sábado, 28 de maio de 2011

Homossexualismo

* Edir Macedo no Sul21

Tenho lido todos os comentários deste blog. Os prós e os contras. Não me surpreendo quando pessoas alienadas à verdadeira fé cristã nos criticam. Se o fizeram com o Senhor Jesus, não o farão com Seus servos? Mas o que me deixa perplexo é o grau de insensatez entre aqueles que usam textos bíblicos para condenar os homossexuais. Será que a Bíblia coroa juízes? Será que por sermos discípulos de Jesus somos automaticamente elevados à condição de perfeitos a ponto de julgar e condenar os homossexuais, por exemplo?
Infelizmente, um dos fatores que mais tem impedido as pessoas de conhecer o Salvador e entender a mensagem do Evangelho é justamente a prepotência de muitos membros de igrejas, que se julgam crentes e seguidores da Palavra, e que só são capazes de estender a mão para apontar, criticar ou agredir o próximo, mas nunca como um sinal de amor, um gesto de respeito ao ser humano.
A pessoa preconceituosa tende a partir do princípio de que ela própria é o modelo ideal de ser humano, condenando à exclusão social todos os que aparentemente se diferem dela. Um “cristão” que pratique qualquer ato de repulsa contra outra pessoa é um paradoxo. Ele não apenas exclui seu próximo socialmente, mas tira dele a possibilidade de conhecer a compaixão Divina; o exclui de alcançar a salvação.
A única maneira de apresentarmos o amor de Deus, principalmente àqueles que são excluídos, é materializando este sentimento em gestos verdadeiros de atenção, respeito, solidariedade e inclusão. É só assim que estaremos praticando Sua ordem: Sede misericordiosos, como também é misericordioso vosso Pai. Lucas 6.36
A mesma Bíblia que condena o homossexualismo, condena qualquer outro tipo de pecado, mas o Senhor Jesus acolhe a todos, sem distinção. Se formos condenar os homossexuais, então teremos de condenar a nós mesmos. Pois, quem está livre de pecados? Qual a diferença entre pecadinho ou pecadão? Deus não faz esta distinção.
A imagem que as pessoas vendem de si mesmas pode até convencer apenas outras pessoas sobre a santidade que se pretende aparentar, mas Deus enxerga o que vai no seu íntimo e isso não há o que disfarce.
Jamais vou defender o homossexualismo, mas sempre terei fé para ajudar tanto homossexuais quanto heterossexuais que estejam dispostos colocar suas dores, sofrimentos e fraquezas aos pés dAquele que quer salvá-los. Só não tenho fé para aturar hipócritas.
Para os crentes cascudos recomendo meditar:
Deus nos habilitou para sermos ministros de uma NOVA ALIANÇA, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica. 2 Coríntios 3.6

* Edir Macedo é um televangelista, empresário e religioso brasileiro, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus proprietário da Rede Record de Televisão.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Uma vitória da dignidade


Decisão da Suprema Corte exige que Califórnia reduza a população carcerária e torne suas penitenciárias mais humanas

Anthony Kennedy, apontado para a Suprema Corte por Ronald Reagan, vem há anos condenando as condições desumanas das prisões norte-americanas. Natural da Califórnia, ele também se interessou pela particularmente horrenda superlotação carcerária do estado. Em Los Angeles, no ano passado, ele considerou “doentio” que os carcereiros e guardas das prisões estaduais tenham patrocinado uma iniciativa popular que, juntamente com outros excessos, agora mantém uma enorme quantidade de californianos presos.
Logo, não chegou a ser uma surpresa que Kennedy tenha sido o autor do texto da opinião majoritária em uma decisão de 5 votos contra 4 nessa semana, que exige que a Califórnia reduza sua população carcerária. A capacidade total é definida como um prisioneiro por cela, o que no estado significaria 80 mil prisioneiros. Mas as prisões da Califórnia muitas vezes abrigam o dobro de presos, com detentos alojados em beliches nos ginásios. No momento a lotação das prisões californianas é de 175%. A decisão da Suprema Corte exige que esse número seja reduzido para 135% nos próximos dois anos.
A superlotação não significa apenas um aumento na violência, mas também tratamento médico e mental inadequado, com um aumento no número de mortes e suicídios. “Como você vai evitar ou conviver com pessoas sentadas sobre suas fezes por dias em um estado perturbado?” perguntou a juíza Sonia Sotomayor a um advogado representando a Califórnia em novembro do mês passado. Em seu discurso nessa semana, Kennedy mencionou um detento que havia sido “mantido em uma jaula por quase 24 horas, coberto por sua própria urina, praticamente catatônico”.
Tais condições são, nas palavras de Kennedy, “incompatíveis com o conceito de dignidade” e se somam ao “castigo cruel” inconstitucional. Os quatro juízes considerados liberais concordaram. Os quatro conservadores discordaram. Para o juíz Samuel Alito, o caso não era de dignidade, mas de segurança pública. A decisão, diz ele, forçará a Califórnia a colocar nas ruas “46 mil criminosos – o equivalente a três regimentos do exército”.
Essa afirmação é um exagero, e não apenas nos números. Em primeiro lugar, a decisão por si só não ordena que os presos sejam liberados. Na teoria, a Califórnia poderia construir novas prisões ou enviar detentos para outros estados. Considerando a crise no orçamento californiano, essa medida é improvável. Mas a Califórnia também poderia enviar presos para as penitenciárias dos condados. No momento, o governador Jerry Brown, está tentando fazer exatamente isso, e está em conflito com as administrações locais.
De maneira geral, muitos prisioneiros podem ser liberado sem nenhuma ameaça à segurança pública. O que causou essa superlotação foram as leis draconianas que mandaram, sem necessidade alguma, para trás das grades, enormes números de presos não violentos: pessoas presas por fumar maconha ou passar cheques sem fundo, ou por faltarem a reuniões com os agentes da condicional.
Mais surpreendente foi o tom usado por outro que não concordou com a decisão, o juiz Antonin Scalia. Chamando o procedimento de “farsa judicial”, Scalia escreveu que a decisão irá beneficiar detentos que “sem dúvida serão grandes espécimes físicos, que desenvolveram músculos intimidadores puxando ferro no ginásio da prisão”. Essa foi a linguagem do sarcasmo, não da dignidade.

Operários do sexo virtual



A explosão de conteúdos “adultos” na internet resultou em uma indústria que liga “artistas” na frente de suas câmeras e “voyeurs” sentados diante de seus computadores.Esse sistema econômico opaco prospera com a exploração dos “produtores de conteúdo” e prefigura uma forma de divisão do trabalho facilitada pela internet
por Olivier Corten no LeMondeBrasil
 
