O
1º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas
realizado na cidade de São Paulo nos dias 21 e 22 de agosto mostrou
uma realidade que, se já era visível, não tinha ainda contornos ou
caminhos possíveis para uma revolução nas comunicações, sem perda das
características básicas da rede mundial de computadores. Ou do
princípio fundamental da Internet.
A liberdade concreta de um
modelo alternativo de comunicação, capaz de nos livrar da ditadura da
mídia privada. Os mais recentes levantamentos sobre o papel e a força
da Internet mostram que jornais e revistas já foram superados pela
rede.
O aspecto mais importante talvez tenha sido o do trazer ao
mundo real o mundo virtual e mostrá-lo vivo, pujante e visível, em
carne e osso. A conseqüência será a medida da percepção de cada um dos
participantes, de todos os internautas de um modo geral, do poder que
existe, no curso desse processo, de conduzi-lo a caminhos de liberdade
ampla e irrestrita, uma espécie de grito do ser humano que se recusa a
ser coisa, objeto.
Não há censura, ou como foi dito por um dos
participantes, "fugimos da censura da mídia privada". A notícia
escondida, o fato ocultado, os interesses de grupos prevalecendo sobre
aquilo que fato acontece.
Há alguns anos atrás um cientista de
uma universidade norte-americana anunciou que em breve seria possível
captar do espaço todas as palavras ditas pelo ser humano desde o
primeiro. Isso tornaria possível ouvir Nero, por exemplo, no momento de
sua morte, dizer "que grande homem perde Roma". Ou Bertold Brecht
afirmar que aquele que luta "por toda a vida é indispensável"... O ugh
ugh do primeiro de todos, o Brucutu.
A dificuldade, segundo o
cientista, seria separar as vozes em canais próprios a cada uma delas,
do contrário teríamos apenas uma zoeirada sem tamanho.
A
internet e o papel dos blogs separam as vozes e mais isso, proclamam as
diversas vozes que muitas vezes são caladas pela opressão, qualquer
que seja a sua forma.
Há perigos, evidente, a rede é controlada
por quem vive a "embriaguez do arsenal militar", pode pará-la a
qualquer momento - pelo menos em tese -, já existem tentativas de
mecanismos legais de censura (projeto apresentado através do senador
Eduardo Azeredo ao Legislativo brasileiro e com similar, a fonte é uma
só, em todo o mundo cristão e ocidental), ou de intimidação, como meios
mais sofisticados para identificar revolucionários nesse sentido,
nesse campo, enfim.
O jornal O PASQUIM cumpriu um papel decisivo
na luta contra a ditadura militar. Transformou sisudos generais e seus
apetrechos de barbárie em ridículo sem tamanho forçando-os a uma
retirada que se não é total (os torturadores continuam livres,
impunes), avança e será assim com certeza num determinado ponto, nem
que seja onde as paralelas se interceptam no infinito.
O 1º
Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas trouxe um elemento novo a
essa perspectiva de um mundo alternativo, diferente dessa dialética
entre barbárie civilizada na forma de hambúrguer e barbárie em si, nas
bombas despejadas sobre países como o Afeganistão.
O da
construção coletiva, diversa na multiplicidade de idéias, de caminhos,
mas convergente na necessidade de trilhas e estradas comuns.
E uma ética que nada tem a ver com a frieza do caiu um avião e morreram duzentas e tantas pessoas, ou de um dossiê fajuto.
É uma combustão que explode em liberdade. Só isso.
Desde
o conjunto regional do jornalista Luís Nassif às discussões e
experiências de uma nova linguagem. Não tem freios, nem peias, mas tem
sentido e está decodificada em cada manifestação viva de humanidade.
É
como uma proclamação "sou um ser humano, tenho pernas, braços, tenho
liberdade para pensar, para caminhar e caminhos para me irmanar fora de
todo o ozônio que sufoca cada espírito de vida", por redundância que
espírito de vida pareça.
É o contraponto ao caos, embora possa à
primeira vista parecer o contrário. Vai na direção oposta do pessimismo
de Huxley, ou do cientificismo histórico de Toynbee.
No caso
específico do Brasil é um grito insurgente contra a ditadura da mídia
privada. GLOBO, o exemplo maior. A fonte mais forte de toda a barbárie
nas suas mais diversas formas e manifestações. Inclusive sabão que lava
mais branco, tira manchas infalível e odor da natureza a cada trinta
minutos para você flutuar.
