Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
quinta-feira, 20 de janeiro de 2011
Tratados como inimigos
Governo demarcou menos terras, não aplicou orçamento e ainda
tornou-se cúmplice da explosão de violências contra os povos indígenas
Roberto Antonio Liebgott no Brasil de Fato
Porto Alegre, Rio Grande do Sul
Nas
eleições de 2002, a candidatura de Lula expressava o anseio popular por
mudanças e sobre a qual recaiam a confiança e as esperanças dos pobres,
que acreditavam ser possível um governo desenvolver políticas de
geração de empregos, assistência digna, educação de qualidade,
segurança, reforma agrária, redistribuição de renda.
Os
povos indígenas confiaram que haveria um governo comprometido com suas
lutas e reivindicações e, por conseguinte, as suas terras seriam
demarcadas e que se estruturariam políticas tendo em vista assistência
diferenciada e digna, conforme determinações constitucionais.
Mas
suas expectativas e anseios não foram atendidos. As demarcações de
terras, dever do Estado, não se tornaram prioridade e muitos dos
procedimentos demarcatórios se encontram paralisados. Poucas foram as
terras regularizadas nos dois mandatos do presidente Lula: 88 terras
foram homologada, sendo que muitas delas tiveram os procedimentos
iniciados em governos anteriores.
Se comparado
com governos anteriores, os dados evidenciam que os procedimentos de
demarcações de terras foram sendo relegados ao esquecimento ou
protelados indefinidamente.
Para agravar a
situação, este governo inaugurou expedientes ilegítimos, tais como a
redução de áreas já demarcadas, e a suspensão de portarias que previam a
continuidade dos procedimentos demarcatórios.
Governo
|
Nº de Terras Homologadas
|
Terras em Hectares
|
Collor de Mello / Itamar Franco (Período: 1990-1994)
|
128
|
31913228
|
Fernando Henrique Cardoso (Período: 1994-2002)
|
147
|
36061504
|
Luiz Inácio Lula da Silva (Período: 2003-2010)
|
88
|
14339582
|
PAC “goela abaixo”
Ao
fazer uma retrospectiva da política indigenista, dos oito anos de
governo do presidente Lula, se constatou, de um lado, o interesse em
manter o bom discurso, alinhado com os anseios e expectativas dos povos
indígenas e de outro, as práticas cotidianas, que diferentemente da
retórica de que se garantiriam os seus direitos, se direcionaram para
estimular a ambição dos segmentos que historicamente se opõem a eles.
Para estes o governo criou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)
que, na essência, serviu e serve para financiar e apoiar empresas da
agroindústria, os banqueiros, as empreiteiras da construção civil, os
conglomerados que investem nas grandes barragens, em mineração, na
exploração madeireira e os grandes latifundiários que se dedicam ao
monocultivo ou a criação bovina.
Na concepção
desenvolvimentista do atual governo, focada apenas em aspectos
econômicos, estes segmentos são “produtivos” e viáveis. Já os povos
indígenas e comunidades tradicionais (como ribeirinhos, caiçaras e
quilombolas) foram rotulados como improdutivos e, desse modo, tratados
como sujeitos sem relevância para a economia e para o país. A sensação
que se tem é a de que aqueles que governam o Brasil analisam e concebem
que os pobres e as “minorias étnicas” devem receber, do poder público, a
sua “generosidade” ou “caridade” e não políticas estruturantes. E, além
disso, o presidente Lula, seguindo o exemplo dos governos militares,
considerou os povos indígenas obstáculos ou entraves ao desenvolvimento e
seus direitos constitucionais penduricalhos.
Explode a violência
Nos
últimos anos pode-se dizer que foi deflagrada uma intensa perseguição e
criminalização de lideranças indígenas que lutam pela terra. Isso
ocorreu especialmente na Bahia, Pernambuco, Maranhão, Mato Grosso do
Sul. Some-se a isso o alastramento de violências contra comunidades e
povos em diferentes regiões brasileiras. Além de terem seus territórios
invadidos, de padecerem com a falta de assistência em saúde, estes povos
sofreram com o assassinato de 437 pessoas.
A
omissão do governo Lula em relação ao intenso processo de violências
enfrentadas pelos Guarani Kaiowá em Mato Grosso do Sul, e que se pode
caracterizar como genocídio, é talvez o elemento mais significativo da
falta de interesse pelos povos indígenas. Os abusos contra este povo são
denunciados por organizações de defesa dos direitos humanos e indígenas
no Brasil e no exterior. A demarcação das terras poderia ter evitado a
morte de centenas de pessoas do povo Guarani Kaiowá. Além disso, uma
ação mais eficaz de proteção das comunidades e de punição daqueles que
praticam as violências poderia ter abrandado, em parte, o sofrimento que
lhes é imposto há décadas.
O estado de Mato
Grosso do Sul é recordista em violências contra os povos indígenas, e
ali as comunidades indígenas são obrigadas a viver em beira de estradas,
são expulsas de seus acampamentos e têm seus pertences queimados.
Vale
ressaltar que em diferentes estados do Brasil também foram praticados
assassinatos de indígenas, e nem todos esses números são divulgados.
Orçamento
Os
dados da execução do orçamento indigenista, ao longo dos últimos oito
anos, também demonstram o descaso com os 241 povos indígenas do país.
Mesmo quando há recursos aprovados, estes acabam não sendo executados
conforme o previsto. Chegamos ao final de 2010 com apenas 61% do
orçamento indigenista liquidado. Programas e ações fundamentais para a
sobrevivência física e cultural dos povos indígenas tiveram uma pífia
execução de seus recursos. Vejamos:
Ação
|
% Liquidado
|
Conservação e Recuperação da Biodiversidade em Terras Indígenas
|
0,00%
|
Saneamento Básico em Aldeias para Prevenção e Controle de Agravos
|
3,21%
|
Estruturação de Unidades de Saúde para Atendimento Indígena
|
9,94%
|
Demarcação e Regularização de Terras Indígenas
|
16,03%
|
Vigilância e Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Indígenas
|
51,00%
|
Promoção, Vigilância, Proteção e Recuperação da Saúde Indígena
|
65,00%
|
Estes
números indicam que os recursos previstos no Orçamento Geral da União
para assistência em saúde, demarcação de terras e recuperação de áreas
degradadas não foram aproveitados como deveriam, e tal procedimento é
injustificável diante da grave situação vivida pelas comunidades e povos
indígenas. Não parece ser, portanto, por falta de recursos que o
governo Lula deixou de demarcar terras indígenas e ocupa o pior lugar em
termos de desempenho neste quesito, se comparado aos seus antecessores.
Reestruturação x Mega projetos
A
Funai, durante todo o mandato do governo Lula, manteve-se em estado de
letargia e subserviência frente às pressões desencadeadas contra as
demarcações de terras. Ao final de 2009, como que num passe de mágica, a
equipe do governo decidiu reestruturar o órgão indigenista, através de
decreto nº. 7056, expedido no dia 29 de dezembro daquele ano. A referida
reestruturação não agradou a muitos dos povos indígenas por apresentar
mudanças na estrutura do órgão sem que eles fossem consultados,
desrespeitando a Convenção 169 da OIT, ratificada e homologada pelo
governo brasileiro. Esse fato gerou um ambiente de extrema desconfiança
quanto às reais motivações que levaram o governo a impor as pretendidas
mudanças.
Depois de apresentada a proposta de
reestruturação do órgão indigenista apenas as coordenações que tratam
das questões administrativas, ambientais e aquelas destinadas a estudos
sobre os empreendimentos que incidem sobre terras indígenas tiveram
planejamentos e ações efetivamente desenvolvidas. Desse modo, pode-se
dizer que o órgão indigenista foi colocado, de certa forma, a serviço do
PAC, e sua função parece ser, neste caso, a de convencer as comunidades
indígenas de que devem dar suas anuências aos projetos a serem
executados.
Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI)
No
que se refere às demandas para além das questões fundiárias, foram
sendo promovidas inúmeras ações nas áreas ambientais, de saúde, de meio
ambiente, agricultura, educação. No entanto, muitas delas foram
realizadas de maneira pulverizada e desarticulada entre si, sem
convergir para a questão central, que é a falta de uma política com
efetiva participação indígena.
Na expectativa de solucionar este
problema, os povos indígenas apresentaram proposta de criação do
Conselho Nacional de Política Indigenista. Ao invés disso, o Governo
Federal constituiu a Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI),
em 2007. Não tendo o status de Conselho, a CNPI não tem poder de
deliberação. Os seus membros apresentam as demandas (temas e questões)
que afetam os povos indígenas e que devem ser debatidas, estudadas e
refletidas para posterior encaminhamento no âmbito do governo e da
política indigenista.
Em quase três anos de existência, a CNPI
acabou se tornando um ente de articulação de algumas lideranças, mas
parece ser desconsiderada no que se refere às ações e políticas a serem
implementadas a partir de suas recomendações, já que estas não são
assumidas pelo governo. Exemplo disso foi a edição do decreto de
reestruturação do órgão indigenista, sem que os integrantes da Comissão
tivessem conhecimento de seu conteúdo e muito menos que tenham sido
ouvidos a este respeito. Em síntese, as mudanças que deveriam ser
antecedidas pelo debate e anuência dos povos indígenas acabaram sendo
abruptamente anunciadas desrespeitando, inclusive, os fóruns
qualificados para o debate, como é o caso da CNPI.
Só em 2008,
após muita pressão dos movimentos indígena e indigenista, o Governo
Federal apresentou o Projeto de Lei nº. 3571 que prevê a criação do
Conselho Nacional de Política Indigenista. A sua tramitação segue a
passos lentos no Congresso Nacional, pois não lhe foi dada a importância
devida.
Também merecem uma avaliação as políticas de saúde e
educação. Na assistência à saúde indígena existiram graves e profundas
contradições, pois foi transformada em espaço de negociações com
partidos políticos, de modo especial com o PMDB. A política esteve
estruturada durante mais de uma década no modelo de assistência
terceirizada. Os convênios eram estabelecidos entre a Fundação Nacional
de Saúde (Funasa) com ONGs ou prefeituras. Esta relação perdurou até o
ano de 2008 quando, por pressão do movimento indígena, em função da
intervenção do Ministério Público do Trabalho e de decisão da Justiça, o
modelo de assistência (conforme está estabelecido na lei Arouca e pelas
deliberações das Conferências de Saúde Indígena) passou a ser tratado
no âmbito do Ministério da Saúde. Vale destacar que durante um longo
período a Funasa foi alvo de denúncias por malversação de recursos
públicos e por corrupção. Auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas
da União constataram graves distorções sobre o uso dos bens e recursos e
na prestação dos serviços.
Tardiamente e já quase no final de
seu governo, o presidente Lula determinou a criação da Secretaria
Especial de Atenção a Saúde Indígena. A proposta atende às
reivindicações dos povos indígenas, e esta Secretaria será o órgão
gestor do Subsistema de Atenção a Saúde Indígena, sob a responsabilidade
do Ministério da Saúde. O novo modelo terá como referência os Distritos
Sanitários (DSEIs) enquanto unidades gestoras. A Secretaria foi criada
formalmente, mas ainda não foi estruturada.
