quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Exército boliviano se declara socialista e antiimperialista


O Exército Boliviano, que celebrou no último domingo (14) seus 200 anos de criação, se declarou "socialista'', "antiimperialista'' e "anticapitalista''. O comandante nacional do Exército, general Antonio Cueto, afirmou que a Constituição promulgada em 2009 "dá lugar a que o Exército surja como uma instituição socialista, comunitária''.

"Nos declaramos antiimperialistas, porque na Bolívia não deve existir nenhum poder externo que se imponha, queremos e devemos atuar com soberania e viver com dignidade. Também nos declaramos anticapitalistas porque este sistema está destruindo a mão terra'', afirmou durante um ato pelo bicentenário do Exército. Essa instituição assume como ano de criação 1810, quando começaram as revoluções independentistas no atual território boliviano contra a coroa espanhola.

Cueto criticou os "governos neoliberais'' bolivianos que "fizeram um pacto com o sistema capitalista, buscando a destruição das Forças Armadas'' do país, "com planos que diminuíam progressivamente sua capacidade operativa''. Ratificou que o Estado boliviano "é pacifista'', mas também se reserva "o legítimo direito à defensa'' de seu território e agregou que os militares ‘‘não irão permitir sob nenhuma circunstância a instalação de bases estrangeiras'' em seu território.

Por sua vez, o presidente Evo Morales pediu aos militares que estejam preparados para defender a soberania da Bolívia, ante a possibilidade de que "qualquer império'' tente ‘‘intervir militarmente''em seu país, como o fizeram há 200 anos para "combater o domínio espanhol''.

"A história demonstra que o Exército nasce com uma posição antiimperialista porque combateu o império europeu desde 1810'', afirmou Morales, ao destacar que o ‘‘nacionalismo militar'' das Forças Armadas não foi "importado nem imposto'', mas que nasceu em seguida à luta da Guerra do Chaco travada contra o Paraguai entre 1932 e 1935.

Ao ato assistiram os comandantes dos Exércitos do Chile, Juan Miguel Fuente-Alba e do Equador, Patrício Cáceres, além de delegações militares da Argentina, Brasil, Chile e Peru. O Exército boliviano ratificou seu compromisso com o ‘‘processo de mudança'' levado adiante pelo governo.

Fonte: EFE

Conselho de Comunicação Social: quatro anos de ilegalidade

Por Venício Lima - de Brasília


No sábado, dia 20 de novembro, serão quatro anos que o Conselho de Comunicação Social, órgão auxiliar do Congresso Nacional, criado pela Constituição de 1988, se reuniu pela última vez. Um ano atrás, neste Observatório, publiquei artigo intitulado “CCS: Três anos de ilegalidade”.
Matéria da Folha de S.Paulo sob o título “Congresso vai reativar conselho de comunicação”, publicada no último dia 31 de outubro, informa que “no recesso de julho, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), despachou cartas a dezenas de entidades anunciando a medida (reativação do CCS), e 21 delas já indicaram nomes para compor o órgão”.
A se confirmar a informação, o senador do Amapá, exemplo emblemático do coronel eletrônico, terá esperado os últimos dias de seu terceiro mandato como presidente do Congresso Nacional para cumprir a lei. Todavia, até este momento, apesar da ilegalidade flagrante, a situação não se alterou.
Desta forma, tomo a liberdade de repetir aqui praticamente os mesmos argumentos do artigo publicado um ano atrás na expectativa de que, em novembro de 2011, talvez a Constituição e a lei estejam sendo cumpridas.
Responsabilidade do Congresso Nacional
Criado pela Constituição de 1988 (artigo 224) e regulamentado pela Lei 8.389 de 1991, os integrantes do CCS são eleitos em sessão conjunta do Congresso Nacional. Acontece que a Mesa Diretora, vencidos os mandatos dos conselheiros ao final de 2006, jamais promoveu a eleição dos novos membros. O § 2º do artigo 4º da Lei é claro:
Art. 4° O Conselho de Comunicação Social compõe-se de:
(…)
§ 2° Os membros do conselho e seus respectivos suplentes serão eleitos em sessão conjunta do Congresso Nacional, podendo as entidades representativas dos setores mencionados nos incisos I a IX deste artigo sugerir nomes à mesa do Congresso Nacional.
Trata-se, portanto, de evidente descumprimento de uma lei exatamente por parte do poder que tem o dever constitucional maior de criá-las e, espera-se, deveria cumpri-las.
A situação chegou a tal ponto, que um integrante do próprio Congresso Nacional, a deputada Luiza Erundina (PSB-SP), em agosto de 2009, entrou com uma representação na Procuradoria Geral da República para que o Ministério Público investigue os motivos pelos quais não se promove a eleição dos novos membros do Conselho de Comunicação Social.
Triste história
Ao longo de 2009, em pelo menos duas ocasiões, tratei da questão neste Observatório (“Por que o CCS não será reinstalado” e “CCS: o Senado descumpre a lei”). O tema, paradoxalmente, não merece a atenção da grande imprensa, apesar de os donos da mídia terem, pelo menos, a metade dos membros do CCS.
Como se sabe, o CCS, apesar de regulamentado em 1991, só logrou ser instalado onze anos depois como parte de um polêmico acordo para aprovação de Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que, naquele momento, constituía interesse prioritário dos empresários de comunicação. A Emenda Constitucional nº 36 (Artigo 222), de maio de 2002, permitiu a propriedade de empresas jornalísticas e de radiodifusão por pessoas jurídicas e a participação de capital estrangeiro em até 30% do seu capital.
O fato é que, mesmo sendo apenas um órgão auxiliar, o CCS instalado demonstrou ser um espaço relativamente plural de debate de questões importantes do setor – concentração da propriedade, outorga e renovação de concessões, regionalização da programação, TV digital, radiodifusão comunitária, entre outros.
Vencidos os mandatos de seus primeiros integrantes, houve um atraso na confirmação dos membros para o novo período de dois anos, o que ocorreu apenas em fevereiro de 2005. Ao final de 2006, no entanto, totalmente esvaziado, o CCS fez sua última reunião e os novos membros nunca mais foram eleitos.
Atribuições
Nunca será demais relembrar quais são as atribuições que o CCS deveria estar exercendo se o Congresso Nacional cumprisse a Constituição e a Lei. O artigo 2º da Lei 8.389/91 reza:
O Conselho de Comunicação Social terá como atribuição a realização de estudos, pareceres, recomendações e outras solicitações que lhe forem encaminhadas pelo Congresso Nacional a respeito do Título VIII, Capítulo V, da Constituição Federal, em especial sobre:
a) liberdade de manifestação do pensamento, da criação, da expressão e da informação;
b) propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias nos meios de comunicação social;
c) diversões e espetáculos públicos;
d) produção e programação das emissoras de rádio e televisão;
e) monopólio ou oligopólio dos meios de comunicação social;
f) finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas da programação das emissoras de rádio e televisão;
g) promoção da cultura nacional e regional, e estímulo à produção independente e à regionalização da produção cultural, artística e jornalística;
h) complementaridade dos sistemas privado, público e estatal de radiodifusão;
i) defesa da pessoa e da família de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto na Constituição Federal;
j) propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens;
l) outorga e renovação de concessão, permissão e autorização de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens;
m) legislação complementar quanto aos dispositivos constitucionais que se referem à comunicação social.
Além disso, dois outros diplomas legais atribuem competências específicas ao CCS:
1. A Lei 8.977 de 6 de janeiro de 1995 (Lei do Cabo) diz em seu artigo 44 que ele deve ser ouvido em relação a todos os atos, regulamentos e normas necessários à sua implementação; e
2. A Lei 11.652 de 7 de abril de 2008 (Lei da EBC) diz em seu artigo 17 que o Conselho Curador da empresa de radiodifusão pública deve encaminhar a ele as deliberações tomadas em cada reunião.
Por que o CCS não funciona?
O Congresso Nacional e, sobretudo, o Senado Federal, abriga um grande número de parlamentares com vínculos diretos com as concessões de rádio e televisão. O CCS é um órgão que – insisto, mesmo sendo apenas auxiliar – discute questões que ameaçam os interesses particulares desses parlamentares e dos empresários de comunicação, seus aliados. Essa é a razão – de fato – pela qual o Congresso Nacional descumpre a Constituição e a lei.
Indefensável é a cumplicidade gritantemente silenciosa da grande mídia e daqueles que nos lembram quase diariamente dos supostos riscos e ameaças que a liberdade de expressão enfrenta no Brasil e em países vizinhos da América Latina.
O funcionamento regular de um órgão auxiliar do Congresso Nacional, composto por representantes dos empresários, de categorias profissionais de comunicação e da sociedade civil, com a atribuição de debater normas constitucionais e questões centrais do setor, não interessaria à democracia?
Por que, afinal, o Conselho de Comunicação Social não funciona?

