quarta-feira, 24 de setembro de 2008

A dinâmica da grande queda

O declínio da capacidade produtiva dos EUA, em contradição com o aumento impressionante do consumo e do crédito, está na origem da crise. Mas ela foi ampliada pela recusa das autoridades a rever dois dogmas do neoliberalismo: o "livre" comércio e a "livre" circulação de capitais.

Gérard Duménil, Dominique Lévy

Chama a atenção o caráter adocicado da nota publicada no último dia 14 de junho, ao término da reunião dos ministros da economia do G8: “A inovação financeira tem contribuído consideravelmente para o crescimento e para o desenvolvimento mundiais; mas, diante dos riscos à estabilidade financeira, é imperativo o aumento da transparência e da consciência dos riscos”. As palavras-chave são: “desenvolvimento” e “inovação financeira”, de um lado; e “transparência”, de outro. Outros termos estão ausentes, como “regulamentação”, por exemplo. E não se faz menção aos fatores subjacentes à crise: os desequilíbrios crescentes da economia norte-americana.

No cerne dos mecanismos que culminaram na crise atual, encontra-se, além da ausência de regulamentação dos processos financeiros, algo que se pode denominar de “a trajetória neoliberal” da economia dos Estados Unidos, um itinerário iniciado nos primeiros anos da década de 1980, após três décadas de keynesianismo. Cinco grandes tendências estavam presentes. Em primeiro lugar, a redução do investimento produtivo. Com isto, nos referimos ao crescimento de todos os elementos “físicos” necessários à produção: edifícios, máquinas etc. Esse recuo veio acompanhado de uma fortíssima expansão relativa do consumo. Jamais se observou algo parecido no passado. A super-expansão do consumo esteve na origem do aumento do déficit do comércio exterior. Enfim, ecoando tais tendências, é preciso mencionar o duplo aumento da dívida interna (essencialmente a das famílias e a das finanças) e do financiamento da dívida externa pelo resto do mundo.

Uma trajetória bem estranha, impulsionada pelo consumo em detrimento do investimento produtivo, e alimentando-se das importações – demanda sustentada graças ao crédito concedido pelas instituições financeiras norte-americanas, cientes de que nada seria possível sem o financiamento pelo resto do mundo. Isso deveria causar inquietação, mas, ao contrário, a propaganda neoliberal tratou de divulgar a imagem lisonjeira de os Estados Unidos serem a “locomotiva” do crescimento mundial.

O aumento dos desequilíbrios e a crise financeira nasceram nos próprios Estados Unidos, e não seriam possíveis sem o domínio exercido por esse país sobre o resto do mundo. Mas o neoliberalismo também tem uma parcela de responsabilidade, pois os lucros das empresas, dos quais uma grande parte era anteriormente retida para investimento, foram transferidos aos credores, na forma de juros, e aos acionistas, na forma de dividendos. Logo, as empresas passaram a reservar cada vez menos para investir. Além disso, as fronteiras comerciais se escancararam – principalmente para os países da periferia, nos quais o custo de mão-de-obra era baixo (China, México, Vietnã etc.). Uma fração crescente da demanda dirigiu-se para as importações, a tal ponto que, nos Estados Unidos, se pode falar em “desterritorialização” da produção.

A produção diminuiu, e os EUA passaram a depender cada vez mais da generosidade dos estrangeiros. Estranha combinação entre enriquecimento de uma minoria, aumento do consumo dos mais favorecidos e o agravamento dos desequilíbrios da economia nacional

A necessidade de manter a demanda em território norte-americano impôs a injeção massiva de crédito: ano após ano, e cada vez mais, ao passo que a produção era pouco sustentada pelo investimento. Assim, o processo exigiu muito mais crédito do que seria necessário numa economia pouco aberta e voltada para o seu próprio crescimento. Este é o ponto essencial e foi ele o desencadeador da crise financeira: uma trajetória insustentável até as areias movediças do subprime, percorrida mediante o artifício do estímulo sempre renovado, ao preço de um endividamento crescente.

A isso somou-se o papel central do dólar, mundialmente usado nas transações comerciais e financeiras, como divisa de reserva, sobre a qual muitas outras moedas indexaram suas taxas de câmbio. O resto do mundo colaborou alegremente. Derramou-se pelo planeta um fluxo enorme de notas verdes, correspondente ao déficit comercial dos Estados Unidos. Os estrangeiros aplicavam os dólares que recebiam em troca dos bens que exportavam para os Estados Unidos. Compravam ações, obrigações privadas e públicas, bens do tesouro etc. Mesmo porque não tinham escolha. Não havia nenhum meio de absorver tantos dólares desde que essa moeda deixou de ser conversível em ouro. Sem dúvida, o desejo generalizado de se desfazer das notas verdes pressionava sua cotação para baixo e, conseqüentemente, tornava necessária a elevação da taxa de juros nos Estados Unidos. Mas, desde o início dos anos 2000, a taxa de juros de longo prazo permaneceu baixa. Assim, a economia dos Estados Unidos foi derrapando ao longo dessa trajetória em que os desequilíbrios internos e externos, reais e financeiros, se ampliavam progressivamente.

Os detentores de capitais e os segmentos mais elevados da pirâmide salarial (uns e outros se interpenetrando) prosperaram e se distanciaram do resto da população. Mas a produção manufatureira diminuiu, e o país passou a depender cada vez mais da generosidade dos estrangeiros. Estranha combinação entre o enriquecimento de uma minoria, o aumento do consumo dos mais favorecidos e o agravamento dos desequilíbrios da economia nacional, cada vez menos regulamentada.

