Por Augusto Buonicore no sitio GRABOIS
Se
perguntássemos para qualquer pessoa comum o que é história,
elarapidamente nos diria: É algo que trata de fatos e personagens que
existiram num passado mais ou menos distante. Estes três elementos
(fatos, personagens e passado), sem dúvida, entrariam em duas de cada
três definições do que seria História. E, ao referir-se ao passado,
pensavam-na como uma coisa morta, que nada poderia nos dizer e, muito
menos, nos ensinar sobre o presente.
Não é sem razão que no interior das salas de
aula a história muitas vezes foi tida como uma disciplina chata. Isto se
deu especialmente devido a pouca relação estabelecida entre o que era
ministrado e os problemas concretos vividos pelos alunos. Não existia
qualquer convicção de que o aprendizado da história pudesse ajudá-los
desvendar e, principalmente, transformar o mundo em que viviam.
O problema é que o passado do historiador não deveria ser – e não é -
algo morto, como o fóssil de um dinossauro encravado numa rocha ou
exposto num museu. Os fatos, como uma espécie de matéria-prima da
história, não são coisas mortas que apenas devem ser coletados e
colocados numa seqüência rigorosamente cronológica.
Repito, não é possível estudar uma comunidade humana e seu
desenvolvimento histórico como se fosse uma colméia ou um conglomerado
de rochas. Estranhamente, este passado continua vivendo e produzindo
seus efeitos sobre nós e é, justamente, por isso que deve ser estudado e
melhor compreendido.
No caso das ciências humanas – ao contrário das ciências naturais e
exatas – não há uma muralha da China separando o objeto a ser estudado
(as sociedades) e o sujeito que o estuda (o historiador, o sociólogo
etc.), mesmo tratando-se do estudo de agrupamentos que viveram há
milhares de anos.
Para os antigos historiadores, de tendência positivista, os fatos eram como coisas brutas. Eles estavam permanentemente atrás dos fatos puros, duros e irretorquíveis.
Para os antigos historiadores, de tendência positivista, os fatos eram como coisas brutas. Eles estavam permanentemente atrás dos fatos puros, duros e irretorquíveis.
Contra os fatos não há argumentos, gostavam de dizer. Contudo, os fatos
não falam por si mesmos, como afirma o senso comum positivista. Segundo o
historiador inglês Edward Carr, “os fatos falam apenas quando o
historiador os aborda: é ele quem decide quais os fatos que vem à cena e
em que ordem e em que contexto”. E conclui: “A convicção num núcleo
sólido de fatos históricos que existem objetiva e independentemente da
interpretação do historiador é uma falácia absurda, mas que é muito
difícil de ser erradicada”.
No entanto, o historiador que se propõe fazer perguntas ao passado não é
um ser desencarnado, separado do mundo. Ele é membro de uma determinada
sociedade, de uma determinada época, de uma determinada classe social.
Ele se encaixa no interior de determinadas ideologias e perspectivas
teórico-metodológicas, que, na maioria das vezes, têm um forte sentido
classista. Portanto, o historiador não é neutro diante dos conflitos e
dos problemas que aparecem à sua frente durante a pesquisa que realiza.
É sua situação no mundo que determina as perguntas e as escolhas
cotidianas que faz. Isto, é claro, vai direcionar as respostas que ele
procura encontrar. Um historiador liberal-burguês, por exemplo, jamais
colocaria a questão: De onde vem a exploração do trabalho? Para ele, o
conceito exploração nada teria de científico, não passaria de uma
excrescência ideológica - invenção de alguns socialistas inconformados.
A história não é a simples catalogação neutra de fatos ocorridos no
passado. A missão dos historiadores é relacioná-los numa totalidade
concreta (processo histórico) e, principalmente, interpretá-los. E a
interpretação sempre tem por base determinada teoria ou ideologia. A
partir dos mesmos fatos podemos construir várias e contraditórias
interpretações.
O historiador marxista tem como objetivo fornecer uma explicação
coerente das origens e desenvolvimento das sociedades humanas em suas
diversas dimensões. Compreender as inúmeras transformações por que elas
passaram. As mudanças sociais devem ser, em última instância, os
verdadeiros objetos da história.
As sociedades humanas – como tudo no universo - estão num constante movimento. Elas nascem, desenvolvem-se - conhecem várias fases – e depois fenecessem. Estas transformações podem se dar lentamente – quase imperceptíveis - ou de maneira abrupta, como ocorre nas guerras e nas explosões revolucionárias.
As sociedades humanas – como tudo no universo - estão num constante movimento. Elas nascem, desenvolvem-se - conhecem várias fases – e depois fenecessem. Estas transformações podem se dar lentamente – quase imperceptíveis - ou de maneira abrupta, como ocorre nas guerras e nas explosões revolucionárias.
Mas, qual é o motor dessas permanentes mudanças? São as contradições
existentes no seio de cada sociedade, que se traduzem naquilo que os
marxistas chamaram de lutas de classes.
Por que os trabalhadores devem conhecer a história?
Em todas as comunidades humanas existe um combate surdo pela memória.
Este combate faz parte de uma luta ainda maior que é a travada pela
conquista da hegemonia. Em outras palavras, a história é um espaço no
qual grupos sociais se enfrentam para decidir qual deles dirigirá os
rumos da nação e mesmo do planeta.
Por isso, as classes dominantes sempre procuraram reconstruir o passado
para, no presente, justificar sua própria dominação. Os líderes das
nações imperialistas também buscaram se utilizar da chamada história
universal para justificar a dominação e a exploração que exerciam sobre
outros povos, considerados inferiores.
