O governo espanhol quer levar a julgamento por crimes de guerra e contra a humanidade as seguintes personalidades israelenses.
Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
sexta-feira, 21 de novembro de 2008
Israelenses procurados por crimes de guerra
O governo espanhol quer levar a julgamento por crimes de guerra e contra a humanidade as seguintes personalidades israelenses.
MUSICA CUBANA
01. Elena La Cumbanchera
02. Que Importan Las Diferencias
03. Criolla Carabali
04. Yo Bailo Con La Fea
05. Trompeta Querida
06. Chango Ta Veni
07. Vuelve Amalia
08. No Puedo Conformarme
09. Aunque Mami No Quiera
10. Que Cante
11. Coco Mai Mai
12. A Maria le Gusta
13. Malanga Murio
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quinta-feira, 20 de novembro de 2008
DO BLOG DO AZENHA...
CONSCIÊNCIA NEGRA: O GOVERNO LULA E O ESTATUTO DA IGUALDADE
Superação do racismo e da xenofobia exige faxina ética
"Consciência Negra é expressão cara à luta anti-racista mundial, mas é quase indefinível, pelo muito que significa".
O 20 de novembro, Dia da Nacional da Consciência Negra, data da imortalidade de Zumbi dos Palmares (1655-1695), nos alerta que superar o racismo é parte indissociável da luta pelos direitos humanos, embora o campo dos direitos humanos resista a incorporar tal compreensão.
Consciência Negra é expressão cara à luta anti-racista mundial, mas é quase indefinível, pelo muito que significa. Todavia, a partir dela é absolutamente pertinente re-dizer que a peleja contra o padrão cultural preconceituoso, discriminador, inferiorizante e escrito na pedra, como se fosse uma Tábua da Lei, e o empenho para enfrentar a agenda explícita e a oculta do racismo é o caminho para um novo padrão cultural no qual o racismo, a xenofobia e intolerâncias correlatas sejam apenas lembranças de um passado insano, pois combater o racismo exige disposição para uma faxina ética na história da humanidade.
Num giro no que já escrevinhei sobre racismo, xenofobia e demais formas de intolerâncias, encontrei páginas e páginas! Revendo-as, ainda que só de olhadela, consumi várias horas em quase dois dias. Senti um misto de sensação do dever cumprido e um vazio enorme, ao constatar que, como eu, milhares de pessoas têm escrito denunciando as mazelas decorrentes do racismo.
Tudo parece insuficiente diante do monumento de pedra que o racismo erigiu. É quase nada diante da cultura racista, tão bem narrada por Lima Barreto (1881-1922), em Clara dos Anjos (1948, portanto obra póstuma), que ao ser abandonada por Cassi Jones – branco, malandro de marca maior e sedutor de jovens ingênuas, disse: " – Mamãe! Mamãe! Nós não somos nada nesta vida!"
Lima Barreto ao colocar na boca de Clara dos Anjos a frase: "Nós não somos nada nesta vida", foi magistral. Sabia o que dizia e porque deveria ser dito daquele modo. É que desde sempre a ideologia racista opera para nos tornar aquilo que precisa que sejamos: NADA!
E assim rouba a nossa voz e muitas de nossas mais brilhantes cabeças, tornando-as "correias de transmissão" de seus intentos. Dois casos contemporâneos são exemplares: as cotas étnicas para acesso à universidade e a tramitação ad eternum do Estatuto da Igualdade Racial no Congresso.
Como acreditar na boa fé se o governo, que diz apoiar o Estatuto, se nega a conferir lastro financeiro específico para a implementação de políticas anti-racistas?
Um jornal mineiro no dia seguinte à eleição de Obama, em editorial, deu nó em pingo d'água. Na maior candura afirmou que a eleição do 1º. negro à presidência dos EUA era um balde de água fria nas "cotas racistas": ele não foi "cotista" e alcançou o posto político mais importante do mundo, logo ele era a vitória do mérito! Não vou desperdiçar pérolas do meu latim com analfabeto político racista. Registro meu repúdio.
O Estatuto da Igualdade Racial, num governo declaradamente anti-racista, empacou no Congresso por obra e graça do governo que não quer amassar barro para aprová-lo, pois tem contra ele uma infinidade de "poréns". Um deles é como bancar propósitos de democratização do Estado: ações afirmativas e ações reparatórias. A recusa de referendar o Fundo Nacional de Promoção da Igualdade Racial, proposto na versão original do Estatuto, exterioriza a agenda oculta do racismo. Repito: "como acreditar na boa fé se o governo, que diz apoiar o Estatuto, se nega a conferir lastro financeiro específico para a implementação de políticas anti-racistas? Penso que a recusa é uma explicitação de que os recursos públicos são considerados como algo privado, que o governante do momento pode dispor ao seu bel prazer, inclusive para manter o status quo racista".
FÁTIMA OLIVEIRA, Médica
fatimaoliveira@ig.com.br
quarta-feira, 19 de novembro de 2008
Nei Alberto Pies
O que é um jardineiro? Uma pessoa cujo pensamento está cheio de jardins. O que faz um jardim são os pensamentos do jardineiro. O que faz um povo são os pensamentos daqueles que o compõem. (Rubem Alves)
Era uma tarde de muito calor. Milhares de professores, embalados por sua cidadania, caminhavam pelas ruas de nossa capital Porto Alegre. Um suave aceno embalava as suas utopias. Uma senhora, de um edifício bem alto, na Borges de Medeiros, ninava as suas esperanças, embalando um lenço verde. É, o lenço era verde e verde é de esperança. E aquela senhora reconheceu que aquela multidão era movida por uma causa: a educação pública e de qualidade para todos.