Como explicar a insistência nesse rumo durante tantos anos? Após as recessões de 1982 e 1990, a atividade foi efetivamente sustentada pelo impulso miraculoso das novas tecnologias, ditas “da informação”. Lentamente no começo, mas de modo particularmente tenaz, a onda agigantou-se na segunda metade da década de 1990: quatro anos de boom, durante os quais os valores tecnológicos foram propelidos a alturas sem precedentes: a bolsa Nasdaq, que negociava ações de 1.053 empresas em janeiro de 1996, passou a abrigar 5.132 em março de 2000. O capital estrangeiro afluiu precipitadamente para aproveitar a inesperada vantagem. Mas ao boom seguiu-se o crack estrondoso: em outubro de 2002, o número de empresas com ações na Nasdaq havia despencado para 1.114.

Em 2001, com o estouro da bolha da informática, veio a recessão, e foi nessa ocasião que se revelaram os efeitos perversos daquelas tendências. O Federal Reserve entrou em cena e fez o seu trabalho habitual:o estímulo ao crédito. Mas as empresas não-financeiras não reagiram ao apelo. Quando faziam empréstimos não era para investimentos produtivos no território dos Estados Unidos, e sim para empreender a pequena batalha das fusões e aquisições ou para incentivar a compra de suas próprias ações . Então, Alan Greenspan aplicou o remédio em dose dupla . Baixou de modo espetacular a taxa de juros, que se tornou cada vez mais baixa e mesmo negativa em termos reais (isto é, uma vez descontada a taxa de inflação).

A ciranda financeira não causou a tendência, pois esta era muito mais antiga e profunda; apenas prolongou a sua duração. Mas as autoridades relutaram em abandonar as regras neoliberais. É que o neoliberalismo não era uma questão de princípios, mas de interesses

O remédio fez efeito. Mas a que preço? O setor financeiro, ou uma fração dele, precipitou-se no espaço aberto pela queda das taxas de juros. E as famílias de classe média responderam pela sustentação da demanda. Convém lembrar que, nos Estados Unidos, a expansão formidável do crédito hipotecário serviu para financiar, ao mesmo tempo, os próprios imóveis e o consumo (como o pagamento dos estudos dos filhos ou o tratamento médico, caríssimo em um país em que a proteção social é deficiente). A partir de 2000, o consumo, que atingira um nível elevadíssimo, parou de crescer mais rapidamente que a produção total; mas a compensação veio da construção civil, aquecida devido à alta dos preços dos imóveis. A economia saiu da recessão.

Essa medalha teve vários reversos: a entrada em cena de um setor financeiro inescrupuloso, que levou à inadimplência muitas famílias endividadas; o aumento acelerado do déficit do comércio exterior e o correspondente crescimento do financiamento desse déficit pelo resto do mundo; a queda das taxas de juros, que instigou as mais temerárias estratégias por parte das sociedades financeiras.

É possível interpretar a conjuntura de saída da crise de 2001 em termos de convergência de interesses entre a política do Federal Reserve e uma grande parcela do setor financeiro privado. Três elementos: 1) uma política de incentivo muito ousada, tornada necessária pela trajetória insustentável; 2) uma resposta eficaz a curto prazo, mas impossível de ser mantida, que levaria ao choque do subprime; 3) uma desvairada efervescência financeira, que prolongou a trajetória além do razoável e multiplicou as conseqüências da crise do crédito hipotecário. A crise e as tendências da macroeconomia alimentavam-se mutuamente. E o endividamento impagável das famílias fez com que se insistisse em uma trajetória perigosa – ao custo do aumento da dívida, ao mesmo tempo em valor e em proporção à renda nacional.

A ciranda financeira não causou a tendência, pois esta era muito mais antiga e profunda; apenas prolongou a sua duração. Não se trata de inconsciência por parte das autoridades monetárias, e sim da relutância em abandonar as regras neoliberais, tal como o exigia a correção da trajetória. Ocorre que o neoliberalismo não era uma questão de princípios, mas de interesses; de modo que as regras encobriam propósitos muito mais importantes e sagrados do que os princípios proclamados. Era o que se veria nos anos seguintes.

Como livrar-se da crise? No início de 2008, podia-se esperar uma intervenção maior do Estado: socorro ao setor financeiro ou a compra dos créditos duvidosos. Mas continuava sendo inconcebível que os dirigentes atacassem o livre-comércio e a livre circulação dos capitais

A amplitude da crise surpreendeu e a urgência da intervenção se evidenciou. Já não estávamos em 1929 e “tudo” se fez para sustentar o sistema financeiro. Primeiro, abriram-se as torneiras da política monetária: ao todo, foram despejados mais de 600 bilhões de dólares, com a perspectiva de novos aportes se necessário, pois agora se tratava de manter em funcionamento um sistema que desabava. Mas isso não foi suficiente, e não faltou quem se emocionasse. Em abril último, o FMI admitia: “Aquilo que começou como uma deterioração relativamente bem contida de certos segmentos do mercado americano dos subprimes degenerou, por metástase, num grave deslocamento para os mercados maiores do crédito e do financiamento, que agora ameaça as perspectivas macroeconômicas dos Estados Unidos e do mundo”

A curto prazo, era difícil impedir a expansão do déficit orçamentário, que já correspondia a 3% da produção do país. E esse incentivo não remediava a crescente dívida externa. Por trás do déficit, perfilavam-se não só a Europa como também, e cada vez mais, os países “emergentes”. Tendo-se em conta as formidáveis reservas financeiras desses novos jogadores e a queda do dólar, a economia dos Estados Unidos transformou-se, para eles, numa pedra no sapato.

