST ocupou fazendas dos latifundiários, realizou formação de grande parte dos seus quadros e até mesmo conseguiu construir uma universidade popular para formação permanente dos seus militantes.
No entanto, o desenvolvimento do capitalismo no campo brasileiro e a emergência do agronegócio criaram uma nova conjuntura no campo brasileiro, onde as relações de produção passaram a se darpredominantemente entre capital e trabalho. Essa conjuntura, aliada ao programa de compensação social do governo Lula, o "Bolsas Família", uma programa de transferência de renda para a população mais pobre, levou o MST a uma encruzilhada.
Ou seja, a realidade mudou radialmente no campo brasileiro, mas a razão de ser do MST era a reforma agrária. Por isso, o movimento, que se tornara um dos símbolos de luta contra o neoliberalismo e, por isso mesmo obteve simpatia mundial, agora está perdendo protagonismo. Os acampamentos do MST foram reduzidos para menos da metade e o movimento vive grandes dificuldades estratégicas. Afinal, se a maioria dos trabalhadores está nas cidades, se o capitalismo hegemonizou as relações de produção no campo e subordinou a pequena agricultura à lógica do capital, torna-se difícil a sobrevivência no longo prazo de um movimento que tem apenas a bandeira da reforma agrária como luta estratégica.
A condensação mais expressiva da teoria movimentista foi o Fórum Social Mundial (FSM). Por ocasião do primeiro FSM, em Porto Alegre, parecia que todos tinham encontrado a fórmula ideal, a varinha mágica,para as novas lutas sociais. Milhares de lutadores de todo o mundo convergiram para o Rio Grande do Sul para se fazer presentes no lançamento da nova grife da luta mundial autônoma. Foi um sucesso extraordinário e um contraponto ao Foro de Davos, onde os capitalistas tramavam novas estratégias para dominação do mundo.
O sucesso de público e de mídia do FSM parecia ter enterrado de vez a noção de vanguarda política. Agora seriam os movimentos sociais, os movimentos de gênero, etnia, das mulheres, os movimentos sociais que doravante comandariam as lutas no mundo. Adeus partidos políticos, adeus movimento sindical, adeus velhos atores sociais da segunda revolução industrial. Agora eram os movimentos difusos, sem centralidade política, inteiramente autônomos, livres de dogmas e ideologias ultrapassadas que iriam provar ao mundo a nova realidade da luta social e política.
Muita gente sinceramente acreditou que o FSM poderia ser a fórmula mágica, o contraponto contemporâneo ao capital, o substituto das velhas vanguardas políticas e seu discurso autoproclamatório. Mas a realidade aos poucos foi colocando no devido lugar o modismo movimentista. Com o tempo, o FSM foi perdendo fôlego, foi se esvaziando, até o ponto em que hoje ninguém mais acredita que possa ser alternativa a coisa nenhuma. Mas uma vez a vida provou que os movimentos por si só não têm condições de mudar a sociedade, é necessário a vanguarda política para conduzir os processos de transformação.
O significado do pós-modernismo e as lutas sociais
Em outras palavras, a ideologia pós-modernista é responsável por grande parte das derrotas dos movimentos sociais nestas duas décadas, não só porque esse modismo teórico influenciou parte da juventude e lideranças dos movimentos sociais, como também porque levou à frustração milhares de lutadores sociais. Isso porque as lutas fragmentadas geralmente se desenvolvem de maneira espontânea. No início tem uma trajetória de ascenso, empolga milhares de pessoas, mas logo depois o movimento vai enfraquecendo até ser absorvido pelo sistema.
Em outras palavras, o pós-modernismo é o fetiche ideológico típico dos tempos de neoliberalismo e representa a ideologia pequeno-burguesa da submissão sofisticada à ordem do capital. Mas essa ideologia carrega consigo uma contradição insolúvel: no momento em que o capital mais se globaliza, com a internacionalização da produção e das finanças, é justamente neste momento que os pós-modernos pregam a fragmentação da realidade, a setorização das lutas sociais, a especificidade dos combates de gênero, etnia, raça, sexo, etc. Só mesmo quem não quer mudar a ordem capitalista pensa desse jeito.
Na verdade, todos que seguem esse ritual teórico, de maneira direta ou indireta, estão abrindo mão de um projeto emancipatório e escondem sua impotência mediante um discurso cheio de abstrações sociológicas, mas muito conveniente para o capital. Por isso, combatem as lutas gerais, para fragmentá-las em lutas específicas, que não afrontam abertamente o sistema dominante.Trata-se do verejo da política fantasiado de moderno.
Esses setores cumpriram, nos últimos 20 anos e ainda cumprem até hoje, um papel muito especial na luta ideológica atual: eles são a mão esquerda do social-liberalismo capitalista. Influenciam as gerações mais jovens, desenvolvem um discurso com aparência de modernidade, influem na organização das lutas sociais. Com seu discurso eclético e fatalista, cheio de senso comum, desorientam setores importantes da sociedade no que se refere à ação política e, na prática, ajudam a organizar, mesmo que indiretamente, a submissão de vários setores sociais à ordem capitalista e aos valores do mercado.
Essas duas décadas de experiências fragmentadas nos levam à conclusão de que, mais do que nunca, as vanguardas revolucionárias têm um papel fundamental no processo de transformações sociais. São elas exatamente que podem conduzir e orientar os vários movimentos sociais com uma plataforma estratégica de emancipação da humanidade, o que significa derrotar o imperialismo e o capitalismo e transitar para a construção da sociedade socialista.

