domingo, 17 de julho de 2011

Márcio Pochmann: 70 anos de salário mínimo no Brasil


A política do salário mínimo no Brasil passou por profundas modificações, seja em seu objetivo, seja em seus resultados, desde sua introdução pelo presidente Getúlio Vargas, em 1940, durante o regime autoritário do Estado Novo (1937–1945). Sua história, contudo, registra quatro fases distintas.

Por Márcio Pochmann*
no VERMELHO

A primeira, entre 1940 e 1951, abrange a instituição e consolidação do valor do mínimo para os trabalhadores urbanos desde a fixação, em 10 de maio de 1940, do primeiro valor monetário. A segunda fase, entre 1952 e 1964, foi marcada pela elevação do poder de compra, como a incorporação de parte dos ganhos de produtividade da economia, ainda sem incluir os trabalhadores do setor rural. Nesse período havia 29 níveis de salário mínimo no país.

A terceira fase diz respeito aos anos de 1964 a 1995, quando a política do mínimo afastou-se e permaneceu distante dos objetivos originalmente definidos em 1940, embora tenha se mantido como um importante mecanismo de intervenção do poder público no mercado de trabalho. Os camponeses e as empregadas domésticas foram incorporados pela política do salário mínimo durante a fase de rebaixamento do seu valor real, apesar de a Constituição Federal de 1988 ter estabelecido compromissos políticos com a recuperação do seu poder de compra. A quarta fase inicia-se a partir de 1995, com o valor real do salário mínimo sendo elevado gradualmente acima da inflação. No ano de 2009, por exemplo, seu poder aquisitivo, foi 74,1% superior ao de 1995, porém se manteve valendo apenas 43,7% do que era em 1940.

Mesmo ainda distante de seus objetivos originais, o mínimo nacional, por ser a remuneração de ingresso no mercado de trabalho organizado e a base da hierarquia salarial de grande parte das empresas, se mantém como referência dos salários dos empregos secundários (não-chefes de família, mulheres e jovens), de empregos com alguma qualificação no início da carreira e, sobretudo, de trabalhadores (chefes de família) sem qualificação. No ano de 2008, por exemplo, 46,1 milhões de brasileiros tinham remuneração mensal referenciadas no valor do salário mínimo, o que representa 49,9% da população trabalhadora. Desse universo, 18,5 milhões eram beneficiados da Previdência Social, 14 milhões eram empregados assalariados, 8,5 milhões eram ocupados por conta própria, 4,7 milhões eram trabalhadores domésticos e 276 eram empregadores.

O setor público emprega somente 1% do total dos brasileiros com remuneração referenciada no valor do salário mínimo, o que equivale somente a cerca de 485 mil pessoas, sendo 6,2 mil na administração federal, 120,7 mil na administração estadual e 357,4 mil na administração municipal. Entre os que recebem o valor do mínimo nacional, 52% são homens e 48% são mulheres, enquanto 71% vivem nas cidades e 29% no meio rural. O setor de serviços absorve 44,2% dos ocupados com remuneração de até um salário mínimo, seguidos de 29% no setor agrícola, de 13,4% na indústria e de 10,6% no comércio. A região Nordeste concentra a maior parcela dos ocupados recebendo o salário mínimo nacional (58,6%), enquanto a região Sul apresenta a menor parcela (20,7%), seguida do Sudeste (22,5%), Centro Oeste (28,1%) e Norte (39,7%).

Decorrente do movimento de queda no valor do salário mínimo, o Brasil se transformou, ao contrário de outras economias que avançaram no seu processo de industrialização, num país de baixos salários. A permanência de um imenso contingente de trabalhadores ganhando tão pouco não pode ser atribuída ao fator econômico, já que entre 1940 e 2009 a renda per capita multiplicou-se por 6,5 vezes, enquanto o valor do mínimo não chega nem à metade do que era no momento de sua criação.

Se a atual Constituição Federal fosse observada, o valor do salário mínimo deveria ser capaz de atender às necessidades do trabalhador e de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que preservem seu poder aquisitivo. Não há dúvidas, porém, de que tais normas ainda não são cumpridas. O mínimo é suficiente para atender ao consumo de 13 alimentos básicos para uma pessoa, mas não para a alimentação de uma família e para as demais despesas que a Constituição define. Em São Paulo, por exemplo, o valor do salário mínimo comprava duas cestas básicas com 13 alimentos, enquanto em 1995 podia adquirir somente uma. Apesar deste avanço em relação à cesta básica, percebe-se que o salário mínimo necessário para atender todas as necessidades básicas, para além da alimentação individual, alcançou a soma de R$1.995,91 em dezembro de 2009. Ou seja, 4,3 vezes o salário mínimo vigente naquele mês. Como o Brasil pagou salário mínimo com maior valor, mesmo tendo a economia nacional capacidade de produzir e empregar mão-de-obra bem menor que a atual, entende-se que a política de recuperação do valor real do mínimo não pode parar. Se o Brasil almeja ser um país desenvolvido precisa considerar o crescimento contínuo do salário mínimo, conforme se observa na Dinamarca, cujo mínimo anual equivale a mais de 2/3 da renda nacional per capita.

Por ter como objetivo contrabalançar as tendências inerentes ao funcionamento do mercado de trabalho de gerar salários decrescentes e emprego precário, o que acentua a desigualdade da renda, a atual política de salário mínimo precisa ser mantida. Seguindo a tendência verificada desde 2007, quando foi criada a política de reajuste real do mínimo, serão necessários 27 anos para que o atual valor do salário mínimo passe a cumprir o preceito constitucional, ou 15 anos se a meta for o poder aquisitivo do primeiro valor do salário mínimo de 40 anos atrás.

*Márcio Pochmann é presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Fonte: Fórum (essa matéria é parte integrante da edição impressa da Fórum 86).

