por James Petras [*]
![]() Inicialmente, descreveremos os processos econômicos, políticos e militares que vêm abrindo este caminho à decadência e à decomposição social, e a seguir mostraremos a reação das massas populares à deterioração de suas condições de vida. As profundas mudanças estruturais que acompanham a ascensão da barbárie constituirão a base para considerar as perspectivas para o socialismo no século XXI. A crescente onda de barbárie Nas sociedades antigas, a "barbárie" e os seus portadores – os "bárbaros" invasores – foram vistos como uma ameaça vinda das regiões periféricas de Roma ou Atenas. Nas sociedades ocidentais contemporâneas, os bárbaros vêm de dentro, da elite, com a intenção de impor uma nova ordem que corrói o tecido social e a base produtiva da sociedade, convertendo meios de subsistência estáveis em condições deterioradas e inseguras da vida cotidiana. A chave para a barbárie contemporânea encontra-se nas estruturas internas do Estado imperial e da economia. Estas incluem: 1. A ascensão de uma elite financeira e especulativa, que tem saqueado trilhões de dólares dos poupadores, investidores, mutuários, consumidores e do Estado, subtraindo enormes recursos da economia produtiva e colocando-os nas mãos da camada parasitária aninhada no Estado e nos mercados financeiros. 2. A elite política militarista, que vem supervisionando um estado de guerra permanente desde meados do século passado. Terror de Estado, guerras intermináveis, assassinatos em zonas fronteiriças e a suspensão das garantias constitucionais tradicionais levaram à concentração de poderes ditatoriais, prisões arbitrárias, torturas e à negação do habeas corpus. 3. Em meio a uma profunda recessão econômica e estagnação, os altos gastos do Estado na construção de um império econômico e militar, às expensas da economia nacional e dos padrões de vida, refletem a subordinação da economia local às atividades do Estado imperial. 4. A corrupção desde o topo, visível em todos os aspectos da atividade do Estado - desde as aquisições de bens e serviços até a privatização e os subsídios para os super-ricos –, incentiva o crescimento do crime internacional de cima para baixo, a lumpenização da classe capitalista e um Estado onde a lei e a ordem se encontram em descrédito. 5. Resultantes dos elevados custos de construção do império e da pilhagem da oligarquia financeira, os encargos sócio-econômicos recaem diretamente sobre os ombros dos trabalhadores assalariados, aposentados e trabalhadores por conta própria, determinando uma grande mobilidade descendente na escala social ao longo do tempo. Com a perda de empregos e o desaparecimento das posições mais bem remuneradas, as retomadas de casas pelos bancos crescem exponencialmente e as classes médias, antes estáveis, encolhem, e os trabalhadores são forçados a alongar suas jornadas de trabalho diárias e a trabalhar durante um maior número de anos. 6. As guerras imperiais, que se espalham pelo mundo e são direcionadas a populações inteiras, que sofrem com os bombardeios e as operações clandestinas de terror, geram, em oposição, redes terroristas, que também atingem alvos civis nos mercados, transportes e espaços públicos. O mundo vai se parecendo ao pesadelo hobbesiano de "todos contra todos". 7. Um crescente extremismo etno-religioso ligado ao militarismo é encontrado entre os cristãos, judeus, muçulmanos e hindus, que substitui a solidariedade de classe internacional por doutrinas de supremacia racial e penetra as estruturas profundas dos Estados e das sociedades. 8. O desaparecimento dos Estados europeus e asiáticos de bem-estar social coletivo – nomeadamente, a ex-URSS e a China – levantou as pressões competitivas sobre o capitalismo ocidental e o encorajou à revogação de todas as concessões de bem-estar social obtidas pela classe trabalhadora no período pós-II Guerra Mundial. 9. O fim do "comunismo" e a integração da social-democracia ao sistema capitalista levaram a um enfraquecimento severo da esquerda, que os protestos esporádicos dos movimentos sociais não conseguiram substituir. 10. Diante do atual assalto às condições de vida dos trabalhadores e da classe média, só se vêem protestos esporádicos, no melhor dos casos, e impotência política, no pior. 11. A exploração maciça do trabalho nas sociedades capitalistas pós-revolucionárias, como a China e o Vietnã, compreende a exclusão de centenas de milhões de trabalhadores migrantes dos serviços públicos elementares de educação e saúde. A pilhagem sem precedentes e a captura, por oligarquias nacionais e multinacionais estrangeiras, de milhares de lucrativas empresas públicas estratégicas da Rússia, das repúblicas da ex-União Soviética, dos países da Europa Oriental, dos Bálcãs e dos países bálticos, foram a maior transferência de riqueza pública para mãos privadas, em curto espaço de tempo, em toda a História. Em resumo, a barbárie surgiu como uma realidade definida, produto da ascensão de uma classe dominante financeira parasitária e militarista. Os bárbaros encontram-se aqui e agora, presentes dentro das fronteiras das sociedades ocidentais e seus Estados. Eles governam e perseguem agressivamente uma agenda que está continuamente a reduzir os padrões de vida, a transferir a riqueza pública para os seus cofres privados, a pilhar recursos públicos, a violar direitos constitucionais no exercício de suas guerras imperiais, a segregar e perseguir milhões de trabalhadores imigrantes e a promover a desintegração e o desaparecimento do trabalho estável e de classe média. Mais do que em qualquer outro momento na história recente, o 1% mais rico da população controla uma parcela crescente das riquezas e das rendas nacionais. Mitos e realidades do capitalismo histórico A retirada, em grande escala e de forma sustentada, dos direitos sociais e previdenciários, da segurança no emprego, e as reduções de salários e aposentadorias, demonstram a falsidade da idéia do progresso linear do capitalismo. Essa reversão, produto do poder ampliado da classe capitalista, demonstra a validade da proposição marxista de que a luta de classes é o motor da História – na medida em que, pelo menos, a própria condição humana é considerada como sua peça central. A segunda premissa falsa – a de que os Estados organizados em "economias de mercado" têm como pré-requisito a paz, tendo como corolário a ascendência dos "mercados" sobre o militarismo – é refutada pelo fato de que a principal economia de mercado – os Estados Unidos – tem permanecido em constante estado de guerra desde o início da década de 1940, estando ativamente engajada em guerras em quatro continentes, até os dias de hoje, e com perspectiva de novas, maiores e mais sangrentas guerras no horizonte. A causa e conseqüência da guerra permanente é o crescimento de um monstruoso "Estado de segurança nacional" que não reconhece fronteiras nacionais e absorve a maior parte do Orçamento do país. O terceiro mito do "capitalismo avançado maduro" é o de que este sempre revoluciona a produção através da inovação e da tecnologia. Com a ascensão da elite financeira especulativa e militarista, as forças produtivas foram saqueadas e a "inovação" é em grande parte direcionada à elaboração de instrumentos financeiros que exploram os investidores, reduzem os ativos e acabam com o trabalho produtivo. Enquanto o império cresce, a economia local se contrai, o poder está centralizado no Executivo, o poder legislativo é reduzido e aos cidadãos é negada uma representação efetiva, ou mesmo o poder de veto através de processos eleitorais. A resposta das massas ao aumento da barbárie A ascensão da barbárie em nosso meio tem provocado revolta pública contra seus principais executores. As pesquisas de opinião têm reiteradamente encontrado: (1) Profunda aversão e revolta contra todos os partidos políticos. (2) Grande desconfiança, nutrida pela maioria da população, contra a elite empresarial e política. (3) Rejeição, também pela maioria, da concentração de poder corporativo e do seu abuso, principalmente por parte dos banqueiros e financistas. (4) Questionamento amplo das credenciais democráticas dos líderes políticos que agem a mando da elite empresarial e promovem as políticas repressivas do Estado de segurança nacional. (5) Rejeição, pela grande maioria da população, da pilhagem do Tesouro nacional para salvação dos bancos e da elite financeira, com a imposição de programas de austeridade regressivos sobre a classe média trabalhadora. Perspectivas para o socialismo A ofensiva capitalista teve certamente um grande impacto sobre as condições objetivas e subjetivas da classe média trabalhadora, empobrecendo-a e provocando uma onda crescente de descontentamento pessoal, que ainda não se traduziu numa movimentação anticapitalista massiva, ou mesmo numa resistência dinâmica e organizada. As grandes mudanças estruturais requerem um melhor entendimento das atuais circunstâncias adversas e a identificação de novas instâncias e meios onde se desenvolvem a luta de classes e de transformação social. Um problema-chave é a necessidade de se recriar uma economia produtiva e reconstruir uma classe trabalhadora industrial após anos de pilhagem financeira e desindustrialização, não necessariamente para as poluidoras indústrias do passado, mas certamente para novas indústrias que criem e utilizem fontes de energia limpa. Em segundo lugar, as sociedades capitalistas altamente endividadas necessitam, fundamentalmente, sair do modelo de construção imperial militarista de alto custo em direção a um modelo de austeridade financeira baseado na classe e que imponha os sacrifícios e as reformas estruturais aos setores bancário, financeiro e comercial de grande varejo, que substitui a produção local pela importação de artigos de consumo de baixo custo. Em terceiro lugar, o enxugamento do setor financeiro e do comércio retalhista exige a melhoria das qualificações dos trabalhadores que serão deslocados ou desempregados, bem como mudanças no setor de TI, de forma a acomodar as próprias mudanças econômicas. Exige, também, a mudança de um paradigma – da renda monetária para o rendimento social –, em que a educação pública e gratuita de alto nível, o acesso universal à saúde e as aposentadorias abrangentes substituirão o consumismo global financiado por dívidas. Isso pode se tornar a base para o fortalecimento da consciência de classe contra o consumismo individual. Esta é a questão: como passar de uma posição em que a classe trabalhadora se encontra fragmentada e enfraquecida e os movimentos sociais em recuo ou na defensiva a uma posição em que seja possível lançar uma ofensiva anticapitalista? Vários fatores subjetivos e objetivos já permitem o trabalho nesse sentido. Primeiro, há uma negatividade crescente contra a grande maioria dos atuais operadores políticos e, em particular, contra as elites econômicas e financeiras que estão claramente identificadas como responsáveis pelo declínio nos padrões de vida. Em segundo lugar, há o ponto de vista popular, compartilhado por milhões de pessoas, de que os atuais programas de austeridade são claramente injustos - com os trabalhadores a pagar pela crise que a classe capitalista produziu. Até o momento, no entanto, estas maiorias são mais "anti"-status quo do que "pró"-transformação. A transição do descontentamento privado para a ação coletiva é uma questão em aberto quanto a quem a desencadeará e como o fará, mas a oportunidade está presente. Existem vários fatores objetivos que podem deflagrar uma mudança qualitativa do descontentamento, deslocando-o da raiva passiva rumo a um maciço movimento anticapitalista. Um "duplo mergulho" na recessão, o fim da atual recuperação anêmica e o início de uma recessão mais profunda e prolongada ou de uma depressão poderiam desacreditar ainda mais os governantes atuais e seus aliados econômicos. Em segundo lugar, o aprofundamento interminável da austeridade poderá desacreditar a noção atual, difundida pela classe dominante, de que os sacrifícios atuais são necessários para se obterem ganhos futuros, abrindo as mentes e encorajando os corpos a se moverem à procura de soluções políticas, de forma a alcançar ganhos no presente e infligir dor às elites econômicas. As inesgotáveis e "invencíveis" guerras imperiais que sangram a economia e a classe trabalhadora podem, em última análise, criar uma consciência de que a classe dominante oferece "sacrifícios" à nação sem nenhuma finalidade "útil". Provavelmente, o efeito combinado de uma nova etapa da recessão, a austeridade perpétua e as estúpidas guerras imperiais acabarão por transformar o mal-estar atual e a difusa hostilidade das massas contra a elite econômica e política em favor dos movimentos socialistas, partidos e sindicatos. Tradução de http://www.correiocidadania.com.br/content/view/4921/9/ Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ . |
Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
terça-feira, 24 de agosto de 2010
A tendência à barbárie e as perspectivas do socialismo
Os alemães tornaram-se cépticos em relação ao capitalismo
Os comentadores alemães rejubilam com as
exportações e os políticos anunciam o fim da crise e o regresso à
normalidade. Mas a população não parece convencida. Por João Alexandrino
Fernandes, de Tübingen, Alemanha, para o Esquerda.net.