Edmilson Costa é membro da Comissão Política do Comitê Central do PCB

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Andrei Tarkovski, 80 anos: O poeta do cinema foi também um pensador da arte

Por Josias Teófilo*no SUL21

Há 80 anos nascia o cineasta soviético Andrei Tarkovsky (1932-1986). Chegou ao mundo depois das revoluções vanguardistas que repensaram o papel do artista na sociedade. Na década de 1960, quando ele realizou seus dois primeiros longas-metragens, as concepções sobre a arte já estavam num processo de transformação profunda. Os pensadores da arte contemporânea idealizaram o artista num lugar totalmente diverso do concebido anteriormente, desmistificando a sua atuação na sociedade e ressaltando o seu aspecto intelectual e político.
Tarkovsky não compartilhava dessas visões advindas da arte contemporânea, seus filmes inicialmente e seus escritos, em especial o livro Esculpir o Tempo, documentaram isso. Com relação à vanguarda russa, inclusive o cinema de Sergei Eiseinstein, a obra de Tarkovsky e sua concepção artística parecem não só se diferenciar mas por vezes se opor diametralmente – como no debate sobre a montagem. Suas referências mais profundas no seu país são a literatura de Tolstoi e Doistoiévski, do século anterior. O cinema ele naturalmente defende como obra autoral.
Esta defesa não é exclusividade de Tarkovsky, porém nele essa autoria tem um componente bastante diverso: ela se apresenta como um dom espiritual. Para ele, o artista é como um demiurgo: “O poeta não usa ‘descrições do mundo’; ele próprio participa da sua criação”, diz ele no seu livro Esculpir o tempo, escrito nos longos espaços de tempo entre a realização dos seus filmes. Foram apenas 7 longas-metragens em toda a sua vida. Ter feito tão poucos filmes – comparado a outros grandes cineastas – não foi uma escolha. A causa foi, principalmente, a dificuldade em realizar o tipo de filme que ele fazia, de caráter profundamente religioso, na União Soviética.
Os longos espaços de tempo entre um filme e outro – em média 5 anos – parecem ter colaborado na densidade dos seus filmes e no grau de reflexão que eles suscintam. Todos os 7 filmes se relacionam profundamente na temática, na forma e nas amplas referências à pintura, literatura, filosofia, etc. Porém, em toda a sua obra, tanto fílmica quanto escrita, um tema é recorrente e crucial: o Sacrifício.
Para ele, a criação artística é um ato de Sacrifício: trata-se de uma doação, que certamente não é material, intelectual ou mesmo emocional. O Sacrifício configura-se como algo espiritual – palavra que ele usa constantemente nos seus escritos. Essa espiritualidade, entretanto, não é religiosa no sentido corrente. Tarkovsky diz que as religiões, tal como se apresentam hoje, “não são capazes de saciar a sede de Absoluto que caracteriza o homem”.
A espiritualidade para ele se concretiza na idéia de Amor, a absoluta antítese de pragmatismo e fundamento do Sacrifício. Talvez sejam essas duas idéis complementares, o Sacrifício e o Amor, que diferenciam o pensamento e a obra de Tarkovsky do seus contemporâneos, tornando sua mensagem ao mesmo tempo atual e profundamente relacionada com a grande arte do passado – o que nos faz refletir sobre a possibilidade de existirem características perenes no fenômeno artístico ao longo dos tempos.

* Josias Teófilo é mestrando em Filosofia pela Universidade de Brasília com o tema A cumplicidade espiritual: o papel social do artista segundo Andrei Tarkovski no filme Andrei Rublev.

Enquanto isso, os Tuaregues...




Em parte o que está acontecendo no Mali é uma consequência da guerra da Líbia. Os tuaregues eram, em grande parte, aliados de Kadafi. Depois da queda do líder líbio, muitos decidiram deixar a Líbia, temendo represálias por parte do novo governo ou de outros segmentos da população. E levaram consigo suas armas.


Quem não se lembra dos tuaregues? Os da minha geração lembram. Eles estavam no filme Beau Geste (1939), direção de William Wyler, com Gary Cooper, Ray Milland, Susan Hayward, Robert Preston e grande elenco. Neste filme, que, na verdade, foi filmado não no Saara, mas nas dunas do sul da Califórnia, os tuaregues, cavalgando loucamente como índios norte-americanos (os da tribo de Hollywood), tentavam tomar o forte de Zinderneuf, sem resultado. Gary Cooper, Ray Milland e os demais resistiam bravamente até o último homem, mas sem entregar o forte. Só Ray Milland sobrava, para voltar melancólica, mas gloriosamente, para casar com Susan Hayward, que ficara o tempo todo à sua espera, tocando piano no salão de Brandon Abbas, na Inglaterra.

Pois agora os tuaregues saíram a fazer estrepolias novamente, mas não nas telas de cinema, nem no sul da Califórnia, mas no Saara mesmo. Nem cavalgam loucamente, mas agem com método e determinação. Já dominam dois terços do território da República do Mali, onde recentemente houve um golpe de estado na capital, Bamako.

Uma revolta de soldados no quartel de Kati, a 10 km. do palácio presidencial, evoluiu em derrubada do governo. O capitão Amadou Sanogo assumiu a liderança da revolta e o controle do governo. O presidente constitucional, Amadou Toumani Touré, está na clandestinidade. Os países vizinhos, do Oeste Africano, exigem que o novo governo – que parece não saber muito bem o que fazer – devolva o poder aos civis. O capitão subitamente promovido a presidente até o momento só fez ganhar tempo: prometeu eleições, mas não mencionou prazo. Diz querer de volta a constituição de 1992 – o que é uma contradição, pois por ela o presidente legal e legítimo é o deposto.

O golpe parece ser decorrência da atuação dos tuaregues, reunidos sob um Movimento Nacional de Libertação do Azawad – nome da região habitada por suas tribos. Essa região transborda o Mali, se espraiando pela Argélia, Líbia, Mauritânia, Líbia, onde vivem os quase 6 milhões de tuaregues que reivindicam um país para si. Ainda não está claro se eles pretendem proclamar a independência do território que já dominam, dois terços do Mali, ao norte, ou se pretendem avançar para a capital e derrubar o(s) governo(s).

O Mali é um dos países mais pobres da África. Seu exército, de 7 mil homens, também é pobre, e essa parece ser uma das razões da revolta. Em parte o que está acontecendo no Mali é uma consequência da guerra da Líbia. Os tuaregues eram, em grande parte, aliados de Muammar Kadafi. Depois da queda e assassinato do líder líbio, muitos decidiram deixar a Líbia, temendo represálias por parte do novo governo ou parte de outros segmentos da população. Levaram consigo suas armas. Acostumados a viver e a lutar no deserto, onde já protagonizaram várias revoltas, passaram a superar o exército em poder de fogo, mobilidade e capacidade militar.