A luta contra a especulação do etanol

 
Etanol: quem segura o rojão é a Petrobras

No meio da colheira, a indústria canavieira diz que houve uma “quebra de safra” e que vai produzir menos etanol este ano. Pronto, está justificado o aumento de preços, não é?. É o mercado, a oferta menor deve, naturalmente, refletir-se em preços maiores. Está no livrinho santo das regras mercadistas.
E quais as razões desta “quebra de safra”? Ah, foi o clima – sabe como é, chove, faz sol… – e também a falta de investimento na renovação e ampliação dos canaviais.
Mas isso aconteceu por dificuldades no setor? Vai aí ao lado o gráfico do faturamento bruto da Cosan-Shell, a maior empresa do setor. E o crescimento dos lucros não é menor, como registra a Agência Reuters, em matéria republicada pela Folha, há um mês:
“A Cosan, maior grupo de açúcar e etanol do Brasil, fechou o quarto trimestre fiscal com lucro líquido de R$ 480,9 milhões, salto de 64% em relação ao ganho de R$ 294 milhões do mesmo período do ano anterior. Em todo o ano-safra 2010/2011, a companhia acumulou lucro líquido de R$ 771,6 milhões, com queda de 26,8% sobre o ganho de R$ 1,054 bilhão de igual período do ano anterior”.
Não se está desfazendo das dificuldades que muitos produtores têm, mas é preciso que fique claro que este setor é cada vez mais concentrado e internacionalizado. 70% das áreas de cana estão em mãos de usinas e, hoje, 35% das usinas são estrangeiras. E as multinacionais pouco investiram em novos projetos.
Claro que é correto o Governo estimular, com financiamento, a ampliação da capacidade de estocagem de etanol. Ela é indispensavel para garantir a estabilidade no abastecimento. Como é correto, para estabilizar preços, a determinação de que as compras se façam em contratos de longo prazo, para garantir linearidade nas entregas, em lugar da especulação confessada de algumas empresas, que usam sua capacidade de estocar – na planta ou no tanque – à espera de melhores preços. 
A estocagem, por si só, não basta. Ao contrário, ela muitas vezes é utilizada como ferramenta para majorar preços, como a gente publicou aqui.
Deve haver duas condicionantes para financiá-la.
A primeira delas é o controle público sobre os estoques. Não se argumente que isso é um bem privado, por várias razões, desde o subsídio dado ao setor, diretamente, até o apoio com que ele contou na formação de um mercado de consumo, com as desonerações tributárias que se fei para a criação de um frota flex-fuel.
A segunda é que o próprio Governo precisa avançar na sua participação no setor, através da Petrobras, tanto na produção quanto na distribuição. E, portanto, o crédito público disponível deve a ela ser preferencialmente dirigido.
Até porque quem segura o rojão, em matéria de combustíveis, é a Petrobras, que não reajustou seus preços na gasolina entregue na boca das refinarias, importou e ampliou o volume de refino do produto.
Apesar da lentidão com que a ANP vem tratando essa regulação, os contratos de fornecimento pré-estabelecido, a longo prazo, vão sair. É que a presidenta Dilma tem mandado avisar que, se não houver um acordo em que as usinas garantam o fornecimento de etanol, taxará a exportação de açúcar.
Aí a turma treme.

sábado, 16 de julho de 2011

Jogos da Alba têm início neste domingo, com 19 países inscritos


Começa neste domingo (17), na Venezuela, a 4ª edição dos Jogos da Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (Alba). Participarão mais de dois mil atletas pertencentes dos 9 países que formam a Alba, além de outros 10 países do mundo. O evento esportivo, que acontecerá até 30 de julho, é realizado a cada dois anos e tem como objetivo demonstrar as habilidades dos esportistas e promover a integração social dos povos.

"Mais que tratados entre estados é necessário fomentar a união latino-americana através do permanente intercâmbio cultural entre os habitantes da região”, declarou o presidente venezuelano Hugo Chávez, ao site de informações do governo. Neste sentido, os Jogos da Alba são exemplos de formas para alcançar este objetivo.
Dezenove nações enviarão suas delegações. Participarão esportistas da Argentina, Brasil, Colômbia, Curazao, Chile, El Salvador, Espanha, Guatemala, Guiana, México, Paraguai, Peru, Porto Rico e República Dominicana, Antigua e Barbuda, Bolívia, Cuba, Dominica, Equador, Nicarágua, San Vicente e as Granadinas e Venezuela. Para alguns países, o torneio servirá como preparação para os próximos jogos Panamericanos de Guadalajara (México) em 2012.

Segundo a organização venezuelana, pelo site de informações do governo, o evento cresceu em participação e mantém "o sonho de Simón Bolívar: a unidade entre os povos da região”. Em entrevista à TeleSur, o ministro de Esporte da Venezuela, Héctor Rodríguez, declarou que "estes jogos aproximam os povos. Esmos dando saltos impressionantes na unidade latino-americana e caribenha”.

Serão disputadas 35 modalidades individuais e de conjunto em múltiplos estádios e centros esportivos de dez estados venezuelanos. Os principais estados sedes serão Lara, Yaracuy e Carabobo, onde se disputarão competições tais como atletismo, handebol, boxe, canoagem, esgrima, judô, karatê, levantamento de peso, luta, tae kwon do, entre outros. A inauguração se realizará no estado de Lara, no domingo pela manhã.

Os outros estados sedes dos Jogos são Anzoátegui, Aragua, Cojedes, Distrito Capital, Portuguesa, Vargas e Miranda. De acordo com a organização, se investiu mais de 23 milhões de dólares em reparações da infraestrutura esportiva destes estados. Em Cojedes, por exemplo, se instaurou a Universidade Esportiva do Sul.

Alba

A Alba reúne nove países: Venezuela, Cuba, Bolívia, Nicarágua, Equador, Comunidade de Dominica, Antigua e Barbuda, Honduras, San Vicente e Granadinas. Juntos, eles representam uma população de 75 milhões de pessoas. A proposta da aliança se formulou pela primeira vez no marco da III Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da Associação de Estados do Caribe, em 2001.