A política de educação
escolar indígena tem sido igualmente contraditória. A responsabilidade é
do Ministério da Educação (MEC), que repassa os recursos e as
atribuições da educação escolar aos Estados que, por sua vez, podem
transferi-las aos municípios. Com o objetivo de buscar uma solução para
as distorções e contradições existentes na execução da política de
educação foram apresentadas propostas dos movimentos de professores
indígenas, de entidades de apoio e pesquisadores apontando para uma
perspectiva da federalização da política. No entanto, os técnicos do
Ministério da Educação optaram por um caminho diferente. Instituíram
através do Decreto nº. 6861, de 27 de maio de 2009, os chamados
Territórios Etnoeducacionais, antes mesmo da realização de todas as
conferências regionais previstas para avaliar e propor alternativas para
a educação escolar indígena. Esse processo de reflexão culminou na
Conferência Nacional de Educação que, ao invés de discutir as propostas
vindas das diferentes regiões, acabou por discutir o fato já consumado
do novo modelo. O modelo dos Territórios Etnoeducacionais não foi
debatido e sequer é compreendido pela maioria das comunidades e povos
indígenas e, porque não dizer, por muitos executores da política que, em
geral, são os estados e municípios.
Judicialização
Não
podemos deixar de observar também as crescentes demandas judiciais
contra procedimentos de demarcações de terras, em curso ou até em fase
de julgamento definitivo. Raras têm sido as decisões que acolhem de
maneira favorável os direitos e interesses indígenas. Normalmente as
decisões têm um caráter liminar que suspendem os procedimentos
demarcatórios até que o mérito seja decidido pelas instâncias
superiores, no caso STJ ou STF. Em função destas manobras jurídicas, os
processos se arrastam por décadas sem que haja uma solução para o
litígio imposto.
Neste sentido, merecem destaque
duas ações de grande repercussão e que chegaram ao STF: o caso do povo
Pataxó Hã-Hã-Hãe, do sul da Bahia, ação que tramita há quase 30 anos e
que, embora com voto favorável do relator da ação ao povo indígena,
ainda não foi julgada; e Raposa Serra do Sol, que teve um desfecho
importante, em função de o julgamento ter sido pela manutenção da
demarcação em área contínua, mas complexo pelo estabelecimento de
condicionantes que afetam todas as demarcações de terras em curso e
aquelas que acontecerão no futuro.
Direitos ameaçados
As
opções políticas do governo do presidente Lula o conduziram para a
governabilidade a qualquer custo. Para isso, o governo estabeleceu
alianças políticas com segmentos retrógrados e possibilitou que certas
áreas estratégicas fossem incluídas no rol dos recursos a serem
explorados, a exemplo das áreas ambientais, minerais e de energia
hidráulica.
Os povos indígenas, no atual governo,
diferentemente de anteriores, se fizeram mais presentes nos espaços
públicos, reivindicando e exigindo que as autoridades cumprissem com
suas responsabilidades.
No entanto, apesar de uma
visibilidade maior e da criação de certos espaços de participação, as
artimanhas utilizadas por parte daqueles que governam engessaram as
ações indígenas em torno de discursos, pedidos de paciência e promessas a
serem cumpridas. Com isso, as lutas indígenas que mostraram maior
relevância foram aquelas que se organizaram em âmbito local ou regional.
As de caráter nacional foram como que dissipadas e muitas delas
esvaziadas pela relação que se estabeleceu com setores do governo
federal que eram, até muito recentemente, opositores aos governos
anteriores e inclusive militantes da causa indígena.
Já
os setores anti-indígenas estão cada vez mais articulados. No
parlamento brasileiro, diversos projetos de lei tentam impedir que
terras indígenas sejam demarcadas. Exemplo disso é a proposta de emenda
constitucional que determina que as demarcações de terras sejam
autorizadas pelo Congresso Nacional. Sem contar as dezenas de outros
Projetos de Lei apresentados por parlamentares para, de algum modo,
restringir os direitos indígenas.
Roberto Antonio Liebgott é Vice-Presidente do Conselho Indigenista Missinário
quarta-feira, 19 de janeiro de 2011
A América Latina e a questão palestina
A participação na posse da presidente
Dilma Rousseff permitiu ao presidente da Autoridade Nacional Palestina,
Mahmoud Abbas, agradecer a presidentes sulamericanos e somar Costa Rica,
Cuba, Nicarágua e Venezuela na relação dos países que reconheceram a
Palestina. Os primeiros foram Brasil, Argentina, Bolívia e Equador.
Depois, foi a vez do Uruguai. Abbas convidou outros países a seguirem
esse exemplo. Junto com as expressões contrárias a esses reconhecimentos
por parte do Departamento de Estado dos EUA, a chancelaria israelense
procurou, sem sucesso, contrapor as gestões palestinas. O artigo é de
Ignacio Klich.
Ignacio Klich – Revista Debate (Argentina) via Carta Maior
A visita ao Brasil de Mahmoud Abbas,
presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), em sua luta por
globalizar o reconhecimento do direito da Palestina por suas terras
ocupadas por Israel desde a guerra de 1967, confirmou a importância que a
América Latina dá a essa questão. Os reconhecimentos obtidos até aqui
são vistos por Abbas como um incentivo à reabertura da estancada
negociação com Israel, desde que o premier Benjamin Netanyahu concorde
em suspender a construção de novas edificações nestas áreas.
A participação na posse da presidente Dilma Rousseff permitiu ao titular da ANP agradecer a presidentes e outros representantes sulamericanos em Brasília e somar Costa Rica, Cuba, Nicarágua e Venezuela na relação dos países que reconheceram a Palestina. Cronologicamente, os primeiros foram Brasil, Argentina, Bolívia e Equador. Depois, foi a vez do Uruguai. Abbas convidou outros países a seguirem esse exemplo.
Além disso, a visita serviu para colocar a pedra fundamental da futura embaixada da Palestina em Brasília. Embora o Itamaraty tenha permitido em 1975 que a diplomacia palestina enviasse um representante ao Brasil, ainda sob o governo militar, e tenha precedido a Argentina no reconhecimento, a missão palestina em Buenos Aires tem sede própria há tempos. Ela foi concedida quando a Argentina tinha um alinhamento funcional com Washington durante o governo de Carlos Menem, e foi acompanhada pela rua Palestina, cruzando a avenida Estado de Israel, um símbolo portenho da convivência palestino-israelense. A delegação internacional logo obteve o estatuto de embaixada
Em 1947, a maioria da representação latino-americana na Assembleia Geral das Nações Unidas apoiou a divisão da Palestina, que, sob mandato britânico, existia há um quarto de século. A ONU acreditava que com o surgimento de Israel e de um Estado palestino se superaria a violenta contradição entre as aspirações nacionais judias e as dos árabes. Somente Cuba foi contra a proposta. Argentina, Chile, Colômbia, El Salvador, Honduras e México se abstiveram. Dado o apoio que Israel foi recolhendo na região a partir desse momento – maior que o obtido em outras regiões em desenvolvimento do mundo – não é estranho, então, que sua diplomacia esteja incomodada com os recentes êxitos palestinos na região.
Em uma tentativa de minimizar essas conquistas, porta vozes oficiais e alguns comentaristas procuram desqualificar esses reconhecimentos, equiparados automaticamente com uma desqualificação de Israel.
Segundo uma nota publicada em um jornal israelense, os países latino-americanos que reconheceram recentemente a Palestina teriam feito isso porque “lutam contra a hegemonia estadunidense, sem interesse algum em Israel”. Essa caracterização exclui aqueles governos mais ou menos sensíveis aos interesses de Washington, entre eles os do Cone Sul, com repetidas expressões favoráveis a Israel.
Em 1947, o plano de partição contou, entre outros apoios, com o voto positivo do outrora representante uruguaio na ONU, Enrique Rodríguez Fabregat, posterior integrante do grupo fundador da Frente Ampla. Antes de sua morte, em 1976, o diplomata revisou sua posição. Apesar de que, em 1956, a associação israelense com a guerra das potências coloniais (Inglaterra e França) contra o Egito começou a desencantá-lo, Rodríguez Fabregat, sem abdicar de seu apoio à criação de Israel, concluiu que a divisão não havia levado em conta os palestinos como deveria.
Apesar dos custos que teve ao assumir o nacionalismo palestino para concretizar suas postergadas aspirações, e apesar das terras perdidas e dos novos refugiados que surgiram após as guerras árabe-israelenses, está longe ser casual que o mundo árabe tenha sido refratário à solução dos dois estados, aprovada pela Organização de Libertação da Palestina em 1988, e pela Liga Árabe em 2002.
Resta saber os resultados de tal aceitação; entre eles, a delimitação dos dois estados. A ONU havia outorgado a Israel 55% da Palestina, fração que Israel ampliou de fato nas guerras de 1948-49 e em 1967. Por ser mais antigo, maior teria sido o provável desencanto de um Rodríguez Fabregat progressista, dada a crescente virada à direita de Israel desde 1977, ano em que o direitista Likud desbancou os trabalhistas como favoritos do eleitorado para formar o governo. A mais recente expulsão de cidadãos palestinos de Israel e a caça às bruxas movida contra ativistas de direitos humanos também compõem esse cenário.
Por outro lado, esse desencanto talvez permita explicar a aceitação do presidente uruguaio José Mujica, em setembro de 2010, de um prêmio da Organização Sionista e do município de Jerusalém, cujo titular é um dos principais promotores oficiais israelenses da questionada atividade de construção de casas em territórios em disputa. E, dois meses mais tarde, seu vice chanceler anunciaria o reconhecimento uruguaio da Palestina.
Novos apoios
Antes de voltar a Ramallah, Abbas tinha a esperança de que, no curto prazo, Chile e Paraguai poderiam se integrar à lista de mais de cem países que já reconheceram a Palestina. A quase uma semana de seu encontro com o presidente Sebastián Piñera, o Chile formalizou esse reconhecimento, deixando para outra ocasião a manifestação sobre as fronteiras entre Israel e Palestina. Identificar os limites do Estado palestino como os do período que antecedeu a guerra de 1967 – com efeito, parte das linhas de armistício de 1949 – significa reconhecer que a primeira expansão israelense é irreversível.
Junto com as expressões contrárias a esses reconhecimentos por parte do Departamento de Estado em Washington, a chancelaria israelense procurou, sem sucesso, contrapor as gestões palestinas. Nada ilustra melhor tal ineficácia do que o par de conversações telefônicas mantidas por Netanyahu com Piñera antes do reconhecimento chileno. Fontes chilenas também vaticinaram que Peru e El Salvador reconhecerão a Palestina em breve.
A chancelaria israelense teme que esse reconhecimento seja fomentado em Lima, em fevereiro, durante a III Cúpula América do Sul-Países Árabes (ASPA), diálogo iniciado pelo Brasil em 2005, como parte de seu interesse em ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança ampliado das Nações Unidas.
A situação deixaria a Colômbia, cuja chanceler já manifestou sua resistência a fazer tal coisa sem um acordo de paz palestino-israelense, como o único membro da ASPA a persistir em sua negativa durante 2011, enquanto a diplomacia palestina gestiona apoios em El Salvador, Guatemala, Honduras e México.