Não cometemos crime ao lutar por nossos direitos, como muitos desejam supor. Sem medos, caminhamos pacificamente, segurando bem firme as nossas armas: nossa voz e nossas bandeiras. Aprendemos, faz bom tempo, que quem luta, também educa. E que se "educar é nossa vida, lutar é nossa atitude".
O sol escaldante e reluzente da capital nos fez lembrar do educador Rubem Alves, que certo dia resolveu perguntar-se e responder-se: "o que é que se encontra no início? O jardim ou o jardineiro? É o jardineiro. Havendo um jardineiro, mais cedo ou mais tarde um jardim aparecerá. Mas, havendo um jardim sem jardineiro, mais cedo ou mais tarde ele desaparecerá. O que é um jardineiro? Uma pessoa cujo pensamento está cheio de jardins".
Se pudéssemos conversar com a senhora do lenço verde, da Borges de Medeiros, e com todos os que nos acenam (dos mais diferentes jeitos), diríamos a estes que os professores e professoras semeiam, todos os dias, um jardim de esperanças em suas salas de aula. Que todos os dias, enfrentam o seu ofício não só pelo salário, mas como uma missão de contribuir para com a humanidade, através da educação. Que todos os dias correm riscos de vida, pela vida de outras pessoas, por causa da violência que já chegou às nossas escolas. Que seus dias tem sido castigados, semelhante ao castigo que o sol impõe às plantas do jardim, no rigor dos nossos verões.
Nós somos jardineiros e fazemos a luta a partir de nossa dignidade. Somos referência para muitos jovens, porque ainda não deixamos de semear em suas vidas (e em seus corações) a idéia de que a vida é um jardim, que precisa ser cultivado, regado e cuidado. As flores precisam de carinho. Os seres humanos, de reconhecimento. Os vegetais precisam de sol, os alunos precisam de horizontes. As plantas precisam de terra, adubo e água. Os seres humanos precisam de estímulos, zelo e cuidados.
Logo a gente que cuida de jardins, não é bem cuidado. O nosso clamor é por reconhecimento. Por sabermos da importância dos jardins, exigimos que os governos façam sua parte para engrandecer e embelezar o jardim das nossas vidas, e o jardim das vidas daqueles e daquelas que cuidamos com o maior carinho. Lidamos com vidas e temos dignidade. Sabemos, por consequência, quanto nos custa ensinar, mas não reclamamos deste custo. Como amamos a nossa profissão, resolvemos pedir que nos reconheçam como gente, e como profissionais da educação.
Sabemos que o sol tende a nos castigar com o avanço do verão. Mas também sabemos que este mesmo sol brilha para todos e é fonte inesgotável para gerar vida, capaz de conduzir novos horizontes. No horizonte do sol, arriscamos paralisar as aulas, pois aprendemos que aqueles que nada arriscam nada podem conquistar. E para a senhora do lenço verde, pedimos que não canse de nos acenar, pois a vida e a luta é esperança. Seu gesto, com certeza, estimulará muitos outros a nos acenar. Obrigado!
Para uma retomada da razão no mundo árabe-islâmico
Na apresentação do livro “Introdução à crítica da razão árabe”, de Mohammed Abed al-Jabri [1], Ahmed Mahfoud e Marc Geoffroy, analisam a estagnação do pensamento árabe-islâmico, por volta do século15. Lançam perguntas sobre o porquê desse processo.
“Do ponto de vista da história geral da cultura humana, o momento em que a cultura árabe-islâmica retoma a chama da Civilização é o do extremo fim da época tardo-antiga, período de decadência filosófica e científica, de “demissão” da razão grega. Na outra extremidade, a cultura árabe-islâmica cede, a partir do século 15, o lugar ao Ocidente cristão, que conhece a partir daí um desenvolvimento intelectual nunca visto e ininterrupto até hoje. Neste sentido, o período de atividade máxima da cultura árabe-islâmica pode, pois, ser considerado como o extremo início de um desenvolvimento intelectual que deveria prosseguir plenamente em outro lugar. Assim, é legítimo, para M. A. al-Jabri, perguntar-se por que a cultura árabe-islâmica jamais superou a fase de pródromo e, no entanto, buscar a resposta para esta pergunta numa comparação entre a experiência árabe-islâmica e as experiências grega antiga e européia.” [2]
“Por que o pensamento árabe-islâmico, com exceção da experiência andalusi que, aliás, não teve nenhuma repercussão notável no mundo muçulmano, jamais conheceu uma auto-superação e se fechou na repetição, ao passo que a história do pensamento grego e, mais ainda, a história do pensamento ocidental moderno foram ambas processos evolutivos contínuos, assinalados por etapas, cada uma das quais constituindo ao mesmo tempo o prosseguimento e a superação da que a precede? Em outros termos, “por que os construtos cognitivos (conceitos, métodos, visões) elaborados na cultura árabe-islâmica na época de seu desenvolvimento durante o período medieval não tiveram a evolução que teria colocado essa cultura em condições de realizar um renascimento intelectual e científico que fosse uma garantia de progresso contínuo, a exemplo do que se produziu na Europa a partir do século 15?” [3]
O atentado de 11 de setembro de 2001, que atingiu os Estados Unidos, perpetrado por fundamentalistas islâmicos, foi o ponto culminante de uma série de atos terroristas. Conforme Abdelwahab Meddeb, escritor e poeta tunisiano, [4], teriam começado em 1979, ano em que Khomeini triunfa no Irã e o Afeganistão é invadido pela antiga URSS.