Artigo publicado originalmente no Observatório da Imprensa.

Venício A. de Lima é professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010.

A longa marcha do imperialismo benévolo

  Paulo Alves de Lima Filho  no Correio da Cidadania 
 
"Ai esta terra ainda
Vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se
Um imenso Portugal"
 
(Chico Buarque-Rui Guerra)
 
"Pero es demasiado temprano para decir si Dilma logrará concentrarse en la visión global. Con el agregado que no es irrelevante de que la actual trayectoria brasileña podría llevar a la formación de la primera potencia tropical global. ¿Sería sólo sub-imperial? ¿Sería sólo cordial? ¿O sería una nueva especie mutante, impredecible de subimperialismo benigno?" - Pepe Escobar, Asian Times/Liberacion, 03/11/2010.
 
A eleição de Dilma Rousseff deveria prestar-se para exercícios teóricos de síntese, de preferência curtos, para que sejam lidos nestes tempos de baixo prestígio da razão. O tema é mais do que momentoso. Os pouquíssimos donos da mídia e o punhado de donos do mundo e seus poderosíssimos ventríloquos se apressam a estender à estreante presidente os caminhos da preferência de seus negócios mundiais. A expressão nacional desses anseios monopolistas se apresenta basicamente através de dois projetos, aos quais podemos denominar provisoriamente de imperialismo benévolo e imperialismo malévolo.
 
A disputa ente esses dois projetos fechará um ciclo histórico iniciado com a revolução portuguesa de 1245-47, derrame da qual veio a ser o Brasil, parte desgarrada do império português no século XIX, porém sempre firme na subordinação aos desideratos da acumulação mundial do capital. O Brasil alcançaria, pois então, a máxima expressão capitalista mundial ora cantada polifonicamente em prosa e verso ao ser potência, até que enfim, do capital financeiro ou monopolista. O imperialismo benévolo, anti-colonial, galopa no projeto do núcleo dirigente do PT. Realizar-se-á através da Unasul, de uma política externa independente e democrática, forte apoio estatal aos grupos monopolistas nativos e pela via de altas taxas de crescimento econômico aliado a políticas sociais redistributivas. Bem distinto do imperialismo malévolo de caráter colonial, representado pelas forças do PSDB-DEM, dentes arreganhados às democracias populares e seus processos de emancipação política, econômica e social, assim como às políticas estatais mais autônomas vis a vis os capitais privados, principalmente os forâneos.
 
Impossível deter a marcha do Brasil ao seu destino imperialista. O capital monopolista domina a esmagadora maioria das atividades capitalistas, tanto o nativo quanto o estrangeiro. Este, majoritário nos campos mais dinâmicos e estratégicos. Todas as forças do status quo desejam alcançar esse destino anunciado de grande potência, a começar pelos militares. Um imperialismo benévolo, sem seu componente belicista dado a evoluir em espaço regional sem potência concorrente, exceto os Estados Unidos.
 
Não havendo disputas hegemônicas exacerbadas e recém sepultadas as aspirações manipuladas derivadas da guerra fria, uma atmosfera de concórdia e unidade se estende como forma de realização das aspirações nacionais.
 
O sentido do futuro
 
O imperialismo benévolo, definição evitada pela mídia e outras forças do status quo e substituída pela categoria potência, marcharia rumo a um novo milagre econômico agora também social, pois redentor da miséria. Este milagre seria derivado dos lucros do Pré-Sal e pela irresistível expansão do mercado interno e forte empuxe exportador, eixos de uma espiral virtuosa mais brilhante que a cúpula da catedral de Santa Sofia.
 
Contudo, quão mais o Estado maior petista se afirma nessa rota, tão mais abandona seus conteúdos emancipatórios originais, fincado que está à estaca do centrão conservador e flertes mais à direita, aos quais se obriga aliar para permanecer no poder e ampliar nele o seu espaço. Isso implica em direitização do poder, regressão ideológica, desemancipação crescente, forma particular desse neoliberalismo social, neodesenvolvimentista, anti-colonial. Em sua benevolência, de certo modo assemelha-se aos trajetos dos seus comparsas russos e chineses. Não à toa o Brasil já foi chamado de Rússia dos trópicos.
 
Ao caminhar rumo ao seu ápice desnudando-se das suas vestes emancipatórias, nele se acentua o predomínio da bandeira anti-colonial como afirmação do Estado nacional, fato que paradoxalmente o enfraquece e o torna vítima provável das forças do imperialismo malévolo, contra as quais Dilma obteve vitória consistente somente no segundo turno.
 
Diga-se assim: a marcha do Brasil potência benévola e benfeitora vai enfraquecendo seu projeto nacional. Esta ocorre sob o império da fissão prolongada e sucessiva do núcleo original do PT, cujo penúltimo episódio foi a evicção do PSOL e a saída de Marina Silva o último. Repete-se a recente regressão histórica do PMDB e, grosso modo, do bloco de forças derrotado pelo golpe de 1964.
 
O momento histórico
 
Todavia, o momento histórico é outro e o sentido do processo, idem. Na ausência histórica de uma burguesia nacional autônoma, democrática, popular e dirigente, a nova pequena burguesia - ou classes médias, como queiram -, em seu afã de realização social, se apresenta na cena, para susto das velhas classes médias, com seu incontido apetite pelo poder a todo o custo e estonteante balé para nele manter-se. Quem, senão o Estado lhe permitiria realizar tal tarefa propriamente burguesa? Ele é o capitalista coletivo através do qual esse estrato burguês se afirma entre as potências do capital como grande capital – propositalmente enfraquecido pelas privatizações, esse o sentido delas, aliás -, subvertendo, assim, o jogo monopolista privado. O Estado liquidado pelo golpe de 64 possuía forte presença nacionalista, em momento histórico que ameaçava levar ao poder crescentes maiorias populares antiimperialistas e, assim, passar à construção de um capitalismo nacional autônomo e soberano, popular e democrático. Tal projeto, assim como o socialismo chileno e outros arroubos nacionalistas - populistas, na vulgata pró-colonial -, foi devidamente liquidado pela longa marcha da contra-revolução capitalista, como bem notaram Florestan e muitos outros. Impôs-se, nesta, a revolução monopolista como obra-mestra das ditaduras.
 
No entanto, este Estado das novas pequenas burguesias urbanas no poder e dos movimentos sociais sob sua tutela, o Estado do PT e aliados, deseja afirmar a sua autonomia para os negócios nacionais, para a mundialização do imperialismo brasileiro, benévolo e democrático. Ou melhor, para a mundialização solidária, pró-imperialista, capaz de inserir mundial e dinamicamente, com um mínimo de autonomia, esses negócios do capital monopolista nativo. E até de modo ecologicamente sustentável, como quer uma parte desses negócios, apoiadores generosos da candidatura de Marina Silva.
 
O neodesenvolvimentismo, projeto dessas forças, expressa esse rumo ao Brasil Potência, imperialista, anti-colonial e anti-belicista. Porém, de modo inabalável, decidido a construir seu complexo industrial-militar adequado à sua condição de potência terrestre e, agora, mais ainda do que antes, Atlântica, devido ao Pré-Sal. Este se torna objeto a exigir soberania nas águas territoriais brasileiras, como veementemente se expressou Jobim em conferência no Forte de Copacabana (BBC-Brasil, 3/11/2010). Uma miscelânea complexa, sem dúvida. Nada mais complexo que o decorrer das revoluções burguesas conservadoras.
 
O novo mito redentor
 
Atente-se para o mito da erradicação da miséria, servido expressamente como doação de certo valor para a minoração da fome secular, que não vem acompanhado da promessa de universalização dos direitos republicanos ou da democracia como poder crescente das maiorias politicamente emancipadas na República. Nem como expressão do controle sobre a reprodução social, seja sobre o capital financeiro, os meios de comunicação, a ciência e a tecnologia, a função social da terra ou o meio ambiente.
 