Uma recente
sondagem indica que 88% dos alemães tornaram-se cépticos em relação ao
capitalismo e aspiram a uma nova ordem económica. Foto Werner
Kunz/Flickr
Têm vindo a surgir nos meios de comunicação social notícias sobre a recuperação económica da Alemanha: a Alemanha está a sair da crise, prevendo-se já uma taxa de crescimento de 3% em 2010. A Alemanha, o “motor” da Europa, está de regresso - assim se pensa, pelo menos.
Porém, o mais interessante é que estas notícias, que parecem convencer todos, não convencem a população alemã!
Neste momento diz-se que a economia da Alemanha cresce. Os comentadores
rejubilam com as exportações e os políticos anunciam o fim da crise e o
regresso à normalidade. E no entanto, segundo uma sondagem agora
divulgada, efectuada pelo instituto de pesquisa de opinião Emnid, por
incumbência da Fundação Bertelsmann, esta euforia não se reflecte no
estado de espírito da população. A maioria das pessoas não acredita que
tudo volte a ser como era de forma assim tão simples. Pelo contrário:
dois terços da população não esperam sequer que a recuperação económica
faça aumentar automaticamente a sua qualidade de vida.
Segundo a sondagem, a convição da população alemã mudou e tudo indica
que de forma estável. De facto, 88% dos alemães tornaram-se cépticos em
relação ao capitalismo e aspiram a uma nova ordem económica: acreditam
que o capitalismo não toma suficientemente em consideração quer o
equilíbrio social, quer a protecção do ambiente, quer a necessidade de
uma relação cuidadosa com os recursos naturais.
Significa esta atitude que os alemães pretendem uma revolução?
Atendendo aos resultados da sondagem, não. Significa que os alemães
estão pensativos e que vêem a responsabilidade pela actual situação
económica e social não só nos políticos e nos dirigentes da economia,
mas também em si próprios: quatro em cada cinco alemães são da opinião
de que cada um deveria reflectir sobre a sua própria forma de vida,
sobre se, para si, o crescimento económico é tudo.
Hoje em dia valores como a justiça social ou a protecção ambiental são
para a maioria dos alemães tão importantes que influenciam de forma
crescente a sua posição relativamente ao sistema económico. Para a
grande maioria dos cidadãos as fontes de qualidade de vida pessoal são
de natureza imaterial: relações sociais, saúde e condições ambientais
são mais importantes do que ter mais dinheiro e propriedade.
Importante também é que esta nova escala de valores recolhe um consenso
fora do vulgar em todos os escalões sociais e mostra-se independente
dos níveis de educação. Uma afirmação da pesquisa: “a prosperidade
social é, para mim, menos importante do que a protecção ambiental e a
redução das dívidas do Estado” mereceu não só a concordância de 75% das
pessoas com formação liceal, a forma mais elevada do ensino secundário e
que permite o acesso ao ensino superior, mas também a concordância de
69% das pessoas com a formação da chamada “Hauptschule”, que é a forma
mais elementar do ensino secundário alemão.
Segundo os resultados da sondagem, os alemães acreditam ainda que o
sistema económico pode ser orientado na direcção certa e a maioria está
convencida de que crescimento e protecção ambiental são objectivos
compatíveis um com o outro – mas pressupondo que existe para tal a
necessária vontade política. 82% consideram a continuação do crescimento
indispensável para a estabilidade política, mas em contrapartida não
acreditam nas chamadas “forças de regeneração próprias” do mercado, em
relação às quais os jovens são particularmente cépticos - e, pode-se
aqui bem dizer, com razão. O que a crise financeira precisamente
demonstrou foi o contrário, foi que quem “regenerou” o mercado não foram
nenhumas “forças de regeneração próprias”, mas sim as gigantescas
transferências de fundos feitas pelo Estado para instituições
financeiras aí a operar.
São todas estas incongruências ligadas ao sistema económico, acrescidas
da comprovada incapacidade do sistema para resolver os problemas de
justiça social e para deter a ameaça de destruição ambiental, neste
momento já à escala planetária, fortalecidas pela constatação de que por
mais que os números digam que a economia cresce, o impacto deste
crescimento pouco ou nada se faz notar na vida do cidadão comum, ao
passo que, na situação contrária, de crise, o impacto negativo é
imediato, que os alemães parecem ter deixado de ignorar.
Ora, deixar de ignorar não é, certamente, condição suficiente - mas é condição necessária para qualquer mudança seja possível.
Fontes: "Umfrage: Neun von zehn Deutschen fordern neue Wirtschaftsordnung“, in Spiegel Online, 18. August 2010, www.spiegel.de. "Umfrage-Wachstumsskeptisch“ em Zeit Online, 18.08.2010,www.zeit.de.
Homenagem a Getulio Vargas
Porque não mataram Getúlio
Brizola Neto no Tijolaço
A essa hora da manhã, 56 anos atrás, as ruas já estavam cheias de uma multidão atônita, em pânico, em lágrimas.
O estampido do pequeno revólver que disparara a bala fatal no coração
de Getúlio Vargas ecoava como se fosse um poderosíssimo canhão, um
grunhido de dor que enchia os subúrbios da cidade, tomava corpo e, em
pernas, em caminhões, em trens e em ônibus, começava fluir, em ondas,
para as praças.
E a dor e a raiva, tão sempre companheiras, se misturaram numa
comoção coletiva e em atos de inconformismo, queimando os jornais que
detratavam o velho, empresas estrangeiras. O então jovem gaúcho Paulo
José, o grande ator, conta que a multidão, em Porto Alegre, saiu “depredando tudo que tivesse nome americano: o Consulado, as Lojas Americanas, até a American Boite…”
Nem eu nem você vivemos estas cenas. Elas e perderam no tempo e
sobrevivem apenas em velhos e riscados filmes em preto e branco, como o
que reproduzo aí em cima, (espere um pouquinho, daqui a pouco a edição fica pronta e eu publico)com
uma regravação, por Zé Ramalho, do genial “Ele disse”, composto por
Jackson do Pandeiro sobre a carta testamento de Getúlio ainda ali, no
terremoto da tragédia.
Mas será que é mesmo assim? Será que comoas velhas fotos de família
que parecem nos retratar como já não somos mais, na aparência, não se
guardam ali as raízes do que fomos e somos e que irrigam nossos sonhos e
desejos.
O Vargas dos direitos trabalhistas, do petróleo, da exploração
soberana dos nossos recursos naturais, dos bairros operários, dos Iapis,
que entoava o seu “trabalhadores do Brasil” ao discursar, para mostrar
que falava ao povo, essencialmente, e não às elites deste país é uma
destas raízes.
Formou-se e tomou corpo absorvendo a seiva das lutas sociais da
primeira metade do século 20 e cresceu em direção à luz do sonho de uma
soberania nacional, um desenvolvimento autônomo que, como o sol, não
importa que o quão longe esteja, nos alimenta com sua força vital.
Ah, quantos machados e quantas serras tentaram cortar esta raiz. A
ditadura e seus porões e seus exílios. Depois, os professores de finos
modos e feroz crueldade, como Fernando Henrique e, como ele, outros
tantos que, filhos de Vargas, desejaram tomar daquele pequeno revólver e
disparar não contra seu peito, mas contra o que dentro dele havia: o
desejo de um Brasil soberano, livre, forte, dono de suas riquezas e
habitado por uma gente que reunia todas as diferenças de pele, voz,
secas, águas, campos, praias, frios calores, mas que se igualava naquela
expressão que os chamava à consciência de que éramos um povo e um povo
valoroso:
“Trabalhadores do Brasil”.
Se Vargas estava morto,o que mais queriam matar?
Era isso, meus amigos, era isso.
Os que vieram de Vargas, na primeira geração, Jango e Brizola,
receberam um anátema. Eram malditos. Foi preciso bani-los, para o
exílio, para a morte ou para o desterro político do “ultrapassado,
populista, demagogo”. Não houve poucos, que, com a arrogância dos que
acham que, antes deles, nada havia, repetiram o que vinha das vozes
oficiais, fixando seus olhos nas origens e nos defeitos dos personagens,
sem serem capazes de entender que alinão estavam apenas homens de carne
e osso, mas personagens da história.
Mas o processo social é caprichoso. Ao tomar posse, depois de uma
estrondosa eleição popular, Getúlio saudo o povo trabalhador dizendo:
“Hoje, estais com o Governo, amanhã, sereis Governo”.
