Passamos horas na sala de embarque do aeroporto esperando Godot. E Godot parece nunca chegar.
Nessas horas, tenho a certeza que a Infraero resolve economizar até no ar condicionado.
A espera, o calor… O tumulto, o calor… A desinformação, o calor… A
fome, o calor… Lembro quando, anos atrás, durante o ápice do caos aéreo,
rolaram tapas entre passageiros e funcionários, entre passageiros e
passageiros. Um funcionário-descontrolado chegou a tomar o celular de
uma repórter-passageira que registrava um coronel-suado dando
explicações. Sobre o que? Na época, não deu para ouvir. Muita gente…
Cansei de contar o número de vezes, nos últimos anos, em que me
lasquei por conta dos grandes ou pequenos momentos de caos. Muita gente
ao meu lado jogou videogame, Sudoku, navegou na internet, cochilou,
namorou, comeu, reclamou, esperando Godot. E Godot nem tchum.
Não culpo os aeroviários e controladores de vôo. Nos últimos anos,
constatamos o quanto a situação deles é desesperadora, muitos com
jornada de trabalho que extrapola o limite da regulamentação da
profissão, sob imposição de estresse, sofrendo pressão do patrão de uma
lado e da sociedade de outro. O setor cresce economicamente, nada mais
justo que a remuneração também.
(Como não estamos mais nos primórdios da revolução industrial, não
faz mais sentido jogar tamancos – do francês, sabots – nas engrenagens
para paralisar a produção e se fazer ouvir. Há formas mais modernas, mas
com o mesmo efeito. A idéia da paralisação e da grave também é essa.)
Começam a chamar uma possível paralisação de trabalhadores de
terrorismo. Terrorismo não é parar de trabalhar. Terrorismo é fazer a
população ficar contra um grupo de trabalhadores, enquanto se encobre as
incompetências do setor privado, que cresce e não quer gastar para se
adaptar a essa nova realidade, e do poder público, que acumulada inação
na área por vários presidentes da República.
Durante anos, a “modernização” do sistema aéreo esbanjou dinheiro em
piso de granito de aeroportos. À medida em que o capital fixo crescia (o
visível, porque radar para eliminar “ponto cego” nem pensar), o capital
variável (salários) continuava insuficiente para o nível de exigência
das profissões.
Apóio os aeroviários e os controladores de vôo. Apóio os cobradores e
motoristas de ônibus. Apóio os bancários e metalúrgicos. Apóio os
garis. Apóio os residentes médicos. Apóio o santo direito de se
conscientizarem, reconhecerem-se nos problemas, dizer não à exploração e
entrar em greve até que a sociedade pressione e os patrões escutem.
Mesmo que isso torne minha vida um absurdo.
Mesmo que Godot nunca chegue.
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