Enfim, o anunciado fim da miséria não vem acompanhado pela emancipação nacional e social, como se a miséria fosse atributo exclusivo das maiorias trabalhadoras, dos miseráveis, e não da sociedade da miséria, que a produz e reproduz desde os seus primórdios como forma histórica do capital, colonial e escravista. Como se a miséria não fosse uma forma de produção miserabilizante da riqueza.
 
Por fim, os dois projetos históricos imperialistas em disputa, colonial e anti-colonial, promovem guerra de vida ou morte para ver quem, com mais zelo, carrega os despojos do país herdado da contra-revolução capitalista. A última flor do Lácio desabrocha nos funerais das emancipações.
 
Paulo Alves de Lima Filho é membro do IBEC (Instituto Brasileiro de Engenharia de Custos) e um dos fundadores do Grupo Rosa Vermelha.

Oito gaúchos estão cotados para compor o ministério de Dilma


Bruno Alencastro/Sul21
Foto: Bruno Alencastro/Sul21

Felipe Prestes no Sul21

A presidente eleita Dilma Rousseff (PT) promete anunciar a composição de seu ministério até o dia 15 de dezembro. Nesta semana, a petista começa a montar, junto com a equipe de transição, o quebra-cabeça que envolve os pleitos de cada partido da base aliada e os critérios técnicos para a escolha dos nomes. Oito gaúchos estão cotados para compor o primeiro escalão. Três deles fazem parte do governo Lula e podem permanecer: o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, o presidente da Petrobras Biocombustíveis, Miguel Rossetto, ambos do PT; e o ministro da Defesa, Nelson Jobim (PMDB).
Também circulam nos bastidores os nomes dos deputados federais Mendes Ribeiro Filho (PMDB), Maria do Rosário (PT), Manuela D’Ávila (PCdoB) e do ex-governador Olívio Dutra (PT). Os quatro negam estarem pleiteando o posto de ministro. O deputado federal Beto Albuquerque (PSB) vai na direção oposta: garante que está lutando por um lugar no ministério.
Convidado por Tarso Genro para ocupar a Secretaria de Infraestrutura do RS, o socialista afirma que, ainda antes do convite, já pleiteava um ministério em um provável governo Dilma. Ele esclarece também que vai buscar este espaço dentro das instâncias partidárias do PSB, não em interlocução direta com integrantes da transição. “Quando o Tarso me convidou para compor o governo estadual eu lhe manifestei que disputaria o espaço nacional que coubesse ao PSB”, diz Beto Albuquerque.
O deputado federal reeleito afirma que a possibilidade de participar do governo não fica restrita às áreas de infraestrutura e transportes (Beto já foi secretário dos Transportes no governo Olívio, sendo inclusive colega de Dilma Rousseff, que era secretária de Minas e Energia). Ele aponta como prováveis “concorrentes” dentro do PSB o presidente do PSB paulista Márcio França e o ex-ministro da Integração Nacional Ciro Gomes, que participou com sucesso da coordenação de campanha de Dilma.
Divulgação
Foto: Divulgação

As perspectivas para Beto Albuquerque são boas, porque o PSB, que hoje ocupa dois cargos de primeiro escalão – a Secretaria Especial dos Portos e o Ministério de Ciência e Tecnologia – saiu fortalecido da última eleição. Em 2011, será o partido da base aliada com mais governadores. O PSB também aumentou sua bancada no Congresso. “Há imposição pelo resultado das urnas de que o PSB aumente seu espaço no governo”, diz Beto Albuquerque. “O PSB ganha peso político após a última eleição”, concorda o petista João Motta, futuro secretário de Planejamento do Governo Tarso.
Beto ressalta, contudo, que o PSB não teve qualquer conversa oficial com Dilma Rousseff. Não houve, portanto, uma definição sobre quantos e quais ministérios o partido deve ocupar. Além disso, acredita que os nomes indicados pelo PSB também dependerão de uma anuência da presidente eleita. “Depende da presidente, da disposição dela”.

Indefinições

Dilma Rousseff começou apenas nesta semana a definir os critérios para a escolha dos ministros. “Dilma tomou conhecimento de tudo ontem (16). O Dutra, que estava comandando a transição passou para ela. Eles devem estar montando o quebra-cabeça hoje (17)”, diz o prefeito de São Leopoldo Ary Vanazzi, que participou da coordenação de campanha de Dilma no estado.
O próprio PT ainda não definiu quem indicará para o governo e que espaço pretende ocupar no primeiro escalão, discussão que será realizada nesta quinta-feira (18), em reunião da Executiva nacional. O presidente nacional do partido, José Eduardo Dutra, deve esclarecer aos membros da Executiva do PT quais os critérios definidos pela transição para a composição do governo.
No Rio Grande do Sul, o PT também não tem nenhuma definição sobre indicações que poderá fazer ao futuro governo federal. O presidente estadual do partido Raul Pont explica que haverá uma reunião da Executiva estadual partido na segunda-feira (22) na qual o partido pode decidir por indicar nomes que achar adequados para ocupar ministérios e também cargos do governo federal no RS.
Divulgação
Maria do Rosário/ Divulgação

Por ora, petistas acreditam na permanência de Guilherme Cassel e Miguel Rossetto, e também lembram o nome da deputada federal Maria do Rosário, que poderia ocupar a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Raul Pont, que faz parte da mesma corrente interna que Cassel (a Democracia Socialista), afirma que o ministro do Desenvolvimento Agrário tem manifestado interesse em deixar o ministério, mas, contraditoriamente, crê que Cassel pode permanecer no MDA. “Ele tem dito que não tem interesse em continuar, mas acredito que, se houver o convite para permanecer, ele pode aceitar”.

Sem pretensão por cargos

Correntes do PT já se articulam para que o ministério seja ocupado por Olívio Dutra, se Cassel deixar o cargo. O prefeito de São Leopoldo, Ary Vanazzi, afirma que “tem um grupo do PT que o está bancando para o lugar do Cassel”. Coincidência ou não, Vanazzi faz parte da mesma corrente de Olívio Dutra, a Articulação de Esquerda.
Bruno Alencastro/Sul21
Foto: Bruno Alencastro/Sul21

O ex-governador, por sua vez, garante que não luta para ser ministro. Olívio Dutra diz que apenas viu na imprensa que seu nome circulava como possível ministro e que não autorizou ninguém a postular a ocupação deste posto. Também garante que conversas sobre ocupação de ministérios não estão na sua agenda. “Não autorizei ninguém a fazer qualquer postulação em meu nome. Não pleiteio ser ministro e não tenho tido conversas sobre esse assunto. Apenas vi na imprensa”.
Maria do Rosário, por sua vez, demonstra certo constrangimento em falar sobre a possível indicação para o cargo de ministro. A parlamentar aparenta preocupação em mostrar que não está querendo forçar a barra para fazer parte do primeiro escalão de governo, mas também demonstra o desejo de estar em um ministério: “Estas coisas quanto mais a gente fala, menores são as chances de acontecer”, diz.
Rosário garante que não tem a pretensão de ser ministra, mas que aceitaria fazer parte do governo caso convidada. “Se me convidarem eu vou, mas se não continuarei lutando para defender o governo”, ressalta. Ela lembra que é natural cogitarem seu nome, porque tem sido veiculada a notícia de que Dilma deverá aumentar a participação feminina na Esplanada dos Ministérios, mas garante que “não há nada de objetivo” em torno de sua participação. A deputada atribui a circulação de seu nome à generosidade de correligionários. “Alguns generosos amigos e companheiros lembram do meu nome”.