Pois não é que um operário de carne e osso – bem verdade que, por
tempos, tutelado como ícone por um grupo de intelectuais onde não
faltavam os elitistas, que torcia o nariz ao nome de Getúlio, chegou ao
Governo. Lá, lá, ao seu jeito e nas suas circunstâncias, entendeu o que
foi o velho, ao ponto de repetir seu gesto sujando a mão de petróleo,
de praticar uma política de valorização do salário-mínimo que e muito
mais forte do que aquele discurso de “conquista da categoria organizada”
e de entender que modernização do país e crescimento econômico só podem
existir, de verdade, quando há ascensão do nosso povão.
Em um artigo que li, do professor Emir Sader, ele pergunta:
- Como isso foi possível, depois de 21 anos de ditadura militar e
de mais de uma década de governos neoliberais? Qual o fio condutor que
articula o movimento popular brasileiro desde suas origens
contemporâneas, na Revolução de 30, passando por estas oito décadas de
acontecimentos tão significativos – progressivos e regressivos – até
chegar ao complexo período que vivemos?
Foi, professor, o fio da História, aquele que é tecido por gente e
por fatos, por sonhos, por conquistas e derrotas, em que cada ponto se
apóia e firma no ponto anterior, e no anterior, e no anterior,até
estarmos todos seguindo uma linha que podemos nem mesmo saber onde
começa, mas que serpenteia inexorávelmente em uma direção, como um rio
procura o mar.
PS. Hoje, às 15 horas, quando fizermos uma pequena homenagem a
Getúlio, em seu busto, na Cinelândia, preparei uma surpresa, uma cena
que vai parecer uma brincadeira a alguns. Não me importo. A memória de
Vargas é para ser lembrada com alegria, não com lágrimas. Porque a
melhor homenagem que ele poderia desejar está expressa na sua própria
letra, às portas do gesto heróico de 24 de agosto de 1956: que o povo de
quem ele foi escravo, um dia, não mais seja escravo de ninguém.
segunda-feira, 23 de agosto de 2010
Mas o que são mesmo as tais “multinacionais brasileiras”?
Multinacionais brasileiras? A resposta envolve alternativas
que vão muito além do que um simples "sim" ou "não". Deve passar por um
profundo debate sobre os "comos", os "porquês", os "paraquéns" e os
"sob-quais-condições".
Por Paulo Kliass, na Agência Maior*
Conforme compromisso assumido no
artigo da semana passada, fiquei de discutir um pouco agora o conceito
expresso aqui no título. Multinacionais brasileiras? Confesso que a
primeira vez em que me deparei com a expressão, há muitos anos atrás,
senti um certo incômodo.
Afinal, na condição de brasileiro, uma pessoa que se considera de esquerda, num mundo dominado pelo capital estrangeiro, naquela época era mais fácil denunciar as mazelas do imperialismo provocadas pela ação perniciosa e exploradora das multinacionais com sede no exterior...
No entanto, o processo de internacionalização da economia avançou e alguns países do chamado bloco dos "não-desenvolvidos" ou "em desenvolvimento", segundo a classificação da preferência de cada um, avançaram mais do que a média dos desenvolvidos e do que a média mundial. Entre outros, é famoso o caso dos BRICs, acrônimo para designar Brasil, Rússia, Índia e China.
Com todos os problemas derivados das tentativas de agrupar realidades bastante diferentes entre si, esse conjunto consegue chamar a atenção para algumas semelhanças significativas. Trata-se de países de grande extensão territorial, com expressivo contingente populacional e elevado potencial de crescimento econômico a partir dos anos 2000.
Face à crise por que vêm passando as economias de Estados Unidos, Japão e Europa nas últimas décadas, os Brics passam a ser vistos como alternativas para a retomada do crescimento da economia em escala global. Seja pelo lado da produção de bens e serviços, seja pela capacidade mesmo de consumo representada por essa demanda concentrada territorialmente, mas da ordem de bilhões de indivíduos.
Cada um desses países tem seu ritmo próprio de crescimento da economia, sua história recente que explica a emergência repentina, sua entrada nesse mundo da divisão internacional do trabalho e do capital. O caso da China é o mais evidente: o País vem crescendo a taxas elevadíssimas ao longo das últimas 2 décadas e acaba de ultrapassar o PIB do Japão, tornando-se a segunda economia do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.
Com esse processo, emergem os mega-consórcios e as mega-empresas chinesas. Um das operações mais simbólicas foi a compra em 2004 da famosa IBM norte-americana, a antes toda poderosa empresa multinacional de informática. Passou a fazer parte da Lenovo, conglomerado majoritariamente chinês.
A China é detentora de boa parte da dívida pública dos EUA e desponta como a potência hegemônica das próximas décadas. Assim, a cada dia que passa uma nova empresa chinesa gigante desponta para o noticiário econômico nas mais diversas áreas, como transportes, bens de capital, siderurgia, petroquímica, automobilística, etc.
O caso russo está bastante vinculado ao processo descontrolado de transição às regras da economia mercado, ocorrido a partir da década de 90. O colapso político e econômico do regime soviético fez com que um conjunto de grandes conglomerados estatais fossem submetidos a um processo descontrolado de privatização. Na verdade, o que ocorreu foi uma transferência do patrimônio público para poucos indivíduos e/ou grupos, que se converteram em verdadeiros bilionários da noite para o dia.
Em especial nas áreas de transportes, siderurgia, telecomunicações, petroquímica, energia, entre outras. Um país com história milenar de influência na região, a atual Rússia continua a tentar exercer sua hegemonia econômica e diplomática naquela parte do mundo.
Quem nunca ouviu falar na Gazprom, a maior empresa de gás no mundo atual? Ao lado dela, as outras grandes empresas russas de escala internacional operam basicamente no ramo de energia, mineração e infra-estrutura.
O caso da Índia já é um pouco distinto. Desde o processo de luta contra a dominação britânica, o País tenta construir um caminho próprio que combine a afirmação da independência política com a construção de uma infra-estrutura social e econômica capaz de dar conta da enorme quantidade de desafios relativos à construção de uma Nação livre. A exemplo dos casos anteriores, sua história é milenar e conta períodos de apogeu de dominação social, econômica e cultural no Oriente.
Há quase meio século busca uma inserção baseada no fortalecimento regional do país e na ampliação de sua influência no mundo globalizado. A grande referência continua sendo o êxito do grupo Tata, um conglomerado mais conhecido na área da metalurgia e da indústria automobilística.
Há, inclusive, indícios de que estaria a preparar as malas para seu desembarque em nossas praias, atraído pelo potencial de produção e comercialização do carro mais barato do mundo - o Nano. As demais empresas gigantes indianas com influência mundial operam, em sua maior parte, nas áreas de energia, infra-estrutura, mineração e telecomunicações.
E o caso brasileiro? Pois é, nos últimos anos cada vez mais se menciona a expressão das "multinacionais brasileiras". Mas quais são elas, afinal? As listas variam muito, de acordo com os critérios utilizados, com os anos mantidos como referência e com os setores incluídos. Por exemplo, se excluirmos o setor financeiro, logo de cara ficam de fora Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, BNDES, Bradesco e Itaú.
Se a base for anterior a 2009, Sadia e Perdigão aparecem ainda separadas, antes da fusão de gigantes ocorrida no ano passado. Se incluirmos as empresas de construção civil, a sagrada trindade formada por Camargo Correia, Odebrecht e Andrade Gutierrez passa a ser presença assegurada. E por aí vai. Cada um monta a sua lista de acordo com seus interesses, muitas vezes para fazer incluir alguma ou excluir outra... Afinal, o jogo é prá cachorro grande, big businness!
De qualquer forma, em geral a lista é encabeçada pela Petrobrás e pela Vale. Em seguida surgem Gerdau, Braskem e Votorantim. A seguir as empresas alimentícias, como a Brazil Foods (Sadia + Perdigão) e a Friboi-JBS (maior empresa do mundo na área de carnes e frigoríficos).
Em geral, está também presente a empresa de nosso Vice Presidente José de Alencar, a Coteminas. Freqüentam também a WEG (motores), a Natura e a Marcopolo (setor automobilístico). Alguns leitores podem estar se perguntando a essa altura: sim, Paulo, mas e daí? Pois é, boa pergunta! E daí?
E daí que, cada vez mais, a questão da inserção da economia brasileira no cenário internacional passa por um debate a respeito de qual a melhor estratégia a ser adotada. Muitos empresários, economistas e agentes públicos defendem a consolidação das chamadas "campeãs nacionais".
As declarações e as ações desenvolvidas pelo Presidente do BNDES, Luciano Coutinho, representam bem essa visão. Trata-se de envidar todos os esforços possíveis para que o Brasil constitua e fortaleça cada vez mais um pequeno número de "grandes e boas" empresas ditas brasileiras, em setores nos quais sejam capazes de despontar como lideranças no mercado planetário disputado da globalização acentuada.
Mas o detalhe é que a construção desse caminho custa caro, muito caro. E como sempre ocorre, a retórica liberal pede uma licença poética e chama ardentemente a presença do Estado, para ajudar nessa tarefa, agora sim, travestida de elevado grau de patriotismo! Afinal, esse é um País que vai prá frente...
E aqui entra o papel das instituições públicas, que operam com recursos do Estado brasileiro, como é o caso do BNDES. Além de emprestar a juros subsidiados, o Banco tem operado como o cimento financeiro necessário para a conformação dos grandes conglomerados brasileiros de capital...privado! E esse papel é encarado como a função nobre, por excelência, do Banco na atual etapa por que passa o processo de acumulação capitalista em escala internacional.
O BNDES empresta a juros mais baixos principalmente para os grandes conglomerados, oferece cartas de garantia para as ações no plano internacional, adianta recursos para processos de capitalização, entre outras operações. Todo esse esforço para o fortalecimento da causa nacionalista. Haja patriotismo...
Mas até o mais ingênuo dos Cândidos sabe que o capital não tem Pátria! O que move suas ações e decisões é a busca do lucro, da acumulação. E ponto final. Quantos não vibraram há alguns anos atrás, quando constituímos uma das maiores empresas de cerveja do mundo, com a fusão da Brahma e da Antarctica?