Podemos chamar de “artistas” ou “modelos”. São sobretudo mulheres jovens, embora existam também homens, casais e mulheres maduras. Instalados diante das câmeras de seus computadores, eles trabalham conectados à internet tentando atrair o cliente para que venha se juntar aos seus chats privados. Striptease de um continente a outro, eles dialogam, se exibem, simulam excitação sexual e respondem a pedidos de clientes enviados pelo teclado ou por voz.
Remunerados por base de porcentagem sobre o tempo de conexão pago a esses sites especializados, eles são filipinos, romenos, russos, norte-americanos, colombianos ou franceses. Dentro de uma decoração que reproduz clichês visuais de “quartos de motéis”, eles vendem de suas camas – às vezes de uma simples poltrona – tempo de exibição, diálogo e simulação. O site Live Jasmin diz ter 31.315 garotas e 8.921 rapazes. Por um sistema de filiação, as plataformas oferecem aos proprietários desse tipo de site uma lista mundial de modelos que possibilita, graças à diferença de fuso horário, possuir sempre on-line um conjunto de muitas centenas de pessoas disponíveis. Em troca dessa oferta sempre renovável, a plataforma fica com uma parte significativa dos ganhos, repassando 30% ao webmaster.
Diferentemente dos sites e fóruns cujos anúncios têm por objetivo um encontro físico, esses novos espaços de consumo sexual são inteiramente virtuais. Muito claros e precisos quanto às condições de utilização do site, avisam que, se tentarem contatar os modelos, os usuários serão excluídos.
Uma conexão de dez minutos com quatro clientes simultaneamente não passa, segundo os sites, de 5 a 10 euros. Na melhor das hipóteses, é como ganhar um salário mínimo mensal em algumas horas, em um só dia, diante de uma câmera – na pior, algumas dúzias de euros.
Tal como acontece com a oferta de trabalho a domicílio, os anúncios de recrutamento na internet falam em “nenhuma obrigação de carga horária”, “fazer dinheiro” etc. Sempre em busca de novos recrutas, as plataformas propõem remuneração garantida (variáveis segundo o país dos visitantes) que vão desde alguns centavos a 1 euro por minuto de “show privativo” – que na prática pode reunir vários espectadores pagando cada um 1 euro por minuto.
Essa economia da virtualidade não necessita de contratos nem imobilização financeira ou imobiliária, nem de nenhum investimento, mas apenas da locação de servidores e banda larga que permita o roteamento de áudio e vídeo. Os proprietários e acionistas dessas nebulosas transações permanecem invisíveis. Essa economia feita de tecnologia, virtualidade, fluxos, paraísos fiscais e pobreza assemelha-se à nova economia desmaterializada de hoje. Sabe-se muito pouco sobre a “produção de conteúdo”. Os ganhos dos hostsficam em total obscuridade. O empobrecimento e a concorrência fazem o resto. E eis que então emerge um novo proletariado mundial: o dos fornecedores de conteúdo das tecnologias de informação, que nenhuma regulamentação de trabalho reconhece e que nenhuma legislação sobre o direito à imagem ou à propriedade intelectual consegue enquadrar. A indústria do sexo, como sempre, é uma precursora.
Representando hoje, segundo diversos estudos, 12% dos sites e quase 25% das pesquisas na internet, essa indústria tem contribuído amplamente para o desenvolvimento do micropagamento on-line, para a compressão de vídeo e para outras tecnologias da rede. Ela fez nascer um modelo de marketing cujo princípio é colocar em cena as “vitrines virtuais” acessíveis gratuitamente, mas reenviando a serviços pagos. É ela também que está inventando e refinando todas as tecnologias de compartilhamento de links, transferência de tráfico de um site a outro e fidelização de clientes.
Na França, um homem a cada dois e uma mulher a cada cinco declaram assistir regularmente à pornografia.1 Se o recurso à prostituição entre os homens permanece relativamente estável – 3,3% dos homens em 2006, contra 3,1% em 1992 –, o consumo por sexo on-line está explodindo.
Segundo o psicólogo Alvin Cooper, diretor do San José Marital and Sexuality Centre de Santa Clara, na Califórnia, “o sexo na internet é principalmente praticado pelos homens como forma de aliviar o stress, uma maneira de fantasiar, mas mantendo-se fiel na vida real”.2 Da mesma maneira que outros vícios, ele diz que “esse comportamento pode compensar os sentimentos de ódio, decepção, tédio, tensão, inquietação, solidão ou tristeza e levar a uma exacerbação da vida virtual confortável diante do computador”. Um hábito que não é inofensivo, uma vez que o pesquisador acredita que ele pode “levar a mudanças de percepção de que existem outros, gerar um distanciamento da vida real, modificar a percepção da realidade e por vezes conduzir ao isolamento social”.
Longe de se concentrar nas mãos de poucos gigantes, a competição é permanente e os sites gratuitos que meramente repetem sequências de filmes piratas ou de “amadores” têm apenas por objetivo “sugar” o internauta e direcioná-lo aos serviços pagos. Para melhor entender o funcionamento e uso dessa economia, três pesquisadores, Christian Platzer, Engin Kirda e Christopher Kruegel, ao longo do estudo, confirmaram o papel dos criadores dos sites. Eles revelam os bastidores de guerras comerciais envolvendo técnicas de pirataria de bases de dados de concorrentes, e fraudes geradas ao se clicar em banners de publicidade,3 que permitem gerar o máximo de lucro redirecionando os internautas.
Enquanto na tela as ofertas de chat pornográfico se multiplicam, oferecendo uma infinidade de “modelos”, podemos observar uma mutação da relação econômica e de subordinação. Diferentemente do cinema, nenhum diretor dirige os atores; diferentemente dos serviços telemáticos e dos peep- -shows, nenhum treinamento é oferecido, muito menos roteiros com diálogos para se ter com os clientes. O artista aqui deve incorporar os desejos dos internautas, seus códigos e suas fantasias para reproduzi-los. E, com base em uma vaga lista de preferências que teria levado aquele cliente até ele, o trabalhador o satisfaz em troca de uma remuneração calculada em porcentagem.
Normalmente discutido em meio a debates parlamentares, o sexo na internet só é visto sob o ângulo da proteção à infância e da repressão à pedofilia e do proxenetismo. Ainda não se levanta nenhuma questão em torno do cybersexo, nem sobre seus operários “autoempresários” do “divertimento para adultos”, verdadeiros pilares de uma indústria muito lucrativa. Não se fala nem mesmo das condições de vida que fizeram essa pessoa escolher ser esse tipo de profissional.


Ilustração: Allan Sieber

1 Nathalie Bajos et al., Enquête sur la sexualité en France: Pratiques, genre et santé, La Decouverte, 2008, Paris.
2 Alvin Cooper, Sex and the Internet: A Guidebook for Clinicians, Brunner-Routledge, Nova York, 2002.
3 “Is Internet for Porn? An Insight into the On-line Adult Industry”, seminário WEIS 2010, Universidade de Harvard, 7 e 8 de junho de 2010

Jornada eleitoral histórica para os bascos



 
O 22 de Maio de 2011 ficará como um importante marco na longa história de luta e resistência do povo basco. A coligação Bildu - que o Estado espanhol tentou ilegalizar - conquistou o melhor resultado eleitoral de sempre para a esquerda independentista. Tornou-se na primeira força, no País Basco, em número de eleitos, na segunda força em número de votos e vai governar quase uma centena de câmaras municipais.