Nada de oficial

O nome do deputado federal Mendes Ribeiro Filho (PMDB) está altamente cotado para ocupar um ministério. Mendes bateu pé com a maior parte das lideranças de seu partido no estado e comandou com afinco a campanha pró-Dilma entre peemedebistas gaúchos. O parlamentar tem boa relação com o vice-presidente eleito Michel Temer.
Bruno Alencastro/Sul21
Foto: Bruno Alencastro/Sul21

A favor de Mendes também pesa o fato de que o deputado federal Eliseu Padilha ficou como primeiro suplente para 2011 e depende do ingresso de Mendes em um ministério para que Padilha permaneça no Congresso. Padilha tem bom trânsito com o PMDB nacional, com Temer e com os senadores José Sarney e Renan Calheiros. O parlamentar tem trabalhado para que se concretize a indicação de Mendes.
Uma pessoa próxima a Temer confirma que o nome de Mendes Ribeiro Filho tem sido citado em conversas da cúpula peemedebista e é considerado qualificado para compor o ministério. Ressalta, contudo, que o PMDB ainda não definiu indicação de nomes. Explica também que o PMDB ainda não conversou sobre que pasta Mendes poderia ocupar, porque isso dependerá da sinalização da presidente Dilma Rousseff, indicando quais pastas poderão ser ocupadas pelo partido.
Mendes Ribeiro Filho reconhece que seu nome tem sido “muito falado”. “Pessoas comentam, os colegas de bancada comentam. Isto muito me honra”. Mas ressalva que não tem trabalhado para ocupar cargo de ministro. “Eu apenas ouço”, garante. O deputado evita falar sobre que pasta poderia ocupar. “Não posso falar sobre o que não existe”.
O colega de partido de Mendes, Nelson Jobim é um dos ministros mais cotados para permanecer. Seu nome é defendido inclusive pelo presidente Lula e a pasta da Defesa não desperta grande cobiça dos partidos aliados.

Esporte difícil

Outro nome especulado é o da deputada federal Manuela D’Ávila (PC do B) reeleita com mais de 480 mil votos. Diz-se que a comunista poderia chefiar o Ministério do Esporte, que já é comandado por um colega de partido de Manuela, Orlando Silva. A favor de Manuela, além da expressiva votação, pesa o fato de ser coordenadora da Frente Parlamentar do Esporte.
Entretanto, a intenção do PCdoB é manter Orlando Silva no ministério. A pasta tem ganhado cada vez mais visibilidade com a proximidade da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos. Não é interesse do partido mexer em time que está ganhando. O nome de Manuela deve ganhar força se o PCdoB conseguir mais uma pasta no futuro governo.
Bruno Alencastro/Sul21
Um assessor de Manuela diz que a possibilidade de ela ser ministra é mera especulação. Garante que ela não recebeu convite ou sondagens nem do governo nem do PCdoB. E diz que a própria parlamentar deseja que o Ministério do Esporte permaneça sendo comandado pelo colega de partido Orlando Silva.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Israel aprova plano de retirada de povoado sírio-libanês

O governo israelense aprovou nesta quarta-feira um plano para retirar suas tropas de parte de uma aldeia na fronteira libanesa, que tem sido motivo de atritos com o grupo guerrilheiro libanês Hezbollah e com a vizinha Síria.

O gabinete de segurança, formado por 15 integrantes do governo, aprovou por votação a desocupação da parte norte de Ghajar, mas não estabeleceu data. Os ministros disseram que antes disso será preciso discutir com as forças de paz da ONU no Líbano sobre a segurança da zona desocupada.

Israel capturou Ghajar, que fica ao pé das colinas do Golã, em 1967, quando a localidade pertencia à Síria. Posteriormente, uma demarcação do território libanês feita pela ONU abrangeu a parte norte da aldeia, deixando o sul sob controle de Israel.

Os moradores receberam cidadania israelense em 1981, mas se consideram sírios.

Em nota, o governo israelense disse que pretendia preservar "a segurança dos cidadãos de Israel e os meios de vida dos residentes da aldeia, que continua sendo uma unidade indivisível".

Israel deixou o norte de Ghajar em 2000, quando encerrou sua ocupação de 22 anos no sul do Líbano. Mas retomou a área em 2006, durante a guerra contra o Hezbollah, alegando que a aldeia era usada para ataques da guerrilha e para o tráfico de drogas.

O Hezbollah, aliado da Síria e do Irã, controla o sul do Líbano e tem ministros no governo libanês. Resistindo aos apelos por seu desarmamento, o grupo cita a presença israelense em Ghajar como prova de que a ocupação do território libanês continua e precisa ser combatida.

A Unifil (força da ONU no sul do Líbano) e o Hezbollah não se manifestaram sobre a decisão israelense.

Em agosto, o coordenador especial da ONU para o Líbano, Michael Williams, disse que a retirada israelense "faria muito para ajudar a restaurar a confiança" entre as partes em conflito.

Para os moradores, Ghajar deveria ser da Síria. "A aldeia deveria ser devolvida à Síria como parte de uma negociação diplomática", disse Najib Khatib, porta-voz da comunidade, à Rádio do Exército de Israel.

Tecnicamente em guerra, Israel e a Síria mantiveram negociações de paz indiretas ao longo das últimas duas décadas, com poucos progressos.

Israel anexou as colinas do Golã, algo que a comunidade internacional nunca reconheceu, e se recusa a discutir a devolução dessa área estratégica para a Síria. O governo sírio, por sua vez, rejeita a pressão israelense para que se distancie do Irã, do Hezbollah e de grupos militantes palestinos.

"Nenhuma autoridade do governo vem conversar conosco", disse Khatib. "As pessoas aqui estão amarguradas e frustradas. Estamos neste pesadelo há dez anos."

Paco de Lucía - 1


 
Paco de Lucia-Ricardo Modrego





https://www.deflamenco.com/discos/portadas/grandes/pldosgui.jpg



 
Créditos: Loooloblog

Está aberto o processo da ditadura contra Dilma




Superior Tribunal Militar acata pedido do jornal e libera acesso ao arquivo. Quais serão as consequências da divulgação das informações agora?