Ou VEJA e seu cinismo de mentiras
digeríveis pela classe média. FOLHA DE SÃO PAULO saudosa da
"ditabranda". Nem falo do ESTADÃO, lá ainda não chegaram à abolição,
ainda reina soberano e com pompa o imperador Pedro II.
Mas falo
da RBS e do estupro escondido, ocultado porque praticado por filhos de
senhores de gente e da mídia. Presumidamente senhores.
É óbvio
que o poder, entendido como camarilha no bunker do institucional, tente
de todas as formas silenciar esse canal. Há jornalistas como Paulo
Henrique Amorim, Celso Lungaretti que estão teoricamente sufocados por
processos vários de bandidos diversos (Daniel Dantas, Gilmar Mendes,
Boris Casoy, etc). São incapazes, os bandidos, de perceber que na
verdade essa expressão, ou esse tempo de verbo, sufocado, no duro mesmo
significa liberto da penosa tarefa de engolir sapos. Diferente de
William Bonner, que, naturalmente, desenvolveu um aparelho digestivo
capaz de trogloditar qualquer falta de ranhura nas pistas de um
aeroporto em nome da companhia relapsa e criminosa na manutenção, no
clássico "a culpa é do piloto".
Blogs e a Internet no seu todo
rompem essa cadeia de "quem quer um bom dia?" Depende do que seja o bom
dia, isso atormenta a essa gente.
E há anônimos blogueiros, que
como cometas a uma velocidade imperceptível ao olho humano, mas que
sensibiliza e desperta humanos, despejam o lixo que os tais donos
escondem debaixo do tapete.
Tudo tem seu lugar, seu tempo, há
dimensões várias ao longo da História. O encontro serviu para mostrar
que além disso o caminho é o do compromisso básico e fundamental com o
caos organizado, mas sempre caos, e caloroso da liberdade e da vida em
seu sentido e em sua essência. Em sua razão de ser.
E não
importa que seja um jornalista consagrado como Luís Carlos Azenha, ou um
engenheiro fotógrafo por amor à imagem, Castor, mas o blog que exibe
as contradições de uma sociedade organizada em torno de fachadas.
A
tarefa é colocá-las, as fachadas, abaixo. A ética e só a da verdade
contida em cada luta pela preservação da espécie em cada um dos caminhos
importantes à espécie. Vale dizer não passa por gente como Fernando
Henrique e sua presunção de semi deus. Ou José Arruda Serra em sua
arrogância de anjo guardião do inferno capitalista.
Passa por cada um no caos livre de todos somados na alternativa possível.
Não há donos do estoque de ar. Nem estoques de ar. Existe apenas o ar.
O
encontro foi um primeiro passo. Dali é possível perceber a realidade
imediata de cada um, a cidade, a comuna, inserida no todo. E juntar cada
Brancaleone na utopia possível, porque começa a ser real. A se mostrar
factível. Mesmo porque quem procurou utopia até hoje procurou
perfeição, não se ateve à necessidade das imperfeições.
De algumas pelo menos para não ser tão radical. E muitas são indispensáveis para não dizer ótimas.
De
tudo o que se falou, o que se ouviu, até o que se pensou em silêncio
meditabundo como diria Stanislaw, nada precisa ser peneirado porque ao
fim restou a certeza que está desperto o ser humano na sua totalidade e
está declarada uma guerra pacífica até um certo ponto (guerra não é
sempre feita com armas de tiro, digamos assim, mas as de idéias também),
mas aguda, viva.
Quando Elizabeth Bishop disse que "o paraíso
deve ter sido muito chato", levantar, comer maçãs, olhar a natureza,
afagar os leões, dormir a sesta e repetir tudo até a noite, se é que
noite havia, estava conclamando a olhar o outro e perceber-se nele. A
uma fusão que é estelar no sentido da vida plena, livre, algo incapaz de
ser compreendido por quem acha que o português de Adoniran Barbosa
prejudica a qualidade de suas letras (já ouvi essa besteira de um
intelectual padrão FHC).
O que tudo isso tem a ver com Bolsa de Valores? Tem tudo. Azar dos caras da bolsa que não entendem nada.
É por aí o mundo alternativo.
Consolidado
num Barão de Itararé. "Um bom jornalista é um sujeito que esvazia
totalmente a cabeça para o dono do jornal encher nababescamente a
barriga".
O blogueiro não. É como pobre, "quando enfia a mão no bolso tira no máximo cinco dedos".
E muitas esperanças e caminhos.
Nada a ver com O Homer Simpson conceituado e definido por William Bonner, paladino da cabeça vazia.
*Laerte Braga é jornalista
Fonte:
Jornal O Rebate -
http://www.jornalorebate.com.br