Mas, como reza o dito popular, alegria de pobre dura pouco. E, logo em seguida, a Ambev foi tranqüilamente vendida para os gigantes belgas da Interbrew. E desde 2005 voltamos a beber cerveja estrangeira... O que dizer da - até então - brasileira Garoto, engolida pela transnacional suíça Nestlé? E que agora, há poucos dias atrás, da nossa TAM sendo absorvida pela chilena LAN? O que foi feito desses gigantes tão brasileiros até bem pouco tempo atrás?
A análise da constituição das grandes multinacionais mostra alguns, digamos assim,"vícios" de origem. A Petrobrás é empresa da União desde sua fundação em 1954. A Vale foi privatizada e vendida a preço de banana há pouco mais de uma década.
A Gerdau e Braskem operam na área da siderurgia e petroquímica, com toda a facilidade propiciada pela aquisição de plantas com a privatização das empresas federais Siderbrás e Petroquisa. As empresas de construção civil devem sua existência e agigantamento às facilidades das grandes licitações de obras públicas pelo Estado brasileiro ao longo das últimas décadas.
Ou seja, fica evidente a presença da ação estatal para fortalecer e favorecer o grande capital privado, que por sua vez só existe em função das facilidades históricas já oferecidas pelo próprio Estado.
Talvez faça algum sentido o Brasil se lançar nessa aventura de competição na esfera internacional. Afinal, essas são as regras atuais do jogo e o País não consegueria sobreviver como uma ilha isolada. No entanto, é importante debatermos quais são as verdadeiras prioridades para um País com recursos não sobrantes como o nosso.
Como já mencionado, a ação do BNDES e do Estado tem um custo. Quando o Banco oferece tantas benesses ao capital privado, ele não exige nada em contrapartida. Por exemplo, não coloca como pré-condição o assento nos Conselhos de direção das empresas para exigir o cumprimento de requisitos mínimos em termos da ação empresarial, como a proibição da venda da empresa para grupos estrangeiros.
E ainda: respeito à responsabilidade social, manutenção e geração de novos empregos, política de sustentabilidade ambiental, respeito a determinadas condições mínimas para os trabalhadores, para ficar em apenas alguns itens.
Ou as nossas aspirações à liderança internacional incluiriam as pressões diplomáticas de liberar as empresas, como faz o Estado chinês pelo mundo afora, para operar com o uso de mão de obra ilegal no exterior, com o intuito único de aumentar sua competitividade?
O BNDES optou por concentrar também seus empréstimos para os grandes grupos. As informações demonstram que no último período, 57% dos desembolsos foram direcionados para apenas 12 grupos. Se tirarmos a Petrobrás e a Telebrás, restam apenas 10 conglomerados privados, incluindo as 3 gigantes da construção civil, a Votorantim, a Vale e a JBS-Friboi, entre outras.
Em seu portal, o Relatório do Banco se vangloria de que 72% dos empréstimos são direcionados para empresas de grande porte. E que 35% dos mesmos são para obras previstas no PAC. Em termos setoriais, 43% vão para a indústria da transformação e 40% para infra-estrutura.
Por outro lado, o Presidente Lula emitiu Medidas Provisórias entre 2009 e 2010, autorizando o Banco a aumentar sua capitalização em R$ 180 bilhões, com o objetivo de elevar o volume de empréstimos. Sempre com os juros da TJLP, altamente subsidiados, lembremo-nos disso.
A decisão que o País precisa tomar refere-se às prioridades e ao "timing" dessa estratégia de inserção internacional. Por exemplo, é mais do que sabido que sem investimento maciço em saúde, educação e ciência e tecnologia, de nada adianta esses vultosos investimentos nas empresas multinacionais brasileiras.
O futuro não está em empresas da construção civil ou do agronegócio! Constituir multinacionais para operar nesses setores é desperdiçar recurso público. A verdadeira sabedoria na formulação de políticas públicas está justamente em antecipar tendências estratégicas de longo prazo, para o futuro das próximas gerações e não para o País do depois-de-amanhã. Aqui entram aspectos como informática de última geração, nano eletrônica, engenharia genética, tendências da biodiversidade, mecatrônica, etc.
Muitos poderão argumentar que não basta apenas esperar o futuro, que as coisas são construídas desde já. De acordo. Mas que não faltem - como têm faltado - recursos para esses projetos de longo prazo. Sempre se faz pressão para liberar os recursos para o aqui e agora, mas as políticas que apresentarão seus resultados num futuro mais distante são sempre relegadas a um segundo plano. E nesse ponto toda a atenção deve ser conferida ao desenho do fundamental e bilionário Fundo do Pré Sal - em princípio, corretamente dirigido para essas missões estratégicas e não para o desperdício do "prá ontem"! Veremos.
Além disso, é fundamental que o comportamento do BNDES seja mais efetivo no controle dos recursos direcionados aos grandes conglomerados. Por exemplo, com o estabelecimento de uma Carta de Princípios a ser assinada pelos tomadores de empréstimos.
É público e notório que boa parte das empresas não têm compromisso algum com a sustentabilidade ambiental nem com a geração de emprego ou reaplicação de seus lucros com algum tipo de compromisso social. Pelo contrário, uma das empresas que despontvaa na liderança do recebimento de recursos para o agro-negócio, a Cosan, tem vários processos na Justiça por acusações de uso de trabalho escravo!
Multinacionais brasileiras? Como vimos, a resposta envolve alternativas que vão muito além do que um simples "sim" ou "não". Deve passar por um profundo debate sobre os "comos", os "porquês", os "paraquéns" e os "sob-quais-condições". Infelizmente, nem o propício momento do debate eleitoral está sendo usado para tal fim.
(*) Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10
Afinal, na condição de brasileiro, uma pessoa que se considera de esquerda, num mundo dominado pelo capital estrangeiro, naquela época era mais fácil denunciar as mazelas do imperialismo provocadas pela ação perniciosa e exploradora das multinacionais com sede no exterior...
No entanto, o processo de internacionalização da economia avançou e alguns países do chamado bloco dos "não-desenvolvidos" ou "em desenvolvimento", segundo a classificação da preferência de cada um, avançaram mais do que a média dos desenvolvidos e do que a média mundial. Entre outros, é famoso o caso dos BRICs, acrônimo para designar Brasil, Rússia, Índia e China.
Com todos os problemas derivados das tentativas de agrupar realidades bastante diferentes entre si, esse conjunto consegue chamar a atenção para algumas semelhanças significativas. Trata-se de países de grande extensão territorial, com expressivo contingente populacional e elevado potencial de crescimento econômico a partir dos anos 2000.
Face à crise por que vêm passando as economias de Estados Unidos, Japão e Europa nas últimas décadas, os Brics passam a ser vistos como alternativas para a retomada do crescimento da economia em escala global. Seja pelo lado da produção de bens e serviços, seja pela capacidade mesmo de consumo representada por essa demanda concentrada territorialmente, mas da ordem de bilhões de indivíduos.
Cada um desses países tem seu ritmo próprio de crescimento da economia, sua história recente que explica a emergência repentina, sua entrada nesse mundo da divisão internacional do trabalho e do capital. O caso da China é o mais evidente: o País vem crescendo a taxas elevadíssimas ao longo das últimas 2 décadas e acaba de ultrapassar o PIB do Japão, tornando-se a segunda economia do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.
Com esse processo, emergem os mega-consórcios e as mega-empresas chinesas. Um das operações mais simbólicas foi a compra em 2004 da famosa IBM norte-americana, a antes toda poderosa empresa multinacional de informática. Passou a fazer parte da Lenovo, conglomerado majoritariamente chinês.
A China é detentora de boa parte da dívida pública dos EUA e desponta como a potência hegemônica das próximas décadas. Assim, a cada dia que passa uma nova empresa chinesa gigante desponta para o noticiário econômico nas mais diversas áreas, como transportes, bens de capital, siderurgia, petroquímica, automobilística, etc.
O caso russo está bastante vinculado ao processo descontrolado de transição às regras da economia mercado, ocorrido a partir da década de 90. O colapso político e econômico do regime soviético fez com que um conjunto de grandes conglomerados estatais fossem submetidos a um processo descontrolado de privatização. Na verdade, o que ocorreu foi uma transferência do patrimônio público para poucos indivíduos e/ou grupos, que se converteram em verdadeiros bilionários da noite para o dia.
Em especial nas áreas de transportes, siderurgia, telecomunicações, petroquímica, energia, entre outras. Um país com história milenar de influência na região, a atual Rússia continua a tentar exercer sua hegemonia econômica e diplomática naquela parte do mundo.
Quem nunca ouviu falar na Gazprom, a maior empresa de gás no mundo atual? Ao lado dela, as outras grandes empresas russas de escala internacional operam basicamente no ramo de energia, mineração e infra-estrutura.
O caso da Índia já é um pouco distinto. Desde o processo de luta contra a dominação britânica, o País tenta construir um caminho próprio que combine a afirmação da independência política com a construção de uma infra-estrutura social e econômica capaz de dar conta da enorme quantidade de desafios relativos à construção de uma Nação livre. A exemplo dos casos anteriores, sua história é milenar e conta períodos de apogeu de dominação social, econômica e cultural no Oriente.
Há quase meio século busca uma inserção baseada no fortalecimento regional do país e na ampliação de sua influência no mundo globalizado. A grande referência continua sendo o êxito do grupo Tata, um conglomerado mais conhecido na área da metalurgia e da indústria automobilística.
Há, inclusive, indícios de que estaria a preparar as malas para seu desembarque em nossas praias, atraído pelo potencial de produção e comercialização do carro mais barato do mundo - o Nano. As demais empresas gigantes indianas com influência mundial operam, em sua maior parte, nas áreas de energia, infra-estrutura, mineração e telecomunicações.
E o caso brasileiro? Pois é, nos últimos anos cada vez mais se menciona a expressão das "multinacionais brasileiras". Mas quais são elas, afinal? As listas variam muito, de acordo com os critérios utilizados, com os anos mantidos como referência e com os setores incluídos. Por exemplo, se excluirmos o setor financeiro, logo de cara ficam de fora Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, BNDES, Bradesco e Itaú.