por Celso Marcondes, em CartaCapital




“STM libera processo da ditadura contra Dilma”: essa é manchete de capa da edição desta quarta-feira 17 do jornal Folha de S.Paulo. A matéria principal ocupa quase toda a página 4 e na abertura já comemora: “advogada da Folha diz que resultado é vitória ‘de toda a sociedade’ ”.
Essa “vitória” que o jornal encampa em nosso nome começou a ser organizada em setembro deste ano, quando a Folha protocolou mandado de segurança no Superior Tribunal Militar. Na ocasião, ela argumentou que era direito de todos os brasileiros saber o histórico da candidata antes que as urnas presidenciais fossem abertas.
No STM, o julgamento foi suspenso duas vezes, mas a Folha não se fez de rogada, em 19 de outubro apelou para o Supremo Tribunal Federal, na esperança de que ele determinasse a abertura dos arquivos antes da realização do segundo turno. Relatora do caso, a ministra Cármem Lúcia, devolveu o caso ao STM, que só agora, por 10 votos contra 1, liberou o acesso do ávido jornal paulistano ao processo.
Na próxima semana será publicada a ata da sessão e a partir daí os repórteres da Folha poderão se deliciar com a leitura de tudo o que os ditadores e seus funcionários escreveram sobre nossa presidenta eleita quando ela tinha cerca de 20 anos.
Até aqui, o que, em síntese, todos sabem, é que Dilma Rousseff combateu a ditadura militar desde muito jovem. Militou numa organização guerrilheira chamada Vanguarda Armada Revolucionária – Palmares, ficou presa por mais de dois anos, foi torturada barbaramente e depois de libertada retomou sua vida no Rio Grande do Sul.
Do meu ponto de vista, é o suficiente, não preciso saber mais. Fico satisfeito em ter conhecimento que, mesmo usando de métodos que nunca aprovei, ela teve a coragem de combater os terroristas que tomaram de assalto o governo e o Estado brasileiro em 1964. Eram eles, como se sabe, militares, apoiados e sustentados por civis, entre os quais muitos empresários, inclusive da área de comunicação.
No entanto, para muita gente conhecer este resumo daquela fase da vida de Dilma não bastou. Desde o momento em que ela foi cogitada como candidata do presidente Lula, a internet foi dominada por uma onda de mensagens que questionavam o currículo militante da candidata. Taxada de cara como “terrorista” até uma ficha falsa foi montada, a descrever os atentados, sequestros e assaltos a banco nos quais ela teria se metido.
A mesma Folha, na época, foi o único jornal que embarcou na história da suposta ficha e a publicou em primeira página, com os devidos comentários desairosos. Sem ouvir antes a acusada. Revoltada, Dilma reagiu, pediu direito de resposta, o jornal foi obrigado a lhe dar espaço e a recuar na denúncia, reconhecendo que não tinha atestado a autenticidade da peça montada não se sabe aonde, o que se constituiu num dos episódios mais vergonhosos da história recente do jornal.
Porém, seus proprietários não pararam por aí e durante toda a campanha eleitoral colocaram jornalistas para investigar este período de sua vida. Não faltaram entrevistas com ex-companheiros de militância, nem com ex-militares ou carcereiros que teriam tido contato com Dilma nos anos 70. O que se buscava então era, digamos, algo mais concreto no currículo da militante: teria participado de algum sequestro ou assalto? Atirado ou matado alguém? Delatado companheiros? Em nenhum momento, porém, qualquer jornalista, depois de muitas entrevistas e pesquisas em outros arquivos que existem pelo País, conseguiu qualquer prova de participações ou atos da jovem de 20 anos em eventos semelhantes.
O que imaginavam os que pretendiam “conhecer melhor a história” da candidata era que, se acusada concretamente de participação numa ação violenta, haveria material de combustão suficiente para abalar sua campanha eleitoral. Numa sociedade pronta para ser comovida por campanhas conservadoras incentivadas por parte da grande mídia, é fácil imaginar a repercussão que teria uma manchete do tipo “Dilma participou de assalto que ocasionou morte de inocente”.
Esta manchete – ou similares – nunca chegou à televisão ou aos grandes jornais, embora tenha frequentado à exaustão a internet. Durante a campanha de José Serra, porém, cansamos de assistir a insinuação: “no meu currículo não há manchas, nem zonas obscuras”, ele dizia sempre, a deixar claro que o candidato “do bem” não tinha nada a esconder, mas a “do mal” deveria ter.
Às vésperas da realização do segundo turno, a liminar da Folha de S.Paulo endereçada ao STF gerou uma onda de rumores nas campanhas. Esperava-se que uma “grande novidade” vinda da abertura do processo causasse comoção suficiente para abalar a trajetória da candidata rumo à vitória nas urnas. A sabedoria da ministra Cármem Lúcia, porém, tirou do Supremo a responsabilidade pela decisão e inviabilizou o final da história antes do pleito.
Dentro de alguns dias o caso terá seu desfecho. Todo o Brasil saberá o que está escrito na ficha real de Dilma Vana Rousseff guardada no cofre militar até aqui.
Saberemos finalmente se a presidenta eleita – não diplomada ainda -, no auge dos seus 20 anos, participou ou não de assaltos, sequestros e atentados. Conheceremos também como foi seu comportamento nas masmorras.
Estará tudo lá, escrito, bonitinho, preto no branco, apenas marcado pela ação do tempo. Com carimbos, assinaturas, rubricas e protocolos. Também pareceres, fotos, recortes de jornais, talvez. Tudo com as devidas chancelas de Humberto de Alencar Castelo Branco, Arthur da Costa e Silva, Emílio Garrastazu Médici e Ernesto Geisel.
Os jornalistas da Folha devorarão avidamente as informações do processo e nos brindarão com um resumo delas. Outros órgãos de imprensa, como já fizeram no dia de hoje com a decisão do STM, repercutirão tudo.
Aí então, uma parte dos brasileiros dirá: nada me toca, continuo a admirar a coragem que a presidenta tinha aos seus 20 anos. Se ela de fato participou de algum ato violento, seus algozes já a fizeram pagar por isso. Mesmo assim, não reconheço nenhuma credibilidade nos arquivos infectos e nos processos manchados de sangue dos generais que escreveram o pior momento da nossa história. E credibilidade é matéria prima da imprensa.
Porém, haverá quem vá dizer: não avisamos? Vocês elegeram uma terrorista.
O efeito que este debate irá causar ninguém sabe medir. È fato, porém, que a Folha comemora hoje a “vitória de toda a sociedade”. Enquanto ela comemora, muitos arquivos e processos continuam fechados. E torturadores e seus mandantes caminham impunes por nossas ruas. Ou morrem de velhice.

* Celso Marcondes é jornalista, editor do site de CartaCapital e diretor de Planejamento da revistal.

Reflexões de Fidel Castro...

Panela de grilos

Nisso virou a reunião do G-20 em Seul, capital da República da Coréia.

O que é o G-20?, perguntarão muitos leitores saturados de siglas. Mais um engendro do poderoso império e seus aliados mais ricos que criaram o G-7: os Estados Unidos, o Japão, a Alemanha, a França, o Reunido Unidos, a Itália e o Canadá.  Depois decidiram admitir a Rússia no clube que então recebeu o nome de G-8.

Posteriormente se dignaram a admitir cinco importantes países emergentes: a China, a Índia, o Brasil, o México e a África do Sul. O grupo cresceu depois com a admissão de vários países da OCDE, mais outra sigla, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico: a Austrália, a República da Coréia e a Turquia. Ao grupo adicionaram a Arábia Saudita, a Argentina e a Indonésia, e totalizaram 19. O vigésimo membro do G-20 foi nada mais, nada menos que a União Européia. A partir deste ano 2010, um país, a Espanha, recebeu a singular nomeação de “convidado permanente”.

Outra importante reunião de alto nível internacional é levada a cabo quase simultaneamente no Japão, a da APEC (Cooperação Econômica Ásia-Pacífico). Se os pacientes leitores somam ao grupo anterior os países seguintes: Malásia, Brunei, Nova Zelândia, Filipinas, Singapur. Tailândia, Hong Kong, China Taipei, Papua-Nova Guiné, Chile, Peru e Vietnã, com importantes trocas comerciais e todos banhados pelas águas do Pacifico, têm o que é chamado APEC: Foro de Cooperação Econômica Ásia-Pacifico, o quebra-cabeça completo. Apenas lhes faltaria o mapa; um laptop pode subministrá-lo perfeitamente.

Nesses eventos internacionais são discutidos os aspectos fundamentais da economia e das finanças do mundo. O Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, com poder decisivo nos assuntos financeiros, têm dono: os Estados Unidos.

É importante lembrar que ao finalizar a Segunda Guerra Mundial, a indústria e a agricultura dos Estados Unidos estavam intactas; as da Europa Ocidental, totalmente destruídas excetuando as da Suíça e da Suécia; a URSS, materialmente arrasada e com enormes perdas humanas que ultrapassavam os 25 milhões de pessoas; o Japão vencido, arruinado e ocupado. Por volta de 80% das reservas em ouro do mundo passaram aos Estados Unidos.

De 1 a 22 de Julho de 1944, num isolado embora amplo e confortável hotel de Bretton Woods, pequena localidade do estado de New Hampshire no nordeste dos Estados Unidos, foi realizada a Conferência Monetária e Financeira da recém-criada Organização das Nações Unidas.

Os Estados Unidos obtiveram o excepcional privilégio de converter seu papel moeda em divisa internacional, conversível em ouro à taxa fixa de 35 dólares a onça Troy. Visto que a imensa maioria dos países deposita suas reservas de divisa nos próprios bancos dos Estados Unidos, o que equivale a um considerável empréstimo ao país mais rico do mundo, a conversibilidade ao menos estabelecia um máximo à impressão sem limites de papel moeda. E ao menos significava uma garantia para o valor das reservas dos países depositadas em seus bancos.

Partindo desse enorme privilégio, e tendo a emissão de notas a limitante de sua conversibilidade em ouro, o poderoso país aumentava seu controle sobre as riquezas do planeta.

As aventuras militares dos Estados Unidos na aliança com as antigas potências coloniais, principalmente o Reino Unido, a França, a Espanha, a Bélgica, a Holanda e a recém-criada Alemanha Ocidental, levaram-nos a guerras e aventuras militares que deixaram em crise o sistema monetário nascido em Bretton Woods.

Na época da criminosa guerra contra o Vietnã, país onde os Estados Unidos estiveram a ponto de usar as armas nucleares, o Presidente norte-americano decidiu de maneira unilateral e desavergonhada suspender a conversibilidade do dólar. Desde então a emissão do papel moeda não teve limites. Abusaram de tal forma desse privilégio que o valor da onça Troy de ouro passou de 35 dólares a cifras que têm ultrapassado já os 1 400 dólares, isto é, não menos de 40 vezes o valor que manteve durante 27 anos, até 1971 em que Richard Nixon adotou a funesta decisão.