É uma aliança política estratégia que "tem o propósito histórico fundamental de unir as capacidades e fortalezas dos países que a integram, na perspectiva de produzir as transformações estruturais e o sistema de relações necessários para alcançar o desenvolvimento integral requerido para a continuidade de nossa existência como nações soberanas e justas”, se explica no texto do Tratado.

Fonte: Adital, com informações de TeleSur, AVN e Alba.

Deolindo Amorim: o Filósofo e Didata do Espiritismo



  • Escreve: Jaci Regis no PENSE


  • Deolindo Amorim foi um grande didata a serviço do pensamento espírita. De personalidade serena e afetuosa, lutou incessantemente contra a corrupção do pensamento doutrinário e pelo entendimento da obra de Allan Kardec, sempre de forma elegante e independente.


    Deolindo Amorim nasceu em 23 de janeiro de 1906 no Estado da Bahia, numa família pobre e católica. Foi presbiteriano fervoroso. Rompeu com sua igreja e permaneceu muitos anos sem definição filosófica ou religiosa. Em 1935 descobriu o Espiritismo.

    A palavra descobriu é empregada no seu sentido de percepção totalizadora de uma idéia. É, certamente, um exercício intelectual, mas ultrapassa esse universo para penetrar no universo da apreensão do objeto.

    Quando se descobre uma doutrina, por exemplo, ela se incorpora a nossa estrutura mental, ao nosso modo de estar no mundo.

    Bem ao contrário de qualquer recaída fanática, a descoberta é a forma de inserir-se no conteúdo, abrangendo, pouco a pouco, não apenas os enunciados, as ideias, os conteúdos. É mais, percebe-se os objetivos, divisa-se o rumo e a essência. Enquanto o adepto, o estudioso permanece na superfície ou na profundidade da ideia, o descobridor se integra, faz uma ligação definitiva com a Doutrina. Foi o que aconteceu com Deolindo Amorim.

    Nascido a 23 de janeiro de 1908, Deolindo mudou-se para o Rio de Janeiro. Radicado na antiga capital do Brasil, tornou-se jornalista e, posteriormente funcionário público, tendo galgado elevada posição funcional no Ministério da Fazenda.

    Desde que descobriu a Doutrina Espírita, tornou-se, progressiva e determinadamente, no baluarte pela definição específica do que é o Espiritismo.

    Conheci pessoalmente Deolindo Amorim. Missivista atencioso, ele teceu comentários elogiosos à minha obra “Comportamento Espírita”, na ocasião de seu lançamento. A dimensão de seu trabalho certamente não cabe nos limites destas notas. Sua figura simpática, serena, não significava, entretanto, fraqueza ou acomodação. Polemizou com companheiros de forma responsável e respeitosa. Prosseguiu seu caminho com coerência e dignidade. Manteve posições firmes, mesmo contra amigos e situações.

    Personalidade afetuosa, mostrou uma determinação e uma estrutura de pensamento ímpares. Foi, ao longo de sua vida, uma barreira positiva, definida, contra a corrupção do pensamento doutrinário. Lutou sem descanso pelo bom entendimento da obra de Allan Kardec.

    Creio que a figura ímpar de Deolindo pode ser definida como o didata por excelência, o professor eficaz do Espiritismo.

    O ATIVISTA

    Deolindo não ficou na teoria. Além de escrever livros, editar jornais, representar periódicos e enviar artigos para muitos jornais e revistas, proferir conferências, tomou iniciativas que marcaram o movimento espírita brasileiro.

    Já em 1939 ele idealizou e promoveu o I Congresso de Jornalistas e Escritores Espíritas, realizado na cidade do Rio de Janeiro. Foi uma reunião de intelectuais espíritas, semente de propostas posteriores. O momento era crucial, o Espiritismo era perseguido pela Igreja e pela Polícia. A II Grande Guerra estava iniciada.

    Esteve ao lado de Leopoldo Machado na promoção do I Congresso de Mocidades e Juventudes Espíritas do Brasil e na criação do Conselho Consultivo de Mocidades Espíritas.
    Foi parceiro fiel de Aurino Souto, presidente da Liga Espírita do Brasil. Finalmente, fundou em 7 de dezembro de 1957 O Instituto de Cultura Espírita do Brasil (ICEB), instituição de grande influência no estudo e divulgação do Espiritismo, com sede no Rio de Janeiro e que dirigiu até sua desencarnação.

    EM DEFESA DO ESPIRITISMO

    Um dos problemas mais emergentes relativos ao bom entendimento da Doutrina Espírita foi a constante tentativa de confundi-lo seja com a Umbanda, o Candomblé, com as religiões cristãs e doutrinas espiritualistas. Principalmente com os cultos afro-católicos, as confusões foram muitos grandes. Hoje, talvez, esse aspecto esteja quase superado mas já foi mais grave. A própria Federação Espírita Brasileira (FEB) pretendeu fazer uma divisão absurda: chamar de Espiritismo todas as práticas mediúnicas ou semelhantes e de Doutrina Espírita, a obra de Kardec.

    Em 1947 Deolindo publicou Africanismo e Espiritismo, onde deixa clara a inexistência de ligações filosóficas, práticas ou doutrinárias entre o Espiritismo e as correntes espiritualistas apoiadas na cultura africana, trazida pelo escravos e que se converteram em várias seitas de gosto popular.

    Determinado a explanar, didaticamente, as bases da doutrina de Allan Kardec, ele escreveu “O Espiritismo e os Problemas Humanos”, “O Espiritismo à Luz da Crítica”, em resposta a um padre que escrevera livro atacando a Doutrina. “Espiritismo e Criminologia”, oriundo de uma conferência no Instituto de Criminologia da Universidade do Rio de Janeiro. Em 1958, lançou “O Espiritismo e as Doutrina Espiritualistas”, onde não combate nenhuma corrente ou ideia espiritualista, como a Teosofia, a Rosacruz, seitas de origem asiática ou africana. Ele simplesmente define, separa, identifica o que é o Espiritismo, mostrando a sua independência filosófica, embora ressaltando eventuais coincidências de pontos filosóficos, devido à base espiritualista desses movimentos.