Por seu turno, Abbas previu que ninguém poderá antecipar o resultado de uma larga paralisação das negociações de paz. Para um parceiro trabalhista de Netanyahu, o ministro da Indústria e Comércio, Benjamin Bem Eliezer, essa estagnação pode determinar que Washington reconheça a Palestina, mediante negociações que delimitem ambos Estados, definindo também a repartição de Jerusalém e o tema dos refugiados. Um documento da União Europeia recomendou em dezembro último tratar Jerusalém oriental como a capital palestina. Embora Bem Eliezer não tenha falado em datas, uma ocasião para Washington poderia ser setembro próximo, quando se completa um ano do início de negociações por um acordo de paz, suspensas pela decisão de israelense de seguir construindo em territórios ocupados. Com ou seu reeleição de Barack Obama, o reconhecimento estadunidense pode ser mais fácil de imaginar depois das próximas eleições presidenciais – em sua ante sala os apoios de Israel tentam maximizar sua influência –, acompanhados, logo em seguida, da retirada de suas tropas do Iraque e do Afeganistão.
(*) Ignacio Klich é historiador, organizador de “Árabes e judeus na América Latina”, Século XXI, Editora Iberoamericana, Buenos Aires, 2006.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
A participação na posse da presidente Dilma Rousseff permitiu ao titular da ANP agradecer a presidentes e outros representantes sulamericanos em Brasília e somar Costa Rica, Cuba, Nicarágua e Venezuela na relação dos países que reconheceram a Palestina. Cronologicamente, os primeiros foram Brasil, Argentina, Bolívia e Equador. Depois, foi a vez do Uruguai. Abbas convidou outros países a seguirem esse exemplo.
Além disso, a visita serviu para colocar a pedra fundamental da futura embaixada da Palestina em Brasília. Embora o Itamaraty tenha permitido em 1975 que a diplomacia palestina enviasse um representante ao Brasil, ainda sob o governo militar, e tenha precedido a Argentina no reconhecimento, a missão palestina em Buenos Aires tem sede própria há tempos. Ela foi concedida quando a Argentina tinha um alinhamento funcional com Washington durante o governo de Carlos Menem, e foi acompanhada pela rua Palestina, cruzando a avenida Estado de Israel, um símbolo portenho da convivência palestino-israelense. A delegação internacional logo obteve o estatuto de embaixada
Em 1947, a maioria da representação latino-americana na Assembleia Geral das Nações Unidas apoiou a divisão da Palestina, que, sob mandato britânico, existia há um quarto de século. A ONU acreditava que com o surgimento de Israel e de um Estado palestino se superaria a violenta contradição entre as aspirações nacionais judias e as dos árabes. Somente Cuba foi contra a proposta. Argentina, Chile, Colômbia, El Salvador, Honduras e México se abstiveram. Dado o apoio que Israel foi recolhendo na região a partir desse momento – maior que o obtido em outras regiões em desenvolvimento do mundo – não é estranho, então, que sua diplomacia esteja incomodada com os recentes êxitos palestinos na região.
Em uma tentativa de minimizar essas conquistas, porta vozes oficiais e alguns comentaristas procuram desqualificar esses reconhecimentos, equiparados automaticamente com uma desqualificação de Israel.
Segundo uma nota publicada em um jornal israelense, os países latino-americanos que reconheceram recentemente a Palestina teriam feito isso porque “lutam contra a hegemonia estadunidense, sem interesse algum em Israel”. Essa caracterização exclui aqueles governos mais ou menos sensíveis aos interesses de Washington, entre eles os do Cone Sul, com repetidas expressões favoráveis a Israel.
Em 1947, o plano de partição contou, entre outros apoios, com o voto positivo do outrora representante uruguaio na ONU, Enrique Rodríguez Fabregat, posterior integrante do grupo fundador da Frente Ampla. Antes de sua morte, em 1976, o diplomata revisou sua posição. Apesar de que, em 1956, a associação israelense com a guerra das potências coloniais (Inglaterra e França) contra o Egito começou a desencantá-lo, Rodríguez Fabregat, sem abdicar de seu apoio à criação de Israel, concluiu que a divisão não havia levado em conta os palestinos como deveria.
Apesar dos custos que teve ao assumir o nacionalismo palestino para concretizar suas postergadas aspirações, e apesar das terras perdidas e dos novos refugiados que surgiram após as guerras árabe-israelenses, está longe ser casual que o mundo árabe tenha sido refratário à solução dos dois estados, aprovada pela Organização de Libertação da Palestina em 1988, e pela Liga Árabe em 2002.
Resta saber os resultados de tal aceitação; entre eles, a delimitação dos dois estados. A ONU havia outorgado a Israel 55% da Palestina, fração que Israel ampliou de fato nas guerras de 1948-49 e em 1967. Por ser mais antigo, maior teria sido o provável desencanto de um Rodríguez Fabregat progressista, dada a crescente virada à direita de Israel desde 1977, ano em que o direitista Likud desbancou os trabalhistas como favoritos do eleitorado para formar o governo. A mais recente expulsão de cidadãos palestinos de Israel e a caça às bruxas movida contra ativistas de direitos humanos também compõem esse cenário.
Por outro lado, esse desencanto talvez permita explicar a aceitação do presidente uruguaio José Mujica, em setembro de 2010, de um prêmio da Organização Sionista e do município de Jerusalém, cujo titular é um dos principais promotores oficiais israelenses da questionada atividade de construção de casas em territórios em disputa. E, dois meses mais tarde, seu vice chanceler anunciaria o reconhecimento uruguaio da Palestina.
Novos apoios
Antes de voltar a Ramallah, Abbas tinha a esperança de que, no curto prazo, Chile e Paraguai poderiam se integrar à lista de mais de cem países que já reconheceram a Palestina. A quase uma semana de seu encontro com o presidente Sebastián Piñera, o Chile formalizou esse reconhecimento, deixando para outra ocasião a manifestação sobre as fronteiras entre Israel e Palestina. Identificar os limites do Estado palestino como os do período que antecedeu a guerra de 1967 – com efeito, parte das linhas de armistício de 1949 – significa reconhecer que a primeira expansão israelense é irreversível.
Junto com as expressões contrárias a esses reconhecimentos por parte do Departamento de Estado em Washington, a chancelaria israelense procurou, sem sucesso, contrapor as gestões palestinas. Nada ilustra melhor tal ineficácia do que o par de conversações telefônicas mantidas por Netanyahu com Piñera antes do reconhecimento chileno. Fontes chilenas também vaticinaram que Peru e El Salvador reconhecerão a Palestina em breve.
A chancelaria israelense teme que esse reconhecimento seja fomentado em Lima, em fevereiro, durante a III Cúpula América do Sul-Países Árabes (ASPA), diálogo iniciado pelo Brasil em 2005, como parte de seu interesse em ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança ampliado das Nações Unidas.
A situação deixaria a Colômbia, cuja chanceler já manifestou sua resistência a fazer tal coisa sem um acordo de paz palestino-israelense, como o único membro da ASPA a persistir em sua negativa durante 2011, enquanto a diplomacia palestina gestiona apoios em El Salvador, Guatemala, Honduras e México.
Por seu turno, Abbas previu que ninguém poderá antecipar o resultado de uma larga paralisação das negociações de paz. Para um parceiro trabalhista de Netanyahu, o ministro da Indústria e Comércio, Benjamin Bem Eliezer, essa estagnação pode determinar que Washington reconheça a Palestina, mediante negociações que delimitem ambos Estados, definindo também a repartição de Jerusalém e o tema dos refugiados. Um documento da União Europeia recomendou em dezembro último tratar Jerusalém oriental como a capital palestina. Embora Bem Eliezer não tenha falado em datas, uma ocasião para Washington poderia ser setembro próximo, quando se completa um ano do início de negociações por um acordo de paz, suspensas pela decisão de israelense de seguir construindo em territórios ocupados. Com ou seu reeleição de Barack Obama, o reconhecimento estadunidense pode ser mais fácil de imaginar depois das próximas eleições presidenciais – em sua ante sala os apoios de Israel tentam maximizar sua influência –, acompanhados, logo em seguida, da retirada de suas tropas do Iraque e do Afeganistão.
(*) Ignacio Klich é historiador, organizador de “Árabes e judeus na América Latina”, Século XXI, Editora Iberoamericana, Buenos Aires, 2006.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
Fotos: Antonio Cruz/ABr
O Hezbollah assumirá o governo do Líbano?
Do sitio Esquerda Net
Governo libanês cai face a renúncia de 1/3 mais
um dos seus membros. Israel está a ser acusado de tentar dividir a
sociedade libanesa, para beneficiar da crise do governo Hariri.Por
Franklin Lamb, Countercurrents.
Outdoors do Hezbollah. Foto de ninjawil.
Sul de Beirute: “Caso ninguém tenha percebido, o governo Obama acaba de
dar o Líbano de presente ao Irão. Washington ofereceu anteriormente o
Iraque, o Afeganistão, o Golfo e o Paquistão. Que prova faltaria de que o
trunfo estratégico do Irão é a subserviência dos EUA a Israel? Para o
Irão, o controle que Israel tem sobre o governo dos EUA é um presente
que sempre chega”. Com esse comentário, o meu vizinho, o embaixador de
Direitos Humanos do Líbano Ali Khalil declarou que a hegemonia dos EUA
na Região desce por um plano inclinado, e a manobra de ontem no Líbano
provavelmente acelerou a retirada dos norte-americanos.
Parece que os meus outros vizinhos no sul de Beirute foram para a cama
mais cedo na noite depois dos acontecimentos que marcaram o colapso do
governo libanês apoiado por EUA, pelos sauditas e por Israel. Alguns,
como o americano e o libanês com quem divido o quarto, planeiam uma
rápida evacuação, no caso dos nossos amigos do Hezbollah que cuidam da
segurança da rua baterem à porta, com o sinal combinado. Duas batidas
rápidas e o grito de “Yalla!” (Vamos, vamos!) e será hora de partir para
o norte, depressa, sem olhar para trás. O motivo disso é que, como
muitos aqui, eles temem que Israel aproveite essa mais recente crise do
governo libanês para novamente invadir o Líbano.
Na passada quinta-feira, a energia (e a Internet) fornecida pelo
“governo” foi cortada das 10 da manhã às 2 da tarde e outra vez das 6 da
tarde até meia-noite. Cortes diários de pelo menos dez horas são
normais no sul e no norte do bairro “chique” pró-EUA e sauditas de
Hamra, onde são experienciados cortes diários de três horas. Viver
muitas horas à luz de velas faz os rumores mais sem fundamento soarem
verosímeis. “As forças armadas do Líbano, do Hezbollah e aliados da
Turquia, da Síria, da Jordânia, de Israel e do Irão estão em prontidão.
Os americanos vão mandar batalhões que estão no Iraque!”, diz o rapaz
que trabalha numa loja próxima do meu apartamento. Não pude deixar de
observar que os adolescentes que andam sempre pelas calçadas parecem ter
desaparecido. Até o rapaz da loja onde carrego o meu telefone estava
impaciente: “por favor, depressa”, disse ele. “Tenho um compromisso e
preciso fechar a loja”.