Uma análise sígnica das imagens dos aviões colidindo com os dois arranha-céus em Nova York nos revela as intrincadas superposições representativas que, como camadas de uma cebola, formam a realidade. As imagens são ‘espetáculo’ num mundo que se apresenta como espetáculo através de ‘extensões’ e ‘amplificadores sensíveis’ tecnológicos, resultantes do processo científico de acumulação (de saber) do que chamamos Ocidente.
O que as imagens revelam além dessa superfície, dessa camada visual e primária do ‘espetáculo’, é a ‘re-ação’ de um outro (o Outro) mundo, um mundo que se tornou ‘re-ativo’ e que existe ‘significativa-mente’ na realidade (nada menos que ‘presença’). Outro é o mundo árabe-islâmico, embora o que se revela no cenário de terror como ‘re-atividade’ seja praticado por uma parcela que não deve representar a sua totalidade, o que seria uma simplificação ‘míope’ (num sentido semiótico), visto que essa parcela – ‘terroristas fundamentalistas islâmicos’ – é sintoma, uma ‘patologia’ que, para entendermos melhor, precisamos recuar no tempo. Antes, contudo, é importante colocar que o ato ‘re-ativo’ (o atentado) foi realizado através do uso da ‘técnica’ (e sua tecnologia) do ‘inimigo’ (o Ocidente).
Mohammed Abed al-Jabri, filósofo marroquino contemporâneo, identifica uma interrupção na atividade de reprodução na cultura árabe-islâmica, que deu lugar “a um estado de inércia, de recuo e de repetição”. Diz ele que “desde então se estabeleceu (...) uma ‘compreensão da tradição encerrada na tradição’, ainda hoje dominante”. Com esse estado de inércia e de recuo, o mundo árabe-islâmico se deparou, nos nossos dias, com um Ocidente que manteve o seu ritmo baseado justamente na marcha de avanços capitaneados pela ‘técnica-tecnologia-ciência’, que desde o Renascimento (século 16) e o Iluminismo (século 18) trouxe consigo o desenvolvimento do saber que resultaria, enfim, naquilo que hoje podemos identificar como “especificidade da modernidade” no Ocidente.
A falta de perspectiva histórica e de objetividade caracteriza o conjunto do pensamento árabe moderno e contemporâneo, resultado de um ‘desvio da razão’ no decorrer do processo que se estabeleceu no ‘mundo-cultura-pensamento’ árabe-islâmico há cerca de oito longos séculos
É imprescindível observarmos o que al-Jabri nota sobre a leitura da história por parte dos fundamentalistas religiosos do Islã. Diz ele que essa leitura “vem de uma concepção religiosa da história, para a qual a história é um instante dilatado no presente, um tempo estendido na vida afetiva, testemunha da luta perpétua e dos eternos sofrimentos padecidos pela afirmação da identidade. E como se declara que a fé e a convicção religiosa é que definem essa identidade, o fundamentalismo eleva o fator espiritual à condição de único motor da história. Quanto aos outros fatores, são considerados secundários, dependentes do espiritual ou coisas que desfiguram o ‘verdadeiro’ curso da história”.
O pensamento árabe-islâmico não se resume, contudo, ao fundamentalismo religioso. Existem outras ‘leituras’, embora o próprio al-Jabri admita que “o olhar árabe liberal sobre a tradição” parte do presente que ele vive, ou seja, do Ocidente. Essa ‘leitura’, portanto, é europeizante e adota “um sistema de referência europeu”. Torna-se oportuno para nós ressaltar a questão do ‘olhar’, termo usado pelo autor, cuja origem sígnica nos remete aos gregos.
Refugiar-se num passado distante e buscar apoio junto a um ancestral fundador, para recuperar a auto-estima. Este é o ‘modus operanti’ do sujeito que habita aquilo que se auto-determina mundo (ou cultura, ou, ainda, pensamento) árabe-islâmico contemporâneo. Daí a tendência a ser, conforme abaliza o filósofo marroquino, em sua maior parte, fundamentalista.
A falta de perspectiva histórica e de objetividade caracteriza o conjunto do pensamento árabe moderno e contemporâneo, resultado de um ‘desvio da razão’ no decorrer do processo que se estabeleceu no ‘mundo-cultura-pensamento’ árabe-islâmico há cerca de oito longos séculos. E é esta ‘razão’ (e ‘desvio’) que deve ser submetida a uma análise e a uma crítica, no entender de al-Jabri, como também do professor Abdelwahab Meddeb.
A esse respeito escreve al-Jabri: “Sem dúvida, um povo só pode pensar o mundo através da sua tradição. Mas uma coisa é pensar através de uma tradição que passou por um desenvolvimento contínuo até o presente, uma tradição de que o presente faz parte integrante, uma tradição continuamente renovada, revisada e criticada; outra coisa é pensar através de uma tradição de desenvolvimento interrompido há séculos, uma tradição afastada do presente pelo profundo abismo que os progressos da ciência cavaram entre ela e a ciência”.
Devemos notar também um outro fenômeno. A língua árabe permaneceu a mesma durante mais de quatorze séculos. O sentimento, portanto, de sacralidade do texto é superdimensionado. Entendemos como sentimento ‘expressão’ de uma ‘lógica do inconsciente’ que aflora no sujeito com tal potência que enfraquece a capacidade de observação analítica e crítica por parte da razão para redimensionar os dados de significação dos objetos em suas devidas categorias ou estádios.