Desde então ocuparam as principais cidades da região: Gao, Kidal e a legendária Timbuktu, a 700 km. da capital.

Por ora as potências ocidentais – a França, em particular, que se envolveu na guerra civil da vizinha Costa do Marfim, derrubando o governo e pondo um de seu agrado na capital, e vive delicado momento eleitoral – não sabem ainda o que fazer. Certamente não vão apoiar os tuaregues; ao mesmo tempo, não podem apoiar do governo “revolucionário” do capitão revoltado; também não se sabe ainda sua avaliação do governo deposto, tido como fraco para liderar suas próprias tropas e enfrentar o inimigo tuaregue ao norte.

De momento, a situação é a de um beco com muitas entradas e nenhuma saída. Uma situação nada incomum nesta África cuja reocupação pelas potências internacionais está em andamento, tanto na prática quanto nos mapas de planejamento.

Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.

Timor Leste: porque o mais pobre é ameaça para o poderoso

por John Pilger 
 
A partilha. O truísmo de Milan Kundera, "a luta do povo contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento", descreve Timor Leste. No dia em que decidi filmar ali clandestinamente, em 1993, fui à loja de mapas Stanfords, no Covent Garden de Londres. "Timor?", disse um assistente de vendas hesitante. Pusemo-nos a examinar prateleiras marcadas Sudeste Asiático. "Desculpe-me, onde é exactamente?"

Após uma pesquisa ele encontrou um velho mapa aeronáutico com áreas em branco assinaladas: "Dados de auxílio incompletos". Nunca lhe fora pedido Timor-Leste, o qual está a Norte da Austrália. Tal era o silêncio que envolvia a colónia portuguesa a seguir à sua invasão e ocupação pela Indonésia, em 1975. Mas nem mesmo Pol Pot conseguiu, proporcionalmente, matar tantos cambodgianos quanto o ditador Suharto, da Indonésia, matou em Timor-Leste.

No meu filme, Morte de uma nação , há a cena de um brinde a bordo de um avião australiano a voar sobre a ilha de Timor. Decorre numa festa e dois homens de fato estão a brindar-se com champanhe. "Isto é um momento histórico único", balbucia um deles, "é verdadeiramente histórico e único". Trata-se de Gareth Evans, ministro dos Negócios Estrangeiros da Austrália. O outro homem é Ali Alatas, o porta-voz principal de Suharto. Passa-se em 1989 e eles estão a fazer um voo simbólico para celebrar a assinatura de um tratado pirata que permitiu à Austrália e às companhias internacionais de petróleo e gás explorarem o fundo do mar ao largo de Timor-Leste. Por baixo deles há vales crivados de cruzes negras onde aviões caça fornecidos por britânicos e americanos estraçalharam pessoas em bocados. Em 1993, o Comité de Assuntos Estrangeiros do Parlamento australiano relatou que "pelo menos 200 mil", um terço da população, havia perecido sob Suharto. Graças a Evans, em grande parte, a Austrália foi o único país ocidental a reconhecer formalmente a conquista genocida de Suharto. As forças especiais assassinas da Indonésia, conhecidas como Kopassus, foram treinadas na Austrália. O prémio, disse Evans, eram "ziliões" de dólares.

Ao contrário de Muammar al-Kaddafi e Saddam Hussein, Suharto morreu pacificamente em 2008 cercado pela melhor ajuda médica que os seus milhares de milhões podiam comprar. Ele nunca correu o risco de ser processado pela "comunidade internacional". Margaret Thatcher disse-lhe: "Você é um dos nossos melhores e mais válidos amigos". O primeiro-ministro australiano Paul Keating encarava-o como uma figura paternal. Um grupo australiano de editores de jornais, conduzido pelo veterano servidor de Rupert Murdoch, Paul Kelly, voou a Djacarta para prestar homenagem ao ditador; há uma foto de um deles a fazer uma reverência.

Em 1991, Evans descreveu o massacre de mais de 200 pessoas por tropas indonésias, no cemitério de Santa Curz, em Dili, capital do Timor-Leste, como uma "aberração". Quando manifestantes colocaram cruzes do lado de fora da embaixada da Indonésia em Canberra, Evans ordenou a sua retirada.

Em 17 de Março, Evans estava em Melbourne para falar num seminário sobre o Médio Oriente e a Primavera Árabe. Mergulhado agora no ocupado mundo dos "think tanks", ele explana acerca de estratégias de grandes potências, nomeadamente a elegante "Responsabilidade de proteger", a qual é utilizada pela NATO para atacar ou ameaçar ditadores arrogantes ou desfavorecidos sob o falso pretexto de libertar seus povos. A Líbia é um exemplo recente. No seminário também estava presente Stephen Zunes, professor de política na San Francisco University, que recordou à audiência o longo e crítico apoio de Evans a Suharto.

Quanto acabou a sessão, Evans, um homem de fusível limitado, atacou Zumes e gritou: "Quem raios é você? De onde raios você saiu?" Disseram a Zumes, confirmou Evans posteriormente, que tais observações críticas mereciam "um soco no nariz". O episódio foi oportuno. A celebrar o décimo aniversário de uma independência que Evans outrora negava, Timor-Leste está nas convulsões da eleição de um novo presidente; a segunda volta da votação é em 21 de Abril, seguida pelas eleições parlamentares.

Para muitos timorenses, com seus filhos malnutridos e atrofiados, a democracia é uma noção. Anos de ocupação sangrenta, apoiada pela Austrália, Grã-Bretanha e EUA, foram seguidos por uma campanha implacável de intimidação por parte do governo australiano para afastar a pequena nova nação da fatia a que tem direito das receitas de petróleo e gás do seu leito marítimo. Tendo recusado reconhecer a jurisdição do Tribunal Internacional de Justiça e a Lei do Mar, a Austrália mudou unilateralmente a fronteira marítima.