Como evitar tal coisa? Podia-se esperar uma intervenção maior do Estado: o socorro ao setor financeiro ou a compra dos créditos duvidosos, o aumento das despesas públicas, a “re-regulamentação” das finanças (proibição de certas práticas de crédito e maior controle sobre os fundos especulativos). Também era possível implementar a defesa das empresas norte-americanas no exterior e nos Estados Unidos. No entanto, continuava sendo inconcebível que os dirigentes atacassem o livre-comércio e a livre circulação dos capitais, essenciais ao domínio das empresas transnacionais norte-americanas no mundo.

Portanto, podia-se entrever um afastamento simulado e limitado das regras neoliberais. Exceções ad hoc. Uma nova lei sobre os investimentos estrangeiros e a segurança nacional, Foreign Investiment and National Security Act, votada em 2007, deu ao presidente norte-americano importantes poderes para limitar os investimentos desse tipo nos Estados Unidos, em nome de uma definição bem ampla da segurança interna. Esse gênero de neoliberalismo “remendado” configura o esquisito destino de uma potência hegemônica cujo domínio a longo prazo está em jogo.

Lei de licença-maternidade abre debate sobre direitos da mulher

Com caráter facultativo, lei não atinge todas as trabalhadoras brasileiras; especialistas avaliam que o modo como a norma está sendo aplicada gera conflitos entre os direitos da mulher e a responsabilidade do Estado e das empresas



Sancionada no último dia 9 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a nova lei que amplia a licença-maternidade em dois meses recebe o apoio de especialistas no que diz respeito à saúde e desenvolvimento da criança.


Entretanto, no que se refere ao campo de trabalho e conquistas das mulheres na sociedade, há opiniões divergentes. A falta de políticas públicas voltadas ao cuidado com as crianças é apontada como uma falha no sistema brasileiro, que torna a norma de licença-maternidade insuficiente às necessidades de mães e filhos.


O projeto de lei traz como característica a facultatividade, tanto para empresa quanto para a funcionária. No entanto, feministas defendem que esse caráter limita o direito da mulher, já que, para ter acesso ao benefício, ela depende da escolha do empregador em participar do Programa Federal.


Eneida Dutra, assessora técnica do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA) para as áreas de Trabalho e Previdência, alega que a facultatividade abre espaço para pressões quanto à escolha que a funcionária fará. “Esperamos que não haja assédio moral para deixar a mulher insegura em relação à opção pela extensão”, observa.


Dutra explica que o modo como a lei foi elaborada não constitui um direito de fato às trabalhadoras brasileiras, pois é limitado. “Torna-se um benefício e não um direito, porque o direito é universal”, resume. Uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC 30/2007), de autoria da deputada Ângela Portela (PT-RR), busca a obrigatoriedade do direito a todas as trabalhadoras. Contudo, ainda está em tramitação no Congresso Nacional.


Entretanto, para a senadora Patrícia Saboya (PDT/CE), autora do projeto de lei que amplia a licença-maternidade, essa é uma forma de chamar o empresariado a ter uma consciência social. “Isso porque só adere ao Programa Empresa Cidadã, criado pelo projeto, a empresa que, por ter responsabilidade social, acredita que possa abrir mão de dois meses do trabalho de sua funcionária em troca de lhe conceder um tempo que trará benefícios a seu filho por toda a vida dele. Aliás, uma das grandes vantagens do projeto é ajudar a consolidar, aos poucos, no país, essa cultura da responsabilidade social, fazendo com que as empresas percebam que, ao adotar essa prática, ajudam toda a sociedade”, defende.


Mercado de trabalho


Patrícia Saboya defende, ainda, que a ampliação da licença não acarretará danos para o desempenho profissional das mulheres nem para o desenvolvimento das atividades das companhias. Para ela, esse aumento “terá um efeito altamente benéfico para as próprias empresas. Isso porque as funcionárias, ao retornarem ao trabalho, estarão muito motivadas, mais tranqüilas e com a sensação do dever cumprido”.


No entanto, dúvidas como instabilidade profissional e perda de competitividade frente ao mercado de trabalho são levantadas pelo empresariado e organizações feministas. Uma das preocupações é com a possibilidade de que os empregadores passem a optar pela contratação de funcionários do sexo masculino por conta do período de afastamento que uma funcionária ficará de suas atividades se engravidar.


Para a feminista Sonia Coelho, da equipe técnica da Sempreviva Organização Feminista e membro da Marcha Mundial das Mulheres, tal afirmação não pode ser feita de imediato, pois os resultados virão com o tempo. Ela afirma que o mercado de trabalho “não pode prescindir do trabalho das mulheres”.


Sonia explica que existem trabalhos que somente as mulheres podem realizar, com sensibilidade e agilidade, como trabalhos manuais, devido a sua experiência em trabalhos domésticos. E que se as empresas colocassem homens para fazer, eles levariam muito tempo para aprender e isto seria prejudicial para o próprio empregador. “O mercado de trabalho lucra com o trabalho das mulheres, e, sobretudo, com as desigualdades entre homens e mulheres”, alega.