Desde Heráclito e Parmênides, pré-socráticos que divergiam quanto ao ‘caráter’ da realidade, o primeiro em defesa do dinamismo, sendo notória a frase a ele atribuída de que “não podemos banhar-nos duas vezes no mesmo rio, porque o rio não é mais o mesmo"; o segundo defendendo uma posição monista, para a qual o movimento seria apenas aparente, um aspecto superficial das coisas, vemos dois ‘olhares’ da realidade que se diferem radicalmente. Entrementes, seja o fluxo ‘orgânico’ do mundo e das coisas do mundo aparente ou não, a língua, como atributo humano, é ‘organismo vivo’, e, como tal, dinâmico. A sacralização da língua árabe em seu ‘congelamento’ consubstancial (língua-pensamento-cultura-mundo) seria também sintoma do ‘desvio da razão’, que provocaria, como bem enxergou al-Jabri, uma redução do texto em meros “receptáculos para todas as sensações e todas as paixões”?
O legado grego para dois mundos
A problemática que perpassa a atividade dos filósofos muçulmanos foi e é a problemática da “conciliação entre razão e transmissão”. E foi também para eles que o legado grego se fez presente, fundamentalmente Platão e Aristóteles, embora o processo tenha sido diverso daquele que se apresentaria mais tarde na cristandade européia. Não poderíamos deixar de ilustrar dois dos mais relevantes filósofos do mundo árabe-islâmico. São eles, em nomes latinos, Avicena e Averróis.
Avicena (980-1037 do calendário cristão) nasceu em Afshana, norte do Irã, e morreu em Hamadhan. Foi o maior nome da filosofia neoplatônica islâmica e da medicina medieval. Teve como mestre Farabi, ao qual deve sua compreensão da “Metafísica” de Aristóteles.
Averróis (1126-1198) nasceu em Córdoba, descendente de uma longa linhagem de eminentes juristas da Espanha muçulmana. Morreu no Marrocos. Os três grandes campos explorados pelo pensamento de Averróis são os seus comentários e a sua interpretação de Aristóteles, a sua crítica de Farabi e de Avicena, que invoca um aristotelismo livre dos contra-sensos que lhe infligira a tradição filosófica oriental, e a sua demonstração do acordo essencial entre a filosofia e a Revelação, como duas expressões distintas de uma única e mesma verdade. Com o renascimento do aristotelismo na Europa do oeste, no fim do século 12, foi imediatamente reconhecido como grande autoridade no pensamento judeu e cristão [5].
O pensamento grego é assim capturado por pensadores de dois mundos que, ao longo dos séculos, coexistiram, co-habitaram espaços comuns, por vezes se chocaram e, outras, dividiram, trocaram e disseminaram entre si conhecimento
Difícil não pensar no que Agostinho e Tomás de Aquino representaram e representam para o pensamento cristão e o que trouxeram para este de Platão e Aristóteles, ao olharmos Avicena e Averróis no pensamento árabe-islâmico. O pensamento grego é assim capturado por pensadores de dois mundos que, ao longo dos séculos, coexistiram, co-habitaram espaços comuns, por vezes se chocaram e, outras, dividiram, trocaram e disseminaram entre si conhecimento.
Foi uma época fértil para o mundo, a cultura e o pensamento árabe-islâmicos nos mais diversos campos da ciência, desde a matemática, passando pela astronomia, até a medicina. Seus pensadores dispensavam tempo e muita energia para formular e levantar questões que, em retrospecto (o que é, para nós, razoavelmente fácil fazer hoje), poderíamos ousar determinar aquele momento específico como um estágio ‘imediatamente’ anterior ao que seria o grande salto – que não veio; e que viria, de outra forma, não no mundo árabe-islâmico (na época aquele que tinha todas as condições para tal), mas no mundo cristão, mais tarde, com o Renascimento e o Iluminismo.
Os campos do conhecimento a serviço da luta pelo poder
Ibn Hazm (994-1063), “o jurista de Córdoba”, considerado o iniciador de um novo momento do pensamento árabe-islâmico, defendia que “tudo que escapa ao domínio do Texto [o Alcorão] é ilimitado, depende da liberdade do homem”, deve ser deixado à sua razão e à sua livre escolha, conforme escreveu al-Jabri em seu livro “Introdução à crítica da razão árabe”.
Mas o que teria acontecido a um mundo tão pleno de potencialidades, tão fértil, que o fizesse estacionar e permanecer nesse estado de inércia séculos e séculos porvir? Precisaríamos prolongar demais os questionamentos e temas aqui abordados, e esta não é a finalidade deste artigo, que aspira apenas delinear caminhos que poderão, noutro momento, ser percorridos pelo leitor por sua própria conta e seu próprio sabor. Entretanto, não seríamos honestos se não assinalássemos alguns esclarecimentos, mesmo que, para tal, exista o risco de nos limitar.
Assim como o que entendemos como mundo cristão, o mundo árabe-islâmico é ricamente heterogêneo. As lutas políticas marcaram e marcam fortemente esses mundos (quais são os mundos não marcados por tais lutas?). E muitos dissídios, sejam eles na esfera religiosa, como também em outras (científica, jurídica, econômica etc.), são determinados por decisões que envolvem lutas pelo poder. O próprio al-Jabri admite que “a influência ideológica e a hegemonia cultural constituem os meios de acesso privilegiados à dominação secular”. Destarte, escolas de diferentes pensamentos e concepções serviriam para legitimar certo grupo no poder.