O assassinato do primeiro-ministro Rafik Hariri
A actual crise começou em 14 de fevereiro de 2005, “Dia dos Namorados”,
quando foi assassinado o primeiro-ministro Rafik Hariri e outros 20. O
governo Bush declarou a Síria culpada pelo atentado e viu uma
oportunidade para forçar o regime de Assad a assumir uma posição difícil
em relação ao Irão, principal inimigo dos EUA na Região, empurrando-o
contra a Resistência Nacional Libanesa liderada pelo Hezbollah.
Um dos advogados a serviço do Departamento de Estado da secretária
Condoleezza Rice apareceu com a ideia de usar o Conselho de Segurança da
ONU, que criaria um Tribunal Especial para o Líbano [ing. Special Tribunal for Lebanon (STL)],
para investigar o caso, processar os assassinos e acusar a Síria de
trabalhar contra os projectos dos EUA e de Israel na Região.
Um detalhe que de início foi ignorado, mas adiante se tornou num
presente dos céus a favor dos interesses de Israel e do governo Bush,
foi o boato difundido pelo Tribunal Especial, segundo o qual havia
suspeitas de que membros do Hezbollah talvez estivessem envolvidos nos
assassinatos. Perante esse boato, Israel e os EUA mudaram abruptamente
de posição e começaram a usar o recém-constituído Tribunal Especial para
livrar-se do Hezbollah de uma vez por todas, além de usá-lo também
contra a Síria, certos de que a Síria também seria acusada.
A pressão contra o Hezbollah levou o Partido a condenar o que tem
chamado de falsas testemunhas e a exigir que o governo libanês
investigasse também os investigadores e suas testemunhas. Os inimigos do
Hezbollah passaram a defender o tribunal, mesmo apesar do risco que se
criava para a estabilidade do Líbano. Depois de cerca de 14 meses a
insistir para que o governo de Saad Hariri reconsiderasse seriamente as
suas posições em relação ao Tribunal Especial, a oposição liderada pelo
Hezbollah apresentou um ultimato à maioria: ou convocava-se reunião do
Gabinete para o dia 12 de Janeiro de 2011 para discutir o Tribunal
Especial e a sua actividade dentro da política libanesa, ou a oposição
renunciaria em bloco, o que levaria à queda do governo Hariri.
O Hezbollah e os seus aliados queriam que o primeiro-ministro Hariri
reunisse o Gabinete para votar a suspensão da subvenção de 49% que o
Líbano paga como parte dos custos de funcionamento do Tribunal Especial;
a retirada, do Tribunal Especial, dos juízes libaneses que lá
trabalham; o fim da cooperação entre o Líbano e o Tribunal Especial; e a
decisão de processar as “falsas testemunhas” ouvidas pelo Tribunal
Especial na investigação conduzida pela ONU sobre o assassinato de Rafik
Hariri.
Sob enorme pressão de Washington, Paris e Riade, Saad Hariri opôs-se ao
que a oposição pedia. A oposição, então, renunciou. Nos termos do art.
69º da Constituição do Líbano, a renúncia de 1/3 mais um dos membros do
Gabinete determina a queda do governo (30 membros). Foi a primeira vez,
na turbulenta história política do Líbano, que um governo cai por efeito
de renúncia de 1/3 mais um dos membros.
Para a renúncia de todo o gabinete, que derrubaria o governo pró-EUA de
Hariri, seria necessário que, além dos dez membros do Hezbollah, mais
um membro do Gabinete também renunciasse. O principal assessor-político
do secretário-geral do Hezbollah Hassan Nasrallah, Hussein Khalil,
procurou então o representante do Presidente Suleiman no Gabinete,
Sayyed Hussein. Khalil apresentou a Hussein as saudações de Nasrallah e a
sua esperança de que Hussein decidisse baseado em sua consciência.
Hussein apresentou imediatamente sua renúncia e, enquanto o
primeiro-ministro Hariri conversava na Casa Branca com o presidente
Obama, o seu governo, no Líbano, deixava de existir.
O que significa a queda do governo Hariri, no curto prazo
Os actores regionais reagiram mais ou menos conforme o previsto: os EUA
acusaram o Irão, a Síria e o Hezbollah de “chantagem”; os franceses
avisaram a Síria de que seria responsabilizada pela violência no Líbano,
caso acontecesse; e os britânicos alertaram para os riscos de longo
prazo. O ministro das Relações Externas da Grã-Bretanha William Hague
disse, em declaração: “É um desenvolvimento de extrema gravidade que
pode vir a ter graves implicações para o Líbano e para a estabilidade da
Região”. Outro diplomata britânico acrescentou ontem: “Terrível. Algum
dia conseguiremos resolver esse problema?”.
Funcionários do ministério de Negócios Estrangeiros de Israel disseram
que “acompanhamos atentamente os acontecimentos no Líbano depois das
renúncias” e que “Os libaneses entendem que houve uma tentativa, por um
grupo de extremistas, de perturbar a paz, e que essa tentativa pode vir a
revelar-se uma jogada muito perigosa” – segundo o Canal 10 da televisão
de Israel. Israel está a ser acusado hoje, no Líbano, de tentar dividir
a sociedade libanesa, para beneficiar da crise do governo Hariri.
Quarta-feira, depois de sequestrar Sharbel Khoury, pastor que vive
próximo de Rmeish (e que foi libertado 24 horas depois) a marinha de
Israel também invadiu águas do Líbano. Na passada quinta-feira, aviões
israelitas sobrevoaram Balbeque, Nabatiê e Marjun. Essas incursões
configuram a 7.269ª violação, por parte de Israel, da soberania
territorial do Líbano, desde agosto de 2006, quando o Conselho de
Segurança da ONU aprovou a Resolução n. 1.701.
Protestos da UNIFIL e da ONU não têm qualquer efeito sobre Israel, e
Washington permanece muda e não protesta contra as repetidas violações,
por Israel, da soberania territorial do Líbano.
Membros do Movimento Patriótico Livre [ing.Free Patriotic Movement (FPM)]
e um dos apoiantes do Hezbollah, Jebran Bassil, que foi Ministro da
Energia até renunciar ontem, culpou Washington pelo fracasso dos
esforços dos sírios e sauditas para impedir que o Gabinete renunciasse.
“O outro lado curvou-se às pressões externas, sobretudo às pressões
norte-americanas, ignorando os desejos e os conselhos de sauditas e
sírios”, disse Bassil.
Por sua vez, o líder do Partido Socialista Progressista [ing. Progressive Socialist Party (PSP)]
Walid Jumblatt pareceu concordar com o FPM e atribuiu às potências
ocidentais – que chamou de “forças do obscurantismo” – o fracasso da
mediação tentada pela Arábia Saudita e pela Síria: “Tudo leva a crer que
forças do obscurantismo envolveram-se no processo e boicotaram a
iniciativa de sírios e sauditas, que visava a bloquear a repercussão
negativa das acusações feitas pelo Tribunal Especial”.
O líder das Forças Libanesas Samir Geagea culpou os adversários do
Movimento 8 de Março por desejar o que chamou de “poderes stalinistas”,
acusando-os de “querer roubar direitos legais do presidente e do
primeiro-ministro”.
Qual o futuro do Hezbollah?
O Hezbollah liderava a oposição, resultado das últimas eleições, que
lhe deu maioria no Parlamento. Essa maioria autoriza o Partido da
Resistência a apresentar candidato próprio ao posto de primeiro-ministro
durante as consultas parlamentares cujo início o presidente deve
anunciar em breve com vistas à formação de novo governo. Na passad
quinta-feira, o líder do Hezbollah no Parlamento, o deputado Mohammed
Raad, anunciou que a oposição indicará “um nome com história na
resistência libanesa para chefiar o novo governo.”
Há quem preveja que o Hezbollah sugerirá o nome do veterano líder
sunita Omar Karami, personalidade discreta entre os moderados, que goza
de forte apoio popular, dos progressistas e dos sírios.
O que quer que decida fazer, o Hezbollah pode muito bem levar o seu
tempo para ponderar as grandes responsabilidades que envolvem o
movimento de resistência caso decida governar o Líbano. Alguns dos
apoiantes do Partido da Resistência têm insistido para que o Partido
assuma o gigantesco desafio e implemente o projecto exposto no Manifesto
de 2009 e a plataforma eleitoral já divulgada (combate à corrupção
‘mafiosa’ que mina algumas das lideranças políticas libanesas). Várias
organizações não-governamentais libanesas pedem que o Hezbollah aposte
mais na defesa do frágil meio ambiente do Líbano, que resolva de uma vez
os graves problemas de água, electricidade e infra-estrutura, e que
permita que os cidadãos libaneses decidam, pelo voto, e, pelo voto, dêem
o necessário aval político à causa da Resistência.
Outros continuam a defender que o Hezbollah assuma o governo para pôr
imediatamente um fim à vergonha do Líbano e de todos os árabes e
assegurar os direitos humanos básicos – habitação digna e trabalho digno
– aos refugiados palestinos, no Líbano e em toda a Região. Se o
Hezbollah assumir o governo político do Líbano, as perspectivas de os
palestinos alcançarem esses direitos elementares que hoje lhes são
negados melhorarão muito.
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu
Franklin Lamb é um pesquisador do Líbano e recebe e-mails em: fplamb@gmail.com
terça-feira, 18 de janeiro de 2011
Racismo: ninguém sente, ninguém vê, ninguém sabe o que é
Diante de tantos anos de negação e silêncio, é preciso começar a entender que os preconceitos, como o racismo, são produtos da cultura na qual estão inseridos, e como tais adaptam-se às condições de manifestação aceitáveis e estabelecidas pela sociedade, manifestando-se às claras ou de forma velada e simbólica.
Por Ana Maria Gonçalves na Revista Fórum
Diante da revelação feita por um famoso cantor
brasileiro, negro, de que sua filha de seis anos estava sendo
discriminada durante a aula em uma das escolas de balé mais tradicionais
de São Paulo, com as outras alunas se recusando a dar as mãos para ela,
ou do depoimento de uma menina, também de seis anos, aluna de escola
pública, no qual conta que as coleguinhas não querem brincar com ela
durante o recreio porque sentem nojo por ela ser negra, resta-nos parar e
perguntar: a quantas situações de humilhação essas e outras crianças
continuarão a ser submetidas pela vida afora, antes que a sociedade tome
para si a responsabilidade de discutir, entender e combater o racismo?
O racismo, como o percebemos hoje, é uma instituição relativamente recente na história na humanidade. Até por volta da Idade Média, os principais fatores de discriminação eram religiosos, políticos ou referentes à nacionalidade e à linguagem do indivíduo. No século XV, quando os europeus desembarcaram na África, e principalmente com o início do tráfico negreiro, usaram a ciência a favor do colonialismo e desenvolveram teorias de superioridade evolutiva, baseadas em diferenças biológicas, que justificavam seus interesses de expansão e poder. Estava criado o racismo etnocêntrico, fundamentado em doutrinas bíblicas, filosóficas e científicas que não resistiram à evolução dos tempos, mas que deixaram marcas indeléveis e profundas nas sociedades que as usaram para justificar a escravidão, como é o caso da sociedade brasileira. O conceito de "raça" – e termos derivados – hoje em dia é apenas político e social, e se justifica porque os traços físicos (cabelo, cor da pele, formato de nariz e boca etc) característicos da população negra ainda estão ligados à percepção negativa historicamente construída.
