Igor Natusch no Sul21
O requerimento para instalação da CPI da Saúde em Porto Alegre é mais
um episódio a marcar o clima tenso que tomou conta da relação de
Juliana Brizola com o PDT, o partido criado pelo seu avô, Leonel
Brizola. Protocolado na tarde desta segunda-feira (20), o pedido de
investigação foi proposto pela oposição ao governo da capital, comandado
por José Fortunati (PDT). Até a manhã de hoje, faltava uma única
assinatura para viabilizar a CPI – ela acabou sendo dada por Juliana
Brizola, contra os interesses do próprio partido. Curiosamente, a 12ª
assinatura, a de Juliana, que permitiu a tramitação na Câmara Municipal
do pedido da CPI da Saúde, foi justamente a que faltou para que a
vereadora conseguisse a instauração de outra Comissão Parlamentar de
Inquérito: a da Secretaria Municipal da Juventude. A CPI do ProJovem,
que tramita na Casa, foi encaminhada pelo vereador tucano Luiz Braz, da
base aliada de Fortunati.
Mais do que uma represália contra o que Juliana considera uma
“perseguição” do seu partido, a atitude da vereadora, que ocupará uma
cadeira na Assembleia gaúcha a partir de 2011, é um sinal de que a
detentora do sobrenome que personifica o trabalhismo está disposta a
bater de frente com o partido de seu avô. Há a possibilidade crescente
de Juliana Brizola partir de mala e cuia para outra sigla – no caso, o
PSol.
A proposta de CPI para apurar denúncias sobre a Secretaria Municipal
de Saúde existe desde janeiro de 2010. Em abril, já haviam sido
coletadas 11 das doze assinaturas necessárias para o andamento da
investigação. A última assinatura só surgiria hoje, com a concordância
de Juliana em opor-se ao governo de seu partido. “Ela era favorável à
CPI (da Saúde) desde o início”, garante o vereador de Porto Alegre,
Pedro Ruas (PSol), que deu início ao processo. Segundo ele, a pressão
partidária impedia que Juliana assinasse o requerimento. Barreira que
teria deixado de existir depois da polêmica envolvendo a investigação da
Secretaria de Juventude. “Com os últimos acontecimentos, a vereadora
(Juliana Brizola) não se sente mais presa às imposições de seu partido, o
que a deixou muito mais à vontade para assinar (a CPI)”, garante Ruas.
Agora, a CPI da Saúde fica no aguardo de parecer da presidência da
Câmara.
Tentando apagar o incêndio, lideranças trabalhistas acenam com uma
solução conciliadora. Juliana Brizola poderia, de acordo com a proposta
da bancada do PDT, assumir a Comissão de Educação na Assembleia
Legislativa a partir de 2011. Seria um modo de diminuir a insatisfação
da deputada eleita, que não apenas ostenta um sobrenome muito importante
para a sigla, como teve também a melhor votação da bancada trabalhista
nas eleições de outubro. Uma reunião da bancada pedetista está marcada
para terça-feira (21), na qual Juliana Brizola deve estar presente.
Entre outros assuntos, o encontro deve consolidar a oferta da Comissão
de Educação, como meio de acabar com as rusgas entre Juliana e a sigla.
“O lugar dela é no PDT”, diz o deputado Adroaldo Loureiro, que será
colega de Assembleia de Juliana Brizola a partir de 2011. Frisando que a
futura deputada merece ser “bem tratada” pelo partido, Loureiro diz
crer que a tendência, daqui para frente, é que as coisas se acalmem.
“Foi um ano muito complicado, cheio de conflitos dentro do partido, e
isso acabou tendo influência. Além disso, ela será deputada, estará em
outro ambiente a partir do ano que vem. Acredito que teremos um clima
mais favorável ao entendimento daqui para frente”, assegura.
Briga antiga
A insatisfação de Juliana é assunto que se arrasta há anos nos
corredores do PDT. Os choques entre a atual vereadora e a direção
estadual da sigla foram tantos que motivaram até uma denúncia por
assédio sexual contra o então presidente do partido no RS, Pompeo de
Mattos, em 2004. Nas articulações para definir o apoio dos trabalhistas
ao governo de Tarso Genro (PT), Juliana Brizola foi uma das vozes mais
fortes contra a participação, mas acabou sendo voto vencido. Nos últimos
dias, a situação ganhou tamanha dimensão que até o presidente nacional
do PDT, Carlos Lupi, aproveitou viagem ao RS para tentar acalmar os
ânimos.