No âmbito particular do mundo árabe-islâmico, sem esquecermos de toda a sua especificidade, aquelas escolas e aqueles pensadores que em dado momento identificamos como o mais fértil de toda a sua existência, e que defendiam o uso da razão sem que esta se submetesse a uma tradição inapta para fomentar o avanço do pensamento, fracassaram em seus projetos de trazer ao mundo o seu próprio “Renascimento” e “Iluminismo”.
Avicena seria “condenado” por um Avicena posterior de discurso irracionalista, que sobreviveria como projeto de filosofia persa (Irã), unindo-se à filosofia iluminista iraniana. Cabe lembrar que dentro do mundo árabe-islâmico a rivalidade entre “orientais” (o Irã é persa e não árabe) e “ocidentais” (iraquianos, sírios, entre outros) se mantém durante séculos.
A chegada de Averróis ao panorama mundial islâmico, em al-Andalus, retomando e ultrapassando Ibn Hazm, enfrentando a capitulação aviceniana e dedicando-se ao árduo trabalho de compreender e interpretar a obra de Aristóteles foi, talvez, o ápice do pensamento e da filosofia árabes, o legado que muitos defendem hoje como caminho para se desfazer as vicissitudes que estagnaram o mundo árabe-islâmico na Idade Média, tornando-os prisioneiros de um passado “idealizado” e agentes ‘re-ativos’ num mundo ‘hiper-dimensionado’ que não compreendem e que não os compreende (e que acaba por reduzi-los em arquétipos gerais ou específicos – fundamentalistas e terroristas).
Segundo al-Jabri, deve-se recuperar o pensamento averroísta tomando-lhe emprestada a capacidade de ruptura, o que significa romper com o espírito gnóstico de Avicena. Diz ele: “Nós, árabes, vivemos, depois de Averróis, à margem da história (na inércia e no declínio), porque nos agarramos ao momento aviceniano (...) Os europeus, por seu lado, viveram a história de que havíamos saído, porque souberam apropriar-se de Averróis e viver até hoje o momento averroísta”. Momento este que poderíamos definir de forma alegórica como permanente processo (e projeto) de construção de uma “cidade da razão”, ou seja, processo (e projeto) de buscar submeter o maior número de pessoas possíveis ao uso da razão, sendo esta o verdadeiro remédio contra as trevas.
Espera-se, de tal modo, que o mundo árabe-islâmico contemporâneo seja capaz de reencontrar o seu plano de construção da “cidade da razão”, e que o Ocidente também seja capaz de compreender e interpretar o mundo árabe-islâmico, como fez Averróis com Aristóteles e os gregos, para que tenhamos os caminhos do diálogo abertos entre esses dois mundos tão próximos e tão distantes, tão semelhantes e tão diferentes.
terça-feira, 18 de novembro de 2008
A leitura na vida e na morte do Che
No poema Lisboa revisitada, Fernando Pessoa escreveu: “(...) só és lembrado em duas datas, aniversariamente: quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste (..)”. Ernesto Che Guevara parece uma dessas pessoas que só são lembradas no aniversário de sua morte. Com freqüência, exalta-se a figura do herói-mártir do voluntarismo revolucionário, do guerrilheiro heróico. No último dia 14 de junho, Guevara completaria 80 anos. Mais uma vez, as poucas referências ao seu aniversário natalício não mencionaram outras dimensões da vida deste ser profundamente complexo e humano.
Guevara passou por várias metamorfoses ao longo da vida, e essas mutações bruscas foram a marca de sua personalidade. Teve muitas vidas simultâneas – a do viajante, a do médico, a do aventureiro, a do crítico social - que se condensaram e se cristalizaram, por fim, em sua experiência de condottiere, como gostava denominar-se. No entanto, pouco se escreveu sobre a paixão que tinha pela leitura, que remonta à sua infância, e que o acompanharia até seu assassinato na Bolívia.
De acordo com o próprio Guevara, seu interesse pela leitura começou ao tentar ocupar-se durante os ataques de asma, quando seus pais o obrigavam a ficar em casa, fazendo inalações prescritas por eles. Devido às crises, a mãe ensinou-o a ler, pois muitas vezes ele não pôde ir à escola. A partir de então, Guevara se transformou num leitor voraz. Alberto Granado, o amigo que o acompanhou na viagem pela América do Sul, ficou intrigado quando descobriu que o jovem Ernesto “já estava lendo Freud, gostava da poesia de Baudelaire e lera Dumas, Verlaine e Mallarmé em seu idioma original, bem como a maioria dos livros de Émile Zola, os clássicos argentinos, como o épico Facundo de Sarmiento, e as mais recentes obras de William Faulkner e Jonh Steinbeck”. [1]
Ao longo de sua trajetória, Guevara procurou unir a leitura à vida. Como leitor, buscava completar o sentido de sua vida por meio de imagens extraídas das leituras que fazia. Assim, viveu a partir de certos modelos de experiência que leu e procurou repetir e realizar; encontrou em cenas lidas um modelo ético de conduta, a forma pura da experiência. Cortázar escreveu um conto, sobre uma passagem na sua vida, em que el Che, ferido, pensando que está à morte, lembra-se de um relato que leu. Assim escreveu em Passagens da guerra revolucionária: “Na mesma hora comecei a pensar na melhor maneira de morrer, naquele minuto em que tudo parecia perdido. Lembrei-me de um velho conto de Jack London, em que o protagonista, apoiado no tronco de uma árvore, toma a decisão de acabar a vida com dignidade, ao saber-se condenado à morte, por congelamento, nas regiões geladas do Alasca. É a única imagem de que me lembro”.