    O DIDATA DA DOUTRINA

    Deolindo não lançou teorias, nem propôs ideias revolucionárias de atualização ou desenvolvimento da Doutrina. Esmerou-se e o fez com absoluto sucesso, em definir o conteúdo, a abrangência, o papel e o lugar do Espiritismo na sociedade e nas doutrinas espiritualistas.

    Não se pense, todavia, que tenha sido ortodoxo e conservador. Nada disso. Foi uma mente aberta ao novo, entendeu perfeitamente o sentido evolucionista do Espiritismo e recusou-se a aceitar as ideias conservadoras, retrógradas.

    Na Introdução de “O Espiritismo e as Doutrina Espiritualistas” ele diz: “Escrevemos este trabalho com o sincero propósito de concorrer, embora despretensiosamente, para que se esclareça cada vez mais a verdadeira posição do Espiritismo perante as doutrinas e os cultos espiritualistas. Todas as doutrinas, como todos os credos, sejam quais forem as suas origens, nos merecem o mais justo respeito. (...) Devemos, porém, dizer claramente o que é e o que não é Espiritismo, para que não haja confusão nem tomem corpo interpretações duvidosas.”

    E reafirma sua posição: “Repetimos que o Espiritismo é universalista, porque os fatos do espírito são universais, os seus problemas têm o sentido da universalidade, mas também é oportuno acentuar que o Espiritismo não é uma forma de sincretismo doutrinário ou religioso, sem unidade nem consistência”.

    Que é o Espiritismo, afinal? Vejamos o que nos diz Allan Kardec: O Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Ciência de observação, sim, nem precisamos dizê-lo, porque tem por objeto uma fenomenologia que já foi comprovada em experiências; doutrina filosófica, realmente, porque, tendo por base experimental o fenômeno mediúnico, faz inquirições sobre as causas e leis, deduzindo consequências que incidem no domínio moral, da religião, da filosofia em si. Eis, em síntese, o que é o Espiritismo

    Finalizando o excelente “O Espiritismo e as Doutrinas Espiritualistas”, afirma que “Como doutrina essencialmente progressista, recebe os enriquecimentos das ciências, como acompanha os fenômenos sociais e culturais, sem perder, todavia, a sua integridade e as suas características. Nenhuma religião, nenhum culto espiritualista poderia absorvê-lo ou confundi-lo, a despeito da existência de aspectos comuns, porque as suas concepções basilares, tendo consequências científicas, filosóficas e religiosas, não permitem adaptações e concessões arbitrárias. Desta proposição, consequentemente, chegamos à conclusão de que O Espiritismo é uma doutrina que se basta a si mesma, sem empréstimos nem acréscimos artificiais”.

    A QUESTÃO RELIGIOSA

    Sobre a questão religiosa no Espiritismo, sua posição foi bem igual a de Kardec. Citando as palavras do fundador, concluía que, como qualquer filosofia espiritualista, o Espiritismo tinha consequências religiosas, mas de forma alguma se tornava uma religião constituída.

    “Allan Kardec frisa bem que o Espiritismo não é uma religião constituída. Não o fora nos primeiros tempos, quando o seus delineamentos ainda estavam na fase de elaboração, nem o seria hoje, com a experiência histórica de mais de um século, quando a Doutrina já está definitivamente consolidada. O qualificativo constituída não exclui a ideia religiosa. Há muita diferença entre o culto organizado e atos religiosos ou consequências religiosas. O Espiritismo tem, indiscutivelmente, consequências religiosas, e muito profundas, mas a sua esquematização, a sua índole e a sua conceituação básica não comportam qualquer forma de culto material, nem, sacerdotes, nem chefes carismáticos... O verdadeiro culto para o Espiritismo é o culto interior, é o sentimento, a elevação do pensamento.”

    “O fato de haver Allan Kardec preferido não instituir nenhum sistema moral, porque lhe bastou a moral cristã para o coroamento da doutrina por ele codificada, não quer dizer que o Espiritismo concorde ou deva concordar com tudo quanto ensinam as diversas religiões e denominações cristãs; muito menos seria possível introduzir no Espiritismo práticas, dogmas e formas peculiares às religiões oriundas do Cristianismo.”

    E, “não é possível reduzir o Espiritismo às limitações de uma seita cristã, assim como não se pode concordar com a suposição corrente de que tudo seja a mesma coisa.”

    “Tendo-se preocupado fundamentalmente com a interpretação filosófica do fenômeno e suas consequências na ordem moral, a Codificação do Espiritismo não cogitou, nem poderia cogitar, de qualquer culto material, assim como não prescreve cerimônias de iniciação, nem hierarquia sacerdotal” .

    Se reconhecida, como é obvio, que o Espiritismo tem uma ligação estreita com a moral de Jesus, e consequentemente com o Evangelho, deixa claro que essa foi uma decisão de Kardec e separa de maneira muito clara o cristianismo do Espiritismo.

    Pelo fato de aceitar a mensagem do evangelho, afirmou, não significa que o Espiritismo aceita tudo do cristianismo. Ele sempre foi contrário à confusão dos que tentam diluir o Espiritismo seja com os cultos espiritualistas, seja com os rituais do cristianismo. Repudiava o tudo é a mesma coisa, frase usada para justificar as deturpações gritantes contra a identidade da Doutrina.

    “É o Espiritismo que interpreta o evangelho, não é o evangelho que interpreta o Espiritismo.”

    REFORÇO À INTELECTUALIDADE

    Como é comum no movimento espírita, Deolindo foi muito criticado por optar pela cultura e pela inteligência. Existiu, no Rio de Janeiro, a Faculdade Brasileira de Estudos Psíquicos que ele não fundou, como às vezes se diz, mas a que pertenceu e foi seu último presidente. Tornada insubsistente a continuidade da Faculdade, ele promoveu a criação do Instituto de Cultura Espírita do Brasil (ICEB) fundado em 7 de dezembro de 1957 e por ele dirigido até sua desencarnação.