Se a base for anterior a 2009, Sadia e Perdigão aparecem ainda separadas, antes da fusão de gigantes ocorrida no ano passado. Se incluirmos as empresas de construção civil, a sagrada trindade formada por Camargo Correia, Odebrecht e Andrade Gutierrez passa a ser presença assegurada. E por aí vai. Cada um monta a sua lista de acordo com seus interesses, muitas vezes para fazer incluir alguma ou excluir outra... Afinal, o jogo é prá cachorro grande, big businness!
De qualquer forma, em geral a lista é encabeçada pela Petrobrás e pela Vale. Em seguida surgem Gerdau, Braskem e Votorantim. A seguir as empresas alimentícias, como a Brazil Foods (Sadia + Perdigão) e a Friboi-JBS (maior empresa do mundo na área de carnes e frigoríficos).
Em geral, está também presente a empresa de nosso Vice Presidente José de Alencar, a Coteminas. Freqüentam também a WEG (motores), a Natura e a Marcopolo (setor automobilístico). Alguns leitores podem estar se perguntando a essa altura: sim, Paulo, mas e daí? Pois é, boa pergunta! E daí?
E daí que, cada vez mais, a questão da inserção da economia brasileira no cenário internacional passa por um debate a respeito de qual a melhor estratégia a ser adotada. Muitos empresários, economistas e agentes públicos defendem a consolidação das chamadas "campeãs nacionais".
As declarações e as ações desenvolvidas pelo Presidente do BNDES, Luciano Coutinho, representam bem essa visão. Trata-se de envidar todos os esforços possíveis para que o Brasil constitua e fortaleça cada vez mais um pequeno número de "grandes e boas" empresas ditas brasileiras, em setores nos quais sejam capazes de despontar como lideranças no mercado planetário disputado da globalização acentuada.
Mas o detalhe é que a construção desse caminho custa caro, muito caro. E como sempre ocorre, a retórica liberal pede uma licença poética e chama ardentemente a presença do Estado, para ajudar nessa tarefa, agora sim, travestida de elevado grau de patriotismo! Afinal, esse é um País que vai prá frente...
E aqui entra o papel das instituições públicas, que operam com recursos do Estado brasileiro, como é o caso do BNDES. Além de emprestar a juros subsidiados, o Banco tem operado como o cimento financeiro necessário para a conformação dos grandes conglomerados brasileiros de capital...privado! E esse papel é encarado como a função nobre, por excelência, do Banco na atual etapa por que passa o processo de acumulação capitalista em escala internacional.
O BNDES empresta a juros mais baixos principalmente para os grandes conglomerados, oferece cartas de garantia para as ações no plano internacional, adianta recursos para processos de capitalização, entre outras operações. Todo esse esforço para o fortalecimento da causa nacionalista. Haja patriotismo...
Mas até o mais ingênuo dos Cândidos sabe que o capital não tem Pátria! O que move suas ações e decisões é a busca do lucro, da acumulação. E ponto final. Quantos não vibraram há alguns anos atrás, quando constituímos uma das maiores empresas de cerveja do mundo, com a fusão da Brahma e da Antarctica?
Mas, como reza o dito popular, alegria de pobre dura pouco. E, logo em seguida, a Ambev foi tranqüilamente vendida para os gigantes belgas da Interbrew. E desde 2005 voltamos a beber cerveja estrangeira... O que dizer da - até então - brasileira Garoto, engolida pela transnacional suíça Nestlé? E que agora, há poucos dias atrás, da nossa TAM sendo absorvida pela chilena LAN? O que foi feito desses gigantes tão brasileiros até bem pouco tempo atrás?
A análise da constituição das grandes multinacionais mostra alguns, digamos assim,"vícios" de origem. A Petrobrás é empresa da União desde sua fundação em 1954. A Vale foi privatizada e vendida a preço de banana há pouco mais de uma década.
A Gerdau e Braskem operam na área da siderurgia e petroquímica, com toda a facilidade propiciada pela aquisição de plantas com a privatização das empresas federais Siderbrás e Petroquisa. As empresas de construção civil devem sua existência e agigantamento às facilidades das grandes licitações de obras públicas pelo Estado brasileiro ao longo das últimas décadas.
Ou seja, fica evidente a presença da ação estatal para fortalecer e favorecer o grande capital privado, que por sua vez só existe em função das facilidades históricas já oferecidas pelo próprio Estado.
Talvez faça algum sentido o Brasil se lançar nessa aventura de competição na esfera internacional. Afinal, essas são as regras atuais do jogo e o País não consegueria sobreviver como uma ilha isolada. No entanto, é importante debatermos quais são as verdadeiras prioridades para um País com recursos não sobrantes como o nosso.
Como já mencionado, a ação do BNDES e do Estado tem um custo. Quando o Banco oferece tantas benesses ao capital privado, ele não exige nada em contrapartida. Por exemplo, não coloca como pré-condição o assento nos Conselhos de direção das empresas para exigir o cumprimento de requisitos mínimos em termos da ação empresarial, como a proibição da venda da empresa para grupos estrangeiros.
E ainda: respeito à responsabilidade social, manutenção e geração de novos empregos, política de sustentabilidade ambiental, respeito a determinadas condições mínimas para os trabalhadores, para ficar em apenas alguns itens.
Ou as nossas aspirações à liderança internacional incluiriam as pressões diplomáticas de liberar as empresas, como faz o Estado chinês pelo mundo afora, para operar com o uso de mão de obra ilegal no exterior, com o intuito único de aumentar sua competitividade?
O BNDES optou por concentrar também seus empréstimos para os grandes grupos. As informações demonstram que no último período, 57% dos desembolsos foram direcionados para apenas 12 grupos. Se tirarmos a Petrobrás e a Telebrás, restam apenas 10 conglomerados privados, incluindo as 3 gigantes da construção civil, a Votorantim, a Vale e a JBS-Friboi, entre outras.
Em seu portal, o Relatório do Banco se vangloria de que 72% dos empréstimos são direcionados para empresas de grande porte. E que 35% dos mesmos são para obras previstas no PAC. Em termos setoriais, 43% vão para a indústria da transformação e 40% para infra-estrutura.
Por outro lado, o Presidente Lula emitiu Medidas Provisórias entre 2009 e 2010, autorizando o Banco a aumentar sua capitalização em R$ 180 bilhões, com o objetivo de elevar o volume de empréstimos. Sempre com os juros da TJLP, altamente subsidiados, lembremo-nos disso.
A decisão que o País precisa tomar refere-se às prioridades e ao "timing" dessa estratégia de inserção internacional. Por exemplo, é mais do que sabido que sem investimento maciço em saúde, educação e ciência e tecnologia, de nada adianta esses vultosos investimentos nas empresas multinacionais brasileiras.
O futuro não está em empresas da construção civil ou do agronegócio! Constituir multinacionais para operar nesses setores é desperdiçar recurso público. A verdadeira sabedoria na formulação de políticas públicas está justamente em antecipar tendências estratégicas de longo prazo, para o futuro das próximas gerações e não para o País do depois-de-amanhã. Aqui entram aspectos como informática de última geração, nano eletrônica, engenharia genética, tendências da biodiversidade, mecatrônica, etc.
Muitos poderão argumentar que não basta apenas esperar o futuro, que as coisas são construídas desde já. De acordo. Mas que não faltem - como têm faltado - recursos para esses projetos de longo prazo. Sempre se faz pressão para liberar os recursos para o aqui e agora, mas as políticas que apresentarão seus resultados num futuro mais distante são sempre relegadas a um segundo plano. E nesse ponto toda a atenção deve ser conferida ao desenho do fundamental e bilionário Fundo do Pré Sal - em princípio, corretamente dirigido para essas missões estratégicas e não para o desperdício do "prá ontem"! Veremos.
Além disso, é fundamental que o comportamento do BNDES seja mais efetivo no controle dos recursos direcionados aos grandes conglomerados. Por exemplo, com o estabelecimento de uma Carta de Princípios a ser assinada pelos tomadores de empréstimos.
É público e notório que boa parte das empresas não têm compromisso algum com a sustentabilidade ambiental nem com a geração de emprego ou reaplicação de seus lucros com algum tipo de compromisso social. Pelo contrário, uma das empresas que despontvaa na liderança do recebimento de recursos para o agro-negócio, a Cosan, tem vários processos na Justiça por acusações de uso de trabalho escravo!
Multinacionais brasileiras? Como vimos, a resposta envolve alternativas que vão muito além do que um simples "sim" ou "não". Deve passar por um profundo debate sobre os "comos", os "porquês", os "paraquéns" e os "sob-quais-condições". Infelizmente, nem o propício momento do debate eleitoral está sendo usado para tal fim.
(*) Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10
Cuidado com os agrotóxicos nos alimentos
por Igor Felippe Santos

O
Brasil bateu recorde na utilização de agrotóxicos no ano passado. Mais
de um bilhão de litros de venenos foram jogados nas lavouras, de acordo
com dados do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa
Agrícola. Com a aplicação exagerada de produtos químicos nas lavouras no
país, o uso de agrotóxicos está deixando de ser uma questão relacionada
especificamente à produção agrícola e se transforma em um problema de
saúde pública e de preservação da natureza.
De acordo com dados divulgados em novembro de 2009 pelo Censo
Agropecuário 2006 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), houve, em 2006, pelo menos 25.008 casos de intoxicação de
agricultores. Os dados também indicam que herbicidas, fungicidas e
inseticidas foram usados em mais de um milhão de fazendas.
O pesquisador da Fiocruz, médico e professor da Universidade Federal
do Mato Grosso (UFMT), Wanderlei Antonio Pignati, responsabiliza o
agronegócio por essa expansão desenfreada. Para ele, “é preciso discutir
o modelo de produção agrícola que está aí. É um modelo insustentável”.
As transnacionais da agricultura vem concentrando a terra e utilizando
uma grande quantidade de agrotóxicos para garantir a produção em escala
industrial. Também prometiam diminuir a utilização com os transgênicos,
mas com a sua aprovação de diversas variedades só aumenta o uso dessas
substâncias químicas.
Pignati explica que “as sementes das grandes indústrias são
dependentes de agrotóxicos e fertilizantes químicos. As indústrias não
fazem sementes livres desses produtos, porque são produtores tanto das
sementes como dos agrotóxicos. Criam sementes dependentes de
agrotóxicos”. Ele realizou estudos sobre os impactos dos agrotóxicos no
Mato Grosso, demonstrando que nas regiões com maior utilização de
agrotóxicos é maior a incidência de problemas de saúde agudos e
crônicos.