Os números são esclarecedores. Com 99,99 por cento dos votos contados, obteve 1137 eleitos e um total de 313.151 votos (22 por cento), bem acima do melhor resultado que havia conquistado em 1999 com o Euskal Herritarrok. O Partido Nacionalista Basco é a força mais votada no conjunto dos quatro territórios com 327.011 votos (22,97 por cento) e 881 eleitos. Só depois aparece o PSOE com 16 por cento e o PP com 11,64 por cento. Outras forças independentistas como a Nafarroa Bai tiveram 2,55 por cento e a Aralar 2,26 por cento. A Esquerda Unida chegou aos 2,43 por cento.
Entre as conquistas do Bildu destacam-se Donostia (San Sebastian). A coligação independentista não só conquistou a capital da Gipuzkoa como arrebatou a maioria das câmaras municipais daquela província basca. O PP foi, finalmente, corrido da gestão camarária de certas localidades onde havia vencido graças à ilegalização da esquerda independentista. Em Lizartza, que era um desses casos, o Bildu obteve 82,87 por cento dos votos.
É certo que são eleições municipais, e forais no caso basco, mas estes resultados evidenciam o carácter anti-democrático do Estado espanhol. A decisão de ilegalizar o Sortu e a tentativa de ilegalizar o Bildu, depois de uma década de sucessivos partidos e coligações proibidos, demonstra que se impediu a participação democrática de centenas de milhares de cidadãos bascos. Com ou sem apoio à luta armada da ETA, o direito à expressão pacífica foi violado. Há gente presa e torturada por opinar. Há jornais e rádios proibidos. Há organizações juvenis e de defesa dos presos ilegalizadas.
Se o País Basco não vivesse um regime de excepção, o caminho natural para o PSOE seria abandonar o governo autonómico basco e abrir caminho a eleições antecipadas. O lehendakari Patxi López sabe que só ocupa aquele cargo, com o apoio do PP, graças à anulação dos votos da esquerda independentista. Mas o governo que lançou a polícia contra o seu próprio povo não obedece a outros interesses senão os do Estado espanhol. É, pois, pouco provável que o faça.
Em relação à esperança que se levanta no País Basco, é importante que se reforce a luta pela concretização de um processo de paz que conduza a uma situação democrática que permita aos bascos decidir o seu próprio futuro. Também é importante que o Estado espanhol aceite acabar com a repressão e dialogue com a ETA no sentido da libertação de todos os presos. A vitória do Bildu é uma vitória de todos os trabalhadores bascos. Uma vitória não só contra a ocupação mas também contra o capitalismo.

Dilma pode ter se baseado em “kit errado” ao vetar cartilha contra homofobia


João Peres – Rede Brasil Atual via Sul21

Presidência e ministro Fernando Haddad não descartam que Dilma tenha visto material do Ministério de Saúde, que foi levado por evangélicos ao Planalto na reunião de quarta-feira

Livretos do Ministério da Saúde apresentados por evangélicos à presidenta Dilma Rousseff podem ter levado à suspensão do kit elaborado pelo Ministério da Educação (MEC) para combater a homofobia nas escolas públicas. A hipótese não é descartada pela própria Presidência da República e pelo MEC.
Na quarta-feira (25), após encontro com frentes religiosas, Dilma determinou que fosse reanalisado o material, constituído por um caderno, seis boletins, três vídeos e um cartaz. A intenção do MEC era ajudar o debate em salas de aula do Ensino Médio a respeito da discriminação contra homossexuais.
Informações recebidas pela Rede Brasil Atual dão conta de que o deputado Anthony Garotinho (PR-RJ), um dos principais interlocutores do encontro, mostrou à presidenta um material elaborado pelo Ministério da Saúde. A assessoria do parlamentar descreveu os títulos dos materiais apresentados na reunião. “O caderno das coisas importantes” foi elaborado pelo MEC, mas em parceria com o escritório da Organização das Nações Unidas para Educação e Cultura (Unesco) e sem qualquer relação com o kit contra a homofobia. Outro, também em parceria com a agência da ONU, é a história em quadrinhos “A vida como é – e as coisas como são”, lançada em 2010 abordando as relações entre filhos homossexuais e seus pais.
Os demais são de um programa do Ministério da Saúde que visa a reduzir danos no uso de drogas e ao combate a doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). Ao ser informada por telefone que o material citado não diz respeito aokit contra a homofobia, a assessoria do deputado afirmou que “chegou a nossas mãos como sendo o kit-gay (sic). De qualquer maneira é pornográfico”.
Uma das ilustrações mostra dois rapazes praticando sexo. O Ministério da Saúde informou que se trata de um material voltado a um público absolutamente específico: agentes que trabalham com a prevenção de DSTs e com viciados em drogas, sem qualquer conexão com o material elaborado pelo MEC e jamais tendo sido distribuído em escolas.
Origem
A fonte das cartilhas encaminhadas a parlamentares ligados às causas religiosas é o Fórum Evangélico Nacional de Ação Social e Política (Fenasp). O presidente da entidade, Pastor Wilton Acosta, usou parte do material do Ministério da Saúde em um debate da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão a respeito dos programas do governo federal sobre diversidade sexual.
As mesmas imagens estão disponíveis na página da Fenasp na internet. A reportagem tentou, sem sucesso, contato telefônico com Acosta. A secretária-geral da organização, Damares Alves, afirmou não saber se as cartilhas foram apresentadas a Dilma Rousseff como parte do kit contra a homofobia. O mesmo material foi levado por Damares a uma reunião com o ministro da Educação, Fernando Haddad. “A gente quis mostrar para ele que é uma prática do governo a produção de material de mau gosto”, explica.
Ela lamenta que o combate à homofobia tenha se transformado “em prioridade” para o ministério e avalia que a campanha que seria difundida pelo kit não ajudaria a combater o problema. Damares considera que mostrar relações homoafetivas não vai colaborar em nada para a discussão. “Como dizer que não vivemos a normalidade da heterossexualidade? Isso pode mudar nas próximas gerações, mas essa geração ainda entende a normalidade na heterossexualidade”, questiona.

Incertezas
A assessoria de comunicação da Presidência da República afirmou não haver condições de afirmar se Dilma viu ou não o material correto. A informação é de que Dilma analisou as cartilhas e os vídeos sem a presença de assessores ou do ministro da Educação.
Em rápido pronunciamento a jornalistas nesta quinta-feira (26), a presidenta afirmou não ter visto os filmes, mas considerou o material inadequado. “Não vai ser permitido a nenhum órgão do governo fazer propaganda de opções sexuais, nem de nenhuma forma nós não podemos interferir na vida privada das pessoas”, disse.
O ministro da Educação confirmou que a presidenta não soube precisar se o material a que teve acesso faz parte dokit contra a homofobia. Haddad lembrou que filmes e textos que circulam pelo Congresso são de campanhas do Ministério da Saúde, levando à desinformação de alguns parlamentares e da sociedade. “Houve muita confusão a respeito. Quando uma discussão deixa de ser técnica e passa a ser política você tem muita dificuldade de organizar um debate racional sobre o assunto”, lamentou o ministro, que considera acertada a decisão de suspender a distribuição das cartilhas em meio a um cenário de turbulência.
A ministra-chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), Iriny Lopes, foi outra que ponderou que a decisão não representa um retrocesso nas políticas governamentais de conquistas de direitos. “O programa de enfrentamento à homofobia é um programa definitivo. Ele não sofrerá retrocessos. O governo da presidenta Dilma é pautado pela questão de direitos, a presidenta tem demonstrado isso em todos os seus gestos”, disse.
A determinação do Planalto é que qualquer material relativo aos direitos sociais terá de passar por análise de uma comissão a ser montada no Palácio do Planalto antes de vir a público.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

"Dois séculos de conquistas estão sendo jogados no lixo"



A Carta Maior reproduz a entrevista concedida ao jornalista Jaume Barberà e destaca alguns trechos da fala de Galeano:

 Em entrevista à Televisão da Catalunha, o escritor uruguaio Eduardo Galeano fala sobre as mobilizações que levaram milhares de jovens para as ruas de diversas cidades espanholas nos últimos dias. "Esse é um dos dramas do nosso tempo. Dois séculos de lutas operárias que conquistaram direitos muito importantes para a classe trabalhadora, estão sendo jogados na lata de lixo por governos que obedecem à uma tecnocracia que se julga eleita pelos deuses para governar o mundo. É uma espécie de governo dos governos, como este senhor que agora parece que se dedica a violar camareiras, mas antes violava países e era aplaudido por isso".