    Quanto à questão da unificação do movimento, Deolindo nunca aderiu à Federação Espírita Brasileira, tanto que aliou-se à Liga Espírita do Brasil, entidade criada em 1927, por Aurino Souto e da qual Deolindo foi o último 2º vice-presidente.

    Em 1949, com o chamado Pacto Áureo, a Liga Espírita do Brasil, que não tinha representatividade nacional, deixou de existir, transformando-se numa entidade federativa estadual. Hoje, depois de várias denominações, é a USERJ - União das Sociedades Espíritas do Estado do Rio de Janeiro.

    Deolindo foi contra o acordo. Suas palavras sobre o assunto, em 1949: “quando a Liga aceitou o Acordo de 5 de outubro, acordo que se denominou depois, Pacto Áureo, tomei posição contrária (...) votei contra a resolução, porque não concordei com o modo pelo qual se firmara esse documento. E o fiz em voz alta, de pé, na Assembleia, com mais doze companheiros que pensavam da mesma forma”.

    Admirava muito Léon Denis, de quem disse: “Léon Denis pertence, com inteira justiça, à galeria dos mais autênticos filósofos espíritas. Discípulo e continuador de Allan Kardec, ninguém o foi, até hoje, com mais afeição e com vigor intelectual”.

    Mas seu respeito a sua fidelidade ao pensamento de Allan Kardec foi não apenas exemplar, mas de um tirocínio brilhante e uma defesa inteligente e atuante.

    Em 24 de abril de 1984, aos 77 anos de vida terrena, desencarnou Deolindo Amorim, fechando um ciclo fecundo de pensadores espíritas, dos quais, com justiça, ele está num lugar privilegiado.

    Todavia, mais do que nunca, neste momento em que o Espiritismo precisa decidir seu próprio caminho, o pensamento, a palavra e a postura de Deolindo Amorim são elementos indispensáveis para entender, seguir e definir o futuro da Doutrina.

    Fonte: Jornal de cultura espírita “Abertura”, dezembro de 2000, ano XIII, nº 155 - Santos-SP.

    Jaci Regis (1932-2010), psicólogo, jornalista, economista e escritor espírita, foi o fundador e presidente do Instituto Cultural Kardecista de Santos (ICKS), idealizador do Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita (SBPE), fundador e editor do jornal de cultura espírita “Abertura” e autor dos livros “Amor, Casamento & Família”, “Comportamento Espírita”, “Uma Nova Visão do Homem e do Mundo”, “A Delicada Questão do Sexo e do Amor”, “Novo Pensar - Deus, Homem e Mundo”, dentre outros.

    Lindo!!! Alfonsina y el Mar (MERCEDES SOSA)

    Documentário - A Morte Inventada: A Alienação Parental [Raro]


    A Alienação Parental, descrita em meados da década de 80 pelo psiquiatra infantil norte-americano Richard Gardner, revela-se como uma situação na qual um progenitor procura afastar seu filho ou filha do outro progenitor intencionalmente.
    Essa alienação é realizada através de informações contínuas no intuito de destruir a imagem do progenitor alienado na vida da criança.
    Na maioria das vezes a mãe ou pai que praticam essa alienação obtêm êxito e o filho permanece, durante anos, acreditando naquela visão distorcida. Infelizmente, durante o processo de separação, os filhos acabam sendo o principal instrumento para agredir o ex-companheiro.
    As crianças vítimas de Alienação Parental carregam para sempre os sinais desse tipo de violência, podendo desenvolver, na fase adulta, distúrbios psicossociais severos.
    O documentário “A Morte Inventada” propõe disseminar o assunto entre pais, psicólogos, advogados, juízes, promotores, assistentes sociais, pediatras e todos os envolvidos nesse drama familiar.
    Esta violência tão frequente e pouco conhecida não pode continuar destruindo a relação entre pais e filhos.

    Com colaboração da BRUNA, novo link: 

    http://bitshare.com/files/onygi36h/AMorteInventada.avi.html
    Áudio - PT/BR
    Formato Vídeo - AVI 

    Uma boa leitura para um sábado sombrio...

    EM DEFESA DAS CAUSAS PERDIDAS: ZOZIEK ,UMA LEITURA OBRIGATÓRIA!






    Um dos grandes filósofos políticos do nosso tempo, Slavoj Žižek investiga nesta obra o cerne das chamadas “políticas totalitárias” do passado. A fim de examinar os dilemas do momento presente e propor alternativas, coloca-se como observador da história para, calcado nas bases teóricas críticas da psicanálise e do marxismo, resgatar o que ainda podemos aprender com as chamadas “Causas perdidas”. Momentos de mudança radical ocorridos a partir de grandes causas são férteis, candentes de idealismo e capazes de abrir e iluminar caminhos, ainda que seus meios provem-se equivocados.

    Com seu estilo sempre contestador e sagaz, Žižek desfaz ponto a ponto a trama das análises prontas e desgastadas, elaborando sua defesa das causas perdidas para, de acordo com ele, não “defender, como tal, o terror stalinista, mas tornar problemática a tão facilzinha alternativa democrático-liberal”.

    De acordo com o jurista e filósofo Alysson Leandro Mascaro, que assina o prefácio da obra, Žižek faz a passagem entre a constatação factual e a plena intervenção política, alcançando o estágio que denota a maturidade política de um filósofo: o apontar dos caminhos. Tudo isso sem deixar de lado as provocações que o tornaram conhecido do grande público, articulando Lacan, Hegel e Marx, o cinema, a música, a cultura popular e os objetos de consumo.

    O livro consolida uma perspectiva de filosofia política que ganha ares de proposição específica: a defesa das causas perdidas e o encontro das visões filosóficas não liberais existenciais e marxistas. Para além de Lacan e Marx, Žižek alinha Heidegger e Foucault em sua empreitada política. Ao discorrer sobre as formas de luta pela emancipação universal e a iminente crise ecológica global, reivindica a possibilidade de reinvenção do terror revolucionário e da ditadura do proletariado.