Os trabalhadores das fazendas que aplicam os agrotóxicos, seus
familiares que vivem nas áreas pulverizadas, a população das cidades
vizinhas e os consumidores de alimentos são os principais prejudicados
pela utilização excessiva de venenos. Determinados agrotóxicos causam
distúrbios neurológicos, respiratórios, cardíacos, pulmonares e no
sistema endócrino, ou seja, na produção de hormônios, principalmente nas
pessoas que trabalham diretamente na aplicação dessas substâncias.
Além disso, causam um desequilíbrio no ecossistema, com a
contaminação dos poços artesianos de água potável, dos córregos, rios e
lagoas, da água de chuva e do ar, além da própria produção que será
comercializada.
O Brasil também é o principal destino de agrotóxicos banidos no
exterior. Pelo menos dez produtos proibidos na União Europeia (UE) e
Estados Unidos são liberados nas lavouras brasileiras, de acordo com a
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Os agrotóxicos ocupam
o quarto lugar no ranking de intoxicações. Ficam atrás apenas dos
medicamentos, acidentes com animais peçonhentos e produtos de limpeza.
Houve registro de 6.260 casos provocados por agrotóxicos em 2007.
Laboratórios demonstram o risco de algumas substâncias provocarem
problemas agudos e crônicos (veja abaixo).
Alimentos com resíduos tóxicos
Uma análise da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária ), realizada desde 2001, chamada Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para), acompanha os níveis de resíduos de agrotóxicos nos alimentos consumidos pela população acima do permitido por lei. Os dados impressionam: no pimentão, foram encontrados até 64,36% de resíduos de substância tóxicas acima do permitido; 36,05%, no morango; 32,67%, na uva; 30,39%, na cenoura; 19,8%, no alface; e 17%31%, no mamão.
Uma análise da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária ), realizada desde 2001, chamada Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para), acompanha os níveis de resíduos de agrotóxicos nos alimentos consumidos pela população acima do permitido por lei. Os dados impressionam: no pimentão, foram encontrados até 64,36% de resíduos de substância tóxicas acima do permitido; 36,05%, no morango; 32,67%, na uva; 30,39%, na cenoura; 19,8%, no alface; e 17%31%, no mamão.
Para o professor Wanderlei Antonio Pignati, “a tendência é aumentar a
utilização de agrotóxicos. Por isso, é preciso uma política mais
contundente do governo, dos movimentos de agroecologia e da sociedade,
que cada vez mais consome agrotóxicos”. Nesse quadro, o MST pretende
fazer uma campanha nacional para denunciar os efeitos nocivos dos
agrotóxicos, ao lado de cientistas, pesquisadores, organizações
ambientalistas, movimentos populares, centrais sindicais e entidades
ligadas à educação.
Nesse período, é importante também questionar os candidados em
relação às propostas para o controle dos agrotóxicos. Até agora, apenas
José Serra (PSDB) se pronunciou sobre o assunto: propôs a criação do
“defensivo agrícola genérico”. Com o apoio à utilização dessas
substâncias químicas, que contaminam os alimentos e o ambiente, Serra
quer criar doenças crônicas e agudas genéricas…
O modo de produção do agronegócio, além de aumentar a concentração de
terra e expulsar famílias do campo, sustenta a sua produção na
utilização de agrotóxicos em escala industrial. Precisamos de um novo
modelo de produção agrícola, baseado em pequenas propriedades,
organizadas em agroindústrias gerenciadas por cooperativas de
trabalhadores rurais, para garantir a produção de alimentos saudáveis e
de qualidade para a população brasileira.
Doenças causadas por agrotóxicos
Saiba algumas das doenças agudas e crônicas causadas pelos venenos nos trabalhadores, suas famílias, populações que moram perto das fazendas e consumidores em geral:
Saiba algumas das doenças agudas e crônicas causadas pelos venenos nos trabalhadores, suas famílias, populações que moram perto das fazendas e consumidores em geral:
Má formação fetal
Dor de cabeça
Diarréia
Vômitos
Desmaios
Náuseas
Problemas de rim
Doenças de pele
Irritação ocular e auditiva
Depressão
Lesão neurológica
Neurite da coluna neurológica cervical
Câncer
Problemas hormonais, neurológicos e reprodutivos
Dor de cabeça
Diarréia
Vômitos
Desmaios
Náuseas
Problemas de rim
Doenças de pele
Irritação ocular e auditiva
Depressão
Lesão neurológica
Neurite da coluna neurológica cervical
Câncer
Problemas hormonais, neurológicos e reprodutivos
Igor Felippe Santos é jornalista, editor da Página do MST, integrante da Rede de Comunicadores pela Reforma Agrária e do Centro de Estudos Barão de Itararé.
Revista Caras visitou os bastidores do Encontro de Blogueiros
por Luiz Carlos Azenha no viomundo
Houve um debate sobre mudar o nome do Encontro de Blogueiros
Progressistas. “Livres”, “independentes”, “de esquerda” e outras
propostas surgiram. Eu, por mim, diria que foi o encontro do Miro
(Altamiro Borges, do blog do Miro), da Danielle (Barão de Itararé) e das Conceições, a Lemes (Blog da Saúde)
e Oliveira (Maria Frô). Refiro-me àqueles que, de fato, suaram sangue
para fazer do encontro o sucesso que foi, considerando especialmente que
tudo foi organizado em menos de três meses. Ah, e teve a turma do
Emerson Luis (Nas Retinas), de Brasília, sem a qual não teria havido transmissão.
Estamos todos mortos de cansaço, de maneira que fica mais fácil,
primeiro, publicar fotos e vídeos do encontro. A seguir, a cobertura que
a revista Caras faria dos bastidores do encontro (o Cloaca faria melhor):
O blogueiro do Cloaca News
ganhou o prêmio Barão de Itararé por causa das sátiras mortais que
publica em seu espaço, mas nós da Caras teríamos escolhido a Aline, de
Minas Gerais, pelo acessório que nos faz lembrar José Serra.
Francisquinho ao pai, Rodrigo Vianna, do Escrevinhador: “Papai, esses blogueiros estão cheirando mal”.
Altamiro Borges, do blog do Miro, se prepara para levantar vôo (ao lado da Conceição Lemes).
O carioca Miguel do Rosário, do Óleo do Diabo, estava um luxo no inverno paulistano.
O ator José de Abreu disfarçou bem (com a Conceição Oliveira, do Maria Frô). Queria mesmo, como nós da Caras, ter ido ao encontro do Millenium.
O prefeito Gilberto Kassab proporcionou o ponto alto da reunião,
dando um banho nos blogueiros sujos que comemoravam o evento no bar da
esquina.
Dominação cultural
Paulo Metri no Correio da Cidadania | |
No processo de dominação cultural de uma sociedade, muitos de seus
membros tomam ações que não a favorecem, sem consciência do dano que
elas causam. Tomam-nas por cópia de padrão corriqueiro vindo do passado
ou influência proposital de terceiros, que são conscientes do dano. A
busca por influenciar o pensamento da sociedade é quase como uma guerra
de propaganda e muitos estratagemas são utilizados. Desta dominação, o
usufrutuário pode ficar com a melhor parte do comércio internacional ou
ter acesso a recursos minerais estratégicos e escassos ou receber
polpudos royalties por trabalhos intelectuais etc. Portanto,
está-se falando de algo de valor que influencia enormemente o bem-estar
da população de um país. A partir deste ponto, vão ser descritas várias
situações em que esta dominação está presente.
Observem o pensamento bastante elaborado que os países do mundo não
devem competir em todos os produtos comercializados mundialmente,
passando-se a evitar taxações protecionistas e subsídios, de forma que
cada um ganhe somente os mercados daqueles produtos para os quais tem
"vocação natural", ou seja, aqueles produtos para os quais possui
vantagens comparativas. E vão além dizendo que, desta forma, todos os
países saem ganhando, pois todos os produtos estarão sendo ofertados
para todos por quem os pode produzir pelos menores preços.
Uma tese do pensamento acadêmico, dentro da Teoria dos Jogos, foi
providenciada para embasar o raciocínio anterior e, ainda mais, uma
premiação do Nobel, hoje já bastante desgastada, foi entregue ao seu
autor por respaldar brilhantemente o pensamento, sem se ater ao fato que
ele é correto dentro de limites. Este posicionamento reproduz, para
todo o sempre, o instante de início de aplicação da tese. Fica vedado a
qualquer sociedade, que busca crescer, a possibilidade de migrar para
produtos com maior conteúdo tecnológico, para poder ter maior usufruto
do comércio mundial, ou seja, países ficam proibidos de adquirir
"vocações". Certamente, a teoria citada tinha beneficiários poderosos e
vingou exatamente por ir ao encontro de seus interesses. Notar que esta
tese só é válida para os subdesenvolvidos, pois, a produção de algodão
dos Estados Unidos recebe subsídios e este país ficou indignado pelo
Brasil, que tem produção de algodão mais barata, portanto, com vocação
para produzi-lo, ter levado o caso para a Organização Mundial do
Comércio.
As teses neoliberais e da globalização de interesse dos países centrais,
aquela globalização financeira e dos mercados, mas que não inclui a
globalização do mercado de mão-de-obra, eram dogmas irrefutáveis,
difíceis de serem contestados nos anos 80 e 90. A grande mídia, empresas
de marketing, políticos vendidos para o capital e prepostos remunerados
do mesmo formavam a tropa de choque do neoliberalismo, acarretando
dominação garantida dos países subdesenvolvidos, de população pouco
politizada e, na maioria das vezes, ricos em recursos naturais.
O neoliberalismo e a globalização de interesse dos desenvolvidos podem
ser vistos como instrumentos de dominação, e eles trazem como
conseqüência maior presença do capital estrangeiro na economia do país,
grande número de empresas nacionais sendo vendidas ou falindo, menos
proteção do país em virtude da desregulamentação providenciada, a
existência de legislação protetora dos interesses das empresas
estrangeiras, agências reguladoras criadas na administração do país
dominado para garantir os negócios para as empresas estrangeiras,
liberdade total de entrada e saída de dinheiro do país, a não submissão
das empresas estrangeiras aos Tribunais de Justiça do país, indo
qualquer discussão sobre a interpretação dos contratos para as
arbitragens internacionais, mesmo sendo uma disputa com o Estado etc.