Em entrevista ao programa "Singulars", da Televisão da Catalunha (TV3), o escritor uruguaio Eduardo Galeano fala sobre as manifestações dos últimos dias que levaram milhares de jovens para as ruas de diversas cidades espanholas. Galeano esteve em Madri e pode presenciar ao vivo as mobilizações na Porta do Sol. Disponibilizamos abaixo a entrevista concedida ao jornalista Jaume Barberà e destacamos alguns trechos da fala de Galeano:

Untitled from Rebelión on Vimeo.
"Há hoje em quase toda a América Latina um problema visível e preocupante que é o divórcio entre os jovens, as novas gerações, e o sistema político, o sistema de partidos vigente. Eu não reduziria a política à atividade dos partidos, por que ela vai muito mais além, mas isso é preocupante mesmo assim".

"Nas últimas eleições chilenas, por exemplo, 2 milhões de jovens não votaram. E não votaram porque não se deram ao trabalho de fazer o registro eleitoral. Suponho que a maioria não fez o registro por que não acredita nisso. E me parece que isso não é culpa dos jovens. Neste sentido, gostei muito de ter presenciado essas manifestações que tive oportunidade de ver na Porta do Sol".

"Um dos lemas que ouvi era 'com causa e sem casa', o que é muito revelador da situação atual. Muitos daqueles jovens ficaram sem casa e sem trabalho. Isso deve ser levado em conta. Esse é um dos dramas do nosso tempo. Dois séculos de lutas operárias que conquistaram direitos muito importantes para a classe trabalhadora, estão sendo jogados na lata de lixo por governos que obedecem à uma tecnocracia que se julga eleita pelos deuses para governar o mundo".

"É uma espécie de governo dos governos, como este senhor que agora parece que se dedica a violar camareiras, mas antes violava países e era aplaudido por isso. É essa estrutura de poder, muitas vezes invisível, que de fato manda. Por isso, quando se consegue aglutinar vozes capazes de dizer 'basta' a primeira coisa a fazer é ouvi-las com respeito, sem desqualificá-las de antemão e saber esperar. Esses jovens não parecem esperar ordens de ninguém. Agem espontaneamente, aliando razão à emoção. Como vai acabar isso? Não sei. Talvez acabe logo, talvez não. Vamos ver".

"O mundo está preso em um sistema de valores que coloca o êxito acima de todas as virtudes. Ele é uma fonte de virtudes. Em troca, condena o fracasso. Perder é o único pecado para o qual, no mundo de hoje, não há redenção. Estamos condenados a ganhar ou ganhar. Os dois homens mais justos da história da humanidade, Sócrates e Jesus, morreram condenados pela Justiça. Os mais justos foram condenados pela Justiça. E nos deixaram coisas muito importantes como amor e coragem".

UERGS: lua de mel com Governo Tarso pode acabar


Profa. Ana Carolina Martins da Silva * no Sul21

Aclamado e esperado pela maioria declarada de professores, alunos e funcionários, bem como de toda a comunidade envolvida direta ou indiretamente com a Instituição, representando o Governo que poderia reconstruir a UERGS, o Governo Tarso pode estar na berlinda mais cedo do que imagina.
Se por um lado a UERGS perde professores e funcionários para Empresas e Instituições de Ensino estruturadas com Plano de Carreira e segurança no emprego, de outro o Governo do Estado continua contando com a UERGS como apoio para reestruturar a Educação no Estado. Além deste, a Instituição é procurada para dar sustentabilidade em projetos educacionais, culturais, tecnológicos por inúmeros Movimentos Sociais que se organizaram sob o nome de Movimento dos Movimentos Sociais Pró-UERGS. Por conta dessas buscas todas, somadas aos alunos que, agora aliviados da tortura do Vestibular, chegam a nós pelo SISU, a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul começa a se estabelecer para ser aquela que foi sonhada por todo o Rio Grande: A Universidade de Pensamento do Estado.
Porém, amor não sobrevive apenas de nuvem fresca e ar assado! Sem receber diárias, sem retorno do transporte efetuado entre unidades para manutenção das aulas, sem aumento, com carga horária extrapolada, sem condições de tempo para fazer aperfeiçoamento ou desenvolver projetos de Pesquisa e Extensão, os poucos professores que restaram na UERGS ainda receberam, nesta última sexta-feira, uma proposta de Plano de Carreira, do Governo do Estado, que não contempla sequer as condições básicas de sobrevivência para qualquer professor de Ensino Superior: DEDICAÇÃO EXCLUSIVA (1ª), Progressão por Titulação (2ª) e no mínimo Equiparação Salarial com as Universidade Federais (3ª);
Ainda, houve o constrangimento moral das negociações estarem sendo conduzidas por alguns dos mesmos funcionários do GAE que, por tantas vezes deixaram os professores da UERGS sem palavras, por simplesmente não apresentarem nada para a Instituição, passando outros órgãos do Estado a frente de sua estabilização, o que tem causado a evasão de quadros.
Ressalva seja feita de que parece que o Governo está decidido a resolver a situação, isso é bom, parece que acabou a “sessão-enrolação” dos governos passados, porém, o que sobrou para a UERGS? Ainda que o proposto aos funcionários possa parecer interessante, a classe docente é inteiramente desrespeitada e desconsiderada. Fosse no governo anterior, eu não teria a menor dúvida de que isso seria uma estratégia para jogar “ermão contra ermão”, como dizia a canção “Colorada” do Silva Rillo e do Mário Barbará. Entretanto, acredito no Governo Tarso. Penso que pode ter sido uma falha de percepção, talvez um engano de método, um desconhecimento do funcionamento do Sistema do Ensino Superior. Um lapso que poderia ser evitado se fosse seguido o projeto de Plano de Carreira apresentado pela UERGS ao Governo Estadual, ainda no Governo passado. Esse foi discutido e aprovado pelo CONSUN (Conselho Superior), onde estão representados todos os segmentos da Universidade, dentre eles, a comunidade. Esse direito é garantido pela LDB, que fixa normas e competências dentro da autonomia universitária para que a Universidade estabeleça sua política de pessoal e seus planos de carreira docente e técnico administrativo, tais diretrizes podem ser conferidas no art. 17 da Lei de criação 11646, bem como, em seu estatuto Decreto Lei 43240 de 15 de julho de 2004, artigos 3º- §III e 5º – §V. Ainda que o Estado não se sentisse confortável para simplesmente aprovar esse Plano, que foi explicado pela nova Gestão da UERGS em reunião com o GAE, inclusive, poderia ter pelo menos levado em conta que professor tem Carreira, não Emprego.
Lapso, ou não, nunca se viu tanta articulação dentre uma comunidade universitária para que se abrisse concurso para a entrada de professores novos, entretanto, enquanto a UFSM com toda a sua tradição, segurança funcional e profissional abre concursos para 41 vagas, praticamente nas mesmas áreas da UERGS, conseguimos concursos a conta-gotas, oferecendo aos futuros colegas trabalho em três ou quatro cidades SIMULTANEAMENTE (que é o que fazemos em geral), sem restituição de diárias, transporte, sem plano de carreira, sem Dedicação Exclusiva, sem progressão e pela metade do salário! Sinceramente, como se vai constituir uma Universidade assim? A partir dessa segunda-feira, os professores da UERGS estarão estudando a proposta do Governo para apresentar mudanças, rejeitada ela já está pela Assembléia dos docentes acontecida no SINPRO, no dia 20/5.
Amor, amor, negócios à parte. Quem já não ouviu isso? A UERGS, com o coração partido, começa a articular entre sussurros e mágoas, o que passou a chamar de “Fora Tarso!”, em comparação ao que se fez com a ex-governadora, cujo-nome-não-deve-ser-pronunciado para que caia no esquecimento. Não é o que queremos. Queremos estar juntos nessa reconstrução tão sonhada. Nós trabalhamos para eleger Tarso Genro. Acreditamos em cada palavra do que Tarso disse em todo o Estado, quando procurado pelos nossos colegas, sobre a UERGS. Nós continuamos trabalhando num sobre-esforço, para manter a Universidade, para não espantar os alunos, para garantir financiamentos em projetos grandes, que beneficiem aos que mais necessitam, que contemplem as expectativas dos novos tempos, como reza o texto do Prof. Ludwig Buckup, grande ambientalista gaúcho, em mensagem à Reitoria da UERGS, tratando de ecologia em nome do Movimento dos Movimentos Pró-UERGS: “A universidade precisa estar atenta as mudanças globais e incorporar os saberes resultados de suas pesquisas na formação de profissionais mais preparados para atuar na sociedade em busca de soluções para a grave ameaça ambiental que se avizinha, como a crise energética, o aquecimento global, a perda progressiva da diversidade biológica, a crise da água, a fome, a pobreza, apenas para citar alguns aspectos mais relevantes.” Finalizando, tomo a liberdade de citar outra canção, bem conhecida e popular: “Sim, é como a flor
Dê água e ar, luz e calor, o amor precisa para viver! De emoção, e de alegria, e tem que regar todo dia.” É hora de Tarso Genro olhar pessoalmente para seu jardim! De tomar para si as negociações do Plano de Carreira dos docentes da UERGS, independente do SINPRO, independente da ADUERGS, independente dos funcionários do GAE, agora é hora do Governador provar o quanto a UERGS vale no âmbito de seu projeto de Estado para os cidadãos e cidadãs que o elegeram em primeiro turno! Foram oito anos de espera e resistência, a hora da UERGS é agora!