No final do século XIX, com a abolição da escravatura e ainda sob forte influência das teses de superioridade europeia, começa a ser colocado em prática um projeto de construção de uma nova nação brasileira, que deveria ser melhorada através do embranquecimento de seu povo. Acreditava-se que, com o passar dos anos, marginalizada, inferiorizada, difamada e abandonada à própria sorte, a população negra desapareceria. Até mesmo o acesso à educação e a possibilidade de conseguir trabalho lhe foram negados, com o governo dando total prioridade a políticas que subsidiaram a vinda de mais de 3 milhões de imigrantes europeus para o Brasil. Algumas décadas mais tarde, a teoria do embranquecimento deu lugar à da miscigenação, que acabou criando um dos mitos mais prejudiciais à luta contra o racismo: o mito da democracia racial. Foi ele que, durante décadas, impediu o Brasil de se tornar um país realmente democrático, com tratamento e oportunidade iguais para todos, ao negar reconhecimento a um problema que atinge mais da metade da nossa população.
Diante de tantos anos de negação e silêncio, é preciso começar a entender que os preconceitos, como o racismo, são produtos da cultura na qual estão inseridos, e como tais adaptam-se às condições de manifestação aceitáveis e estabelecidas pela sociedade, manifestando-se às claras ou de forma velada e simbólica. É por isso que apenas a razão, que nos levou a criar leis que criminalizam atitudes racistas e algumas ações afirmativas, não será suficiente para modificar o imaginário e as representações coletivas negativas que se tem do negro na nossa sociedade, como observa o antropólogo e professor Kabengele Munanga na apresentação do livro Superando o racismo na escola. Segundo ele, "considerando que esse imaginário e essas representações, em parte situados no inconsciente coletivo, possuem uma dimensão afetiva e emocional, dimensão onde brotam e são cultivadas as crenças, os estereótipos e os valores que codificam as atitudes, é preciso descobrir e inventar técnicas e linguagens capazes de superar os limites da pura razão e de tocar no imaginário e nas representações. Enfim, capazes de deixar aflorar os preconceitos escondidos na estrutura profunda do nosso psiquismo".
Se hoje já se admite que o Brasil é um país racista, é preciso admitir também que nossos pensamentos e atitudes são condicionados por essa cultura e essa ideologia racista, pois crescemos introjetando e reproduzindo o que já está estabelecido socialmente. Para mostrar como isso funciona, um interessante trabalho, desenvolvido no departamento de Psicologia da Universidade Federal de Sergipe, analisa pesquisa realizada com crianças de 5 a 8 anos. Foi pedido a essas crianças que desenhassem uma criança branca e uma criança negra e as classificassem, em termos de preferência, em relação a cinco categorias: riqueza, beleza, inteligência, proximidade e contato. O resultado foi um alto índice de racismo, com a criança negra sendo fortemente rejeitada em todas as categorias. O que o estudo queria mostrar é que as crianças são abertamente preconceituosas, e que essa característica perde força a partir da maturação das estruturas cognitivas que permitem que ela deixe de julgar as pessoas com quem se relaciona apenas pela aparência e passe a levar em conta conceitos como bondade ou amizade. Acabou mostrando também que o racismo, longe de desaparecer com a idade e a necessidade de socialização, caso não haja nenhuma iniciativa nesse sentido por parte de pais e/ou educadores, é introjetado e velado pelo aprendizado das normas sociais vigentes, passando a se manifestar de forma indireta e, em muitos casos, inconsciente. O racismo volta então a habitar e alimentar o inconsciente coletivo, que trata de reproduzi-lo de uma geração para outra, tornando-o cada vez mais insidioso, difícil de provar e combater.
Por isso, cabe tão bem a pergunta da campanha Diálogos Contra o Racismo – Pela Igualdade Racial: onde você guarda seu racismo? Complemento com mais uma: o que você tem feito para não deixá-lo de herança para seus filhos?
O racismo, como o percebemos hoje, é uma instituição relativamente recente na história na humanidade. Até por volta da Idade Média, os principais fatores de discriminação eram religiosos, políticos ou referentes à nacionalidade e à linguagem do indivíduo. No século XV, quando os europeus desembarcaram na África, e principalmente com o início do tráfico negreiro, usaram a ciência a favor do colonialismo e desenvolveram teorias de superioridade evolutiva, baseadas em diferenças biológicas, que justificavam seus interesses de expansão e poder. Estava criado o racismo etnocêntrico, fundamentado em doutrinas bíblicas, filosóficas e científicas que não resistiram à evolução dos tempos, mas que deixaram marcas indeléveis e profundas nas sociedades que as usaram para justificar a escravidão, como é o caso da sociedade brasileira. O conceito de "raça" – e termos derivados – hoje em dia é apenas político e social, e se justifica porque os traços físicos (cabelo, cor da pele, formato de nariz e boca etc) característicos da população negra ainda estão ligados à percepção negativa historicamente construída.
No final do século XIX, com a abolição da escravatura e ainda sob forte influência das teses de superioridade europeia, começa a ser colocado em prática um projeto de construção de uma nova nação brasileira, que deveria ser melhorada através do embranquecimento de seu povo. Acreditava-se que, com o passar dos anos, marginalizada, inferiorizada, difamada e abandonada à própria sorte, a população negra desapareceria. Até mesmo o acesso à educação e a possibilidade de conseguir trabalho lhe foram negados, com o governo dando total prioridade a políticas que subsidiaram a vinda de mais de 3 milhões de imigrantes europeus para o Brasil. Algumas décadas mais tarde, a teoria do embranquecimento deu lugar à da miscigenação, que acabou criando um dos mitos mais prejudiciais à luta contra o racismo: o mito da democracia racial. Foi ele que, durante décadas, impediu o Brasil de se tornar um país realmente democrático, com tratamento e oportunidade iguais para todos, ao negar reconhecimento a um problema que atinge mais da metade da nossa população.
Diante de tantos anos de negação e silêncio, é preciso começar a entender que os preconceitos, como o racismo, são produtos da cultura na qual estão inseridos, e como tais adaptam-se às condições de manifestação aceitáveis e estabelecidas pela sociedade, manifestando-se às claras ou de forma velada e simbólica. É por isso que apenas a razão, que nos levou a criar leis que criminalizam atitudes racistas e algumas ações afirmativas, não será suficiente para modificar o imaginário e as representações coletivas negativas que se tem do negro na nossa sociedade, como observa o antropólogo e professor Kabengele Munanga na apresentação do livro Superando o racismo na escola. Segundo ele, "considerando que esse imaginário e essas representações, em parte situados no inconsciente coletivo, possuem uma dimensão afetiva e emocional, dimensão onde brotam e são cultivadas as crenças, os estereótipos e os valores que codificam as atitudes, é preciso descobrir e inventar técnicas e linguagens capazes de superar os limites da pura razão e de tocar no imaginário e nas representações. Enfim, capazes de deixar aflorar os preconceitos escondidos na estrutura profunda do nosso psiquismo".
Se hoje já se admite que o Brasil é um país racista, é preciso admitir também que nossos pensamentos e atitudes são condicionados por essa cultura e essa ideologia racista, pois crescemos introjetando e reproduzindo o que já está estabelecido socialmente. Para mostrar como isso funciona, um interessante trabalho, desenvolvido no departamento de Psicologia da Universidade Federal de Sergipe, analisa pesquisa realizada com crianças de 5 a 8 anos. Foi pedido a essas crianças que desenhassem uma criança branca e uma criança negra e as classificassem, em termos de preferência, em relação a cinco categorias: riqueza, beleza, inteligência, proximidade e contato. O resultado foi um alto índice de racismo, com a criança negra sendo fortemente rejeitada em todas as categorias. O que o estudo queria mostrar é que as crianças são abertamente preconceituosas, e que essa característica perde força a partir da maturação das estruturas cognitivas que permitem que ela deixe de julgar as pessoas com quem se relaciona apenas pela aparência e passe a levar em conta conceitos como bondade ou amizade. Acabou mostrando também que o racismo, longe de desaparecer com a idade e a necessidade de socialização, caso não haja nenhuma iniciativa nesse sentido por parte de pais e/ou educadores, é introjetado e velado pelo aprendizado das normas sociais vigentes, passando a se manifestar de forma indireta e, em muitos casos, inconsciente. O racismo volta então a habitar e alimentar o inconsciente coletivo, que trata de reproduzi-lo de uma geração para outra, tornando-o cada vez mais insidioso, difícil de provar e combater.
Por isso, cabe tão bem a pergunta da campanha Diálogos Contra o Racismo – Pela Igualdade Racial: onde você guarda seu racismo? Complemento com mais uma: o que você tem feito para não deixá-lo de herança para seus filhos?
Povo Qom luta por terra na Argentina
Elaine Tavares no Brasil de Fato
O
Chaco argentino é uma região dura. Ali, nos meses de verão, a sensação
térmica pode passar dos 50 graus. Poucos são aqueles que se atrevem a
sair de casa no horário que vai das 10 às 16 horas. Tudo parece derreter
e a umidade se agarra nos ossos, tornando a atmosfera quase
irrespirável. É nessa extensão de terra, fronteira com o Paraguai, que
vivem ainda dezenas de etnias originárias, do chamado grupo Tobas (do
guarani tová, que significa rosto, cara, frente). Esta expressão,
depreciativa, foi dada pelos conquistadores, ainda que buscada da língua
local, porque estas etnias tinham por costume raspar a parte dianteira
da cabeça. Atualmente, cada uma delas reivindica seu verdadeiro nome,
como é o caso dos Qom. Seu território ancestral se esparrama pelo
Paraguai e parte da Bolívia. Assim como todos os originários desta
imensa Abya Yala estes povos também tiveram de vivenciar a invasão de
seus espaços sagrados, a destruição de sua forma de vida e o quase
extermínio. Mas, também seguindo o rastro do grande movimento que hoje
percorre as veias abertas destas terras do sul do Rio Bravo, estão
novamente de pé, reivindicando direitos e fazendo ecoar suas vozes nas
selvas de concreto erguidas pelos conquistadores.
Hoje, os Qom,
uma das etnias que habitam aquela região, estão fincados no meio do
mini-centro de Buenos Aires, na Avenida 9 de julho, com suas bandeiras
coloridas, suas canções, sua língua e suas demandas. Eles decidiram
montar ali um acampamento para protestar contra os abusos que seguem
sendo cometidos pelos governos e pelos empreendimentos privados, que
insistem em roubar suas poucas terras e empurrá-los para a morte.
A
movimentação começou na região de Formosa, cidade de Clorinda, na
comunidade La Primavera, reduto originário dos Qom, quando o governo
provincial de Gildo Insfran (acusado de racista pelos movimentos
sociais) enviou a polícia para retirar as famílias que lá vivem, sob a
alegação de que iria construir ali um Instituto Universitário. As
famílias não aceitaram a expulsão e decidiram resistir, trancando a
estrada, evitando assim a entrada das máquinas que tinham sido enviadas
pela empresa que deverá construir a universidade privada. No conflito
morreu Roberto Lopez, de 53 anos, e outro ficou gravemente ferido,
morrendo depois no hospital da região. Vinte e nove pessoas acabaram
presas, entre elas mulheres com seus bebês.