Em 2006 foi finalmente assinado um acordo, em grande medida nos termos da Austrália. Logo após, o primeiro-ministro Mari Alkatiri, um nacionalista que enfrentou Canberra e opôs-se à interferência estrangeira e ao endividamento ao Banco Mundial, foi efectivamente deposto naquilo a que chamou uma "tentativa de golpe" por "elementos externos". A Austrália tem tropas de "manutenção da paz" em Timor-Leste e treinou seus opositores. Segundo um documento escapado do Departamento da Defesa australiano, o "primeiro objectivo" da Austrália em Timor-Leste é que os seus militares "tenham acesso" de modo a que possa exercer "influência sobre a tomada de decisões em Timor-Leste". Dos dois actuais candidatos presidenciais, um é Taur Matan Rauk, um general e o homem de Canberra que ajudou a afastar o incómodo Alkitiri.

Um pequeno país independente montado sobre recursos naturais lucrativos e caminhos marítimos estratégicos é objecto de preocupação séria para os Estados Unidos e o seu "vice xerife" em Canberra. (O presidente George W. Bush promoveu realmente a Austrália a xerife pleno). Isso explica em grande medida porque o regime Suharto exigiu tanta devoção dos seus patrocinadores ocidentais. A obsessão permanente de Washington na Ásia é a China, a qual hoje oferece a países em desenvolvimento investimento, qualificação e infraestrutura em troca de recursos.

Ao visitar a Austrália em Novembro, o presidente Barack Obama emitiu outra das suas ameaças veladas à China e anunciou o estabelecimento de uma base dos US Marines em Darwin, bem em frente às águas de Timor-Leste. Ele entende que países pequenos e empobrecidos podem muitas vez apresentar a maior ameaça à potência predatória, porque se eles não puderem ser intimidados e controlados, quem poderá?
O original encontra-se em www.johnpilger.com/...

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

quinta-feira, 5 de abril de 2012

A heresia comunista de Daniel Bensaïd

 
Daniel BensaıdEntre todas as “heresias” de Daniel Bensaïd, quer dizer, suas contribuições para a renovação do marxismo, a mais importante, a meus olhos, é a sua ruptura radical com o cientificismo, o positivismo e o determinismo que se impregnaram tão profundamente no marxismo “ortodoxo”, principalmente na França. Por Michael Löwy no COMBATE