A senadora Patrícia Saboya também acredita que isso não ocorrerá. “Esse mesmo argumento foi usado quando a Constituição de 1988 estabeleceu a licença-maternidade de quatro meses. De lá para cá, o que vimos foi exatamente o contrário. A cada dia, as mulheres conquistam mais e melhores espaços no mercado de trabalho”, opina.


Eneida Dutra, no entanto, teme que a mulher seja alvo de discriminação por conta do aumento da licença-maternidade. Ela afirma que prefere acreditar na “maturidade do empresariado brasileiro” para que esse tipo de situação não ocorra.


Ascensão profissional


Outro ponto questionado se refere à ascensão profissional da mulher. Francisco Gadelha, presidente do Conselho Temático Permanente de Relações do Trabalho e Desenvolvimento Social da Confederação Nacional das Indústrias (CNI), alega que a licença-maternidade estendida prejudicará o desempenho e o crescimento na carreira da mulher. Já que, ao sair de licença, ela se desconectará do mundo do trabalho e, quando retornar, estará desatualizada em relação àquele que a substitui, e terá de se readaptar, o que levará algum tempo.


Gadelha reconhece que a mulher tem alcançado destaque no mercado de trabalho e melhor qualificação nos concursos públicos, além de possuir maior escolaridade que os homens. Mas defende que o afastamento do emprego por seis meses impedirá que ela ascenda a cargos melhores. “Isso a prejudica, já que ela ainda enfrenta dificuldades para se impor no mercado de trabalho: as mulheres ocupam somente 11% dos cargos de chefia”, acrescenta.


A especialista em trabalho e professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Claudia Mazzei Nogueira, no entanto, rebate que essa é a lógica empresarial, que visa somente a acumulação de lucros. “Sempre que há a possibilidade de acumular ganhos, há uma prevenção muito grande do empresariado”, explica, referindo-se ao custo que trará para a empresa esse período de afastamento e substituição da funcionária em licença.

Para Sonia Coelho, “as empresas se utilizam desse argumento numa forma de abaixar salários e rebaixar as mulheres”. Segundo a lei, têm direito a gozar do benefício apenas mulheres que estejam empregas formalmente, que possuam registro em carteira, não as que estejam na informalidade.


Sonia explica, no entanto, que muitas mulheres continuam em trabalhos precarizados, com baixos salários, e essa medida complica mais a situação delas, pois as deixam à margem de mais um direito. Para ela, é necessário “olhar a situação das mulheres como um todo, como estão inseridas no mercado de trabalho”.


Outra crítica à nova lei diz respeito às sugestões de vetos à proposta original que se concretizaram na sanção presidencial. O presidente Lula vetou o parágrafo que concedia isenção fiscal às empresas enquadradas no Simples (tratamento tributário diferenciado e favorecido para microempresas e empresas de pequeno porte) que permitissem o aumento da licença-maternidade de suas funcionárias, assim como o artigo que isentava patrões e funcionárias do pagamento da contribuição previdenciária nos dois meses a mais da licença.


Para a professora Claudia Mazzei Nogueira, os vetos são nocivos à aplicação da lei e à aceitação por parte do empresariado. Segundo ela, a norma incentivava a participação de um número maior de empresas, mas, da forma como está agora, prejudica tanto estas como as funcionárias.


A senadora Patrícia Saboya disse que já esperava os vetos, que acabaram comprometendo a abrangência da proposta. Mas, para ela, o fato de a lei ter sido sancionada demonstrou “avanço no campo dos direitos”.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Governadores do PSDB são contra redução de jornada dos professores !!!
A lei 11.738 que criou o piso salarial profissional nacional do magistério –– R$ 950 para jornada de 40 horas –– também determina alterações na jornada de trabalho e, conseqüentemente, nos planos de cargos e salários dos Estados e municípios brasileiros. Entre estas alterações, o professor deverá dedicar, no mínimo, um terço da jornada a atividades extraclasse, como correção de provas e planejamento de aulas. Embora ainda não seja a ideal, a nova jornada representa um avanço, pois, além de possibilitar a criação de empregos, promoverá um salto na qualidade de ensino e nas condições de trabalho dos professores.

Para suprir a nova jornada será preciso contratar cerca de 60 mil professores em São Paulo. Atualmente, na rede pública paulista, existem duas jornadas: a inicial, de 24 horas, e a básica, de 30 horas. Na jornada inicial, o professor cumpre 20 horas em sala de aula e quatro em atividade extraclasse (16,66% da totalidade das aulas); na jornada básica, 25 horas em sala de aula e cinco em atividade extraclasse (16,66% da totalidade das aulas). Se o professor tem jornada de 40 horas, cumpre 33 em sala de aula e sete em atividade extraclasse, o que representa 17,5% da totalidade das aulas.

Pela nova proposta aprovada, por exemplo, o professor com jornada de 40 horas cumprirá 27 horas em sala de aula e 13 –– um terço da jornada –– em atividades extraclasse. Outro avanço da lei 11.738: a determinação de que abonos e gratificações não poderão ser contabilizados para atingir o piso de R$ 950 para 40 horas até 2010.

Governadores do PSDB não querem cumprir a lei. Setores do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), liderados especialmente pelos governos de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, Estados que adotam a política educacional do PSDB, informaram que entrarão com uma Ação Direta de Inconstitucionalida de (Adin) no Supremo em relação à lei 11.738. Os secretários questionam os parágrafos que determinam a reserva de 33% da carga horária para atividades extraclasse e o que regulamenta o piso, sem integrar em sua composição gratificações e abonos.