Segundo Rubén Días, um
dos representantes do Qom em Buenos Aires, tão logo se deu o conflito, a
comunidade recebeu o apoio de várias etnias amigas e próximas tais como
os mapuche, aymaras, quéchuas e collas. “Os nossos companheiros sabem,
como nós mesmos, que há uma lei que reconhece aquele território como
nosso. Não há como alguma empresa ou o governo agora querer a terra. Ela
é nossa”. Hoje, vivem naquela área mais de 800 famílias Qom, perfazendo
cinco mil pessoas, embora toda a etnia espalhada por reservas e cidades
conte com mais de 60 mil almas. “Nós nunca fomos vistos pelo governo
provincial, não temos água, luz, hospital ou caminhos. Mas, agora, o
poder quer nosso território. Não vamos permitir que isso aconteça, vamos
lutar”.
O acampamento no centro de Buenos Aires visa pressionar o
governo federal, e eles estão há meses tentando uma audiência com a
presidente Cristina Kirchner, coisa que ainda não aconteceu, mesmo tendo
os integrantes realizado uma greve de fome de 30 de dezembro a 12 de
janeiro, que foi encerrada depois de uma visita de um representante do
governo. Este lhes assegurou que a questão da documentação das terras
seria resolvida, mas até agora nada foi feito. Pelo contrário, a
ocupação de terras indígenas por empresas privadas sob a ação da polícia
segue acontecendo. “Esta semana teve outro desalojo, para você ver, por
isso essa luta não é só da comunidade Primavera, é de todos nós,
originários”. Días espera que a luta exposta bem no centro da capital
possa enternecer o coração da presidente Cristina e que ela exija dos
governos provinciais o cumprimento da lei que dá aos originários o
direito a desfrutar do seu território. “Nós não queremos essa vida aqui
na cidade, queremos viver na nossa terra. Lá, nosso supermercado não
exige dinheiro, é a pesca, a caça, coisa que podemos fazer sozinhos, sem
precisar pagar a ninguém. Não estamos acostumados a pedir coisas para
comer, a gente faz isso em comunidade”.
Rubén Días espera que o
governo respeite a luta de toda a sua gente que, desde a conquista, vem
lutando para sobreviver com dignidade. “Estamos reclamando apenas o que é
nosso. Essa terra é do nosso povo. Só saímos daqui quando o povo Qom
entender que já está cumprida a nossa missão, com o devido respeito à
lei que nos garante a terra. Aqui ninguém é contra o governo. Só
queremos o que é nosso”.
A comunidade denuncia ainda o completo
desrespeito à pátria e a sua cultura, na medida em que os policiais que
atacaram o povo Qom ainda queimaram as bandeiras da Argentina e a
sagrada Wiphala, dos originários. Os povos da região do Chaco são
reconhecidamente povos guerreiros e lutaram sem tréguas contra a
tentativa de aculturação pelo homem branco, tanto que em 1858 quase
invadiram a cidade de Santa Fé, sendo reprimidos violentamente pelo
exército argentino. Em 1919 voltaram a se rebelar e mais uma vez foram
massacrados, com mais de 200 mortes no chamado “massacre de Napalmí”.
Hoje, eles voltam às ruas, armados apenas de sua inquebrantável coragem
chaqueana e esperam que não haja mais massacres, mas sim o
reconhecimento de sua luta e cultura.
Elaine Tavares é jornalista
Homofobia à prova
Do sitio Agora Binhí
Está
em processo de aprovação um “Kit” bastante polêmico. Trata-se do kit
contra a homofobia, pejorativamente apelidado de “kit gay”. O assunto
começou a ganhar visibilidade da pior forma possível e de uma maneira
invertida (a informação distorcida vindo à tona), como muitos assuntos
da temática LGBT são tratados.
No dia 23/11/2010, foi realizado o seminário “Escola Sem Homofobia” na Câmara dos Deputados, proposto pelas Comissões de Direitos Humanos e Minorias, Legislação Participativa e Educação e Cultura. Porém, eis que surge o deputado federal Jair Bolsonaro, do Partido Progressista do Estado do Rio de Janeiro, nessa história. No dia 30/11/2010, o deputado fez um discurso nas etapas iniciais da sessão plenária da Câmara, no qual soltou a seguinte pérola:
“Atenção, pais de alunos de 7, 8, 9 e 10 anos, da rede pública: no ano que vem, seus filhos vão receber na escola um kit intitulado Combate à Homofobia. Na verdade, é um estímulo ao homossexualismo, à promiscuidade. Esse kit contém DVDs com duas historinhas. Seus filhos de 7 anos vão vê-las no ano que vem, caso não tomemos uma providência agora (...)Esses gays e lésbicas querem que nós entubemos, como exemplo de comportamento, a sua promiscuidade. Isso é uma coisa extremamente séria(...)Eu não quero isso para a minha neta, para o meu neto!Apelo a todos para que não levem para a galhofa a imoralidade que a Comissão de Direitos Humanos e Minorias está patrocinando nesta Casa. Isso, no meu entender, é o maior escândalo de que se tem conhecimento no Brasil atual. Esse é o apelo que faço a todos.”.
O projeto Escola sem Homofobia é um braço do programa Brasil sem Homofobia. Um grupo de trabalho foi criado para discutir a questão da homofobia em ambiente escolar. É composto por gestores do MEC (Ministério da Educação) e ONG’s como a ABGLT, Ecos – Comunicação em Sexualidade, Pathfinder, Reprolatina, Galé International , entre outras. A primeira ação do grupo foi realizar uma pesquisa nacional para diagnosticar a situação das escolas públicas brasileiras no que diz respeito da homofobia.
A pesquisa foi realizada em 11 capitais: Manaus, Porto Velho, Recife, Natal, Goiânia, Cuiabá, São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Curitiba. Os resultados não foram nada animadores! Dentre eles, as conseqüências da homofobia relatadas foram: tristeza; depressão; baixa autoestima; perda de rendimento escolar; evasão escolar; violência e suicídio. É mole ou quer mais?
Os resultados escancararam uma realidade que muitos LGBT’s já conhecem na pele, infelizmente: a escola pública é um ambiente muito hostil à diversidade sexual, seja quanto a sua manifestação até a sua discussão.
Toni Reis, presidente da ABGLT explica na síntese, o que é o tal kit: “A partir desta pesquisa nós fizemos um kit que vai ser distribuído para 6 mil escolas de todo o Brasil. São seis informativos. São 5 vídeos que tratam da questão do que é uma lésbica, do que é uma pessoa travesti, do que é uma pessoa transexual, do que é uma pessoa gay, como se dá essa questão da homofobia, quais os problemas da homofobia.
"Nós temos os manuais e o guia para o professor trabalhar isso na sala de aula de forma bastante responsável. O que nós queremos é que esse material não faça apologia à homossexualidade, mas que faça apologia à cidadania e o respeito aos direitos humanos”.
Vejam as sinopses dos filmes transcritas pelo Portal IG e Correio Braziliense:
“No vídeo intitulado Encontrando Bianca, um adolescente de aproximadamente 15 anos se apresenta como José Ricardo, nome dado pelo pai, que era fã de futebol. O garoto do filme, no entanto, aparece caracterizado como uma menina, como um exemplo de uma travesti jovem. Em seu relato, o garoto conta que gosta de ser chamado de Bianca, pois é nome de sua atriz preferida e reclama que os professores insistem em chamá-lo de José Ricardo na hora da chamada”. (Em “Material didático contra homofobia mostra adolescente que virou travesti”; Correio Braziliense, 2010.
“Um adolescente que tentava gostar de futebol para agradar o pai, mas nunca conseguiu se sair bem no esporte é o pano de fundo da narrativa do curta “Encontrando Bianca”, produzido por uma empresa para o Ministério da Educação (MEC)”. (Em “Vídeo que trata de homofobia a adolescentes gera ira de deputado”; Portal IG, 2010.
“Os outros dois filminhos – que têm cerca de cinco minutos de duração – falam de outros temas relacionados à diversidade sexual. “Torpedo” conta a história de duas amigas que se apaixonam. Em uma festa, elas trocam carinhos (mãos no cabelo uma da outra, troca de olhares e sorrisos, um abraço mais carinhoso) e são fotografadas por colegas, que publicam as fotos na internet e fazem chacotas das duas. Elas decidem, então, assumir o que sentem. O vídeo termina com um abraço entre elas no pátio do colégio.”
O último, chamado de “Probabilidade”, mostra as dúvidas e conflitos vividos por um jovem de 15 anos, Leonardo. Quando se descobre vivendo o primeiro amor, o rapaz tem de mudar de cidade, por conta do trabalho do pai. Na nova morada, faz amizade com um menino que é muito atencioso com ele desde o primeiro dia de aula. Aos poucos, os dois se tornam amigos e viram alvos de piada, porque o amigo, chamado Mateus, é gay. Leonardo sabe disso, mas não se importa. Nunca houve nada entre os dois. Certo dia, eles vão a uma festa, e Mateus apresenta um primo a Leonardo. Os dois conversam a noite toda e descobrem afinidades. Na hora de ir embora, Leonardo sente vontade de beijar o rapaz e se espanta com isso, mas nada acontece. Já em casa, passa a noite pensando nos próprios sentimentos. No dia seguinte, durante a aula, observa o quanto também se sente atraído por uma amiga. Nesse instante, ele “percebe” que não quer lutar contra o que sente e acha que pode gostar de pessoas, independentemente do sexo”. (Em “Vídeo que trata de homofobia a adolescentes gera ira de deputado”; Portal IG, 2010)
Veja trecho do seminário e o filme “Econtrando Bianca”...
No dia 23/11/2010, foi realizado o seminário “Escola Sem Homofobia” na Câmara dos Deputados, proposto pelas Comissões de Direitos Humanos e Minorias, Legislação Participativa e Educação e Cultura. Porém, eis que surge o deputado federal Jair Bolsonaro, do Partido Progressista do Estado do Rio de Janeiro, nessa história. No dia 30/11/2010, o deputado fez um discurso nas etapas iniciais da sessão plenária da Câmara, no qual soltou a seguinte pérola:
“Atenção, pais de alunos de 7, 8, 9 e 10 anos, da rede pública: no ano que vem, seus filhos vão receber na escola um kit intitulado Combate à Homofobia. Na verdade, é um estímulo ao homossexualismo, à promiscuidade. Esse kit contém DVDs com duas historinhas. Seus filhos de 7 anos vão vê-las no ano que vem, caso não tomemos uma providência agora (...)Esses gays e lésbicas querem que nós entubemos, como exemplo de comportamento, a sua promiscuidade. Isso é uma coisa extremamente séria(...)Eu não quero isso para a minha neta, para o meu neto!Apelo a todos para que não levem para a galhofa a imoralidade que a Comissão de Direitos Humanos e Minorias está patrocinando nesta Casa. Isso, no meu entender, é o maior escândalo de que se tem conhecimento no Brasil atual. Esse é o apelo que faço a todos.”.