“Auguste Blanqui, comunista herético” é o título de um artigo que Daniel Bensaïd e eu redigimos juntos em 2006 (para um livro sobre os socialistas do século XIX na França, organizado por nossos amigos Philipe Corcuff e Alain Maillard) [no Brasil, o artigo foi publicado na revista Margem Esquerda, nº 10]. Esse conceito se aplica perfeitamente a seu próprio pensamento, obstinadamente fiel à causa dos oprimidos, mas alérgico a qualquer ortodoxia.
Daniel havia escrito alguns livros importantes antes de 1989, mas a partir daquele ano, com a publicação de Moi la Révolution : Remembrances d’un bicentenaire indigne [Eu, a revolução: Remembranças de um bicentenário indigno] (Gallimard, 1989) e Walter Benjamin, sentinelle messianique [Walter Benjamin, sentinela messiânico] (Plon, 1990), começa um novo período, que se caracteriza não apenas por uma enorme produtividade – dezenas de obras, dentre as quais várias consagradas a Marx – mas também por uma nova qualidade de escrita, uma fantástica efervescência de ideias, uma surpreendente inventividade. Apesar de sua grande diversidade, esses escritos não deixam de ser tecidos com fios vermelhos comuns: a memória das lutas – e suas derrotas – do passado, o interesse pelas novas formas de anticapitalismo e a preocupação com os novos problemas que se colocam à estratégia revolucionária. Sua reflexão teórica era inseparável de sua militância, quer ele escreva sobre Joana D’arc – Jeanne de guerre lasse [Joana D’arc de guerra cansada] (Gallimard, 1991) – ou sobre a fundação do NPA (Prendre parti [Tomar partido], com Olvier Besancenot, 2009). Seus escritos têm, consequentemente, uma forte carga pessoal emocional, ética e política, que lhes dá uma qualidade humana pouco comum. A multiplicidade de suas referências pode tomar desvios: Marx, Lenin e Trotsky, com certeza, mas também Auguste Blanqui, Charles Péguy, Hannah Arendt, Walter Benjamin, sem esquecer Blaise Pascal, Chateaubriand, Kant, Nietzsche e muitos outros. Apesar de toda essa surpreendente variedade, aparentemente eclética, seu discurso não deixa de ter uma notável coerência.
“Eu leio seus livros sem parar como remédios contra a burrice e o egoísmo”, escreveu recentemente seu amigo, o poeta Serge Pey. Se os livros de Daniel são lidos com tanto prazer, é porque eles foram escritos com a pena afiada de um verdadeiro escritor, que tem o dom da fórmula: uma fórmula que pode ser assassina, irônica, nervosa ou poética, mas que vai sempre direto ao ponto. Esse estilo literário, próprio ao autor e inimitável, não é gratuito, mas vem a serviço de uma ideia, de uma mensagem, de um apelo: não se dobrar, não se resignar, não se reconciliar com os vencedores.
Esta ideia se chama comunismo. Ela não poderia ser identificada com os crimes burocráticos cometidos em seu nome, assim como o cristianismo não pode ser reduzido à Inquisição e às dragonnades [espécie de polícia religiosa criada durante o reinado de Luis XIV para perseguir protestantes e reconvertê-los ao catolicismo]. O comunismo, em última análise, é apenas a esperança de suprimir a ordem existente, o nome secreto da resistência e da sublevação, a expressão da grande cólera negra e vermelha dos oprimidos. É o sorriso dos explorados que esperam ao longe os tiros de fuzil dos insurgentes em junho de 1848 – episódio contado com inquietude por Alexis de Tocqueville e reinterpretado por Toni Negri. Seu espírito sobreviverá ao triunfo atual da mundialização capitalista, tal como o espírito do judaísmo durante a destruição do Templo e a expulsão da Espanha (gosto dessa comparação insólita e um pouco provocadora).
O comunismo não é o resultado do “Progresso” ou das leis da História (com P e H maiúsculos): trata-se de uma eterna luta, incerta e anunciada. A política, que é a arte estratégica do conflito, da conjuntura e do contratempo, implica numa responsabilidade humanamente falível, e deve ser confrontada com as incertezas de uma história aberta.
O comunismo do século XXI era, para Daniel, o herdeiro das lutas do passado, da Comuna de Paris, da Revolução de Outubro, das ideias de Marx e Lenin, e dos grandes vencidos que foram Trotsky, Rosa Luxemburgo, Che Guevara. Mas também algo de novo, a altura das questões do presente: um eco-comunismo (termo que ele inventou), integrando centralmente o combate ecológico contra o capital.
Para Daniel, o espírito do comunismo não podia ser reduzido às suas falsificações burocráticas. Se ele era, com suas últimas energias, contra a tentativa da Contra-Reforma liberal de dissolver o comunismo no stalinismo, ele não reconhecia tampouco que pode-se fazer a economia de um balanço crítico dos erros que desarmaram os revolucionários de Outubro em face das provas da história, favorecendo a contra-revolução termidoriana: confusão entre povo, partido e Estado, cega em relação ao perigo burocrático. É preciso retirar disto certas lições históricas já esboçadas por Rosa Luxemburgo em 1918: a importância da democracia socialista, do pluralismo político, da separação dos poderes, da autonomia dos movimentos sociaisem relação ao Estado.
A fidelidade ao espectro do comunismo não impede que Daniel advogue em favorde uma renovaçãoprofunda do pensamento marxista, especialmente sobre dois terrenos onde a tradição falha em particular: o feminismo e a ecologia. As feministas – como Christine Delphy – por criticar a abordagem de Engels, que definia a opressão doméstica como um arcaísmo pré-capitalista que em breve se apagaria com a salarização das mulheres. No movimento operário, ele forneceu muitas vezes um sexismo grosseiro, principalmente ao retomar a seu favor a noção burguesa de salário mínimo. A necessária aliança entre a consciência de gênero e a consciência de classe não pode ser feita sem um retorno crítico dos marxistas sobre sua teoria e sua prática.
O mesmo vale para a questão do meio ambiente: habitualmente ligado ao compromisso fordista e à lógica produtiva do capitalismo, o movimento operário era indiferente ou hostil para com a ecologia. Por seu lado, os partidos Verdes têm a tendência de se contentar com uma ecologia de mercado e com um reformismo social-liberal. Ora, o antiprodutivismo de nosso tempo deve necessariamente ser um anticapitalismo: o paradigma ecológico é inseparável do paradigma social. Diante dos danos catastróficos provocados no meio ambiente pela lógica do valor de mercado, é preciso propor a necessidade de uma mudança radical do modelo de consumo, de civilização e de vida.
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A filosofia de Daniel Bensaïd não era um exercício acadêmico, mas estava atravessada, de um lado a outro, pelo fogo da indignação, um fogo que, segundo ele, não pode ser apagado nos mornos da resignação consensual. Daí o seu desprezo pelo “homo resignatus”, político ou intelectual que é reconhecido à distância por sua impassibilidade batraquiana perante a ordem impiedosa das coisas. Para além da modernidade e da pós-modernidade, nos resta, dizia Daniel, a força irredutível da indignação, a incondicional recusa da injustiça, que são o contrário exato do costume e da resignação. “A indignação é um começo. Uma maneira de se erguer e de se colocar em movimento. Primeiro a gente se indigna, se insurge e depois vê”.
Seu hino poético-filosófico à glória da resistência – esta “paixão messiânica de um mundo justo que não aceita sacrificar o “cintilar do possível diante da terna fatalidade do real” – se inspira ao mesmo tempo na paciência do marrano e na impaciência messiânica de Franz Rosenzweig e Walter Benjamin. É também inspirado na profecia do Antigo Testamento, que não se propõe predizer, como a adivinhação antiga o futuro, mas, ao contrário, soar o alerta da catástrofe possível. O profeta bíblico, como já o havia sugerido Max Weber em seu trabalho sobre o judaísmo antigo, não procede com ritos mágicos, mas convida a agir. Contrariamente ao esperar e ver apocalíptico e aos oráculos de um destino inexorável, a profecia é uma antecipação condicional, significada pelo oulai (“se”) hebraico. Ela busca desviar a trajetória catastrófica, conjurar o pior, manter aberto o feixe dos possíveis, logo ela é um apelo estratégico à ação. Segundo Daniel, há profecia em toda grande aventura humana, amorosa, estética ou revolucionária.
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Entre todas as “heresias” de Daniel Bensaïd, quer dizer, suas contribuições para a renovação do marxismo, a mais importante, a meus olhos, é a sua ruptura radical com o cientificismo, o positivismo e o determinismo que se impregnaram tão profundamente no marxismo “ortodoxo”, principalmente na França.
Um de seus últimos escritos foi uma longa introdução aos escritos de Marx sobre a Comuna – uma brilhante e enérgica defesa e ilustração do político enquanto pensamento estratégico revolucionário. A doutrina oficial pretende que não há pensamento político em Marx, já que a sua teoria se resume ao determinismo econômico. Ora, a leitura de seus escritos políticos, principalmente a sequência Lutas de classe na França, O 18 de brumário de Luís Bonaparte e A guerra civil na França (os dois últimos publicado no Brasil pela Boitempo em 2011) mostra, muito pelo contrário, uma leitura estratégica dos acontecimentos, levando em consideração a temporalidade própria do político, os antípodas do tempo mecânico do relógio e do calendário. O tempo não-linear e sincopado das revoluções no qual se cavalgam as tarefas do passado, do presente e do futuro é sempre aberto à contingência. A interpretação de Marx por DB é, certamente, influenciada por Walter Benjamin e pelas polêmicas antipositivistas de Blanqui, dois pensadores revolucionários aos quais ele rende uma homenagem apoiada.
Auguste Blanqui é uma referência importante nesta abordagem crítica. No artigo de 2006, mencionado mais acima, ele lembra a polêmica de Blanqui contra o positivismo, esse pensamento de progresso em boa ordem, de progresso sem revolução, esta “doutrina execrável do fatalismo histórico” erigida na religião. Contra a ditadura do fato consumado, acrescentava Bensaïd, Blanqui proclamava que o capítulo das bifurcações ficava aberto à esperança. Contra “a mania do progresso e do desenvolvimento contínuo”, a irrupção eventual do possível no real se chamava revolução. A política que prevalece sobre a história. E propunha as condições de uma temporalidade estratégica e não mais mecânica, “homogênea e vazia”. Logo, para Blanqui, “a engrenagem das coisas humanas não é fatal como a do universo, ela é modificável em cada minuto”. Daniel Bensaïd comparava esta fórmula com ade Walter Benjamin: cada segundo é a porta estreita por onde pode surgir o Messias, quer dizer, a revolução, esta irrupção eventual do possível no real.
Sua releitura de Marx, à luz de Blanqui, de Walter Benjamine de Charles Péguy, o conduz a conceber a história como uma série de ramificações e bifurcações, um campo de possíveis onde a luta de classes ocupa um lugar decisivo, mas cujo resultado é “imprevisível”. Em Le pari mélancolique [A aposta melancólica] (Fayard, 1997), talvez seu mais belo livro, o mais “inspirado”, ele retoma uma fórmula de Pascal para afirmar que a ação emancipadora é “um trabalho para o incerto”, implicando numa aposta no futuro: uma esperança que não é demonstrável cientificamente, mas sobre a qual envolve-se a existência por inteiro. Redescobrindo a interpretação marxista de Pascal de Lucien Goldmann, ele define o envolvimento político como uma aposta pensada sobre o devir histórico, “com o risco de perder tudo ou de se perder”. A aposta é inelutável, num sentido ou no outro: como escrevia Pascal, “embarcamos”. Na religião do deus oculto (Pascal) como na política revolucionária (Marx), a obrigação da aposta define a condição trágica do homem moderno.
A revolução deixa, portanto, de ser o produto necessário das leis da história, ou das contradições econômicas do capital para se transformar numa hipótese estratégica, um horizonte ético, “sem o qual a vontade renuncia, o espírito da resistência capitula, a fidelidade falha, a tradição se perde”. A ideia de revolução se opõe à sequência mecânica de uma temporalidade implacável. Refratária à conduta causal dos fatos ordinários, ela é interrupção. Momento mágico, a revolução leva ao enigma da emancipação em ruptura com o tempo linear do progresso, esta ideologia da caixa de poupança tão violentamente denunciada por Péguy, onde a cada minuto, a cada hora que passa supõe-se trazer algum crescimento à sua pequena poupança através de aumentos nos juros.
Em consequência, como ele explica em Fragments mécréants [Fragmentos canalhas] (Lignes, 2005), o homem revolucionário é o da dúvida em oposição ao homem de fé, um indivíduo que aposta nas incertezas do século, e que põe uma energia absoluta a serviço de certezas relativas. Logo, alguém que tenta, incansavelmente, praticar esse imperativo exigido por Walter Benjamin em seu último escrito, as Teses “Sobre o conceito de história” (1940): escovar a história a contrapelo.
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Daniel fará falta. Já o faz, cruelmente. Mas pensamos que ele gostaria que nos lembrássemos da famosa mensagem de Joe Hill, o I.W.W., o poeta e músico do sindicalismo revolucionário norte-americano, a seus camaradas, às vésperas de ser fuzilado pelas autoridades (sob falsas acusações) em 1915: “Don’t mourn, organize!”. Não lamentem, organizem (a luta)!