Em São Paulo, a secretária da Educação, Maria Helena Guimarães de Castro, já afirmou que não concorda com a lei, principalmente na determinação da nova jornada para atividades extraclasse. Em declarações na grande imprensa, a secretária informou que, para adequar-se à nova lei o Estado deverá gastar mais de R$ 1,4 bilhão. Mais uma vez, a administração do PSDB deixa patente que, em seu projeto político, educação pública é considerada gasto público e não investimento voltado aos interesses dos filhos da classe trabalhadora.

Nova jornada melhora condições de trabalho. Não daremos trégua ao governo para garantirmos a redução da jornada sem redução do salário, possibilitando mais emprego para a categoria. Manteremos a mobilização para pressionar a Secretaria da Educação a cumprir integralmente a lei federal.

Para o autor do projeto que resultou na lei 11.738, senador Cristovam Buarque, ao contrário do que vêm alegando as secretarias estaduais de Educação, “a lei poderá trazer economia, pois o professor adoecerá menos e não precisará ser substituído”. Esta declaração reafirma a luta da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) contra a lei das faltas (lei 1.041) elaborada pelo governo estadual.

Audiências públicas discutirão lei. A Apeoesp já solicitou à Assembléia Legislativa (Alesp), por meio do deputado Roberto Felício, líder da bancada do PT, a realização de uma audiência pública para discutir o piso salarial nacional e a mudança de jornada do professor. A audiência deverá acontecer em setembro.

O Conselho Nacional de Educação (CNE) também realizará audiências nas regiões Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-oeste para debater a importância da lei 11.738 para os professores e para a escola pública. Na Região Sudeste, a audiência deverá acontecer em São Paulo.

Maria Izabel Azevedo Noronha é presidenta da Apeoesp e integrante do Conselho Nacional de Educação
Fonte : http://www.jornalde piracicaba. com.br/capa/ default.asp? acao=viewnot&idnot=20358&cat=115



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segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Frejat - Intimidade Entre Estranhos (2008)




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Créditos:UmQueTenha

Uruguai teme riscos de grande emigração e baixa natalidade


Duas recentes pesquisas realizadas no Uruguai chamam a atenção sobre os problemas demográficos que o país enfrentará nas próximas décadas, se o governo não empreender políticas ativas para modificar as atuais tendências em matéria de população. Uma é a pesquisa coletiva "Demografia de uma Sociedade em Transição", da Faculdade de Ciências Sociais, e a outra é "A População do Uruguai nas Próximas Décadas", de Juan José Calvo e encomendada pelo escritório das Nações Unidas em Montevidéu.


Por Jorge Barreiro, para o Terra Magazine(www.vermelho.org.br)



À pergunta que tanto preocupa os uruguaios e que intitula as subseqüentes linhas, os autores respondem com um sonoro "não". No entanto, ambas as pesquisas concluem que a sociedade uruguaia enfrentará sérios problemas sociais e econômicos nas próximas décadas, se as atuais tendências demográficas se mantiverem inalteradas.


Para chegar a semelhante conclusão é necessário fazer referência às particulares tendências demográficas deste país na segunda metade do século 20, pelo menos no contexto latino-americano e dos chamados países "em desenvolvimento".


O Uruguai experimentou muito cedo no século 20 o que os especialistas chamam de primeira "transição demográfica", ou seja, a diminuição das taxas de fertilidade e mortalidade (que tem como um de seus resultados o envelhecimento da população). A primeira por razões educativas e culturais e a segunda como conseqüência das melhorias sanitárias, que aumentaram a expectativa de vida.

Apenas Cuba seguiu uma evolução similar no contexto latino-americano. Entre os anos 90 do século passado e a primeira década do século 21, aconteceu no Uruguai o que se denomina a "segunda transição" demográfica, que somou à primeira a inclinação a uma maior autonomia e realização individual própria das sociedades pós-modernas, e que, entre outras coisas, implica na postergação da idade de casamento e do primeiro filho, na opção por uma vida de solteiro em caráter permanente e no aumento do número de divórcios.


As últimas estatísticas disponíveis antes da realização de ambas as pesquisas indicam que o número de nascimentos caiu em 19% na década de 1996-2006 e que a taxa de fertilidade está em 2,08 filhos por mulher, ou seja, equivalente à taxa mínima de reposição.

A demógrafa Adela Pellegrino assegura que essa taxa de fecundidade já é inferior à de reposição, o que quer dizer que a população uruguaia já não tem a capacidade de se manter naturalmente no nível atual.


Combinação paradoxal


O Uruguai já é o país de população mais velha da América Latina e o de mais baixo crescimento demográfico depois de Cuba. Cresce a uma taxa de cinco por mil, ou seja, a população aumenta em 16 mil a 18 mil pessoas a cada ano... menos que o número de uruguaios que emigram a cada ano, segundo as "não de todo rigorosas" estatísticas oficiais.


A estrutura de faixas etárias e a taxa de fertilidade do Uruguai são uma autêntica exceção na América Latina e se assemelha mais com a dos países mais desenvolvidos como mostra os quadros ao lado, que, além disso, apresentam as projeções futuras, as quais sugerem uma intensificação da queda da natalidade e do envelhecimento da população, com os conseqüentes problemas sociais e econômicos.


