Fausto Brignol em seu blog
A vitória de Marina – pois foi uma grande vitória – deixou os dois que obtiveram mais votos no 1º turno – Dilma e Serra – como reféns das propostas de Marina e do Partido Verde, na esperança de herdarem os mais de 20 milhões de votos dados à senadora.
Fácil seria para Marina liberar os seus correligionários para votarem
em quem quiserem, de acordo com as suas consciências, mas isso tiraria
toda a força da vitória alcançada do que ela mesma diz que é uma nova
maneira de ver e de fazer política neste país. Se ela agir assim, as
razões da sua candidatura e da sua luta até agora se diluiriam
rapidamente e aqueles que nela votaram se sentiriam, novamente, órfãos
da pátria mãe que tem sido tão pouco gentil com os seus filhos
abandonados. Além disso, os que acreditaram em Marina e nela votaram,
estes sim se sentiriam reféns da velha política de cooptação das
coligações lideradas por PT e PSDB.
Em um Brasil que elegeu Tiririca, numa clara demonstração de deboche
ante as esfarrapadas instituições do sistema - que primam pela corrupção
- propostas como educação, desenvolvimento sustentável, construir sem
destruir, consumir sem ser consumido, cuidar bem da nossa água, das
florestas e das cidades, acabar com o desperdício na produção de
alimentos, de energia na construção civil, no uso dos recursos públicos
em todos os outros setores – tendo como alicerces a educação e a
inovação – despertaram as pessoas daquele marasmo que estas eleições
estavam provocando em grande parte da população.
Um marasmo devido à polarização do processo eleitoral entre dois grupos
partidários que nada apresentam de novo e que trazem em si o germe do
retrocesso político; com uma proposta de economia neoliberal, visando um
desenvolvimento desregrado que tem como único objetivo a acumulação dos
bens de capital, dos lucros gerados pelas riquezas do nosso país
destinados aos bancos e às grandes empresas, deixando sempre o povo de
lado. Povo que recebe as migalhas dos programas assistenciais e se
rejubila quando as recebe. Um povo que já está se acostumando a ser
idiotizado pelos meios de comunicação e a estender a mão para os
poderosos, como se isso fosse muito natural e que desconhece a sua força
que somente é lembrada em época de eleições.
Em um momento como este, de quase total abulia, de desmembramento das
forças sociais, apesar de algumas tentativas partidárias esparsas -
notadamente da esquerda socialista que ainda não encontrou o seu rumo,
dividida em vertentes que se negam a formar um caudal, ou buscar a sua
origem, a sua fonte primária – uma proposta mínima de participação
social concreta, visando objetivos claros, pontuais, como a preservação
da natureza, através de grupos sociais civis, tendo como base a educação
e como objetivo final a busca da construção de um país novo e à frente
uma pessoa corajosa e decidida, como Marina, despertou naqueles vinte
milhões de pessoas a possibilidade, ainda que remota, de um voto que
valesse a pena – uma espécie de resgate do voto do povo.
E ocorreu o inusitado. A candidata do governo e o candidato da oposição
foram para o 2º turno graças aos votos recebidos por Marina, e não por
seus próprios esforços. Principalmente Serra, que deve estar agradecendo
de mãos postas a ineficácia de Dilma e do PT no último mês de campanha e
ao crescimento avassalador de Marina.
Dilma tende a cair mais, mas não o suficiente para perder, e Serra
deverá conquistar mais um ou dois pontos percentuais – o que não será
suficiente para ganhar. É aí que entram os votos de Marina. Vinte
milhões de votos. Um quinto do total dos votos válidos.
Fazer composição seria fácil se Marina apenas buscasse o poder pelo
poder. Bastaria a oferta de ministérios, secretarias, algum poder dentro
do Poder e estaria tudo certo. Aparentemente.
Mas não acredito que seja essa a idéia de Marina – voltar a participar
do Poder entrando pela porta dos fundos e aceitando a sua fatia em troca
dos votos recebidos no 1º turno. Mesmo porque foram votos espontâneos,
que despertaram parte do povo ainda consciente de sua força para a
possibilidade de um Brasil novo, longe das políticas sujas a que estamos
acostumados. Foram votos de esperança, de um novo tipo de esperança, e
que não podem, simplesmente, serem jogados no lixo do esquecimento.
O Partido Verde, enquanto partido político, não tem a força que Marina
possui: de congregar as pessoas. É um partido instável, que carece de
ideologia e que aproveita a onda verde do momento apocalíptico que passa
a mãe terra. Por si mesmo, o PV não tem como barganhar nem um voto. Mas
Marina tem essa força. Aqueles que votaram em Marina acreditarão nela
no instante em que ela apontar um dos dois candidatos - Dilma ou Serra –
como sendo aquele que cumprirá, pelo menos em parte, os objetivos a que
ela se propôs, caso fosse eleita.
E para que isso aconteça, para que os votos de Marina revertam para o
PSDB ou para o PT será necessário que um dos dois partidos assuma um
compromisso público com o desenvolvimento sustentável, capaz de suprir
as necessidades das futuras gerações, sem esgotar agora os recursos para
o futuro, promovendo a revisão de políticas públicas que são predadoras
em relação ao homem e à natureza.
Não acredito que o PT faça isso, porque está demasiadamente atrelado ao
capital internacional e ao grande latifúndio nacional, cedendo cada vez
mais terras para desmatamento, promovendo a destruição da Mata
Atlântica e, o que é mais visível e criminoso, prestes a construir a
Usina hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu, no estado do Pará – o que
irá desalojar milhares de pessoas e causar imenso impacto ambiental.
Além disso, o PT acredita que com apenas mais três ou quatro pontos
percentuais Dilma vencerá a eleição. Dilma, que tem um profundo
desagrado por Marina, que a colocou em xeque.
Resta o PSDB. Poderia o PSDB de Serra dar alguns passos atrás na sua
política conservadora e centrista, que pouco se diferencia da política
do PT? Poderia Serra prestar um compromisso inviolável de promover o
desenvolvimento sustentável, através de políticas públicas ligadas ao
meio ambiente e à defesa da natureza? Poderia o PSDB, e Serra,
comprometer-se a combater seriamente o desmatamento, a diminuir as áreas
de cultivo de transgênicos, a impulsionar uma política nacional de
defesa do meio ambiente e, o que é mais importante neste momento, evitar
a construção de Belo Monte?
Até que ponto os grandes partidos brasileiros, apoiados em grandes
coligações e interesses econômicos, são confiáveis em suas promessas?