* Mestre em Comunicação Social e professora da UERGS

quarta-feira, 25 de maio de 2011

O papel de Palocci na nova estratégia petista

Escrito por Juliano Medeiros   no Correio da Cidadania
 
Desde o final do ano passado, um dado vinha me intrigando. Só agora, com as denúncias envolvendo o ministro da Casa Civil, os números passaram a fazer sentido. Em dezembro foram divulgadas as prestações de contas dos candidatos à presidência da República. Segundo as informações apresentadas pelas coligações à Justiça Eleitoral e amplamente divulgadas pela imprensa, tanto Dilma quanto José Serra receberam grandes somas dos principais grupos econômicos do país.
 
Entretanto, a origem dos recursos recebidos por ambos é levemente distinta. Dilma foi financiada principalmente por empreiteiras e construtoras, largamente beneficiadas pelo Programa de Aceleração do Crescimento – PAC. Mais de 25% de suas doações vieram de empresas como Camargo Corrêa, OAS e Queiróz Galvão. Em seguida, aparecem empresas do ramo do agronegócio. A maior doação de toda a eleição veio da JSB Friboi, que investiu mais de R$ 10 milhões na campanha da petista. Essas empresas, como é de conhecimento público, têm acesso a grandes financiamentos junto ao BNDES e se beneficiaram durante todo o governo Lula de uma política econômica favorável a seus interesses. Portanto, nada mais natural que na eleição demonstrassem sua gratidão.
 
A candidatura de Serra, por sua vez, teve como principal fonte de doações o sistema financeiro. Seu principal doador foi o Unibanco (R$ 4 milhões), seguido por outros agentes de crédito, bancos e similares. Os bancos também estão entre os mais generosos doadores da campanha de Dilma, demonstrando que o sistema financeiro não vê grandes diferenças entre os dois projetos. Ao contrário, o número de doações de empreiteiras e construtores para a campanha de Serra é muito menor em comparação com a campanha de Dilma.
 
Em geral os grandes grupos econômicos que optaram por realizar doações para ambas as candidaturas deram a elas um tratamento minimamente isonômico, dividindo por dois os recursos entre Dilma e Serra. Apenas alguns poucos dentre esses doadores preferiram deixar clara sua opção por um em detrimento de outro. Foi o caso da gigante do aço Gerdau, que doou R$ 3 milhões para Serra e apenas R$ 1,5 milhão para Dilma. Portanto, não é uma simples ironia do destino o fato de Dilma ter convidado recentemente o líder o grupo, Jorge Gerdau Johannpeter, para coordenar em seu governo a implantação do novo modelo de gestão pública, inspirado na administração privada.
 
Assim, a análise a ser feita, e que volta a aparecer em algumas formulações sobre o caráter do governo Dilma, é que as frações da burguesia – considerando-se que ela não é um bloco monolítico cujos interesses fluem sempre num mesmo sentido – se dividiram claramente nas últimas eleições entre Serra e Dilma. Uma parte, a burguesia agro-exportadora, assumiu seu compromisso com a reeleição do projeto liderado pelo PT.
 
Nesse bloco estão empreiteiras e construtoras, os barões do agronegócio, a indústria da mineração, siderurgia e petróleo, entre outros. Outra parte, representada principalmente pelo capital financeiro, se dividiu entre Dilma e Serra, com uma indisfarçável preferência pelo segundo. É essa a principal informação que a prestação de contas das duas principais candidaturas presidenciais nos forneceu desde dezembro: a disputa entre os blocos de poder hoje se dá em torno da busca de aliados no campo da burguesia.
 
Essa conclusão nos ajuda a entender as opções de Dilma nos seus primeiros meses de governo. A privatização dos aeroportos, a alta dos juros e a preocupação com a inflação, a sinalização de uma profunda reforma administrativa e os cortes de R$ 50 bilhões do orçamento tem um objetivo claro: ganhar definitivamente a confiança do capital financeiro e tornar o projeto de conciliação de classes liderado pelo PT unanimidade entre a grande burguesia. Até o momento, Dilma e seu governo têm tido sucesso em sua empreitada: os analistas vinculados ao grande capital estão eufóricos com as primeiras medidas. Na edição da revista Exame deste mês, por exemplo, a privatização dos aeroportos é saudade como o início do "fim da ideologia estatista" no Brasil. Da mesma forma, ficarão gravados nos anais do jornalismo econômico e político os afagos de Miriam Leitão e Arnaldo Jabor ao novo governo, cobrindo Dilma de elogios.
 
A questão, essa sim menos simples, é onde entra Palocci nisso tudo. O ministro é peça chave nesse esquema. Tem relações privilegiadas no sistema financeiro e entre os principais grupos econômicos do país. É um dos fiadores do compromisso do governo com a estabilidade econômica e o principal articulador político da manutenção dessa estabilidade. Mas antes de tudo, Palocci é um soldado deste projeto. As denúncias de enriquecimento duvidoso envolvendo o ministro e sua empresa, a Projeto, têm origem no papel que Palocci ocupa nesse intrincado arranjo.
 
Segundo as notícias que têm sido veiculadas, a Projeto arrecadou cerca de R$ 10 milhões em apenas dois meses, coincidentemente logo após a campanha de Dilma. Vale lembrar que o PT anunciou uma dívida de mais de R$ 20 milhões em sua prestação de contas. Logo, parece evidente que o caso não se trata apenas de tráfico de influência entre a esfera pública e privada – o bom e velho lobby – mas de um esquema de captação de recursos por fora da contabilidade oficial da campanha. Longe de ser um "aloprado", Palocci era um canal confiável para uma operação deste tipo.
 