O pior da atual crise econômica que afeta atualmente a sociedade norte-americana é que as medidas anticrise de outros momentos da história do sistema capitalista imperialista dos Estados Unidos não conseguiram reiniciar a marcha normal. Imerso numa dívida do Estado que se aproxima aos 14 trilhões de dólares, quer dizer, tanto quanto o PIB dos Estados Unidos, o déficit fiscal continua; os enormes gastos para salvar os bancos e a redução quase a zero das taxas de interesse apenas reduzem por baixo de 10% o nível de desemprego, nem o número de famílias cujas moradias estão a ser arrematadas. Crescem os gigantescos orçamentos destinados à defesa que ultrapassam os restantes do mundo, e pior ainda: os destinados à guerra.

O presidente dos Estados Unidos, eleito há apenas dois anos por um dos partidos tradicionais, sofreu a maior derrota nos últimos três quartos de século. Nessa reação misturam-se a frustração e o racismo.

O economista e escritor norte-americano William K. Black estampou uma frase memorável: “A melhor forma de roubar um banco é ser seu dono”. Os setores mais reacionários dos Estados Unidos afiam seus dentes fazendo sua uma idéia que seria a antítese da dos bolcheviques em outubro de 1917: “Todo o poder para a extrema direita dos Estados Unidos”.

Segundo parece, o Governo dos Estados Unidos com suas medidas tradicionais anti-crise, tomou outra decisão precipitada: a Reserva Federal anunciou que compraria 600 bilhões de dólares americanos antes da reunião do G-20.

Na quarta-feira 10 de novembro, uma das mais importantes agências de imprensa dos Estados Unidos informou: “O presidente Barack Obama chegou à Coréia do Sul para participar das reuniões dos 20 principais poderes econômicos do mundo.

“As tensões sobre políticas monetárias e interesses comerciais fizeram-se notar antes da cúpula do Grupo dos 20. O ambiente tornou-se quente devido a uma decisão dos Estados Unidos de inundar sua débil economia com 600 bilhões de dólares à vista. A manobra fez com que líderes do mundo fiquem enfurecidos.

“Obama, contudo, defendeu a medida tomada pela Reserva Federal.”

A própria agência comunicou à opinião mundial em 11 de novembro:

“Na quinta-feira, um forte sentimento de pessimismo caracterizou o início da cúpula econômica dos principais países ricos e em desenvolvimento, da qual participaram os líderes mundiais profundamente divididos sobre suas políticas monetárias e comerciais.

“Fundado em 1999 e elevado a nível de cúpula há dois anos, o Grupo dos 20 (G-20, um foro que abrange países desenvolvidos como os Estados Unidos e a Alemanha, e também a gigantes emergentes como a China e o Brasil) virou peça central dos esforços governamentais para reativar a economia global e evitar outro colapso financeiro mundial...”

“Um fracasso da Cúpula de Seul teria conseqüências graves. O risco é que os países tentem manter suas divisas artificialmente baixas para dar a suas exportações uma vantagem competitiva nos mercados mundiais e isso levaria a uma destrutiva guerra comercial.

“Além disso, os países ver-se-iam tentados a pôr taxas alfandegárias às exportações, uma repetição das políticas que agravaram a Grande Depressão da década de 1930.”

“Alguns países, como por exemplo, os Estados Unidos, acham que a máxima prioridade é pressionar a China para que permita a reavaliação de sua moeda ante outras divisas, de modo que diminuam os enormes superávits comerciais do gigante asiático com Washington ao encarecer as exportações chinesas e abaratar as importações estadunidenses.

“Outros países estão furiosos pelos planos da Reserva Federal estadunidense de fazer uma injeção de 600 bilhões de dólares frescos à débil economia do país. Eles vêem essa ação como uma medida egoísta para encher os mercados com dólares, diminuindo dessa maneira o valor da nota verde, oferecendo aos exportadores estadunidenses uma vantagem de preços injusta.

“Os países do G-20 [...] encontram pouco espaço comum no tema mais incômodo: o que se pode fazer com uma economia mundial que depende dos enormes déficit comerciais dos Estados Unidos com a China, a Alemanha e o Japão.”

“O presidente do Brasil, Luz Inácio Lula da Silva, advertiu na quinta-feira que o mundo iria à bancarrota se os países ricos fazem recortes em seu consumo e tentam de obter prosperidade só tendo como base as exportações.”

“Se os países mais ricos não consomem e todos querem espalhar sua economia com base nas exportações, o mundo irá à falência porque não existe alguém que compre. Todos querem vender...”

“A cúpula começou com certo pessimismo para Obama e o presidente sul-coreano, Li Myung-bak, cujos ministros não conseguiram chegar a um acordo sobre um tratado de livre comércio, estagnado há tempo e do qual havia esperanças para que fosse resolvido nesta semana.”

“Os mandatários do G-20 reuniram-se na quinta-feira à noite no Museu Nacional da Coréia em Seul para o jantar que marcou o início oficial da cúpula.”

“Nas ruas dos arredores, vários milhares de manifestantes protestaram contra o G-20 e o governo da Coréia do Sul.”

Na sexta-feira, dia 12 de novembro, a cúpula concluiu com uma declaração de 20 pontos e 32 parágrafos.

Como é de supor o mundo não é constituído apenas por 32 países em total que fazem parte do G-20 ou só a APEC. Os 187 que votaram a favor da eliminação do bloqueio a Cuba perante os dois que votaram a favor de mantê-lo e os três que se abstiveram, totalizam 192. Para 160 deles não existe tribuna onde possam falar sobre o saqueio imperial de seus recursos e seus urgentes necessidades econômicas. Em Seul a Organização das Nações Unidas nem sequer existe. Essa benemérita instituição não dirá ao menos uma palavra?

Por estes mesmos dias chegaram do Haiti notícias verdadeiramente dramáticas — onde um sismo matou em questão de minutos por volta de 250 mil pessoas em janeiro deste ano — através de agências de notícias européias:

“As autoridades haitianas advertem a rapidez com que a epidemia de cólera se estende pela cidade de Gonaives, na zona norte da ilha. O prefeito desta localidade costeira, Pierreleus Saint-Justin, garante ter enterrado pessoalmente 31 pessoas na terça-feira, à espera de sepultar mais 15 cadáveres.


“’Outros poderiam estar morrendo enquanto falamos’ declarou. [...] desde o dia 5 de novembro já foram inumados 70 corpos só na zona urbana de Gonaives, mas ‘são mais as pessoas que morreram em áreas rurais’ próximas à cidade.”

“... a situação ‘torna-se catastrófica’ em Gonaives  [...] as inundações provocadas pelo furacão ‘Tomas’ podem fazer com que piore a situação.”

“As autoridades sanitárias do Haiti anunciaram na quarta-feira que até o dia 8 de setembro o número de vítimas produto da doença tinha aumentado em todo o país a 643. O número de contagiados de cólera no mesmo período é de 9 971. As emissoras de rádio informam que as cifras que serão divulgadas na sexta-feira poderiam fazer referência inclusive a mais de 700 mortos.”

“... O governo assevera que a doença está a incidir gravemente na população de Porto Príncipe e ameaça os subúrbios da capital, onde mais de um milhão de pessoas continuam a viver em barracas de campanha desde o terremoto de 12 de janeiro.”

Hoje as notícias falam de 796 mortos e 12 303 pessoas afetadas.

Mais de três milhões de habitantes estão ameaçados, muitos deles vivendo em barracas de campanha e nas ruínas que deixou o terremoto, sem água potável.

A principal agência norte-americana informou no sábado:

“A primeira parte do Fundo Estadunidense de Reconstrução para o Haiti já está a caminho, mais de sete meses depois de ter sido prometida para ajudar à reconstrução do país após o devastador terremoto de janeiro.”

“... transferirá nos próximos dias 120 milhões de dólares — aproximadamente uma décima parte da quantidade total prometida — ao Fundo de Reconstrução do Haiti administrado pelo Banco Mundial, disse P. J. Crowley, porta-voz do Departamento de Estado.”

“Um assistente do Departamento de Estado disse que o dinheiro destinado ao fundo será utilizado em tirar o entulho, em moradias, créditos, apoio ao plano da reforma educativa do Banco Interamericano de Desenvolvimento e para apoiar o orçamento do governo haitiano".