As rusgas entre Juliana e o PDT tiveram uma gota d’água na recente
proposta de uma CPI para investigar a Secretaria Municipal da Juventude,
da qual foi titular. A pasta, até a explosão da polêmica, era comandada
pelo marido de Juliana, Alexandre de Souza Silveira, conhecido como
Alexandre Rambo. Rebatendo denúncias contra o marido, as quais ela
atribui a uma armação comandada pelo desafeto Mauro Zacher (PDT), que
também esteve à frente da Secretarua da Juventude, Juliana propôs a
abertura de uma comissão processante para investigar as últimas
administrações da pasta. Porém, seu pedido foi negado pela presidência
da Casa, baseada num parecer da procuradoria-geral da Câmara.
Juntamente com a vereadora Fernanda Melchionna (PSol), Juliana
entrou com um recurso, encaminhado à Comissão de Constituição e Justiça,
onde teve parecer favorável do presidente da CCJ e relator do recurso,
vereador Pedro Ruas. O vereador Luiz Braz (PSDB), no entanto, pediu
vistas e a decisão foi adiada por um dia. Tempo suficiente para Braz
assinar um novo pedido de CPI para investigar a secretaria.
Ao perceber a manobra, Juliana Brizola tentou ela mesma substituir o
pedido de abertura de uma comissão processante pelo de uma CPI. No
entanto, não obteve as 12 assinaturas necessárias, enquanto a Comissão
proposta por Luís Braz, com 14 assinaturas, foi aceita pelo presidente
da Câmara de Porto Alegre, Nelcir Tessaro (PTB). Na prática, o controle
da investigação saiu das mãos da oposição – e, em última análise, de
Juliana Brizola – e passou para o controle de setores muito mais
simpáticos a José Fortunati e ao governo municipal. “Fui desrespeitada
na minha pretensão de ingressar com a CPI e, agora, o pedido de outro
vereador é aceito em lugar do meu. A mesa não pode aceitar esse pedido. É
uma questão de autoria”, disse Juliana, em entrevista coletiva logo
após a decisão.
Conversas com o PSol
A aproximação de Juliana Brizola com o PSol vem sendo costurada há
alguns meses. Nas sessões da Câmara municipal, era comum ver a futura
deputada ao lado de Pedro Ruas e Fernanda Melchionna, representantes
psolistas no legislativo de Porto Alegre. A migração, embora de forte
repercussão, não seria inédita, já que o próprio Pedro Ruas deixou os
quadros trabalhistas em 2004, depois de 25 anos na sigla, para entrar no
PSol.
As conversas entre Juliana e o PSol tomaram tal dimensão que a
vereadora, acompanhada de Pedro Ruas e do presidente gaúcho do PSol,
Roberto Robaina, dirigiu-se até o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) na
quarta-feira passada (15) para um encontro com o presidente do Tribunal,
Luiz Felipe Silveira Difini. O tema da conversa: eventuais implicações
de uma mudança de partido sobre o recém conquistado mandato na
Assembleia do RS. A ideia, no caso, seria de Juliana Brizola tomar posse
ainda como pedetista. Com o mandato já em andamento, a deputada
alegaria perseguição ou rompimento do PDT com o programa partidário para
migrar de sigla – o que, caso aceito pelo Tribunal Superior Eleitoral
(TSE), garantiria a entrada no PSol sem que Juliana precisasse abrir mão
do mandato.
Segundo o vereador Pedro Ruas (PSol), a discussão ainda está em um
estágio “muito preliminar”. Mas confirma a aproximação entre Juliana
Brizola e o partido. “Sempre houve um grande respeito nosso pela
trajetória dela, além de estarmos sempre muito próximos na atuação de
plenário. Para nós (PSol), seria uma honra muito grande recebê-la, caso
as coisas evoluam. Mas ainda não há nada concreto”, ressalva.
Sem entrar no mérito de uma possível entrada de Juliana Brizola no
PSol, a vereadora Fernanda Melchionna (PSol) lembra que os recentes
acontecimentos deram “maior independência” às decisões da futura
deputada estadual. “A vereadora Brizola não encontra mais espaço dentro
do partido ao qual pertence. O PDT distanciou-se das bandeiras que ela
defende, e ela acabou ficando isolada. Isso fez com que ela se
aproximasse de nós (PSol) na Câmara, já que abraçamos várias lutas em
comum”, explica Melchionna.
Adroaldo Loureiro, porém, descarta a hipótese com veemência. “Isso
não passa de boato, não tem a menor sustentação”, diz. Para ele, não
existiria nem sequer uma “lógica política” para sustentar essa
possibilidade. “Ela carrega consigo o legado do doutor Leonel Brizola,
fundador e grande líder do PDT. Não existe motivos para ela sair, aqui é
a casa dela. Nós (deputados estaduais) vamos receber ela de braços
abertos e com muita alegria”.
O Sul21 tentou conversar com Juliana Brizola durante
toda a tarde desta segunda-feira (20), mas a vereadora não retornou as
ligações. A assessoria de Juliana informou que a futura deputada havia
decidido não falar com a imprensa.
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