A vida de Guevara foi marcada pela constante tensão entre o ato de ler e a ação política: a leitura, na figura sedentária do leitor e prática, do guerrilheiro que avança. Mais que paixão, a leitura era para ele uma dependência. “Minhas duas fraquezas fundamentais: o fumo e a leitura”. E leitura feita em situações de perigo, em situações extremas, fora de lugar, em circunstâncias de desorientação, de ameaça, de morte. A leitura opondo-se a um mundo hostil, como restos ou lembranças de outra vida. No excelente ensaio Ernesto Guevara, rastros de leitura, o escritor Ricardo Piglia define esses momentos do guerrilheiro nos intervalos da marcha contínua: “essas cenas de leitura seriam o vestígio de uma prática social. Trata-se de uma pegada - um tanto borrada -, de um uso do sentido que remete às relações entre os livros e a vida, entre as armas e as letras, entre a leitura e a realidade". [2]
Existem duas fotos extraordinárias da revolução cubana. Numa Che lia uma biografia de Goethe num acampamento guerrilheiro. A outra captou o momento em que lia na Bolívia, em cima de uma árvore, em meio à desolação e à experiência terrível. Trata-se de Guevara como o último leitor
Para Guevara, a leitura foi como um filtro que lhe permitiu dar sentimento à experiência. Um espelho que a definia, dava-lhe forma. Além disso, a leitura serviu como metáfora da diferença entre sua vida política e a pessoal, permanecendo como um resto do passado, em meio à experiência da ação pura, do desprovimento e da violência. Isso já era percebido no período da luta em Cuba. Em um testemunho sobre a experiência da guerra de libertação cubana, alguém afirma, referindo-se ao Che: “leitor incansável, abria um livro quando fazíamos uma parada, ao passo que nós, mortos de cansaço, fechávamos os olhos e tratávamos de dormir”. Há uma foto conhecida dessa época, em que lia uma biografia de Goethe num acampamento guerrilheiro. Outra foto extraordinária, captou o momento em que lia na Bolívia, em cima de uma árvore, em meio à desolação e à experiência terrível. Trata-se de Guevara como o último leitor.
Ademais, costumava registrar em seu diário a experiência pessoal e a coletiva a qual estava inserido inteiramente. Escrevendo, Guevara fixou a experiência em si, o que permitiria em seguida ler sua própria vida como se fosse a de outro, e reescrevê-la. No entanto, o Diário da Bolívia é excepcional, por não ter sido reescrito.
Na marcha da história, o leitor sobrevive em Guevara, sob o eterno conflito entre ação do ser político e a leitura do ser isolado, sedentário, reflexivo. Há um relato sobre o primeiro combate da guerrilha boliviana em que estava lendo estendido em sua rede, enquanto esperava o momento exato do início à emboscada. Ainda no país andino, quando por fim é capturado, no dia 8 de outubro de 1967, Che, sem forças, carregava seus livros, dos quais não abriu mão, enquanto todos os outros já se haviam desfeito daquele peso supérfluo.
Nos momentos finais de vida, uniram-se o Che leitor e o Che político, talvez porque estiveram juntos desde o início. Enquanto estava preso na escolinha de La Higuera, aguardando ser assassinado, Julia Cortés, professora e única a assumir uma atitude solidária com Ernesto, foi levar-lhe de casa um prato de comida. Quando entrou na sala, encontrou o Che jogado no chão, ferido. Então – e estas seriam suas últimas palavras - Guevara mostrou-lhe uma frase escrita na lousa e disse que a mesma não estava correta; com enfática perfeição, falou: “falta o acento”. A frase era “yo sé leer” (‘eu sei ler’). Por uma dessas ironias do destino, como um oráculo, uma cristalização quase perfeita, a frase que Guevara corrigiu tinha a ver com leitura.
Como afirma Ricardo Piglia, Guevara “morreu com dignidade, como o personagem de Jack London”. Morre o homem. Ficam suas idéias, sua determinação, seu exemplo.
A receita oculta de Yeda para o déficit zero
- Descumprimento dos limites constitucionais mínimos de gastos com saúde, educação e pesquisa científica e tecnológica.
- Pendência de repasses aos municípios, referentes às quotas de salário-educação, multas de trânsito, ICMS, IPVA, entre outros itens, totalizando R$ 90,090 milhões.
- Sucessivas prorrogações de contratos emergenciais, burlando a exigência de realização de concursos públicos.
- Dívidas com precatórios judiciais contabilizadas em valor menor que o real pelo Estado, incluídas suas autarquias e fundações.
- Não-repasse integral ao IPERGS do produto das contribuições previdenciárias retidas junto à folha de pagamento dos servidores.
- Suplementação das despesas com publicidade em 55,01%.
Esse último ingrediente é fundamental para que essa receita não seja publicada nos meios de comunicação. Sem isso, o bolo do déficit zero desandaria.
Foto: Paula Fiori/Palácio Piratini
Creditos: Marco Aurélio Weissheimer
segunda-feira, 17 de novembro de 2008
A mídia de esgoto de RS....
Sobre festas comuns de adolescentes aos finais de semana e convidados negligenciados por adultos
Editorial de Zero Hora no último sábado, 15, comentando o recente estupro, na cidade de Joaçaba, SC, de uma adolescente de 15 anos por jovens de classe média, "no decorrer de uma aparentemente inocente festinha com pipoca e bebida alcoólica".