Vejamos alguns exemplos extremos destas tentativas: os faraós do Egito foram transformados em filhos diletos do Deus Rá, alguns governantes gregos e romanos também foram transformados em descendentes de deuses e heróis olímpicos. Para justificar a escravidão africana, os negros foram considerados descendentes de Cam, o filho amaldiçoado de Noé. Deveriam pagar, através da servidão, pelos pecados de seus antepassados. Estes são apenas exemplos mais descarados da reconstrução mítica da história feita pelos membros das classes proprietárias no poder e seus escribas. Existem outros exemplos mais sutis, menos perceptíveis, mas, nem por isso, menos perversos.
Vejamos alguns exemplos extremos destas tentativas: os faraós do Egito foram transformados em filhos diletos do Deus Rá, alguns governantes gregos e romanos também foram transformados em descendentes de deuses e heróis olímpicos. Para justificar a escravidão africana, os negros foram considerados descendentes de Cam, o filho amaldiçoado de Noé. Deveriam pagar, através da servidão, pelos pecados de seus antepassados. Estes são apenas exemplos mais descarados da reconstrução mítica da história feita pelos membros das classes proprietárias no poder e seus escribas. Existem outros exemplos mais sutis, menos perceptíveis, mas, nem por isso, menos perversos.
Os deserdados da terra, os povos explorados, escravizados - ou mesmo
eliminados - deixaram poucos rastros na história. Os escravos do Egito,
Roma e Grécia não nos deixaram nenhuma obra escrita, apresentando seu
ponto de vista sobre a situação na qual viviam. Quem escreveu a história
dessas sociedades antigas foram homens livres e, na sua quase
totalidade, proprietários de terras e de escravos. Alguns imperadores,
também, aventuraram-se no oficio de escrever história. É claro que para
enaltecer os seus próprios feitos e dos seus antepassados.
No Brasil, as coisas não podiam ser diferentes. Aqui, também, não foram os índios e negros escravizados que escreveram a história do país. Afinal, a quase totalidade deles não sabia ler e escrever – era lhes proibido freqüentar escolas. O que sabemos deles, num primeiro momento, nos foram contados por viajantes estrangeiros e jesuítas. Relatos que muitas vezes descreviam o martírio desses povos, mas, em geral, vinham carregados de inúmeros preconceitos e graves incompreensões.
Somente na segunda metade do século XIX, ao começar ser questionada a escravidão, surgiu pela pena dos abolicionistas uma outra história, mais crítica ao passado escravista. Mesmo assim, apesar de sua boa vontade, os abolicionistas não poderiam expressar adequadamente as opiniões dos explorados. E aqui não vai nenhum demérito a eles. Pois, foi através dos óculos desses escritores que começamos conhecer um pouco mais da evolução e vicissitudes de nossa sociedade.
No Brasil, as coisas não podiam ser diferentes. Aqui, também, não foram os índios e negros escravizados que escreveram a história do país. Afinal, a quase totalidade deles não sabia ler e escrever – era lhes proibido freqüentar escolas. O que sabemos deles, num primeiro momento, nos foram contados por viajantes estrangeiros e jesuítas. Relatos que muitas vezes descreviam o martírio desses povos, mas, em geral, vinham carregados de inúmeros preconceitos e graves incompreensões.
Somente na segunda metade do século XIX, ao começar ser questionada a escravidão, surgiu pela pena dos abolicionistas uma outra história, mais crítica ao passado escravista. Mesmo assim, apesar de sua boa vontade, os abolicionistas não poderiam expressar adequadamente as opiniões dos explorados. E aqui não vai nenhum demérito a eles. Pois, foi através dos óculos desses escritores que começamos conhecer um pouco mais da evolução e vicissitudes de nossa sociedade.
Não quero dizer com isto que se os índios e os negros escravizados
soubessem ler e escrever produziriam uma interpretação exata da
sociedade na qual viviam. Eles ainda não tinham o instrumental teórico
necessários para isso. Mas, com certeza, seus depoimentos nos permitiram
ver a realidade por outros ângulos e acabar de montar o quebra-cabeça
do que foi a nossa sociedade colonial e escravista. O olhar da senzala
jamais será o mesmo da Casa Grande, mesmo que por ela pudesse ser
fortemente influenciado. Este, inclusive, o erro daqueles que pretendem
generalizar as conclusões de Gilberto Freyre na sua obra magna.
Podemos dizer que somente com o advento do capitalismo e a formação de
uma classe operária moderna, que sabia ler e escrever – podendo, assim,
produzir seus próprios intelectuais orgânicos -, é que foi possível
construir uma história mais coerente das classes exploradas. Apesar
disso, por um bom tempo, esta nova história (socialista) tendeu a ser
marginal, fora dos grandes circuitos, como as academias e o mercado
editorial. Afinal, as idéias dominantes são sempre – ou quase sempre –
as idéias das classes dominantes.
Somente tendo a consciência que a história é um espaço de luta de classes, os trabalhadores poderão se dedicar com mais afinco ao seu estudo e elaboração. O domínio da história e da dinâmica das sociedades em que vivem – como das experiências de resistência desenvolvidas por seus antepassados - os ajudará travar, de maneira mais conseqüente, as lutas do presente, avançando rumo ao socialismo.
Somente tendo a consciência que a história é um espaço de luta de classes, os trabalhadores poderão se dedicar com mais afinco ao seu estudo e elaboração. O domínio da história e da dinâmica das sociedades em que vivem – como das experiências de resistência desenvolvidas por seus antepassados - os ajudará travar, de maneira mais conseqüente, as lutas do presente, avançando rumo ao socialismo.
Saber que as sociedades se transformam – que nada é imutável -, e que o
principal instrumento dessas mudanças é a ação consciente dos homens,
tem um efeito decisivo no processo de constituição da classe dos
trabalhadores, como agente ativo de sua própria história.
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