De qualquer forma, seja qual for o papel de Palocci e da Projeto no esquema que ora começa a ser desvendado, é evidente que o governo jogará a vida para salvar o ministro: ele é o homem forte da tática de diálogo com os poucos setores da burguesia que ainda resistem ao projeto do governo. Esse é o papel de Palocci, por isso o governo o protegerá até onde puder. Ele é peça chave em sua nova estratégia. Por sua vez, a mídia monopolista e a oposição conservadora, comprometidas em preservar os interesses de muitos atores envolvidos, não poderão chegar à raiz dos fatos. Tratarão de proceder a uma condenação moral de Palocci, mantendo o governo refém da instabilidade política com a qual a burguesia consegue sempre arrancar mais e mais concessões do governo. E a análise do sentido das movimentações de Dilma e Palocci, desde a campanha até agora, passará batida.
 
Caberá àqueles que compreendem a íntima relação entre doações de campanha, compromissos políticos e projetos de poder fazer esta denúncia nos termos adequados.
 
Juliano Medeiros é jornalista e editor do Unamérica

terça-feira, 24 de maio de 2011

Para professor da UFRGS, livro do MEC não traz “nenhum absurdo”


Publicação distribuída pelo MEC é acusado por críticos de incentivar estudantes a escrever errado | Foto: Editora Global/Reprodução

Igor Natusch no Sul21

“Posso falar ‘os livro’? Claro que pode”. A frase, contida em um livro didático da coleção “Viver, Aprender”, provocou polêmica e foi repetida incessantemente como exemplo de que o MEC, que está distribuindo o livro, está incentivando a população a escrever errado, desprezando a norma culta. A reação negativa, reproduzida por alguns deputados e senadores, é fortemente questionada por estudiosos da língua portuguesa, que alegam não apenas que a discussão está fora de foco, como também ataca ideias que não são nenhuma novidade dentro do panorama da linguística. “O livro não traz nenhum absurdo, tanto no estudo da linguística quanto em termos de metodologia”, garante o professor Pedro Garcez, do Departamento de Linguística, Filologia e Teoria Literária da UFRGS.
Segundo Garcez, as frases que estão sendo destacadas e repetidas nos meios de comunicação estão em um contexto adequado, inseridas em uma discussão sobre concordância verbal. Para ele, trata-se de um dos aspectos “mais salientes” quando se trata de linguagem adequada ou inadequada. “Muitos erros gramaticais são comuns na linguagem oral, correntes até, mas não doem no ouvido”, explica ele. “Mas a concordância é algo que perturba, ainda mais quando reproduzida na escrita. Pessoas que não estão familiarizadas com a discussão linguística acabam ficando um pouco chocadas, ainda mais se levarmos em conta o modo como a discussão foi colocada na mídia. A coisa chegou muito de supetão”, afirma.
O livro didático que tornou-se pivô da polêmica segue conceitos de variação linguística adotados no currículo educacional brasileiro desde 1997, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Os Parâmetros Curriculares Nacionais foram adotados pelo Ministério da Educação na primeira gestão do ministro Paulo Renato Souza, a partir de estudos de linguagem que, segundo Pedro Garcez, já existem há mais de 40 anos.

Mesmo assim, a Academia Brasileira de Letras (ABL) divulgou nota posicionando-se de forma contrária ao uso dos livros didáticos distribuídos pelo MEC. “O manual que o Ministério levou às nossas escolas não o ajudará no empenho pela melhoria a que o ministro tão justamente aspira”, diz a ABL. Em resposta, o Ministério da Educação declarou que “o reconhecimento da variação linguística é condição necessária para que os professores compreendam seu papel de formar cidadãos capazes de usar a língua com flexibilidade. Cabe à escola o papel de criar situações de aprendizagem que possibilitem aos estudantes utilizar diversas variedades linguísticas”.
“No cotidiano, dizer ‘as coisa’ ou ‘os negócio’ é comum ao povo brasileiro, não é algo que apenas pobres ou ignorantes fazem”, afirma Pedro Garcez. E dá outros exemplos que demonstram que, no dia a dia, falar “errado” é mais comum do que se imagina. “É natural apagar o plural nas proparoxítonas, dizer ‘nós tava’, ao invés de ‘nós estávamos’, por exemplo. No Nordeste, praticamente não existe mais morfologia do verbo na língua falada. É ‘eu tava’, ‘ele tava’, ‘nós tava’, ‘eles tava’. Um uso generalizado”. Os próprios jornais, segundo Garcez, adotam liberdades que não cabem na chamada norma culta, como a colocação do pronome após o verbo (por exemplo, “escolheram ele”).

Trechos do livro foram citados fora do contexto, diz Garcez

Nenhuma dessas variantes, porém, deve ser incorporada na norma escrita – nem de acordo com os livros didáticos do MEC, nem de acordo com os estudos de linguística. É o que garante Pedro Garcez. 

Na leitura do professor da UFRGS, trata-se apenas de reconhecer a existência de variações entre a linguagem falada e a escrita, e em trabalhar conceitos de adequação e inadequação. “Imagine uma peça publicitária usando imperativo, dizendo algo tipo ‘não deixes de vir’. É algo que não daria certo, seria inadequado”, comenta.
O temor de que haja uma incorporação da linguagem coloquial pela norma escrita, admitindo diferentes formas de escrever, é infundado, segundo Garcez. “Há um caráter meio preconceituoso nessa visão de que, se isso acontecer, as pessoas não vão mais se entender”, acusa. “O contexto do que é exposto no livro é justamente o oposto. Para mostrar a importância de melhorar o texto, se fala da necessidade de aprender itens de correção gramatical. São vários pontos, como pontuação, estrutura frasal… E aí chega-se na concordância, dizendo que, dependendo do contexto, não há nada de errado em dizer ‘nós faz’, mas escrever ‘nós faz’ criará uma série de dificuldades”.

Outro elemento contestado por Pedro Garcez refere-se à ideia, defendida por alguns críticos do livro didático do MEC, de que o domínio da dita norma culta é um mecanismo de ascensão social. O argumento surge também na nota divulgada pela ABL sobre o episódio. “Me parece um raciocínio bastante equivocado”, diz o professor da UFRGS. “O mundo é muito mais complexo do que isso. Concordo que para espaços públicos, para a discussão política, o cidadão precisa dominar essa linguagem. Mas não é uma garantia (de ascensão social). De nada adianta falar ‘corretamente’, entre aspas, e não ter outras tantas qualificações necessárias”.

Por fim, o professor de linguística da UFRGS lembra que a manutenção de certos conceitos, além de ignorar o dinamismo da linguagem falada, acaba sendo lucrativa para alguns grupos. “Professores como Pasquale (Cipro Neto), Cláudio Moreno e todos os que publicam obras do tipo ‘Não Erre Mais’ acabam se beneficiando disso (confusão entre língua falada e norma escrita)”, argumenta Pedro Garcez. “Não existe certo ou errado na linguagem falada, e sim adequado ou não adequado. ‘Nós pega peixe’ não encaixa dentro da norma escrita, mas não dá para ignorar que as pessoas usam esse tipo de construção gramatical no dia a dia, enquanto conversam entre si”, conclui.