O projeto Escola sem Homofobia é um braço do programa Brasil sem Homofobia. Um grupo de trabalho foi criado para discutir a questão da homofobia em ambiente escolar. É composto por gestores do MEC (Ministério da Educação) e ONG’s como a ABGLT, Ecos – Comunicação em Sexualidade, Pathfinder, Reprolatina, Galé International , entre outras. A primeira ação do grupo foi realizar uma pesquisa nacional para diagnosticar a situação das escolas públicas brasileiras no que diz respeito da homofobia.
A pesquisa foi realizada em 11 capitais: Manaus, Porto Velho, Recife, Natal, Goiânia, Cuiabá, São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Curitiba. Os resultados não foram nada animadores! Dentre eles, as conseqüências da homofobia relatadas foram: tristeza; depressão; baixa autoestima; perda de rendimento escolar; evasão escolar; violência e suicídio. É mole ou quer mais?
Os resultados escancararam uma realidade que muitos LGBT’s já conhecem na pele, infelizmente: a escola pública é um ambiente muito hostil à diversidade sexual, seja quanto a sua manifestação até a sua discussão.
Toni Reis, presidente da ABGLT explica na síntese, o que é o tal kit: “A partir desta pesquisa nós fizemos um kit que vai ser distribuído para 6 mil escolas de todo o Brasil. São seis informativos. São 5 vídeos que tratam da questão do que é uma lésbica, do que é uma pessoa travesti, do que é uma pessoa transexual, do que é uma pessoa gay, como se dá essa questão da homofobia, quais os problemas da homofobia.
"Nós temos os manuais e o guia para o professor trabalhar isso na sala de aula de forma bastante responsável. O que nós queremos é que esse material não faça apologia à homossexualidade, mas que faça apologia à cidadania e o respeito aos direitos humanos”.
Vejam as sinopses dos filmes transcritas pelo Portal IG e Correio Braziliense:
“No vídeo intitulado Encontrando Bianca, um adolescente de aproximadamente 15 anos se apresenta como José Ricardo, nome dado pelo pai, que era fã de futebol. O garoto do filme, no entanto, aparece caracterizado como uma menina, como um exemplo de uma travesti jovem. Em seu relato, o garoto conta que gosta de ser chamado de Bianca, pois é nome de sua atriz preferida e reclama que os professores insistem em chamá-lo de José Ricardo na hora da chamada”. (Em “Material didático contra homofobia mostra adolescente que virou travesti”; Correio Braziliense, 2010.
“Um adolescente que tentava gostar de futebol para agradar o pai, mas nunca conseguiu se sair bem no esporte é o pano de fundo da narrativa do curta “Encontrando Bianca”, produzido por uma empresa para o Ministério da Educação (MEC)”. (Em “Vídeo que trata de homofobia a adolescentes gera ira de deputado”; Portal IG, 2010.
“Os outros dois filminhos – que têm cerca de cinco minutos de duração – falam de outros temas relacionados à diversidade sexual. “Torpedo” conta a história de duas amigas que se apaixonam. Em uma festa, elas trocam carinhos (mãos no cabelo uma da outra, troca de olhares e sorrisos, um abraço mais carinhoso) e são fotografadas por colegas, que publicam as fotos na internet e fazem chacotas das duas. Elas decidem, então, assumir o que sentem. O vídeo termina com um abraço entre elas no pátio do colégio.”
O último, chamado de “Probabilidade”, mostra as dúvidas e conflitos vividos por um jovem de 15 anos, Leonardo. Quando se descobre vivendo o primeiro amor, o rapaz tem de mudar de cidade, por conta do trabalho do pai. Na nova morada, faz amizade com um menino que é muito atencioso com ele desde o primeiro dia de aula. Aos poucos, os dois se tornam amigos e viram alvos de piada, porque o amigo, chamado Mateus, é gay. Leonardo sabe disso, mas não se importa. Nunca houve nada entre os dois. Certo dia, eles vão a uma festa, e Mateus apresenta um primo a Leonardo. Os dois conversam a noite toda e descobrem afinidades. Na hora de ir embora, Leonardo sente vontade de beijar o rapaz e se espanta com isso, mas nada acontece. Já em casa, passa a noite pensando nos próprios sentimentos. No dia seguinte, durante a aula, observa o quanto também se sente atraído por uma amiga. Nesse instante, ele “percebe” que não quer lutar contra o que sente e acha que pode gostar de pessoas, independentemente do sexo”. (Em “Vídeo que trata de homofobia a adolescentes gera ira de deputado”; Portal IG, 2010)
Veja trecho do seminário e o filme “Econtrando Bianca”...
Assim que for aprovado, um processo de licitação do kit será realizado para que esse material seja produzido em larga escala e distribuído.
Fonte: Eleições Hoje/wordpress.
segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
Valores Ocidentais
Laerte Braga no Diario Liberdade
A
História nem é "carroça abandonada à beira da estrada" (Chico Buarque
de Holanda) e tampouco se faz em um dia. O fim da União Soviética começa
a mostrar outro processo de extinção, o da Europa Ocidental. A maior
parte dos países dessa parte do mundo, a rigor, por conta do alinhamento
quase absoluto com os EUA, perdeu sua autonomia, sua independência e
muitos governos (britânico, sueco, alemão, italiano, por exemplo) são
inteiramente subordinados a Washington.
A
globalização em se falando de Europa foi literalmente
"globalitarização" (Milton Santos), ainda que numa forma diferente da
concebida pelo geógrafo brasileiro. Nações como a Suécia e a Alemanha, o
Reino Unido, são meros pedaços de terra cercados de uma história de
milênios, mas bases militares da OTAN – Organização do Tratado Atlântico
Norte – a força de ocupação norte-americana.
A
guinada à direita do presidente francês Nicolas Sarkozy tem um claro
apelo eleitoral (os votos da extrema-direita em ascensão e suas
políticas contra imigrantes). Com as forças de esquerda desmanteladas e
incapazes de conter o avanço dos EUA sobre o continente, só resta em
termos de sobrevivência abrir as portas dos palácios reais e castelos
para o pão nosso de cada dia. Um euro por visitante, a única concessão a
estrangeiros.
O grande problema
vivido pela Europa Ocidental hoje se materializa na gota d'água do
processo de restrição a direito de imigrantes e nas grandes
manifestações contra o crescimento da população muçulmana. "Muitos
europeus rotulam o crescimento dos contingentes estrangeiros –
especialmente muçulmanos – como incompatíveis com os valores
ocidentais". A afirmação é de Matthew Goodwin, do Instituto de Relações
Internacionais Chatham House, com sede em Londres.
Esse
fenômeno da rejeição a muçulmanos acende outra fogueira e num outro
extremo. A direita traz consigo o antisemitismo. A exigência de brasão,
árvore genealógica, ou fortes depósitos em bancos europeus passa a ser
condição básica para ser absorvido e integrado a Europa. O impasse se
supera com o sionismo, versão fascista do judaísmo e detentora do
controle de grande parte dos "negócios".
O
surgimento de conflitos com setores que aceitam essas políticas pode e
deve incendiar boa parte da Europa, exatamente no momento em que outra
boa parte dos países europeus, começa a vislumbrar a falência econômica.
Para
Washington basta que os europeus continuem acreditando que são donos de
seus museus, castelos, seus reis e rainhas, seus primeiros ministros
exóticos, ou presidentes erráticos como Sarkozy, que o resto eles,
norte-americanos, providenciam.
Em
breve, pelo andar da carruagem, os tradicionais ônibus de dois andares
que circulam por Londres e outras cidades inglesas vão virar bastião da
pátria amada, do império onde o sol não se punha.
Vai ser o que restar diante do avanço dos EUA.
A
extrema direita já participa de governos na Itália, Dinamarca e Holanda
e tem cadeiras nos parlamentos da Áustria, Bulgária, Letônia,
Eslováquia e Suécia.
Na França, surge
a primeira musa dessa horda. Marine Le Pen, 42 anos de idade, deputada
ao Parlamento Europeu pela Frente Nacional de seu país, partido que
entre outras coisas, é racista, fascista e antisemita. Foi eleita para
suceder seu pai Jean-Marie à frente da organização desde 1972. Marine
teria hoje, segundo avaliações de institutos de opinião pública, 17% dos
votos dos franceses numa eventual disputa eleitoral.
Segundo
ela o hábito dos muçulmanos de orar pelas ruas se compara "a ocupação
da França pelos nazistas". Defende o retorno da pena de morte, a volta
do serviço militar obrigatório e acha que os crimes praticados por
policiais contra "suspeitos" (como o do brasileiro Jean Charles
assassinado pela polícia londrina) devem ser considerados "legítima
defesa".
Quer o fim dos benefícios sociais para estrangeiros.
São os tais "valores ocidentais".
A
verdade é que neste momento começam a naufragar e a apodrecer os
pilares da Nova Ordem traçada pelo Consenso de Washington – o
neoliberalismo –.
A própria corte
desse império está mergulhada numa crise que sinaliza seu declínio.
Quando elegeu o primeiro presidente de pele negra, não só os negros, mas
todos, perceberam que se trata de um branco disfarçado e disposto ao
papel de garçom da Casa Branca. Michael Moore, o cineasta, compara-o nas
funções de "comandante em chefe das forças armadas" ao "funcionário do
mês do BurgerKing do meu bairro".
A
ocupação da Europa por bases militares, os conflitos na Ásia, África e
Oriente Médio, as tentativas de golpes contra governos progressistas da
América Latina, são sinais da transformação dos EUA num conglomerado
terrorista formado pelo que Eisenhower (general e ex-presidente) chamou
de "complexo industrial e militar", isso na década de 50 do século
passado.
Não existem mais os Estados
Unidos como nação. Mas o conglomerado EUA-Israel Terrorismo S/A, montado
num arsenal capaz de destruir o mundo cem vezes se necessário for e
pelos tais "valores ocidentais".
Nesse
contexto todo a América Latina passa a ter capital importância diante
do potencial econômico que traz consigo. Matérias primas básicas,
petróleo em grande quantidade, água, toda a perspectiva de um grande
campo para sustentar o conglomerado. Evitar o declínio em curso.
E
é por aí que cresce a importância de governos como o de Chávez, Evo
Morales, Lugo, Pepe Mujica, Ortega, Castro, Corrêa e outros e se faz
necessária a plena definição do Brasil – maior país da região – pelo
processo de integração sem os Estados Unidos, para que não sejamos uma
nova Europa, ou um novo México.
É a barbárie com tecnologia de ponta.
|
Mississippi John Hurt - The Best of 1990
01- Here Am I, Oh Lord, Send Me
02- I Shall Not Be Moved
03- Nearer My God to Thee
04- Baby, What's Wrong With You?
05- It Ain't Nobody's Business
06- Salty Dog
07- Coffee Blues
08- Avalon My Home Town
09- Make Me a Pallet on the Floor
10- Since I've Laid My Burden Down
11- Sliding Delta
12- Monday Morning Blues
13- Richland Women Blues
14- Candy Man
15- Stagolee
16- My Creole Belle
17- C.C. Rider
18- Spanish Fandango
19- Talking Casey
20- Chicken
02- I Shall Not Be Moved
03- Nearer My God to Thee
04- Baby, What's Wrong With You?