(escrito quando do falecimento de Daniel Bensaïd, em 2010). Traduzido do francês por Leonardo Gonçalves e publicado no blog da Boitempo.
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Daniel Bensaïd (1946-2010), filósofo e dirigente da Liga Comunista Revolucionária, foi um dos militantes mais destacados dos movimentos de Maio de 1968. Foi professor de Filosofia da Universidade de Paris VIII. Autor de muitas obras, tem, entre as publicadas em português, Os irredutíveis (Boitempo, 2008), Marx, o intempestivo (1999) e, em co-autoria com Michael Löwy, Marxismo, modernidade e utopia (2000).
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Michael Löwy, sociólogo, é nascido no Brasil, formado em Ciências Sociais na Universidade de São Paulo, e vive em Paris desde 1969. Diretor emérito de pesquisas do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS). Homenageado, em 1994, com a medalha de prata do CNRS em Ciências Sociais, é autor de Walter Benjamin: aviso de incêndio (Boitempo, 2005) e Lucien Goldmann ou a dialética da totalidade (Boitempo, 2009) e organizador de Revoluções (2009),  dentre outras publicações. Colabora com o Blog da Boitempo mensalmente, às sextas-feiras.

Militares ameaçam jovens que protestaram contra comemoração do golpe de 1964


Site de coronel da reserva exibe vídeo e troca informações sobre jovens que participaram de protesto no Rio de Janeiro | Arte: Ramiro Furquim/Sul21

Samir Oliveira no SUL21

Cinco jovens do Rio de Janeiro que protestaram contra a comemoração do golpe de 1964 feita por militares da reserva no dia 29 de março estão sendo ameaçados e tendo suas vidas expostas. O site A Verdade Sufocada, mantido pelo coronel da reserva Carlos Alberto Brilhante Ustra, publicou fotos com o nome de cinco manifestantes e os locais onde eles trabalham. A ira da caserna recaiu com mais força sobre Luiz Felipe Garcez, que foi flagrado numa fotografia cuspindo no coronel-aviador Juarez Gomes enquanto ele deixava o Clube Militar no Rio de Janeiro.
O site de Ustra, ex-comandante do DOI-CODI de São Paulo e torturador reconhecido pela Justiça, informa o e-mail e os perfis no Twitter e no Facebook de Luiz Felipe. Os dados se espalharam por sites e blogs mantidos por militares, que estão postando diversas ameaças aos cinco jovens pela internet.
No blog do coronel da reserva Lício Maciel – que participou da repressão à Guerrilha do Araguaia – há um vídeo de 3 minutos, que já foi retirado do YouTube, com o título de “maloqueiros alucinados”, em referência aos manifestantes. Os jovens são tratados o tempo inteiro como criminosos e agressores de idosos e os militares fazem questão de expor informações sobre eles.
No post que exibe o vídeo, o comentário de um sujeito identificado como Eduardo Cruz demonstra que a vida desses cinco jovens – especialmente a de Luiz Felipe – foi investigada. “Após um levantamento preliminar, obtive algumas informações importantes sobre o covarde que agrediu aquele senhor idoso no dia 29. O nome completo do meliante é Luiz Felipe Monteiro Garcez, vulgarmente conhecido como Pato, estudante do curso de Produção Cultural do IFRJ (Instituto Federal do Rio de Janeiro) desde 2010. Tem 25 anos de idade, frequenta o Diretório Estadual do PT no Rio de Janeiro e não trabalha”, escreveu o comentarista, que fornece informações dos empregos que o jovem já teve.
Eduardo Cruz vai além em seu comentário no blog de Lício Maciel. Ele dá informações sobre a família de Luiz Felipe e ainda faz juízo de valor sobre sua criação. O comentarista cita o nome da “namoradinha” de Luiz Felipe, informa que ele tem uma filha, publica o nome dos pais do jovem e ainda comenta que eles “visivelmente falharam na educação do moleque”.
Site mantido por Carlos Alberto Brilhante Ustra instiga militares a procurarem informações sobre jovens que participaram do protesto | Foto: Brasil247