O código do atraso



As lideranças ruralistas c/ forte influência e trânsito nos arcos e cúpulas de Brasília parecem ter certeza da aprovação de um substitutivo que finalmente as desobrigará do cumprimento de exigências que estão previstas em lei desde o governo do pres. Getúlio Vargas, qdo foi editada a 1 versão do Código Florestal (1934)

por João Paulo R. Capobianco no LeMonde-Brasil
A discussão sobre florestas está nas primeiras páginas dos jornais e no horário nobre das emissoras de rádio e televisão. A boa notícia é que, dessa vez, o acalorado debate não é consequência da divulgação de números alarmantes de derrubadas na Amazônia.
Graças a uma atuação firme de combate ao desmatamento iniciada no primeiro governo Lula, que teve continuidade no segundo e, espera-se, prossiga no de Dilma Rousseff, os índices vêm diminuindo ano a ano. O monstro, que parecia incontrolável e nos assombrou e envergonhou durante os séculos em que reinou na Mata Atlântica e na Caatinga e as décadas em que ditou as regras na Amazônia e no Cerrado, mostrou sua fragilidade ao ter que enfrentar compromisso político e ação firme do governo, impulsionado a agir pela pressão da sociedade.
A má notícia, entretanto, é que essa intensa discussão não é motivada pela evidente necessidade de aperfeiçoamento da legislação florestal, a fim de torná-la mais moderna e compatível com o atual momento em que vivemos. Momento este, marcado por um forte crescimento da consciência ambiental e da valorização dos princípios da sustentabilidade.
O que estamos assistindo, é uma disputa desigual entre os que querem impor uma flexibilização total das normas de conservação e os que, impossibilitados de fazer a agenda avançar, estão na defensiva, tentando garantir que o estrago seja o menor possível.
Essa não é a primeira vez que parlamentares da intitulada “bancada ruralista”, constituída pelo que há de mais atrasado no campo, tentam flexibilizar a legislação. Em 2000 quase conseguiram. Não fosse a vigorosa reação da opinião pública e a resistência de alguns poucos parlamentares, que levaram o então presidente Fernando Henrique Cardoso a intervir no processo, teria sido aprovado o famigerado relatório do Deputado Micheletto (PMDB-PR), que literalmente destruiria os instrumentos legais de proteção da vegetação nativa do país.
Um período de avanços
Desde essa última investida até agora, algumas coisas mudaram nos processos de degradação florestal. E a mudança foi, finalmente, após décadas de descontrole, para melhor.
Na Amazônia, entre 2004 e 2010, o desmatamento anual despencou de 27.423 km² para 6.451 km², atingindo a menor taxa registrada desde que teve início o monitoramento realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em 1988. Nos demais biomas o desmatamento também entrou em declínio, embora no Cerrado os índices ainda sejam alarmantes.
Para se chegar a esse resultado, ainda não completamente satisfatório, visto que o desmatamento, embora menor, continua em proporções muito altas, foi implementado um conjunto inédito de fortes medidas de controle.
Somente na Amazônia, onde o governo concentrou seus esforços no período de 2004 a 2010, foram criadas cerca de 261 mil km² de unidades de conservação e homologadas aproximadamente 180 mil km² de terras indígenas. Essas novas áreas protegidas tiraram do alcance de especuladores e grileiros uma área equivalente à soma dos territórios dos estados de São Paulo e do Paraná.
Para tornar ainda mais eficiente a ação contra a grilagem, um dos principais fatores de desmatamento na Amazônia, foram cancelados nos cadastros do Incra mais de 66 mil títulos de posses ilegítimas e modificados radicalmente os mecanismos e procedimentos para registro de posse.
Somaram-se a isso as operações do Ibama integradas com a Polícia Federal e polícias ambientais dos estados que levaram ao fechamento de aproximadamente 1.500 empresas clandestinas, apreensão de milhões de metros cúbicos de toras, desmonte de máfias da madeira e da especulação de terras públicas, que operavam há décadas na região, e a prisão centenas de pessoas, incluindo funcionários públicos dos governos federal e estaduais.
Complementando essas medidas, vieram outras no campo legal, como a aprovação da Lei de Gestão de Florestas Públicas (Lei 11.482/06) e da Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428/06) e a edição de vários decretos, em especial os de números 6.321/07 e 6.514/08, que definiram mecanismos muito consistentes para fazer valer o cumprimento do Código Florestal.
Contraofensiva ruralista
Conhecendo esse contexto, fica evidente não ser mera coincidência o momento escolhido para esse grande esforço empreendido pelos ruralistas, no sentido de buscar promover a completa desestruturação da legislação de proteção à vegetação nativa do país. Ele é consequência direta da percepção de que os produtores rurais em situação irregular enfrentariam cada dia mais dificuldades para continuarem a deixar de aplicar as exigências legais, frente os novos mecanismos de controle e punição engendrados nos últimos anos.
O movimento antiambiental em andamento agora na Câmara, entretanto, tem uma diferença fundamental em relação ao de 2000: ele foi, dessa vez, minuciosamente preparado em todos os seus aspectos.
Do ponto de vista processual, ressuscitaram um projeto de 1999, que já tinha sido arquivado duas vezes e o submeteram à análise de uma comissão especial criada em setembro de 2009 pelo então presidente da Câmara, Michel Temer, composta quase que exclusivamente por parlamentares ligados ao setor ruralista.
Do ponto de vista político designaram o comunista Aldo Rebelo como relator. Ex-presidente da Câmara dos Deputados, Rebelo é detentor de profundo conhecimento dos processos legislativos, obtido em seus cinco mandatos consecutivos.
Do ponto de vista técnico foram ainda mais longe. Fizeram surgir dois relatórios produzidos por uma unidade da Embrapa, a “Embrapa Monitoramento por Satélite”, de resultados discutíveis, mas muito úteis às teses ruralistas.
Um deles intitulado “Alcance territorial da legislação ambiental e indigenista”, baseado em leitura tendenciosa dos dispositivos legais em vigor e em erros primários de aritmética, serviu de argumento para sustentar um suposto engessamento territorial da agropecuária brasileira pela legislação ambiental. Amplamente divulgado em audiências públicas e alardeado pelos líderes ruralistas por todo o país, o relatório chegou a afirmar que a área disponível para a agropecuária era “negativa” no Brasil.
Outro relatório, ainda mais questionável, intitulado “A dinâmica das florestas no mundo”, afirmava que nos últimos 8 mil anos o volume de florestas no Brasil teria saltado de 9,8% para 28,3% em relação ao total existente no planeta. Tal proeza, segundo os autores, deveria render louros e reconhecimento internacional e não mais pressões pela conservação. O estudo só não esclareceu aos leitores que o desmatamento em nosso país atingiu taxas anuais de proporções tão grandes que, mantido o ritmo do início dos anos 2000, estaríamos repetindo em poucas décadas o mesmo erro cometido em séculos pelos demais países criticados no relatório.
Dessa forma, com uma comissão blindada pelos representantes do setor ruralista, um relator de reconhecida competência parlamentar e trânsito no Congresso Nacional e estudos técnicos de encomenda, o resultado não poderia ser outro. No dia 6 de julho de 2010, a Comissão Especial destinada a proferir relatório sobre o Projeto de Lei 1.876 de 1999, aprovou o substitutivo de Aldo Rebelo por treze votos a favor e cinco contra.
Com a justificativa de que há um enorme contingente de produtores rurais em situação irregular, o que é verdade, e que seria necessário aprimorar os mecanismos que estimulem, apoiem e facilitem a regularização, com o que todos concordam, o substitutivo modifica profundamente as exigências legais atualmente em vigor.
As alterações propostas fazem que, como num passe de mágica, as irregularidades deixem de existir e o que era um passivo ambiental de uma propriedade rural praticamente desapareça. Com isso, muito pouco do que foi ilegalmente desmatado permanece com a obrigação de ser recuperado ou compensado, como exige a legislação brasileira desde 1934.