O Uruguai seguiu, como se pode observar, uma evolução demográfica mais parecida com a dos países mais desenvolvidos do planeta. Mas apesar das projeções apontarem que, neles, a estrutura de idades será no futuro próximo uma questão mais problemática que neste país, não foram disparados lá os alarmes que parecem estar na ordem do dia por aqui. É que no Uruguai deve ser somada aos fenômenos descritos, uma emigração sem precedentes em termos relativos. Na Europa, ao contrário, o envelhecimento da população tem sido em parte amortecido por uma tendência oposta: a recepção de imigrantes jovens.


Emigração


Pelo menos desde a década de 60 do século passado, o Uruguai se converteu em um país de emigração. A partida para o estrangeiro é uma característica estrutural do país que já não depende de ciclos econômicos. Inclusive em períodos de bonança econômica e queda do desemprego, os uruguaios continuam a deixar o país.


Calcula-se que entre 1963 e 2006 deixaram o Uruguai 600 mil pessoas, das quais retornaram algo mais que 120 mil. Estas cifras podem resultar ainda mais significativas se for levado em conta que o Uruguai tem 3,3 milhões de habitantes. Isso quer dizer que um pouco mais de 15% do total de uruguaios vive fora do país. Se forem contabilizados seus filhos nascidos no exterior, a cifra é horripilante. É como se sete milhões de colombianos ou cinco milhões de argentinos vivessem fora de seu país. No contexto latino-americano o Uruguai é um dos países com maior porcentagem de emigrantes. Na última década deixaram o país cerca de 15 mil pessoas por ano, segundo dados não muito rigorosos, o que supõe praticamente a mesma quantidade que o crescimento anual da população.


Mas o tema da emigração adquire ainda mais relevância ao se levar em conta que os emigrantes são mais jovens que a média da população. Segundo a análise dos dados sobre a emigração do período mais recente (2000-2006), mais da metade dos uruguaios que partiram para o estrangeiro tinham entre 20 e 30 anos no momento da partida. Parece desnecessário ressaltar que este buraco dos emigrantes acentua os problemas demográficos do país, porque nesta faixa estão as pessoas em idade reprodutiva. Ainda assim, as pesquisas não confirmam a suposição há muito defendida quanto a esses emigrantes contarem com nível de educação superior à média da população uruguaia: os profissionais liberais, as pessoas com formação universitária e os executivos respondem por 9,8% do total de emigrantes, ante 14,7% na população uruguaia em geral. Não obstante, a grande maioria dos que deixaram o país não pertence aos estratos mais pobres da sociedade nem à população estruturalmente pobre, mas sim consistem de pessoas que sofreram reduções de renda por conta da crise do começo do milênio, e por isso se viram reduzidas à pobreza. Um dado significativo é que 40% dos emigrantes alegam ter optado por esse caminho por "falta de trabalho", e outros 25% por "baixa renda".


Se considerarmos que a emigração no Uruguai abarca, em maior medida que em outros países latino-americanos, o núcleo familiar completo, os envios de fundos do exterior não são importantes ou consideráveis como acontece no caso de algumas outras nações (em termos tanto absolutos quanto relativos). De modo que se torna necessário sinalizar que, para a sociedade uruguaia como um todo, as inconveniências causadas pela imigração superam consideravelmente os benefícios.


Calvo insiste em que não se trata, ao contrário do que supõe a forma de visão complexada que muitas vezes acompanha as sociedades pequenas, de levar a população a atingir um determinado número ("um Uruguai de seis milhões de habitantes!", por exemplo), e sim de "atingir metas qualitativas: a equidade, a criatividade, a capacidade de incorporar inovações, a qualidade, a diversidade, o cosmopolitismo". As pessoas não deveriam estar sujeitas a planos estatais de crescimento ou receber estímulos econômicos para que tenham mais filhos, e sim deveriam estar livres para "escolher o tipo e o tamanho da vida que consideram mais propícios, em decisões livres e bem fundadas".


"As pessoas deveriam poder exercer o direito de viver no local que preferem, e as migrações, tanto dentro quanto para fora de um país, não deveriam ter por motivo um horizonte de limitação de oportunidades". Para não nos estendermos demais, os índices de natalidades registrados entre as mulheres uruguaias não são uniformes: há casais pobres que têm mais filhos do que gostariam e outros casais das camadas médias da sociedade que prefeririam ter mais crianças do que têm.


Deixando de lado quaisquer visões catastróficas, as pesquisas na verdade trazem tranqüilidade aos espíritos patrióticos: os uruguaios não vão desaparecer (hoje, um em cada dois mil habitantes de nosso planeta é uruguaio, e em 2050 essa proporção se reduzirá a um em 2.500, mas não vamos nos extinguir). Mas ainda assim, os números apontam que, se persistirem as tendências atuais, chegaremos a crescimento populacional nulo ou possivelmente negativo, com todas as conseqüências que isso poderia acarretar.

Chávez explica expulsão de "defensores dos direitos humanos"


O presidente venezuelano, Hugo Chávez, disse que ordenou pessoalmente a expulsão do país de dois representantes da Human Rights Watch (HRW) por fazerem "o trabalho sujo dos ianques".


A chancelaria venezuelana comunicou a expulsão do diretor para as Américas da HRW, o chileno José Miguel Vivanco, e de seu assessor, o norte-americano Daniel Wilkinson, que apresentaram em Caracas um relatório criticando a situação dos “direitos humanos” na Venezuela.