Nada mal para um empresa que organizou, no último verão, em um certo final de semana, uma festa comum voltada para adolescentes patrocinada por uma cervejaria. Como se vê, o Grupo RBS é um adulto que não negligencia e nem ignora o álcool quando anuncia seus eventos caça-níqueis para adolescentes. Isso é o que La Vieja chama de responsabilidade social empresarial.
La Vieja continua sustentando a tese de que, além de em geral fazer mau jornalismo, o Grupo RBS redefine o conceito de hipocrisia todas as vezes em que há confronto entre seus interessses privados e determinados interesses públicos.
Créditos: LaViejaBruja
Entendendo o Irã | | | |
Luiz Eça | |
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Há 2.500 anos, quando os antepassados de George Bush habitavam as florestas da Europa, vestindo peles de animais e comendo carne crua, o Irã (o império dos persas) era a mais poderosa nação do mundo.
Conquistado pelos árabes no século 7, o Irã adotou a religião deles e integrou-se no império islâmico como uma parte importante, distinguindo-se nas ciências, literatura, filosofia e arquitetura, daquela que foi a principal civilização da Idade Média.
A dinastia Safavida, que reinou no Irã depois que ele se separou do império muçulmano, foi outro momento de glória do país.
Estes fatos criaram uma identidade nacional e tornaram o povo iraniano orgulhoso de seu país. Mas, a partir do século 19, líderes corruptos permitiram que durante muitos anos a Rússia e a Inglaterra dominassem o Irã e explorassem sua economia. O povo iraniano sempre se rebelou contra as concessões feitas a essas potências e, em 1906, uma revolução constitucional tornou o Irã uma monarquia parlamentarista. Mas os russos e os ingleses não se tocaram. Em 1907 assinaram um tratado que dava à Inglaterra o controle do sul e à Rússia, do norte.
Nessa época, descobriu-se que o Irã tinha muito petróleo e uma empresa inglesa, a Anglo-Iranian Oil Company, assenhorou-se de sua exploração.
Em 1919,os ingleses impuseram o Acordo Anglo-Iraniano que dava a eles o controle do exército, do tesouro, dos transportes e das comunicações do país.
Novamente o povo iraniano revoltou-se e dois anos depois foi revogado o Acordo. Assumiu o poder Reza Shá que procurou modernizar o Irã. Suas boas relações com a Alemanha foram pretexto para os russos e ingleses invadirem o país, em 1941, e forçarem Reza Shá a abdicar em favor de seu sobrinho, Reza Palevi.
Depois da guerra, o nacionalismo empolgou os iranianos. Em 1951, seu parlamento elegeu o primeiro-ministro Mohamed Mossadegh, com a proposta de nacionalizar a indústria petrolífera. Ele declarou ser inaceitável que o Irã fosse um dos povos mais miseráveis do mundo enquanto a Anglo-Iranian ganhava fortunas, explorando as imensas reservas de petróleo do país.
Os ingleses reagiram, aliados aos americanos. E a CIA promoveu a "Operação Ájax", um golpe de Estado contra Mossadegh, tendo o xá Reza Pahlevi assumido poderes ditatoriais. Sem demora, ele devolveu o petróleo às companhias estrangeiras. Reprimiu violentamente a oposição, com sua polícia secreta, a Savak, matando e torturando. Os adversários do regime só podiam reunir-se nas mesquitas, o que deu força política aos clérigos.
Nos anos subseqüentes, os Estados Unidos apoiaram o xá, enviando imensos carregamentos de armas e equipamentos militares. Com isso, o anti-americanismo, nascido na crise que destruiu Mossadegh e a democracia iraniana, radicalizou-se.
Em 1979, o descontentamento contra o governo do xá provocou uma insurreição popular que levou ao poder o aiatolá Komeini e os fundamentalistas xiitas. 30 dias depois de sua posse, houve o episódio em que estudantes seqüestraram 465 pessoas na embaixada dos Estados Unidos. Komeini não apoiou, mas também não fez nada e o governo americano rompeu relações com Teerã.
Em 1980, o governo Ronald Reagan ajudou Sadam Hossein quando ele atacou o Irã, fornecendo helicópteros e informações de satélites para localizar os pontos a serem bombardeados. Nessa guerra, morreu 1 milhão de iranianos. Para o povo: com a cumplicidade dos Estados Unidos.
Estas intervenções americanas condensaram-se numa herança de ódio que tornou o Irã hostil aos Estados Unidos.
Eleito em 1998, o moderado presidente Khatami defendeu a liberdade de expressão, os direitos humanos e uma política econômica que atraísse capitais estrangeiro. Tentou melhorar as relações com os Estados Unidos, mas desistiu quando Bush colocou o Irã no "eixo do mal". Diante da fúria nacional, as eleições seguintes foram ganhas pelo ultra-conservador Ahmadinejad.
Parece estranho que os Estados Unidos tenham sido responsáveis ou co-responsáveis pela queda de um regime democrático (Mossadegh) e de um governo reformista (Khatami). Mas tem lógica, considerando-se os objetivos estratégicos de sua política externa. Como império, eles não podem admitir governos que não aceitem sua hegemonia (Eisenhower: "Quem não está conosco está contra nós"). Sobretudo no caso do Irã que ocupa uma posição geográfica favorável para controlar o fluxo do petróleo dos produtores da península arábica, podendo cortar os fornecimentos necessários à economia americana. Além disso, as reservas do Irã, na OPEP só suplantadas pelas da Arábia Saudita, são extremamente apetitosas para as petrolíferas americanas. Ora, tanto Mossadegh quanto Khatami defendiam uma política externa independente e a exploração do petróleo pelos iranianos. Eram inaceitáveis, portanto.