05- It Ain't Nobody's Business
06- Salty Dog
07- Coffee Blues
08- Avalon My Home Town
09- Make Me a Pallet on the Floor
10- Since I've Laid My Burden Down
11- Sliding Delta
12- Monday Morning Blues
13- Richland Women Blues
14- Candy Man
15- Stagolee
16- My Creole Belle
17- C.C. Rider
18- Spanish Fandango
19- Talking Casey
20- Chicken
21- You Are My Sunshine
CRÉDITOS: Beco do Blues
“O TDAH é um transtorno real e como tal deve ser encarado”
por dra. Katia Beatriz Corrêa e Silva, psiquiatra no Vio Mundo
Caros leitores, ao ler o artigo em pauta fiquei muito preocupada pela veiculação de algumas informações equivocadas, conceitos errôneos e falsos pressupostos.
Devo antes me apresentar: sou médica, psiquiatra da Infância e
Adolescência, com foco de estudo e trabalho em TDAH e Bipolaridade há
aproximadamente 20 anos. Mas como sou formada há 32, antes tive a
oportunidade de me dedicar ao estudo de muitas das desordens que afetam a
Infância e Adolescência.
Ao citar um livro de um outro jornalista, me pareceu que havia uma
insinuação de que os transtornos mentais e emocionais estariam
aumentando em quantidade e diversidade única e exclusivamente para a
alegria e lucro da industria farmacêutica. Antes de qualquer dúvida, não
recebo nada da tal indústria e nem tenho qualquer ligação com isso. Sei
das artimanhas que elas engendram, não sou ingênua, e do seu apetite
pelos lucros.
Mas a Cesar o que é de César.
Essa descoberta não é só do ilustre jornalista. Há muito as
pesquisas sérias já vinham detectando esse fenômeno. Mas vejamos por
outros ângulos. Nesses 50 anos, o conhecimento científico cresceu como
nunca, os meios de detecção de fenômenos, de testagem e confirmação de
hipóteses, de troca de conhecimentos ao redor do mundo, foram ímpares na
história do conhecimento humano. Em consequência a descoberta de novos
transtornos, a melhor compreensão de outros e a melhora na capacidade
diagnóstica cresceram proporcionalmente. Natural, não?
Nesses mesmos 50 anos, a mudança de parâmetros sociais e culturais, a
mudança de referenciais econômicos, culturais, sociais e emocionais ao
redor do mundo foi também ímpar na história da humanidade.
Nunca houve mudanças tão grandes e profundas em uma extensão tão
ampla de países e culturas como nesses últimos 50 anos. E isso provocou e
provoca alterações na forma de ver, sentir, reagir e responder às
situações por parte das pessoas, levando também a desequilíbrios antes
insuspeitos. Natural, não?
Com relação à pesquisa da Dra. Andreasen quanto à diminuição do lobo
frontal por culpa do uso de medicação por longo período, é interessante
saber se o mesmo número de pacientes psicóticos (que já é uma população
heterogênea ), foi acompanhado pelos mesmos cinco anos, sem uso de qualquer medicação,
para então podermos fazer essa afirmação de que foi o uso da medicação
que provocou a diminuição da massa encefálica com prejuízo das funções
cognitivas.
Outra questão que merece toda a nossa atenção é a citação de frases
de pesquisadores fora dos seus trabalhos. Uma frase fora do seu contexto
pode induzir ao que se queira.
Logo em seguida o jornalista faz afirmações no mínimo curiosas: que
os transtornos mentais seriam mais frequentes justamente em quem se
trata. Para que fosse minimamente correta, seria preciso ter o mesmo
número de pacientes com os mesmos transtornos e as mesmas condições
gerais e que não fizessem uso de qualquer medicação para que se pudesse
fazer tal comparação. Não sei se o jornalista tem essa pesquisa e a que
conclusões chegou.
E as crise são mais freqüentes em quem se trata ou quem não se trata
não tem ninguém que cuide dele e logo não saberemos quantas crises teve e
sequer se sobreviveu?
Outra afirmação curiosa é que a depressão seria um desequilíbrio
químico do cérebro, sem qualquer comprovação, seria antes um “lugar
comum”. Sugiro que o prezado jornalista procure se inteirar um pouco
mais das pesquisas, que já não são nem tão recentes.
Seria também interessante saber o que ele chama de evidências
indiretas e que evidencias diretas supõe que tenhamos de transtornos
físicos e mentais.
Outro equivoco grave é supor que o TDAH é uma “nova síndrome”. Em
1902, o Dr. George Still, pediatra inglês, membro do Royal College
apresentou em um encontro científico seus estudos sobre um grupo de
crianças com os mesmos sinais e sintomas que caracterizam o TDAH, tipo
misto. Ele estudou esse grupo por vários anos, antes de apresentar seu
trabalho de pesquisa e antes dele temos descrições na literatura
descrevendo exatamente o quadro que encontramos hoje.
Existe um poema alemão do século 19 descrevendo as aventuras de um
menino inquieto com o mesmo comportamento que vemos atualmente nos
portadores. Acho que a indústria farmacêutica ainda não era tão
presente. Concordo inteiramente que a sociedade e a cultura americanas
tem esse imediatismo, muitas vezes errôneo. Mas confundir as
características de uma sociedade com a existência ou não de um
transtorno mental, me parece, no mínimo, falta de informação correta.
Outra incorreção preocupante é afirmar que o uso da medicação altera a
química do cérebro “para sempre” e “pior, sem saber exatamente o que
está sendo alterado!”.
A química não é alterada para sempre, até porque se assim fosse não
seria preciso continuar o uso da medicação para se continuar a ter os
benefícios que ela traz. O que a medicação propicia é a correção da
falta de neurotransmissores, que não estão na quantidade necessária onde
seria de se esperar. Uma informação que está disponível em qualquer
texto científico sério sobre o assunto. E as consequências sobre o que
acontecerá na vida daquela criança após anos de uso podem ser
acompanhadas através da entrevista aos portadores que se tratam há anos e
que tem suas vidas dramaticamente melhoradas pelo tratamento.
Seria interessante, quando não imprescindível, ouvir os principais interessados nessa questão: os portadores e seus familiares!
Outro equívoco primário é associar o uso da medicação apenas e tão
somente à atividade escolar. Ou à calma e obediência doméstica. Os que
defendem essas justificativas não sabem qual a ação da medicação e não
sabem do que se trata o TDAH. Não basta se dizer “especialista”, é
preciso conhecer realmente o que é o transtorno, que áreas do
comportamento afeta e quais suas reais consequências na vida do
portador. E de suas famílias.
Se o jornalista autor do livro em pauta afirma que os psiquiatras
não sabem dizer o futuro dos pacientes tratados, talvez não tenha ouvido
um número de profissionais suficiente ou tenha escolhido justamente os
que não sabiam. Preconceito é uma atitude absolutamente democrática.
Acomete a qualquer um.
A taquicardia que ele descreve e, sutilmente, sugere ocorrer em todas
as crianças, é um efeito colateral possível sim, mas não tão comum como
ele quer fazer crer. E todos os profissionais de saúde sérios sabem que
toda e qualquer medicação tem efeitos colaterais. Se não tem efeito
colateral, não tem efeito terapêutico. A frase com que encerra o
parágrafo é maldosa e mentirosa. Mas deve causar um grande efeito nas
pessoas leigas e ajudar a vender bem o produto.
A confusão a que o jornalista induz sobre a proximidade etiológica
entre TDAH e Bipolaridade é, no mínimo, suspeita. A intenção clara é
fazer o leitor acreditar que o uso da medicação para o tratamento do
TDAH irá “promover” o surgimento de outro transtorno, mais grave.
Consequentemente, os médicos que prescrevem a medicação para tratar o
TDAH são criminosos, por provocar o surgimento de outro transtorno
mental em quem, afinal, não tinha nada.
O Dr. Joseph Biederman e o grupo do Massachussetts Hospital fazem
parte de um dos grupos de pesquisa mais ativos no estudo do TDAH e o Dr.
Russell Barkley é um dos mais renomados estudiosos do assunto.
Curiosamente o jornalista cita pesquisas muito antigas ( 1973, 1978,
1996, 1997, 2001, 2002, etc.). Pesquisa com mais de cinco anos pode ser
considerada antiga, dada a velocidade com que as descobertas em qualquer
campo das ciências ( exatas, biológicas, e outras ) se dão. As
pesquisas antigas trazem dados que, muito frequentemente, já foram
revistos e muitas vezes modificados.
Outra questão grave é a citação de frases fora de seus contextos.
Elas se prestam às mais variadas interpretações. Principalmente quando
já se tem um caminho que queremos que o leitor siga.
Quanto ao desempenho acadêmico, a capacidade de aprendizagem, os
efeitos positivos nas funções cognitivas (funções executivas ) e a
melhora no relacionamento social, pessoal e emocional, seria mais
honesto perguntar aos portadores e suas famílias, do que citar obscuros
profissionais em pesquisas das quais pouco se sabe.
Entretanto concordo inteiramente com a jornalista quando diz que os
professores não tem a condição de fazer diagnósticos, nem de apontar
tratamentos para os problemas que ocorrem na escola e em sala de aula.
Para isso existem os médicos, neurologistas e psiquiatras da Infância e
Adolescência, que se dedicam a estudar e pesquisar o transtorno.
É claro que inúmeros problemas podem causar agitação, desatenção e
atitude impulsivas em uma criança ou adolescente. É óbvio que não se
pode negar o efeito de problemas familiares, emocionais, pessoais,
econômicos, na vida e no comportamento das crianças. Assim como métodos
educacionais por vezes equivocados ou professores mal preparados também
causam reações semelhantes. Mas a escola pode desempenhar uma parceria
preciosa.
E é justamente porque as “tias Belas” e “tias Rosas” tinham e tem
suas salas cheias com 30 ou mais alunos, e tem tantos anos de prática no
trato com crianças, que podem e geralmente sabem quando um
comportamento não é “só coisa de criança”. A escola pode perceber quando
a alguma coisa diferente acontecendo com a criança e pode sim alertar
os pais ou responsáveis e sugerir a procura a uma ajuda, uma orientação
até uma avaliação. Mas realmente “os professores, por melhores que
sejam, não estão capacitados para sugerir a necessidade de algum
tratamento psiquiátrico.”
Mas isso não quer dizer que o TDAH não exista. Ou que seja uma
invenção de industrias farmacêuticas gananciosas, professores
preguiçosos ou pais estressados.
O TDAH é um transtorno mental real, com consequências sérias e como tal deve ser encarado.
Seria interessante ouvir as associações de pais e portadores, nos
Estados Unidos o CHADD e os ADD, no Brasil a ABDA; na maioria dos países
do mundo existem associações semelhantes.
PS do Viomundo: O jornalista a que se refere a dra. Katia aparentemente é Robert Whitaker, autor de Anatomy of an Epidemic, citado por Heloisa Villela aqui. Ele também é autor de Mad in America.
O fato de que nos propomos a debater questões espinhosas como as
doenças psiquiátricas não significa que os pacientes ou pais de
pacientes devam abandonar as recomendações médicas.
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