    A proposta de ruptura teórica com o bem-estabelecido tem em vista que o capitalismo só pode vicejar em condições de estabilidade social básica. Esse pano de fundo ideológico precisa ser gerido por um forte aparelho cultural e educacional que mantém a confiança simbólica intacta, produzindo indivíduos que não só aceitam a própria responsabilidade por seu destino, como também confiam na “justiça” básica do sistema.

    Repetir o passado não é provar a fraqueza do que se busca novamente, mas sim demonstrar a necessidade premente de concretizar sua grandeza, buscando no mínimo errar menos nessa nova retomada do processo revolucionário. A defesa das Causas perdidas não está envolvida com nenhum tipo de jogo desconstrutivo, seu objetivo é aceitar com coragem a concretização total de uma Causa, inclusive o risco inevitável de um desastre catastrófico. “Parafraseando a memorável frase de Beckett, à qual voltarei várias vezes adiante, depois de errar pode-se continuar e errar melhor, enquanto a indiferença nos afunda cada vez mais no lamaçal do Ser imbecil”, conclui Žižek. De acordo com Mascaro, “Em tempos dinâmicos que chegam até a plena manipulação tecnológica da natureza, onde a única grande estabilidade é a própria exploração capitalista, contra a qual já se luta e já se perde há tempos, trata-se de mostrar que é possível fazer a defesa das causas perdidas, para agora perder melhor ou, quiçá, plenamente ganhar”.

    Trecho

    Restam somente duas teorias que ainda indicam e praticam essa noção engajada de verdade: o marxismo e a psicanálise. Ambas são teorias de luta, não só teorias sobre a luta, mas teorias que estão, elas mesmas, engajadas numa luta: sua história não consiste num acúmulo de conhecimentos neutros, pois é marcada por cismas, heresias, expulsões. É por isso que, em ambas, a relação entre teoria e prática é propriamente dialética; em outras palavras, é de uma tensão irredutível: a teoria não é somente o fundamento conceitual da prática, ela explica ao mesmo tempo por que a prática, em última análise, está condenada ao fracasso – ou, como disse Freud de modo conciso, a psicanálise só seria totalmente possível numa sociedade que não precisasse mais dela. Em seu aspecto mais radical, a teoria é a teoria de uma prática fracassada: “É por isso que as coisas deram errado...”. Costumamos esquecer que os cinco grandes relatos clínicos de Freud são basicamente relatos de um sucesso parcial e de um fracasso definitivo; da mesma forma, os maiores relatos históricos marxistas de eventos revolucionários são descrições de grandes fracassos (da Guerra dos Camponeses Alemães, dos jacobinos na Revolução Francesa, da Comuna de Paris, da Revolução de Outubro, da Revolução Cultural Chinesa...). Esse exame dos fracassos nos põe diante do problema da fidelidade: como redimir o potencial emancipatório de tais fracassos evitando a dupla armadilha do apego nostálgico ao passado e da acomodação demasiado escorregadia às “novas circunstancias”.

    Sobre o autor

    Slavoj Žižek nasceu na cidade de Liubliana, Eslovênia, em 1949. É filósofo, psicanalista e um dos principais teóricos contemporâneos. Transita por diversas áreas do conhecimento e, sob influência principalmente de Karl Marx e Jacques Lacan, efetua uma inovadora crítica cultural e política da pós-modernidade. Professor da European Graduate School e do Instituto de Sociologia da Universidade de Liubliana, Žižek preside a Society for Theoretical Psychoanalysis, de Liubliana, e é um dos diretores do centro de humanidades da University of London.

    Por Miguel Grazziotin em seu blog

    O Brasil e os Estados Unidos: relações globais e bilaterais

    Por Cristina Soreanu Pecequilo no CARTA MAIOR
     
     
    Novo documento elaborado por uma força tarefa do "Council on Foreign Relations" voltou a gerar, em parte do debate nacional brasileiro, principalmente nas esferas mais próximas às políticas de alinhamento com os EUA, elevado otimismo. O texto considera que os norte-americanos precisam aprofundar ainda mais os laços com o Brasil, baseado em uma visão histórica de prévias alianças, mas, principalmente, de necessidades futuras dos EUA, seja em termos de engajamento do poder brasileiro, como de sua contenção e dos demais emergentes.
    Nos últimos meses, o Brasil e outros países emergentes como a China e a Índia foram foco de investidas norte-americanas, criticando sua projeção de poder e ações autônomas no sistema internacional. Contraposta à premissa da multipolaridade, a do domínio hegemônico ocidental foi reafirmada em inúmeras oportunidades pelo Presidente Obama e a Secretária de Estado Hillary Clinton, refutando as teses de declínio. Da mesma forma, nações africanas foram “alertadas” pelos Estados Unidos (EUA) sobre o “novo colonialismo” praticado por estes emergentes.

    Paralelamente, no embate interno, a administração democrata enfrenta forte campanha midiática neoconservadora sobre a sua futura derrota eleitoral em 2012, não importando a ausência de um candidato republicando definido, e as pressões estruturais de uma economia em crise quase que permanente, vide o recente debate sobre a elevação do teto da dívida norte-americana. Diante deste cenário, prevalece a imagem, e realidade, de uma sociedade fragmentada, pressionada por grupos de interesse e dividida entre projetos polarizados.

    Em meio a isso, porém, novo documento elaborado por uma força tarefa do Council on Foreign Relations (CFR) intitulado “Global Brazil and US-Brazil Relations” (disponível em http://www.cfr.org/brazil/global-brazil-us-brazil-relations/p25407) voltou a gerar, em parte do debate nacional brasileiro, principalmente nas esferas mais próximas às políticas de alinhamento com os EUA, elevado otimismo. Similar à expectativa causada pela visita do Presidente Obama em março de 2011 ao país, inclusive por abordar de forma “positiva e aberta” o reconhecimento do poder global do Brasil no atual quadro das Relações Internacionais, o texto lançado neste mês de Julho de 2011, já vem sendo muito comentado.