Eduardo Cruz finaliza o comentário dizendo que “por enquanto é isso” e assegurando que irá prosseguir com a “averiguação” e que voltará “em breve com informações sobre os outros agressores presentes naquele episódio”.
Nesse mesmo post do blog do coronel Lício Maciel há um link para uma pasta no site de compartilhamentos 4Shared com informações sobre a vida de Luiz Felipe Garcez. São exibidas fotos dele, de sua mulher e até de sua filha. Uma das imagens mostra o jovem com a filha recém-nascida no colo, com as devidas identificações.

“Não podemos nos permitir ter medo”, diz jovem ameaçado

Em conversa por telefone com o Sul21, Luiz Felipe Garcez conta que já recebeu mais de 150 ameaças por Facebook e por e-mail. Ele assegura que o vídeo feito com informações sobre sua vida, de seus amigos e de sua família – que chegou a ter mais de 11 mil acessos até ser retirado do ar – foi produzido por um jovem “infiltrado” no protesto do dia 29 de março e diz que vai entrar com processos judiciais contra as pessoas que estão expondo sua vida. “Estamos tomando medidas preventivas, documentando as ameaças e vamos entrar com um  processo por incitação ao ódio. Não podemos ter medo, senão vão entender que esse tipo de intimidação funciona”, comenta.
Pasta criada em site de compartilhamento exibe fotos e informações de Luiz Felipe e da sua família | Arte: Ramiro Furquim/Sul21

Ele acredita que os ataques venham de grupos organizados de extrema direita – com a presença ou não de militares. “São grupos organizados politicamente que podem ter militares da ativa. Mas não é a instituição Exército que está nos atacando, são fascistas que se organizam internamente”, explica.
Luiz Felipe garante que continuará denunciando os abusos e não se intimidará com as ameaças. “Sabemos que é isso que eles fazem, não podemos esperar nenhum tipo de reação diferente. São filhotes de uma ditadura que matou, perseguiu e torturou, ainda tem muita gente que acredita nisso. Muitos dos que eles mataram deram a vida para que pudéssemos estar hoje protestando. Não podemos nos permitir ter medo”, defende.
Outro manifestante exposto por Ustra, Rodrigo Mondego, também conversou por telefone com o Sul21 e disse que também vem sofrendo ameaças. “Se identificam como militares e nos ameaçam de morte. Entramos em contato com o ouvidor da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, com a Defensoria Pública do Rio de Janeiro, com a OAB-RJ e vamos conversar também com Ministério Público Federal”, avisa.
Rodrigo explica que o principal objetivo é retirar a exposição de seus dados e dos seus amigos dos sites dos militares. “Podemos ver que vários blogs de militares nos citam, basta colocar nossos nomes no Google”, lamenta.
Ele acredita que há policiais da PM do Rio de Janeiro atuando para ajudar na apuração de informações sobre sua vida e a dos outros jovens expostos. E lembra que havia diversos agentes disfarçados da P2 – o setor de investigações da Polícia Militar carioca – durante a manifestação contra a comemoração do golpe no dia 29 de março. “Eles são organizados e muita gente simpatiza com a lógica da ditadura. As ameaças são virtuais, mas vindo de onde estão vindo, tememos que se transformem em realidade”, considera.
Rodrigo diz que está tomando precauções quanto à sua segurança e admite que as ameaças afetam o seu cotidiano. “A tortura psicológica está funcionando”, desabafa.
Dentre as centenas de pessoas que participaram do protesto no dia 29 de março, apenas cinco jovens foram expostos por Ustra. Rodrigo Mondego acredita que foram escolhidos por estarem envolvidos na organização do ato, além de serem todos amigos de Luiz Felipe Garcez. Além disso, todos militam na juventude do PT do Rio de Janeiro.

Resistência civil, a nova estratégia palestina

Escrito por Luiz Eça   no CORREIO DA CIDADANIA

Do fundo de sua cela numa prisão israelense, onde cumpre pena de prisão perpétua, Marwan Barghouti apresentou a nova estratégia dos movimentos palestinos. Depois de afirmar que o processo de paz estava morto, ele conclamou seu povo à resistência civil.

A estratégia militar, através de atentados e lançamento de mísseis contra o território israelense, também fracassara. E não só pela imensa superioridade militar israelense, mas também por repercutir mal na opinião pública externa.

Os atentados, sempre divulgados com o maior destaque pela imprensa internacional, abalavam a imagem pública dos movimentos de libertação. E os duelos entre os mísseis lançados de Gaza e a aviação israelense não só resultavam em perdas muito maiores para os palestinos como também, ainda pela ação da imprensa, pareciam ter sido provocados por eles.

O processo de paz, através de negociações com Israel, sob patrocínio dos EUA e da Europa Unida, já tinha se mostrado incapaz de chegar à parte alguma, depois de 19 anos inúteis.