Ouvia-se muito, nas décadas de 80 e 90, e ainda se ouve, hoje, em
diversos lugares, frases como: "É anacrônico falar que certa política é
entreguista. O que tem de mais existirem empresas estrangeiras atuando
em um setor?", "Nacionalismo é coisa de autoritário", "As redes sociais
no mundo de hoje integram as sociedades e passou a ser antiquado ser
nacionalista" etc. Estas frases causam grande repulsa por configurarem a
intenção de enganar o ouvinte para permitir a dominação. Sobre tantos
chavões, pode-se dizer, resumidamente, que o fluxo de caixa de longo
prazo de uma empresa estrangeira atuando no país terá sempre mais
recursos saindo do país do que entrando, pela simples razão que, se
assim não fosse, ela não teria entrado no país. Em outro comentário,
cuidar dos nacionais, os que aqui estão, é o lógico, natural e
exatamente o que é feito nos países desenvolvidos, não havendo nada de
autoritário no fato. O argumento usado exaustivamente que determinado
conceito é anacrônico, quando o certo seria exatamente o oposto, que é o
moderno, não é um raciocínio lógico. Procura-se unicamente conquistar
os mais jovens, que buscam sempre a reforma, até como uma forma de
auto-afirmação. Por isso, o neoliberalismo foi aceito por muitos como o
moderno e o bom, quando provou ser o atraso e o ruim.
Contrapondo-se a esta dominação comprometedora, deve-se destruir a
regulamentação benéfica ao capital internacional, comum para todos os
países subdesenvolvidos, implantada por imposição do mesmo e ampliada
durante a onda neoliberal, que varreu o mundo nas citadas décadas, alem
de criar barreiras protecionistas para todas as indústrias nascentes
etc. O conjunto de regulamentações neoliberais e da globalização
prejudicial trouxe danos aos Estados subservientes ao capital externo,
principalmente danos ao desenvolvimento, com reflexo na qualidade de
vida das suas populações. Decisões soberanas e benéficas para a
sociedade do país têm sido implantadas em países como China e Índia, e
não é por outra razão que as suas taxas de crescimento têm sido altas.
No Brasil, hoje, apesar do furor neoliberal ter diminuído de
intensidade, ainda há muito entulho do pensamento neoliberal em diversas
leis e instâncias do nosso poder.
Assim como a história conhecida é aquela contada pelos vencedores das
batalhas, pode-se dizer que modelos de economia mais difundidos são
aqueles formulados pelos vitoriosos da guerra econômica. Por exemplo, o
caso atual dos países menos desenvolvidos da Europa é bastante
contundente, pois banqueiros vão lucrar muito com a crise, enquanto, à
população destes países, restará aumento de impostos, diminuição dos
salários e dos gastos sociais, desemprego, falência de empresas
nacionais, entrada do capital externo comprando ativos do país avaliados
por baixo, visando remessas futuras de lucros para as matrizes etc.
Isto, que é pouco divulgado desta forma, é chamado de "ajuste". A nossa
economia é muito importante para ser cuidada por economistas sem visão
crítica da realidade, retidão de princípios e conteúdo de nacionalidade.
Assim como qualquer pessoa só entrega sua saúde a um médico que lhe
inspira confiança, a saúde coletiva não pode ser entregue para qualquer
economista compromissado com interesses diferentes dos da sociedade.
Algumas escolas de economia do mundo subdesenvolvido reproduzem o modelo
do capital, sem terem a preocupação de atender à sociedade, pois o
projeto do capital internacional é vencedor em quase o mundo todo, tendo
mídia, propaganda, marketing político e até exércitos a seu favor. Além
disso, há pouco sucesso de políticas econômicas revolucionárias que
vençam déficits sociais em países subdesenvolvidos, a menos de exceções
com algum sucesso, como é o caso do Brasil atual. Arrazoados econômicos
libertadores voltados aos países subdesenvolvidos existem, mas os
interesses dos desenvolvidos aliados aos de oligarquias regionais não os
deixam sair das folhas dos livros. E as escolas de economia dos
subdesenvolvidos, que poderiam ser o lócus da denúncia, mantêm-se, salvo
exceções, com discordâncias insipientes, quando não pregam o
neoliberalismo. Na verdade, devia-se deixar claro que, sem uma
estratégia nacionalista, o desenvolvimento dos retardatários do sistema
mundial não ocorrerá. Obviamente, o ensino de economia que carregasse
muita bagagem de história seria proveitoso, mas tem pouco espaço, em um
mundo em que grupos econômicos e políticos fortes boicotam a divulgação
de experiências, sorrateiramente. A própria economia é uma arma de
dominação.
Não se estão contestando deduções lógicas de teses da teoria econômica
existente. São contestadas as aplicações, muitas vezes, incorretas das
teses. Por exemplo, uma premissa é mencionada no início do
estabelecimento de uma tese econômica e, depois, ela é totalmente
esquecida à medida que a tese é repetida para o cidadão comum. Assim, a
tese passa a ser verdadeira para qualquer situação, ou seja, abandona-se
a sua premissa fundadora. Especificando com um exemplo, diz-se
freqüentemente que, em um mercado de competição perfeita, a competição é
benéfica para a sociedade por acarretar produtos e serviços pelo mínimo
preço. Depois, passa-se, rapidamente e de forma simplificada, a dizer
para a sociedade que a competição é boa para ela, sem se especificar em
que situação. Esquece-se de dizer que o mais comum, em qualquer país,
são os mercados serem imperfeitos.
Sob a ótica pobre de regulação de mercados, é considerado um fator
positivo trazer produtos e serviços estrangeiros para competir com
produtos e serviços genuinamente nacionais, dentro do princípio de que a
competição é benéfica para a sociedade, sem se olhar para nenhum dos
atendimentos de objetivos adicionais satisfeitos pelos nacionais e não
atingidos pelos estrangeiros.
No entanto, há cerca de dez anos, o órgão responsável por garantir a
concorrência nos Estados Unidos aprovou a fusão de determinada área das
empresas americanas General Electric e Honeywell, apesar da grande
concentração de mercado que a fusão acarretava. Não existia outra
empresa americana fabricando o mesmo produto, tendo pesado na decisão a
criação, com a fusão, de uma empresa americana de maior porte com mais
capacidade de competir mundialmente. O órgão regulador de mercado da
Comissão Européia não aprovou esta fusão, significando que a nova
empresa não poderia vender seus produtos no mercado europeu, pela razão
justa de que houve concentração de mercado. A Europa possuía uma empresa
que fabricava o mesmo produto. Para o governo americano, ter sua
empresa forte no mercado mundial era o maior objetivo. Para não haver
abuso de poder de mercado, internamente, iriam usar outros mecanismos,
como controle de preços.
O triste é que órgãos do setor público no Brasil fazem seus concursos
para entrada de novos funcionários de forma que a visão errada da
economia, de interesse social duvidoso, deve ser respondida pelo
candidato como a resposta certa. Isto é conseqüência de dominação
cultural, graças ao interesse de grupos econômicos estrangeiros e à
interferência da oligarquia nacional que também é controladora da
sociedade. Então, foram e estão sendo criados nichos neoliberais no
setor público.
A linha de raciocínios que fundamentou a reforma do Estado, nos anos 90,
era que ele tinha esgotado sua capacidade de investimento em
infra-estrutura, era mau administrador de empresas, era refém dos
servidores públicos, graças ao corporativismo, deveria exercer somente
as "funções típicas de Estado" etc. Para solucionar estes "problemas",
como eram chamados à época, foi privatizado um número considerável de
empresas estatais, muitas a preços irrisórios, e foram criadas as
agências reguladoras setoriais, que deveriam controlar as relações
econômicas nestes setores, agora tomados por empresas privadas,
protegendo sempre o consumidor.
Mas, hoje, existe um problema grave que precisa ser enfrentado e, para
resolvê-lo, precisa existir coragem para tomada de decisões. Trata-se
das agências reguladoras estarem, como era esperado, não satisfazendo
aos interesses superiores da sociedade brasileira. Na verdade, elas
foram criadas para garantirem os interesses do capital internacional no
Brasil, após a compra das empresas estatais. Assim, as agências, este
instrumento de dominação do capital, estão visivelmente defendendo os
interesses dos seus patrões, em detrimento de defender a sociedade.
O esquecimento dos dirigentes das agências com relação a quem eles devem
servir chega a ser revoltante. Como é possível a Agência Nacional de
Energia Elétrica (ANEEL) permitir o cálculo da tarifa elétrica errada
durante tantos anos, prejudicando o consumidor? Como explicar o Brasil
ter uma das mais altas tarifas de telefonia, com o beneplácito da
Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL)? Em que país do mundo, com
exceção do Brasil, um funcionário da Halliburton sairia de seu emprego,
diretamente, para ser diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP),
que cuida exatamente de contratos em que a Halliburton está envolvida? A
falta de inibição desta Agência é tamanha que, querendo aumentar a
velocidade de entrega de blocos do nosso território para empresas
estrangeiras explorarem e produzirem petróleo, ela decidiu, na oitava
rodada, tolher a apresentação de ofertas pela Petrobrás para sobrar mais
blocos para as estrangeiras.
A prática corrente em alguns setores é de os diretores das respectivas
agências serem nomeados a partir de indicações dos agentes econômicos do
setor, ou seja, de forma acadêmica, as agências foram capturadas pelos
agentes regulados. Só em uma sociedade completamente desprotegida, como
a brasileira, com baixo grau de politização, com meios de comunicação
não formadores de cidadãos conscientes, podem acontecer verdadeiras
agressões aos cidadãos comuns como estas. É interessante que as agências
reguladoras, ao não cumprirem seu mínimo papel para com a sociedade,
estão conscientizando esta mesma sociedade de como foram ruins as
privatizações ocorridas.
A lei 9.478 de 1997, que quebrou o monopólio estatal do petróleo,
permitiu a retirada do petróleo nacional por empresas estrangeiras sem
grande usufruto da sociedade brasileira, estabeleceu a possibilidade de
entrega do território nacional para estrangeiros, criou a agência
reguladora ANP, também dita as diretrizes de uma política energética
para o país. É incrível que, nesta política, há a preocupação de se
satisfazerem os consumidores e nada é dito a favor dos cidadãos, que
engloba também os ainda numerosos miseráveis, consumidores de quase
nada.