A respeito da epidemia de cólera, doença que já afetou durante anos muitos países da América do Sul, e que se pode estender pelo Caribe e por outras partes de nosso hemisfério, não foi dita  nem uma palavra.

*A tradução foi feita pelo Portal Cuba.

A memória histórica como campo da luta de classes (1ª parte)


Por Augusto Buonicore no sitio GRABOIS
 
Se perguntássemos para qualquer pessoa comum o que é história, elarapidamente nos diria: É algo que trata de fatos e personagens que existiram num passado mais ou menos distante. Estes três elementos (fatos, personagens e passado), sem dúvida, entrariam em duas de cada três definições do que seria História. E, ao referir-se ao passado, pensavam-na como uma coisa morta, que nada poderia nos dizer e, muito menos, nos ensinar sobre o presente.
Não é sem razão que no interior das salas de aula a história muitas vezes foi tida como uma disciplina chata. Isto se deu especialmente devido a pouca relação estabelecida entre o que era ministrado e os problemas concretos vividos pelos alunos. Não existia qualquer convicção de que o aprendizado da história pudesse ajudá-los desvendar e, principalmente, transformar o mundo em que viviam.

O problema é que o passado do historiador não deveria ser – e não é - algo morto, como o fóssil de um dinossauro encravado numa rocha ou exposto num museu. Os fatos, como uma espécie de matéria-prima da história, não são coisas mortas que apenas devem ser coletados e colocados numa seqüência rigorosamente cronológica.

Repito, não é possível estudar uma comunidade humana e seu desenvolvimento histórico como se fosse uma colméia ou um conglomerado de rochas. Estranhamente, este passado continua vivendo e produzindo seus efeitos sobre nós e é, justamente, por isso que deve ser estudado e melhor compreendido.

No caso das ciências humanas – ao contrário das ciências naturais e exatas – não há uma muralha da China separando o objeto a ser estudado (as sociedades) e o sujeito que o estuda (o historiador, o sociólogo etc.), mesmo tratando-se do estudo de agrupamentos que viveram há milhares de anos.
Para os antigos historiadores, de tendência positivista, os fatos eram como coisas brutas. Eles estavam permanentemente atrás dos fatos puros, duros e irretorquíveis.

Contra os fatos não há argumentos, gostavam de dizer. Contudo, os fatos não falam por si mesmos, como afirma o senso comum positivista. Segundo o historiador inglês Edward Carr, “os fatos falam apenas quando o historiador os aborda: é ele quem decide quais os fatos que vem à cena e em que ordem e em que contexto”. E conclui: “A convicção num núcleo sólido de fatos históricos que existem objetiva e independentemente da interpretação do historiador é uma falácia absurda, mas que é muito difícil de ser erradicada”.

No entanto, o historiador que se propõe fazer perguntas ao passado não é um ser desencarnado, separado do mundo. Ele é membro de uma determinada sociedade, de uma determinada época, de uma determinada classe social. Ele se encaixa no interior de determinadas ideologias e perspectivas teórico-metodológicas, que, na maioria das vezes, têm um forte sentido classista. Portanto, o historiador não é neutro diante dos conflitos e dos problemas que aparecem à sua frente durante a pesquisa que realiza.

É sua situação no mundo que determina as perguntas e as escolhas cotidianas que faz. Isto, é claro, vai direcionar as respostas que ele procura encontrar. Um historiador liberal-burguês, por exemplo, jamais colocaria a questão: De onde vem a exploração do trabalho? Para ele, o conceito exploração nada teria de científico, não passaria de uma excrescência ideológica - invenção de alguns socialistas inconformados.

A história não é a simples catalogação neutra de fatos ocorridos no passado. A missão dos historiadores é relacioná-los numa totalidade concreta (processo histórico) e, principalmente, interpretá-los. E a interpretação sempre tem por base determinada teoria ou ideologia. A partir dos mesmos fatos podemos construir várias e contraditórias interpretações.

O historiador marxista tem como objetivo fornecer uma explicação coerente das origens e desenvolvimento das sociedades humanas em suas diversas dimensões. Compreender as inúmeras transformações por que elas passaram. As mudanças sociais devem ser, em última instância, os verdadeiros objetos da história.

As sociedades humanas – como tudo no universo - estão num constante movimento. Elas nascem, desenvolvem-se - conhecem várias fases – e depois fenecessem. Estas transformações podem se dar lentamente – quase imperceptíveis - ou de maneira abrupta, como ocorre nas guerras e nas explosões revolucionárias.

Mas, qual é o motor dessas permanentes mudanças? São as contradições existentes no seio de cada sociedade, que se traduzem naquilo que os marxistas chamaram de lutas de classes.

Por que os trabalhadores devem conhecer a história?

Em todas as comunidades humanas existe um combate surdo pela memória. Este combate faz parte de uma luta ainda maior que é a travada pela conquista da hegemonia. Em outras palavras, a história é um espaço no qual grupos sociais se enfrentam para decidir qual deles dirigirá os rumos da nação e mesmo do planeta.

Por isso, as classes dominantes sempre procuraram reconstruir o passado para, no presente, justificar sua própria dominação. Os líderes das nações imperialistas também buscaram se utilizar da chamada história universal para justificar a dominação e a exploração que exerciam sobre outros povos, considerados inferiores.

Vejamos alguns exemplos extremos destas tentativas: os faraós do Egito foram transformados em filhos diletos do Deus Rá, alguns governantes gregos e romanos também foram transformados em descendentes de deuses e heróis olímpicos. Para justificar a escravidão africana, os negros foram considerados descendentes de Cam, o filho amaldiçoado de Noé. Deveriam pagar, através da servidão, pelos pecados de seus antepassados. Estes são apenas exemplos mais descarados da reconstrução mítica da história feita pelos membros das classes proprietárias no poder e seus escribas. Existem outros exemplos mais sutis, menos perceptíveis, mas, nem por isso, menos perversos.

Os deserdados da terra, os povos explorados, escravizados - ou mesmo eliminados - deixaram poucos rastros na história. Os escravos do Egito, Roma e Grécia não nos deixaram nenhuma obra escrita, apresentando seu ponto de vista sobre a situação na qual viviam. Quem escreveu a história dessas sociedades antigas foram homens livres e, na sua quase totalidade, proprietários de terras e de escravos. Alguns imperadores, também, aventuraram-se no oficio de escrever história. É claro que para enaltecer os seus próprios feitos e dos seus antepassados.

No Brasil, as coisas não podiam ser diferentes. Aqui, também, não foram os índios e negros escravizados que escreveram a história do país. Afinal, a quase totalidade deles não sabia ler e escrever – era lhes proibido freqüentar escolas. O que sabemos deles, num primeiro momento, nos foram contados por viajantes estrangeiros e jesuítas. Relatos que muitas vezes descreviam o martírio desses povos, mas, em geral, vinham carregados de inúmeros preconceitos e graves incompreensões.

Somente na segunda metade do século XIX, ao começar ser questionada a escravidão, surgiu pela pena dos abolicionistas uma outra história, mais crítica ao passado escravista. Mesmo assim, apesar de sua boa vontade, os abolicionistas não poderiam expressar adequadamente as opiniões dos explorados. E aqui não vai nenhum demérito a eles. Pois, foi através dos óculos desses escritores que começamos conhecer um pouco mais da evolução e vicissitudes de nossa sociedade.

Não quero dizer com isto que se os índios e os negros escravizados soubessem ler e escrever produziriam uma interpretação exata da sociedade na qual viviam. Eles ainda não tinham o instrumental teórico necessários para isso. Mas, com certeza, seus depoimentos nos permitiram ver a realidade por outros ângulos e acabar de montar o quebra-cabeça do que foi a nossa sociedade colonial e escravista. O olhar da senzala jamais será o mesmo da Casa Grande, mesmo que por ela pudesse ser fortemente influenciado. Este, inclusive, o erro daqueles que pretendem generalizar as conclusões de Gilberto Freyre na sua obra magna.

Podemos dizer que somente com o advento do capitalismo e a formação de uma classe operária moderna, que sabia ler e escrever – podendo, assim, produzir seus próprios intelectuais orgânicos -, é que foi possível construir uma história mais coerente das classes exploradas. Apesar disso, por um bom tempo, esta nova história (socialista) tendeu a ser marginal, fora dos grandes circuitos, como as academias e o mercado editorial. Afinal, as idéias dominantes são sempre – ou quase sempre – as idéias das classes dominantes.