    Todavia, estas manifestações, mais uma vez parecem descoladas da própria contextualização do relatório, um estudo sustentado nos desenvolvimentos dos últimos dez anos, e não uma reação imediatista norte-americana à nova administração Dilma Rousseff que assumiu em Janeiro de 2011. Novamente, no debate brasileiro, o arco que engloba os dois últimos anos da administração Fernando Henrique Cardoso (1999/2002) e a totalidade do governo Luis Inácio Lula da Silva (2003/2010), como sustentáculos desta transformação, principalmente a fase Lula-Celso Amorim, está obscurecida.

    Igualmente, ignora-se, que este é um relatório específico, de um think tank relevante, mas, também específico. Ligado a uma parcela do establishment, o CFR é uma entidade altamente reconhecida dentro do debate político norte-americano, tradicional na realização da ponte entre setores acadêmicos, empresariais e governamentais de formulação de política externa e tomada de decisão, que, contudo, não representa consenso ou prevalece com tranqüilidade dentro da Casa Branca, do Departamento de Estado ou de Defesa. Assim, recomendações como a de que os EUA devem incluir o Brasil no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSONU) como membro permanente, representam visões deste grupo, e não necessariamente a totalidade das visões que competem politicamente nos EUA.

    Esta questão específica do assento no CSONU é inserida em uma proposta abrangente de fortalecimento e amadurecimento da relação, em termos discursivos e práticos, como a instalação de novas formas de contato entre as diplomacias, e uma percepção norte-americana mais ampla sobre o papel do Brasil, na região, no mundo e no sistema multilateral em geral e não só na ONU. Ou seja, apesar das boas relações que os EUA têm com o Brasil hoje, o texto considera que os norte-americanos precisam aprofundar ainda mais estes laços, baseado em uma visão histórica de prévias alianças, mas, principalmente, de necessidades futuras dos EUA, seja em termos de engajamento do poder brasileiro, como de sua contenção e dos demais emergentes.

    Trata-se de um relatório bastante completo, no qual o Brasil é examinado em sua dimensão nacional, suas ações globais e regionais, e o que isso significa para as relações bilaterais. Não cabe aqui adentrar nos pormenores do relatório uma vez que o mesmo é extenso, mas é interessante destacar, por capítulo o que os EUA identificaram como pertinente no que se refere ao país. No capítulo “A Economia Brasileira: Mecanismos e Obstáculos” menciona-se a necessidade de ajustes macroeconômicos (juros, crescimento e inflação), o impacto das ações dos EUA no país (muito brevemente), e a relação comercial com a China. Nesta parte, indica-se que seria interessante que Brasil-EUA tivessem posições conjuntas para reduzir o impacto chinês em seus mercados. O capítulo se encerra com uma discussão extensa sobre os potenciais domésticos e os inúmeros pontos de estrangulamento do Brasil: infraestrutura, educação, agricultura, mineração e metalurgia, crescimento da classe média e inovação.

    No segundo capítulo “A Agenda Energética Brasileira e as Mudanças Climáticas”, destaca-se o papel positivo do Brasil no uso de uma matriz variada de energia e a preocupação com o desenvolvimento sustentável. Espaço significativo é reservado à discussão das reservas do pré-sal brasileiro, assim como ao gás e ao etanol. Petróleo e etanol, porém, são o foco. Em termos de agenda climática, controle de emissões, desmatamento, Amazônia, biodiversidade são abordados, com os EUA mantendo suas posições tradicionais de ressaltar a relevância do engajamento do Brasil no tema, sua liderança no setor.

    Na sequência, o capítulo “Brasil como um Diplomata Regional e Global” dá grande destaque às alianças globais do Brasil como BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul), IBAS (Índia, Brasil, África do Sul), o papel na Missão de Estabilização do Haiti (MINUSTAH) e retoma o tema do assento permanente no CSONU. Temas sensíveis como Irã, Direitos Humanos, abstenções brasileiras em votações do CSONU não apoiando a posição dos EUA são discutidas, ressaltando a importância dos norte-americanos compreenderem “o porquê das posições diferentes do Brasil”, estendendo-se ao comércio multilateral e a estrutura econômico-financeira global. Segundo o relatório, os EUA não devem esperar consenso pleno do Brasil por conta de suas alianças com outras nações e sua visão de autonomia (e que isso faria parte de uma tentativa de provar independência e distanciamento dos EUA, mesmo quando o Brasil concordasse com este país). Como se percebe, uma visão norte-americana das motivações brasileiras.

    No que se refere à região sul-americana, considera-se que a liderança brasileira da integração é positiva para os EUA, devido ao papel mediador e estabilizador brasileiro, em termos políticos e financeiros. Aborda-se, igualmente, a política africana do Brasil, continente no qual os norte-americanos perderam espaço para o país, a China e a Índia nos últimos anos.

    O último capítulo é dedicado especificamente a “Brasil e Estados Unidos”, indicando a boa vontade mútua. Adentrando inicialmente os temas Irã e Segurança Nuclear, o capitulo segue para comércio e investimento, para voltar a temas de segurança como imigração e tráfico de drogas, saúde, biocombustíveis, mudança climática. A conclusão segue parâmetro similar, com foco em três pilares: interesses comuns, parceria madura e aproveitar o momento. Segundo o relatório, este é o tempo para avançar as relações bilaterais, alcançando benefícios mútuos.

    Finalmente, não se pode negar que o documento é, realmente, um marco para as relações bilaterais Brasil-EUA, independente das ressalvas aqui colocadas. Apesar do longo histórico de relacionamento, do auge dos estudos de brasilianistas nos anos 1960 e 1970, o intercâmbio sempre foi visto por um prisma regional. Tal prisma, estruturalmente, localizava a importância do Brasil para os EUA na América Latina. Em algumas circunstâncias históricas norte-americanas nem mesmo este viés prevalecia, com a predominância de uma visão generalista da política externa dos EUA sobre o país inserido em “pacotes prontos” para o hemisfério, vide as discussões da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) e propostas anteriores.