Uma comparação com as iniciativas governamentais de regularização do pagamento de impostos, os chamados Programas de Recuperação Fiscal (Refis), pode ajudar a entender a questão.
O Refis visa criar oportunidades para o recolhimento de impostos atrasados, que dificilmente seriam pagos em condições normais de prazos e incidência de juros. Além disso, tem o objetivo de regularizar a situação dos contribuintes inadimplentes que ficam sem acesso ao credito público. Para tanto é dado um desconto e os valores são parcelados de forma a tornar viável o pagamento.
O substitutivo de Aldo Rebelo tenta criar uma espécie de “Refis para devedores de Reserva Legal e áreas de preservação permanente”. O problema é que ele propõe mudanças tão radicais na legislação que seriam comparáveis ao governo mudar a alíquota do imposto que está atrasado durante a negociação do pagamento da dívida. Ora, se a alíquota é alterada para menor, como exigir que os devedores paguem os valores atrasados calculados com uma alíquota que já não existe.
Contrariando a justificativa original de facilitar a regularização, o substitutivo retira propriedades da situação irregular, sem que o proprietário rural tenha que corrigir pelo menos parte do ato ilegal praticado.
Esse é um dos efeitos mais perversos do texto, pois acaba por beneficiar quem desmatou em detrimento de quem cumpriu a lei e possui parte de sua propriedade com Reserva Legal e APP conservada.
O outro efeito negativo, tão grave quanto o primeiro, é que ao diminuir a dimensão das áreas que devem ser mantidas com vegetação nativa, conforme veremos a seguir, o substitutivo torna possível a autorização de desmatamento de extensas áreas hoje protegidas pelo atual Código Florestal.
Estímulo aos desmatamentos
É forçoso reconhecer que o substitutivo de Rebelo foi engenhosamente construído. Salvo dispositivos escandalosamente antiambientais, a maioria dos problemas está nos detalhes de um texto que possui 55 artigos e 37 páginas. Os principais são expostos a seguir:
1. Introdução do conceito de “Área rural consolidada”. Ao definir essa nova figura legal, o substitutivo simplesmente converte para essa categoria as ocupações irregulares feitas até 22 de julho de 2008 em fragrante desrespeito à legislação ambiental. Mais do que um jogo de palavras, introduz uma ideia que será posteriormente defendida à exaustão, de que o que está feito não deve ser revertido. Uma espécie de direito adquirido para quem desrespeitou a legislação ambiental.
2. Ampliação do conceito de pequena propriedade rural, sem critérios socialmente adequados, possibilitando o aumento significativo de proprietários rurais beneficiados pelo tratamento diferenciado e preferencial dado aos pequenos produtores rurais, mesmo sem o serem.
3. Modificação do parâmetro para o cálculo das áreas de preservação permanente (APP) nas margens dos rios, levando à redução das áreas que se encontram em situação irregular e que, portanto, teriam que ser recuperadas, além de permitir futuras autorizações de desmatamento onde hoje é proibido.
4. Redução de 30 para 15 metros a faixa de proteção (APP) das margens de rios de até cinco metros. Essa modificação, combinada com a anterior, vai reduzir drasticamente a proteção legal das matas ciliares, desobrigando a recuperação ou viabilizando novos desmatamentos.
5. Liberação da ocupação e desmatamentos da vegetação nativa situada em altitude superior a 1.800 metros, hoje protegida como APP.
6. Eliminação da proteção das áreas de várzeas, que deixam de ser consideradas como APP, sujeitando os corpos d’água a terem suas áreas de inundação natural totalmente degradadas e contaminadas por uso intenso de pesticidas e adubos.
7. Eliminação da obrigatoriedade de recuperar a Reserva Legal para propriedades de até quatro módulos fiscais, equivalentes a seiscentos hectares na Amazônia.
8. Desconto de área equivalente a quatro módulos fiscais no cálculo da Reserva Legal degradada a ser recuperada nas médias e grandes propriedades.
9. Computo da área de preservação permanente no cálculo da Reserva Legal para todo o país, independentemente das dimensões da propriedade, reduzindo o montante de área ilegalmente desmatada a ser recuperada.
10. Anistia “branca” de cinco anos para desmatadores irregulares. Esse é um dos pontos mais graves e sofisticados do substitutivo. Estabelece a obrigatoriedade da União e dos estados elaborarem, no prazo de até cinco anos, Programas de Regularização Ambiental fixando os parâmetros e as condições para a recuperação da vegetação nativa nas propriedades rurais irregulares. Durante o período de elaboração do tal Programa, o proprietário nada precisa fazer e está autorizado a continuar utilizando economicamente a área que desmatou ilegalmente. Além disso, suas multas e seus processos por desmatamento de antes de 22 de julho de 2008 ficam suspensos.
Há muitos outros aspectos nocivos no substitutivo, como a transferência de competências do Conselho Nacional do Meio Ambiente para os governos federal, estaduais e municipais, que podem editar decretos e atos normativos sem nenhum controle social ou a possibilidade ambientalmente equivocada de permitir a compensação da Reserva Legal em qualquer bioma.
O único dispositivo que tem um aparente caráter ambiental no substitutivo de Aldo Rebelo é a proposta de moratória para novos desmatamentos por um período de cinco anos, a partir da promulgação da lei. Entretanto, cotejando essa previsão com o conjunto de modificações, que tornarão praticamente impossível controlar e punir os desmatamentos ilegais, fica evidente a sua iniquidade.
O grau de acirramento do debate, resultado da radicalização do substitutivo e do próprio posicionamento de Aldo Rebelo, vem conduzindo a um impasse raras vezes visto. No esforço para impedir a desconstituição da legislação ambiental, praticamente nada está sendo feito para a definição de instrumentos legais de compensação aos que preservaram, seja por meio de mecanismos de pagamento por serviços ambientais, seja pela criação de um mercado que remunere a floresta como ativo econômico.
O que está mobilizando a academia, os empresários esclarecidos e os ambientalistas é a defesa de uma agenda preservacionista do século passado e não a do futuro onde será imperativo desenvolver instrumentos para viabilizar a coexistência entre o aumento da conservação e o aumento da produção. Esse é o desafio que deveria estar consumindo as energias dos envolvidos na discussão do Código Florestal.
Sem sinais de avanço, as reuniões se multiplicam no Congresso e no Palácio do Planalto. Uma comissão de negociação foi montada pelo atual presidente da Câmara, para se buscar um acordo que permita colocar o substitutivo em votação sem que vire uma polêmica capaz de gerar fissuras na base do governo, com graves repercussões junto à opinião pública. Até agora nenhum resultado concreto nessa direção foi obtido e multiplicam-se informações desencontradas e contraditórias sobre supostos acordos entre as partes envolvidas.
Nada parece ser suficiente para convencer a bancada ruralista e seu novo líder de que a proposta tal como está é um retrocesso inaceitável, incapaz de levar tranquilidade ao campo e, muito menos, estabelecer a tão desejada segurança jurídica para o pleno desenvolvimento da atividade agropecuária no país.
As lideranças ruralistas com forte influência e trânsito nos arcos, cúpulas e abóbadas de Brasília parecem ter certeza da aprovação de um substitutivo que finalmente as desobrigará do cumprimento de exigências que estão previstas em lei desde o governo do presidente Getúlio Vargas, quando foi editada a primeira versão do Código Florestal, em 1934. Foi naquela época, há mais de oitenta anos, que foi estabelecido que as florestas eram “interesse comum de todos os habitantes do país” e definida a obrigatoriedade de preservação de 25% da vegetação nativa das propriedades rurais e das florestas protetoras, destinadas a conservar os recursos hídricos e evitar a erosão, entre outras funções.
Como em 2000 parece que restará a presidente atuar junto às lideranças do Congresso para evitar o pior.

João Paulo R. Capobianco

Biólogo e ambientalista, é membro do Conselho Diretor do Instituto Democracia e Sustentabilidade, foi secretário nacional de Biodiversidade e Florestas e secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente de 2003 a 2006.