Ahmadinejad também é. A Casa Branca tem um plano para derrubá-lo: agravar cada vez mais as sanções contra o Irã até levar sua economia a um ponto próximo do colapso, o que forçaria o governo iraniano a interromper a produção de urânio puro.
Derrotado e com o país afundado em problemas econômicos profundos, o regime dos aiatolás perderia apoio popular e poderia ser derrubado. Caso o Irã não cedesse, restaria sempre a opção militar.
Há evidências de que o Irã não pretenda produzir bombas nucleares. O próprio serviço secreto americano já admitiu que isso atualmente não acontece. E o governo iraniano atendeu a quase todas as solicitações feitas pela agência atômica da ONU.
De outro lado, ele se recusa a admitir certas inspeções. Tem justificativas aceitáveis: teme que os inspetores informem aos Estados Unidos segredos militares. Há precedentes históricos para o Irã desconfiar do Ocidente.
Mas se o Irã não pretende ter bombas atômicas por que não aceita importar urânio puro, em vez de produzi-lo?
Aí entra uma questão de orgulho nacional. O Irã é um grande país, com 72 milhões de habitantes e uma indústria em fase de expansão, além de sua liderança na área do petróleo. Tem uma rica herança cultural e um passado glorioso.
Seu povo não aceita que os Estados Unidos e Israel desenvolvam programas nucleares enquanto isso lhes seja proibido.
Washington alega que, tendo Ahmenadabad declarado que Israel seria varrido do mapa, não seria surpresa se ele usasse bombas atômicas para isso.
Na verdade, o presidente do Irã esclareceu que não pretende fazer nada contra o povo de Israel. Somente acha que seu regime racista acabará desaparecendo, sendo substituído por uma sociedade, sem distinções de religião ou raça. E, convenhamos, os iranianos nunca seriam tão loucos de atacar um país que já tem 200 bombas, mais o apoio dos Estados Unidos e seu arsenal nuclear.
Como os iranianos não devem mesmo pedir água, restaria a opção militar. A crise econômica que assola o mundo a inviabilizou, por agora. Bombardeado, o Irã fecharia o estreito de Ormuz, bloqueando a passagem do petróleo das nações da Arábia e levando seu preço às alturas.
Quando o furacão passar, talvez o novo presidente americano terá condições para encarar uma guerra. Pelas palavras dos candidatos, estão dispostos. "Bomb, bomb, bomb", é a palavra de ordem de McCain.
Já Obama fala em mais pressões diplomáticas, "sem tirar da mesa" a opção militar. Como ele deve vencer, resta esperar que suas ameaças não passem de demagogia para ganhar os votos de um público que a mídia convenceu a temer o Irã.
Luiz Eça é jornalista.
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Produzido pelo Instituto de Estudos e Pesquisas em Comunicação (Epcom), instituição ligada ao Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), o sítio “Donos da Mídia” tende a se tornar uma das mais importantes ferramentas virtuais para pesquisas relacionadas à comunicação.
A equipe de pesquisadores – jornalistas, estudantes e professores – rastreou toda a mídia brasileira, levantando dados que escancaram sua concentração e suas relações com o poder político. Foram estudados dados dos 9475 veículos de comunicação do país – do jornalismo impresso à radiodifusão. Brilhante, o trabalho deixa à mostra a urgência da democratização dos meios de comunicação brasileiros.
Segundo os dados, existem 35 grupos de abrangência nacional no Brasil, controlando 516 veículos de comunicação. O grupo Abril controla 74 desses veículos; as organizações Globo dominam 69. No ranking das corporações, são seguidas de perto por Band e Record, com 47 e 34 veículos, respectivamente.
Segundo a pesquisa, a Rede Globo detém hoje 340 veículos de comunicação em todo o Brasil. As sete principais redes detêm 1110 dos 1553 veículos de comunicação brasileiros – 71,5%. Entre as sete, cinco são exatamente as mesmas de 30 anos atrás, quando os estudos começaram, durante a ditadura militar.
A segunda constatação é a escancarada proximidade com o poder político, o que talvez explique a produção conservadora da maioria desses veículos, e sua defesa intransigente dos valores de mercado. A Constituição Federal proíbe que políticos eleitos sejam sócios ou diretores de veículos de comunicação. Entretanto, segundo dados oficiais, 271 políticos controlam 324 meios. Um notório desrespeito à lei máxima do país.
Segundo os dados, o partido com maior domínio dos meios é o DEM. 58 deputados, senadores e prefeitos do partido são sócios ou diretores de empresas de mídia. Em segundo lugar vem o governista PMDB, com 48 políticos. O PSDB, com 43, e o PP, com 23, completam a lista dos quatro principais. O sítio também aponta o estado de Minas Gerais como aquele em que há mais políticos detentores de veículos midiáticos. São 38, contra 28 em São Paulo e 24 na Bahia.
A pesquisa começou há trinta anos, com a Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa da Comunicação (Abepec). Foi por muito tempo comandada por Daniel Herz, que nos anos 80 detectou a avassaladora concessão de outorgas do governo Sarney, através do ministro das Comunicações Antonio Carlos Magalhães (em menos de três anos, Sarney concedeu 527 concessões de rádio e TV). Herz morreu há dois anos, mas como se vê, o trabalho de sua vida foi ampliado e publicizado. É tarefa de todos os que sonham com uma comunicação mais democrática divulgar o endereço, e utilizar suas informações.
Acesse em www.donosdamidia.com.br