    Assim como a Estratégia de Segurança Nacional de maio de 2010, publicada pelo Presidente Obama, trata-se de um documento progressista e que revela as limitações dos EUA e a sua capacidade de renovação estratégica para lidar com parceiros na dinâmica do “engajar para conter” (i.e, de reinventar a hegemonia). Ao mesmo tempo, uma renovação que disputa espaço com o declínio e o tradicionalismo, o isolacionismo, o intervencionismo e o unipolarismo, gerando as reações e contrareações hegemônicas já abordadas em artigo para Carta Maior. Reações e contrareações que não se resumem a determinados grupos, mas possuem ressonância em Washington, assim como este próprio relatório também terá. Assim, no debate nacional não podemos nos esquecer que este é um texto norte-americano, produzido e direcionado, para o público norte-americano, e que terá o apoio de uma parte desta sociedade, como visto na p.3:

    As conclusões da Força Tarefa e suas recomendações são direcionadas não somente as formuladores de políticas que lidam com as Américas, mas também aqueles que nos EUA e em outras instâncias, são responsáveis por decisões em questões estratégicas globais, temas econômicos e mecanismos multilaterais nos quais a voz e a ação do Brasil são relevantes. As conclusões e recomendações deste relatório fornecem uma estrutura para políticas bipartidárias- globais, regionais e bilaterais- que levem em conta as oportunidades e desafios da ascensão brasileira, no momento em que os Estados Unidos e o Brasil enfrentam as grandes questões internacionais do século XXI.

    Portanto, são conclusões e recomendações para os EUA sobre o Brasil, mas que devemos obrigatoriamente compreender sob nosso ponto de vista, dentro de um projeto nacional de reposicionamento interno e global. Mais ainda, como um poder global hoje, demonstra-nos a necessidade de melhor estudar, e compreender, nossos parceiros mais próximos, sejam eles os EUA, a China, a Índia, a África do Sul, as nações sul-americanas, os continentes africano e asiático. Somente a partir deste olhar, poderemos elaborar nossas conclusões e recomendações sobre nossos pares, para nós mesmos.
     
    Professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)

    Em Ilhéus, radialista é agredido a paulada

     Charles Carmo, em O Recôncavo



    Fábio Roberto é radialista e trabalha na Rádio Bahiana, em Ilhéus (BA), aonde apresenta o programa Compromisso Verdade, em que costuma levar ao ar muitas denúncias.
    Nesta quinta-feira (14/07), Fábio Roberto foi vítima de uma agressão quando andava no Bairro da Conquista, também em Ilhéus.
    Ao começar a descer a escadaria que dá acesso à Avenida 7 de Setembro, Fábio foi violentamente atingindo com uma paulada que partiu de um homem simulando uma ligação no celular e que, após a sua passagem, o agrediu por trás, correndo em direção a um comparsa que, numa moto, dava cobertura à ação. Os agressores fugiram sem roubar nada.
    O Recôncavo entrou em contato com o radialista. Para o Fábio Roberto “este tipo de atentado não é comum em Ilhéus. Pelas características do atentado, a intenção não era roubar, afinal, estava com uma mochila nova, com equipamentos e nada foi roubado. Eu consegui descer a escadaria sangrando muito, entrar na farmácia e pedi socorro. Meu diretor veio em meu socorro e me levou para o hospital. Estou assustado e surpreso, se eu não tiver condições de trabalhar com segurança, terei que me afastar”, resumiu o comunicador, ainda assustado com a inesperada agressão e temendo outro ato de covardia.
    O Recôncavo vem denunciando a escalada de atos contra a liberdade de imprensa e comunicação na histórica e bela cidade de Ilhéus. Intimidações, tentativas de censura e agressões contra os profissionais da imprensa, que não eram comuns por aquelas bandas, vão se tornando, nos últimos tempos, uma realidade.
    Espera-se que a Polícia Civil e o Ministério Público se atentem para a infeliz novidade de agressões contra os profissionais de imprensa em Ilhéus, antes que uma tragédia maior ocorra.

    sexta-feira, 15 de julho de 2011

    Ex-guerrilheiro tupamaro é nomeado ministro da Defesa do Uruguai

    Da Redação do Sul21

    O presidente do Uruguai, José Mujica, nomeou o ex-senador Eleuterio Fernández Huidobro, ex-guerrilheiro do movimento Tupamaros, do qual ele mesmo participou, como novo ministro da Defesa. Mujica confirmou nesta quinta-feira (15) que o titular da pasta, Luis Rosadilla, vai se afastar do cargo por motivos de saúde e que Huidobro assumirá o ministério já na próxima semana.
    Mujica disse que não tinha “mais remédio que apelar a algum quadro da velha guarda, porque necessito confiança política e capacidade”. No entanto, Huidobro admitiu que ainda não estava informado mas estava disposto a aceitar o convite.
    Mujica afirmou que o afastamento do atual ministro é “uma grande perda” para o governo e que precisava de alguém experiente para substitui-lo. Huidobro, de 69 anos, é um dos “históricos” guerrilheiros do Movimento de Libertação Nacional – Tupamaros (MLN-T), sobre o qual escreveu diversos livros e participou de vários documentários nacionais e internacionais. Junto com Mujica, outro dos fundadores do grupo, o novo ministro passou 13 anos na prisão durante a ditadura no país.
    O futuro titular da Defesa é um dos maiores conhecedores de temas militares dentro da Frente Ampla, coalizão governista de esquerda. Em abril, por disciplina partidária, ele votou no Senado a favor de um projeto de lei que previa a anulação da Lei da Caducidade, que daria impunidade a militares que violaram os direitos humanos durante o regime militar. Como estava contra a posição da Frente Ampla, Huidobro acabou renunciando à cadeira que ocupava desde 2000. O projeto acabou não sendo aprovado no Congresso e a Lei da Caducidade continua em vigor.

    Com informações do Opera Mundi e El País