"Ontem chegou à Venezuela um destes personagens que andam fazendo o trabalho sujo dos ianques e começou a dar declarações, então chamei o chanceler e lhe disse: expulse-o daqui", revelou Chávez.


"Não vamos permitir que estrangeiros venham aqui para julgar o povo venezuelano", disse o presidente.


Chávez reafirmou que o governo norte-americano está por trás de um complô para derrubá-lo e assassiná-lo, e que a visita dos representantes da HRW à Venezuela faz parte deste plano.


"O presidente dos Estados Unidos (George W. Bush) está desesperado porque sabe que tem os dias contados e trata de fazer qualquer coisa para incendiar não apenas a Venezuela, mas todo o continente", afirmou.


O relatório apresentado por Vivanco, chamado de "Uma década do governo Chávez: intolerância política e oportunidades perdidas para o progresso dos direitos humanos", acusa o governo venezuelano de manipular o Poder Judiciário e de enfraquecer o sistema democrático.


Segundo o ministro venezuelano de Comunicações e Informação, Andrés Izarra, a "Human Rights Watch é uma ferramenta ativa no processo de desestabilização" e está ligada aos setores golpistas.


A HRW, que tem sede em Washington, "é uma organização de fachada dos interesses mais bastardos da oligarquia venezuelana e do imperialismo americano", e o governo Chávez não vai "tolerar mais este tipo de ingerência".


Uma gigantesca manifestação apoiou a decisão do governo venezuelano de expulsar os provocadores da HRW. A convocação foi feita através da emissora de televisão VTV pelo ministro de Informações, Andrés Izarra, que também afirmou que a HRW faz parte de um "plano para gerar um golpe e inclusive o magnicídio" do presidente Chávez.


"O plano está em andamento" e a ONG "é só um dos atores" do complô, uma "organização de fachada dos Estados Unidos para intervir nos países", afirmou Izarra.


Uma nota da Chancelaria informou que a expulsão foi decidida "com base nos valores constitucionais de defesa da soberania nacional e a dignidade do povo venezuelano".


Além disso, argumentou que Vivanco e Wilkinson entraram no país com visto de turismo, o que lhes impedia, segundo a Chancelaria, de realizar atividades à margem da "expansão e recriação".


No comunicado, o governo diz notificar a ambos "a obrigação de abandonar de maneira imediata a pátria do Libertador Simón Bolívar".


Da redação, com agências(www.vermelho.org.br)


domingo, 21 de setembro de 2008

Que violonista....fantástico....

O presente infindável



Frei Betto

No século XX, a arte cinematográfica introduziu um novo conceito de tempo. Não mais o conceito linear, histórico, que perpassa a Bíblia e, também, as obras de Aleijadinho ou Sagarana, de Guimarães Rosa. No filme, predomina a simultaneidade. Suprimem-se as barreiras entre tempo e espaço. O tempo adquire caráter espacial, e o espaço, temporal. No cinema, o olhar da câmara e do espectador passa, com toda a liberdade, do presente para o passado e, deste, para o futuro. Não há continuidade ininterrupta.

A TV, cujo advento ocorreu no fim da década de 1930, leva isso ao seu paroxismo. Frente à simultaneidade de tempos distintos, a única âncora é o aqui-e-agora do (tele)espectador. Não há durabilidade nem direção irreversível. A linha de fundo da historicidade - na qual se apóiam o relato bíblico e os paradigmas da modernidade, incluindo um de seus frutos diletos, a psicanálise - dilui-se no coquetel de eventos onde todos os tempos se fundem. Dercy Gonçalves está morta e, sobre sua tumba, os clipes a exibem viva, interpretando sua personagem irreverente e desbocada.

Aos poucos o horizonte histórico se apaga como as luzes de um palco após o espetáculo. A utopia sai de cena, o que permite aos filósofos da desgraça vaticinarem: "A história acabou". Ao contrário do que adverte Coélet, no Eclesiastes, não há mais tempo para construir e tempo para destruir; tempo para amar e tempo para odiar; tempo para fazer a guerra e tempo para estabelecer a paz. O tempo é agora. E nele se sobrepõem construção e destruição, amor e ódio, guerra e paz.

A felicidade, que em si resulta de um projeto temporal, reduz-se então ao mero prazer instantâneo, epidérmico, derivado, de preferência, da dilatação do ego (poder, riqueza, fama etc.) e dos "toques" sensitivos (ótico, epidérmico, gustativo etc.). A utopia é privatizada. Resume-se ao êxito pessoal. A vida já não se move por ideais nem se justifica pela nobreza das causas abraçadas. Basta ter acesso ao consumo que propicia valor e conforto: uma boa posição social, a casa na praia ou na montanha, o carro de luxo, o kit eletrônico de comunicações (telefone celular, computador etc.), as viagens de lazer. Uma ilha de prosperidade e paz imune às tribulações circundantes de um mundo movido à violência. O Céu na Terra - prometem a publicidade, o turismo, o novo equipamento eletrônico, o banco, o cartão de crédito etc.

Nem a fé escapa à subtração da temporalidade. O Reino de Deus deixa de situar-se "lá na frente" para ser esperado "lá em cima". Mero consolo subjetivo, a fé reduz-se à esperança de salvação individual.