Somente tendo a consciência que a história é um espaço de luta de classes, os trabalhadores poderão se dedicar com mais afinco ao seu estudo e elaboração. O domínio da história e da dinâmica das sociedades em que vivem – como das experiências de resistência desenvolvidas por seus antepassados - os ajudará travar, de maneira mais conseqüente, as lutas do presente, avançando rumo ao socialismo.

Saber que as sociedades se transformam – que nada é imutável -, e que o principal instrumento dessas mudanças é a ação consciente dos homens, tem um efeito decisivo no processo de constituição da classe dos trabalhadores, como agente ativo de sua própria história.

O combate à discriminação e a educação antirracista



VERA ROSANE RODRIGUES DE OLIVEIRA no sitio do CPERS


Este artigo tem como preocupação a relevância do combate à discriminação racial através das lutas impelidas pelo Movimento Social Negro Organizado, o qual nos últimos 90 anos privilegia como eixo central de suas reivindicações a educação, enquanto elemento capaz de possibilitar as mudanças de “ideias”, a fim de combater o racismo. Há muito as organizações negras lutam contra a discriminação racial intuitivamente ou não tendo na educação um de seus pilares para sua inclusão no mundo do trabalho. No entanto, é necessário vermos esta questão na perspectiva da sociedade de classes, que utiliza das diferenças sejam elas quais forem, em especial das diferenças raciais, para melhor explorar o conjunto da classe oprimida.
Assim, com a conotação de que o racismo se constituiu ideologicamente e se pauta na discriminação racial para criar as desigualdades de oportunidade e de acesso que dão origem as mais variadas formas de exploração social, que são percebidas nos campos econômico/político-jurídico e cultural e que constituem as bases da dominação e da exclusão social. Neste prisma, deve-se analisar a educação como parte de um processo ideológico de manutenção da hegemonia da elite racialmente dominante.
Pois, como salienta Lia Faria em seu artigo intitulado O papel da Escola no Processo de reversão (ou eliminação) da exclusão social (1996, p. 9-10): Longe de ser uma prática desinteressada e neutra, a educação é um importante instrumento de reprodução social, impondo ao educando o modo de pensar considerado correto, a maneira ״cientifica˝, ״racional˝, ״verdadeira˝ de se entender e explicar a sociedade, a família, o trabalho, o poder, bem como os modelos sociais de comportamento, as formas tidas como corretas de se comportar na família e no trabalho, de se relacionar com Deus, a autoridade, o sexo oposto, os ״subalternos˝.
Esta característica de reprodução de comportamentos trazida por Faria é significativa, principalmente em uma conjuntura onde as demandas por políticas de combate ao racismo, pautadas pelo Movimento Social Negro, começam a ver seus limites estruturais. Não importando se sejam elas políticas educacionais de inclusão como as Cotas e a Lei 10.639 com um caráter mais pedagógico ou mesmo as que tangem aspectos mais globais como o Estatuto da Igualdade Racial, aprovado em agosto deste ano de 2010 e que desconstitui ações voltadas para saúde da população negra e dos Territórios de Quilombos.
 A educação e todo o processo educacional devem ser entendidos enquanto partícipe em uma análise aprofundada e seu aspecto de manutenção da ordem discriminatória. Porém, existe uma determinada postura de mudança que também necessita ser observada, pois o movimento social negro ao optar como forma de reorganização da luta a educação, aposta na mesma como instrumento possível à mudança de mentalidade. Segundo Giroux (1988, p. 32), “a escola é uma das esferas públicas, juntamente com as associações de classe, sindicatos e partidos, isto é, espaços onde a sociedade discute e procura soluções para os seus problemas coletivos”.
As organizações negras há muito já entenderam isso. Mesmo antes do final da escravidão, o Estado Brasileiro enquanto Instituição já tinha a preocupação de determinar os critérios de acesso ou possibilidades aos negros na escola.
O Decreto nº 1.331 de 17 de fevereiro 1854 proíbe nas escolas públicas do país a admissão de escravos e prevê a instrução de adultos negros dependendo da disponibilidade do Professor. Ainda, o Decreto nº 7.031-A, de 06 de setembro de 1878, estabelece que os negros pudessem estudar no horário noturno. Teve-se ainda neste período a Lei Eusébio de Queirós, que aboliu o tráfico negreiro no Brasil, e ao mesmo tempo a Lei que regulamenta a posse e venda de terras.
Observa-se, assim, que a desigualdade entre brancos e negros não se deu de forma particularizada e individualizada, pelas potencialidades dos sujeitos. Mas se consubstancia por vias institucionais da Coroa Real.
Segundo Gohn (1995, p. 42), “as revoltas eram constantes, sendo a da Bahia uma das mais significativas. O apoio à causa da abolição começava a aparecer, vindo a ser transformado nas décadas seguintes na principal questão do país”. A história oficial nos induz a crer que as lutas negras nunca se deram de forma organizada. No entanto, pode-se citar apenas um dos vários exemplos que retratam o quanto é necessário se re-estudar a história: em 1857, trinta anos antes da abolição da escravatura, houve no Rio de Janeiro a primeira Greve de Escravos-operários do Brasil, Gohn (ibid).
Este fato é significante, uma vez que a maioria dos acadêmicos, bem como os militantes sindicais no país, reconhece as lutas organizadas apenas a partir do anarco-sindicalismo, ou seja, do ingresso da imigração Italiana.
Problematizar estes elementos dá sentido às indagações levantas pelo Professor Cunha Junior, de que a produção acadêmica, conta apenas a história dos eurodescendentes, seja pelos setores mais reacionários ou progressivos da intelectualidade. Ou como ainda expresso pelo militante trotskista, James Cânon (2000, p. 03):O movimento socialista anterior [...] jamais reconheceu a necessidade de um programa especial para a questão do negro. Esta era considerada pura e simplesmente um problema econômico, uma parte da luta entre os operários e os capitalistas, a ideia era que não se podia fazer nada sobre os problemas especiais da discriminação e desigualdades antes da chegada do socialismo.
Trilhar o caminho constituído pelo movimento negro até a formulação de que o Estado tem papel emblemático, através das políticas públicas e ações afirmativas como forma de reparações aos crimes da escravidão é fundamental. Em 2001 na III Conferência Internacional Contra o Racismo, a Discriminação, a Homofobia e todas as formas de Intolerância, Correlatas, em Durban, na África do Sul, o racismo foi reconhecido como Crime que Lesa a Humanidade. É preponderante para se perceber a possibilidade da mudança estrutural das condições de desigualdade vividas pelos negros.
A política de cotas em sua formulação atual é um anseio da história contemporânea. No entanto, tem suas raízes desde as associações de ajuda mútua do início do século XIX, passando pela Frente Negra Brasileira e o Teatro Experimental do Negro, a fundação do Movimento Negro Unificado, em 1978 até a configuração da Lei de Cotas em 2001.
Entender o papel educativo da luta negra inferindo no papel social da educação é contribuir no processo de desalienação em que o capitalismo submete a todos de uma forma indistinta, criando a divisão dos próprios trabalhadores, seja, pelas questões de exploração de classe através de salários e condições de trabalho diferenciadas, entre negros e brancos, homens e mulheres, seja pelas possibilidades de acesso aos recursos institucionais, como escolas, universidades, trabalho e outros.
Pois, tanto as relações sociais de produção, e reprodução, como a escola educam o trabalhador para divisão, e essa divisão gerada é que permite que o conhecimento científico e o saber prático sejam distribuídos desigualmente. Assim, também não nos permite entender o processo de construção das relações sociais e do mundo do trabalho.
Estes elementos emblemáticos necessitam ser analisados e incorporados ao espaço da sala de aula, visto ser premente políticas públicas e ações afirmativas como cotas nas universidades, nos serviços públicos, salário igual para trabalho igual, a real implementação da Lei 10.639 ou mesmo a re-discussão de um Estatuto da Igualdade Racial que leve em consideração não apenas os termos raça, racial, escravidão e discriminação que foram abolidos, mas que reveja recursos para implementação de todas as ações necessárias principalmente na educação.

VERA ROSANE RODRIGUES DE OLIVEIRA  é doutaranda em Educação/UFRGS