Como diz o ditado inglês, “it takes two to tango” (é preciso dois para dançar o tango), ficou mais do que claro que os líderes de Israel, especialmente o atual, Bibi Netanyahu, não estavam nem um pouco interessados numa paz justa com os árabes. Seu objetivo, especialmente agora, nunca foi atender aos desejos dos árabes palestinos.

Se os governos israelenses anteriores ainda faziam concessões, embora insuficientes, o atual não faz nenhuma. A política de Netanyahu sempre foi adiar ao máximo o início das negociações, ganhando tempo para aumentar constantemente o número de assentamentos na Margem Oeste e em Jerusalém, tornando sua ocupação um fait accompli.
Com isso vai ficando cada vez mais difícil a formação de um Estado palestino independente. Até tornar-se inviável.

As esperanças depositadas em Obama após o “histórico” discurso do Cairo, no qual defendeu a independência da Palestina, já foram desfeitas.

Se ainda restavam algumas, sumiram de vez diante do discurso do presidente dos EUA na reunião da AIPAC (maior lobby judeu-americano).

Nessa ocasião, ele declarou que fizera de tudo em defesa de Israel. E citou muitas medidas nesse sentido, a maioria delas contrárias às leis internacionais e aos justos interesses palestinos.

Mais ultimamente, o governo Obama mostrou sua total parcialidade, que o incapacita a ser um árbitro no conflito da Palestina: foi o único voto contrário à criação de uma comissão de investigação dos problemas dos assentamentos, aprovada por 36 votos na Comissão de Direitos Humanos da ONU.

Fato chocante, pois Obama passou todo o seu primeiro ano de governo pedindo que Israel interrompesse a fundação de novos assentamentos para permitir o início das negociações.

Sem ter força militar capaz de enfrentar Israel, sem o interesse israelense numa Palestina independente, sem o apoio de Obama para garantir as negociações de paz, a resistência civil era mesmo a única saída que restava.

Em mensagem escrita, enviada através de um portador, Barghouti declarou: “Parem de fazer marketing com a ilusão de que há alguma possibilidade de terminarmos a ocupação e conseguirmos um Estado livre através de negociações, quando isso falhou miseravelmente”.

E apontou sua solução: “O lançamento da resistência popular em larga escala neste estágio é o que interessa à causa do nosso povo.”

Barghouti faz um apelo à não-violência, deixando claro que a resistência civil é mais do que isso. Consiste em usar todos os meios possíveis para protestar e denunciar a violência da ocupação e cortar toda a cooperação com os israelenses em segurança e assuntos econômicos.

A investigação a ser feita pela ONU, através de enviados da Comissão de Direitos Humanos, permitirá que se revele ao mundo as barbaridades sofridas pelo povo da Palestina, sob a ocupação israelense. E, o que é muito importante, terá sua veracidade comprovada por uma entidade respeitada internacionalmente.

Por isso mesmo, Netanyahu, ajudado pelos prestimosos amigos estadunidenses, está acusando de faccioso o setor de Direitos Humanos da ONU. Seu argumento principal é que das 91 decisões de investigação, 39 foram sobre Israel. O que na verdade depõe contra seu país. Se é alvo de tantas comissões de investigação é porque nele se praticam as maiores violências contra os direitos humanos.

Bargouthi tem grande prestígio junto aos palestinos de todas as facções. Acredita-se que suas propostas serão aceitas.

Muitos líderes do Hamas e do Fatah querem que ele suceda a Abbas na presidência da Autoridade Palestina. No entanto, a resistência civil poderá implicar no fim da Autoridade Palestina, já que faz parte de suas funções colaborar com o governo israelense.

Com isso, os EUA e a Europa Unida serão também responsabilizados pelo fracasso das negociações de paz.

Vale lembrar que Tony Blair foi escolhido como enviado especial desse conjunto de nações para promover as negociações entre as partes. Pelo nenhum resultado dessa missão, faz-se pesar que ele se limitou a fazer turismo.

Muita coisa pode acontecer agora. Bargouthi poderá não ser obedecido. O Hamas continuará em pé de guerra e o Fatah fazendo de conta que acredita nas negociações com Israel.

Até mesmo Barghouti poderá ser anistiado pelos israelenses, por ser pragmático e aceitar o Estado de Israel, embora nos limites de 1967, com uma Palestina independente tendo soberania sobre Jerusalém Oriental. Não será por Netanyahu, é claro, mas por seu sucessor, que nunca poderá ser tão duro quanto ele.

Adotando o caminho da resistência civil, a renúncia dos palestinos ao processo de paz implicará provavelmente no fim da Autoridade Palestina, que foi criada em função desse processo.

Livre ou preso, Barghouti é uma voz que os palestinos ouvem. É de se acreditar que sua estratégia será posta em prática. Mas não se pode pensar em resultados a curto prazo.

A resistência civil vai atrair uma repressão ainda mais violenta de Israel. Que tornará cada vez mais negativa sua imagem internacional e mais urgente uma solução. Serão necessários muitos anos. Muito tempo para as pessoas da Europa se emocionarem o bastante e se associar aos palestinos nos protestos. E mais tempo ainda para os estadunidenses e os israelenses sentirem e agirem igual.

Bargouthi acredita que só quando isso acontecer haverá pressão externa e até interna para o governo de Israel aceitar uma Palestina independente e viável.

Luiz Eça é jornalista.

Monólogos da Vagina




Os Monólogos da Vagina foi criado e interpretado por Eve Ensler, que debutou no off Broadway em 1996. Este controverso trabalho iniciou rapidamente uma onda nacional de boas críticas e continuou a percorrer a América do Norte e todo o mundo.O show foi chamado "um fenômeno real e verdadeiro" pelo The New York Times. "Um trabalho de arte com um texto inteligente" disse o Variety. "Simplesmente espetacular. Nota ´A´" disse a Entertainment Weekly. Agora, a intimidade do show original de Eve Ensler foi magnificamente trazida para a tela. Os Monólogos da Vagina captura a performance única de Eve Ensler e viaja para além dos palcos à medida que ela explora o ímpeto criativo por trás dos monólogos, e conduz uma série de novas e reveladoras entrevistas tão inspiradoras como aquelas que motivaram o trabalho original.