Graças às novas tecnologias de comunicação, agora o tempo está confinado ao caráter subjetivo. Experimentá-lo é ter uma consciência tópica do presente. Se na Idade Média o sobrenatural banhava a atmosfera que se respirava e, no Iluminismo, a esperança de futuro justificava a fé no progresso, agora importa o presente imediato. Busca-se, avidamente, a sua perenização. Somos todos eternamente jovens, cultuamos o corpo como quem sorve o elixir da juventude. Morreremos todos saudáveis e esbeltos...

Pulverizam-se os projetos nesse tempo cíclico, onde no mesmo rio corre sempre a mesma água. Outrora, havia namoro, noivado e casamento. Agora, fica-se. Após anos de casado, pode-se voltar ao tempo de namoro e, de novo, ao de casado.

A destemporalização da existência alia-se à desculpabilização da consciência. Uma mesma pessoa vive diferentes experiências sem se perguntar por princípios éticos, políticos ou ideológicos. Não há pastores e bispos corruptos e utopias que resultaram em opressão? A TV não mostra o honesto de ontem pilhado na vigarice de hoje? O bandido não faz gestos humanitários? Onde a fronteira entre o bem e o mal, o certo e o errado, o passado e o futuro?

"Tudo que é sólido se desmancha no ar" irrespirável dessa pós-modernidade, cuja temporalidade fragmenta-se em cortes e dissolvências, close-ups e flash-backs, muitas nostalgias (vide a bossa nova) e poucas utopias.

Se há algo de positivo nessa simultaneidade, nesse aqui-e-agora, é a busca da interioridade. Do tempo místico como tempo absoluto. Tempo síntese/supressão de todos os tempos. Eis que irrompe a eternidade - eterna idade. Pura fruição. Onde a vida é terna.

Nas artes, música e poesia se aproximam, de modo exemplar, dessa simultaneidade que volatiliza o tempo, imprimindo-lhe caráter atemporal. Na música, nossos ouvidos captam apenas a articulação de umas poucas notas. No entanto, perdura na emoção a lembrança de todas as notas que já soaram antes. Em si, a melodia é inatingível, assim como o poema, uma sucessão rítmica de sílabas e palavras sutis. O que existe é a ressonância da nota e da palavra em nossa subjetividade. Então, a seqüência se instaura em nós. Não é o tempo fatiado em passado, presente e futuro. É o presente infindável. O tempo infinito. Como no amor, em que o cotidiano é apenas a marcação ordinária de uma inspiração extraordinária.

Frei Betto é escritor, autor de "A obra do Artista – uma visão holística do Universo" (Ática), entre outros livros.

Um (quase) desabafo do Azenha...

NA INTERNET, UM LEITOR VALE MAIS DO QUE 100 EDITORES

Luiz carlos Azenha

Estou passando mal de tanto ler e ouvir besteiras a respeito da crise econômica nos Estados Unidos.

Na CNN Internacional duas jornalistas (?) comemoravam a recuperação da bolsa de Nova York como se tivessem acabado de assistir a um filme com final feliz.

Nenhum contexto, nenhuma informação relevante além do óbvio.

Eu sei que o papel da mídia corporativa é o de disseminar propaganda como se fosse informação.

Eu sei que o nível de formação crítica dos jornalistas despencou mais que a Bovespa no início da semana.

Eu sei que o Jornalismo a serviço do crime organizado está colocando em risco uma das ferramentas mais importantes para o exercício de minha profissão, que é o sigilo de fonte.

Ainda assim eu fico surpreso com a absoluta incapacidade de 99% da mídia, inclusive de comentaristas experimentados, de dizer algo ou dar espaço a alguém que diga algo que fuja do óbvio e do convencional.

Será que o mercado financeiro chantageou os governos? Será que os grandes bancos poderiam ter se juntado aos governos para oferecer soluções? Ou eles deram no pé e deixaram a conta pendurada com os contribuintes?

São perguntas para as quais não se vê respostas na cobertura midiática.

Ainda bem que temos a internet. A lucidez, nessa hora, parece ficar por conta dos "amadores", como o N. Ramos, de Plano, no Texas, que deixou uma mensagem altamente recomendada por outros leitores do New York Times. Ele escreveu:

Esse Nenhum Banqueiro Deixado para Trás (piada com o programa governamental Nenhuma Criança Deixada para Trás) nada fará pela família média, que terá salários estagnados e menos renda disponível depois de pagar os custos mais altos de energia, alimentação, saúde e educação. Quem vai me salvar? Tenho dois filhos que vão se formar no ensino médio e nos perguntamos onde vamos conseguir dinheiro para pagar a faculdade. Empregos? Não conseguem encontrar. Nossos pequenos investimentos sumiram. Os Estados Unidos não têm dinheiro para a infraestrutura decadente, educação, saúde, mas encontraram dinheiro para salvar os bancos? Onde eles encontraram dinheiro se nossa dívida nacional está perto de U$ 15 trilhões !!! Nós, contribuintes, estamos sendo roubados e o futuro de nossas crianças destruído... Estamos a caminho de ser um país do terceiro mundo.

Não vi um artigo sequer, até agora, que lidasse com as preocupações do leitor cujo texto acabo de reproduzir. É espantoso constatar que o Jornalismo perdeu completamente a relação com os interesses do cidadão comum

Será que os jornalistas -- ou pelo menos os jornalistas que opinam -- perderam o contato com a realidade das pessoas comuns? Será que perderam a capacidade de empatia com os leitores, ouvintes e telespectadores?

Não sei exatamente o que é, mas tem alguma coisa muito errada aí.

Homenagem aos gauchos colorados...