Na reforma da nossa Constituição, tiraram o artigo que privilegiava a
empresa nacional de capital nacional nas compras do Estado. Nas
privatizações que ocorreram na França, qualquer grupo francês que
concorresse a uma privatização já saía em posição vantajosa quando
comparado com as empresas estrangeiras que disputavam a mesma
privatização.
Propositadamente, ouve-se muito que "monopólio é o pior dos mundos", sem se especificar sobre que tipo de monopólio se está falando. O monopólio estatal socialmente controlado é muito benéfico para a sociedade, enquanto o monopólio privado é, verdadeiramente, o pior dos mundos.
É triste ver alguém ser manipulado. Em um noticiário de um canal de
televisão, falava-se de desemprego. Não se falou, em momento algum, que o
modelo econômico atual não privilegia o pleno emprego. Pelo contrário, o
apresentador disse que "as pessoas devem buscar ter habilidades
especiais e conhecimentos adicionais para poderem garantir seus
empregos". Logo depois, entrevistaram um cidadão que, combinado ou não
com a TV, disse, de forma muito convicta, que "ia fazer todos os cursos
que pudesse para poder conseguir emprego". O pobre manipulado, na sua
total ignorância, acha que ele próprio é o culpado por estar
desempregado. Chega a ser desumano levar uma pessoa, que sofre, a pensar
que é a causadora do próprio sofrimento. Qualquer hora, ele estará
pedindo desculpas por estar desempregado, mas dirá que se esforçará ao
máximo, fazendo cursos e tudo mais, de forma a melhorar seu currículo,
para poder conseguir um emprego.
As pessoas precisam entender que isto não tem que ser assim. Todo
cidadão tem o direito a um emprego. O Estado tem o dever de
providenciá-lo. Se ele estudar, o que será bom para ele, facilitará a
obtenção de um emprego. Mas, mesmo sem estudo, a economia deve estar
gerando empregos para todos. No laissez faire da economia do
nosso país do período liberal, "espertos" retinham a mais valia dos
operários na época de grandes lucros. Na época da recessão, houve cortes
frenéticos de pessoal para reduzir o custo de mão-de-obra. O drama de
cada operário demitido não é considerado. O salário "economizado"
correspondente a um mês de um empregado demitido pode ser gasto na
compra de uma bolsa Louis Vuitton da executiva da empresa. O salário e a
bolsa trazem felicidades nas duas pessoas bem diferentes.
Pior que a dominação imposta pelo mais forte é a irracional entrega
voluntária feita pelos nossos pares, reproduzindo razões que não são
relevantes para a sociedade. E não se está falando da entrega consciente
dos bandidos.
Paulo Metri é conselheiro da Federação Brasileira de Associações de Engenheiros.
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Ordem judicial capaz de matar não ressuscita

Jacques Tavora Alfonsin (*)
No dia 21 deste mês de agosto completou-se um ano do assassinato
praticado contra o agricultor Elton Brum da Silva, como conseqüência de
uma ordem judicial determinada em ação movida contra agricultores
sem-terra, como ele, no município de São Gabriel. A agilidade que o
Poder Judiciário mostrou para defender o direito de propriedade, no
processo que assassinou Elton, é geometricamente desproporcional aos
males que esse direito causa, mesmo quando descumpre a sua função
social.
Para se ter uma idéia desse fato, é suficiente uma busca de internet no site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, comarca de São Gabriel, para se constatar que nem data de audiência para coleta de possíveis provas foi designada, no processo 20900023900, que apura a responsabilidade criminal do policial militar que matou o Elton.
Para se ter uma idéia desse fato, é suficiente uma busca de internet no site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, comarca de São Gabriel, para se constatar que nem data de audiência para coleta de possíveis provas foi designada, no processo 20900023900, que apura a responsabilidade criminal do policial militar que matou o Elton.
Enquanto a ordem letal teve execução imediata, o processo crime segue
a passo de gente que caminha a pé e cansada de promessas legais
traídas, bem como ele caminhava… Elton engrossa a lista macabra de
gaúchos mortos em defesa de sua dignidade e cidadania, direito de acesso
à terra, reforma agrária, ora pelos efeitos das ordens judiciais, ora
pela repressão violenta dos seus protestos coletivos. Ah, não vai faltar
quem diga: “Tudo certo, mas onde se lembra aí o soldado da BM, Valdeci
de Abreu Lopes, que morreu na esquina democrática de Porto Alegre, num
outro agosto, esse de 1990, durante um protesto dos sem-terra”? – Com a
dor que se lamenta a morte do Elton e de tantos outros que não vivem
mais, tem de se chorar a desse brigadiano, mas sem se esquecer, sob pena
de cumplicidade com a versão tendenciosa que a mídia produziu na época,
duas diferenças notáveis, pelo menos.
A primeira, a de que o assassino do Elton, além de somente ter sido
identificado pela sua corporação mais de mês depois do assassinato, está
gozando de plena liberdade, não havendo chance de se saber nem quando
será julgado, enquanto os sem-terra denunciados criminalmente pela morte
de Valdeci foram presos em seguida e aguardaram, nessa condição de
confinamento, mais de ano antes do júri que os condenou. a segunda, de
que o tiro que matou o Elton foi dado pelas costas, sem possibilidade
alguma de defesa da vítima, enquanto o instrumento que matou o
brigadiano deu-se em reação imediata ao tiro que ferira no abdome uma
agricultora sem-terra que participava do protesto.
A “explicação” que se dá para tudo isso, já que justificativa não
existe, é da mais variada espécie e artifício, como costuma acontecer
com aquelas doutrinas jurídicas rubricistas que sustentam formulismos
enredados na tramitação dos processos judiciais. Há prazos diversos para
acusações, há prazos para defesas, para recursos, para sentenças. Só
não há prazo para se perseguir, prender e, se as circunstâncias exigirem
(?), matar gente pobre, lutando por seus direitos. Elton não é a
primeira e, pelo rumo que a história vem demonstrando, não será a última
vítima dessas injustiças perpetradas “em nome da lei e do direito”. São
tantos os conflitos gerados pela concentração da propriedade privada
sobre terra, em nosso Estado e no país, o inexplicável atraso na
execução da reforma agrária, provado pelo número das ações judiciais de
desapropriação de terra paradas nos tribunais, que isso provocou até
mudança em um dos dispositivos do Código de Processo civil.
Foi no intuito de não deixar juízas e juízes quase sozinhas/os, para
decidir sobre matéria que sempre envolve multidão, interesse social,
conflito grave entre direitos, risco de acontecer coisas como a que
eliminou a vida do Elton, que o art. 82 daquele Código, em seu inc. III,
passou a exigir que o Ministério Público sempre fosse ouvido nos casos
que “envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais
causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou
qualidade da parte.” Era de se esperar que essa mudança na lei
processual determinaria mais cuidado, uma cautela maior no deferimento
de liminares, especialmente daquelas que são executadas sem chance de
defesa dos réus, como ocorre quase sempre quando esses são sem-terra ou
sem-teto. Aqui no Estado, não é o que tem acontecido, na maior parte das
vezes. Dependendo do agente ministerial que atua nesses casos, o
“público” da sua denominação, bem ao contrário, tem reforçado o que há
de pior no “privado” das demandas que chegam em juízo.
Com um agravante, como ocorreu durante o ano passado. Agora, os
latifundiários gaúchos nem precisam se mexer. É o próprio Ministério
Público que sai em sua defesa, como aconteceu em Canoas, Carazinho,
Pedro Osorio e São Gabriel. Em algumas execuções das ações judiciais que
dois dos seus representantes propuseram nessas comarcas, foi tal a
violência empregada contra acampadas/os, que só não morreu nenhum/a
sem-terra, por sorte. Como essas ordens judiciais não têm o poder de
ressuscitar, a ínfima chance que se abre de, pelo menos, alguém poder
mitigar o mal feito é a de, mais tarde, um/a outro/a juiz/a, com um
pouco mais de sensibilidade humana e social, “indenizar” (?) as/os
herdeiras/os da vítima, que dela dependiam para viver.
É o que está acontecendo agora com a família do Elton. Em julho
passado, atendendo pedido da advogada Cláudia M. Avila, que atua em
defesa dessa família, numa ação judicial proposta contra o Estado do Rio
Grande do Sul, pleiteando reparação de danos morais e materiais que a
morte causou, o juiz Gilberto Schafer, do 2º Juizado da 3ª Vara da
Fazenda Pública de Porto Alegre, já deferiu uma liminar em favor da
mesma família, em tudo diferente daquela que causou a morte do Elton. Em
seu despacho já se antecipa o direito dos/as familiares receberem do
Estado 70% do salário mínimo nacional, sob a seguinte justificativa: “O
Estado do Rio Grande do Sul tem responsabilidade de ordem objetiva pelos
danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros [...],
devendo assim responder pelos atos omissivos e comissivos, dolosos ou
culposos, que resultem em prejuízo a outrem, sendo plenamente aplicada a
teoria do risco administrativo”.
A viúva, a filha pequena e o pai de Elton, evidentemente, não
estariam sofrendo agora dessa necessidade, se a decisão judicial
anterior não tivesse provocado a sua morte. Pouco lhes consola o fato de
que o seu sangue foi derramado em defesa da vida de milhões de outros
brasileiros que, como ele, são vítimas de uma injustiça social que, ao
lado de produzir riqueza para alguns, gera pobreza e miséria para a
maioria de quantas/os precisam do acesso a terra legalmente previsto em
seu favor.
Por isso mesmo, todos os movimentos sociais que atuam em favor de
trabalhadoras/es pobres, como o MST, por exemplo, não deixam morrer a
esperança. A de que esse tipo de tratamento que elas/es sofrem há de ser
vencido, por ser desumano, cruel, ilegal, profundamente injusto. Um
dia, justamente por força de sua luta político-jurídica, esse tratamento
não continuará se refletindo em cada processo judicial apenas para
registrar mais um número e mais um nome.
Já enfrentaram no passado, e continuarão enfrentando a violência que
assassinou o seu companheiro Elton, como a própria causa da infidelidade
que grande parte da sociedade civil e do Poder Publico dedicam à
interpretação e à aplicação da lei como se ela não existisse,
exatamente, para proteger e defender os direitos humanos fundamentais de
quantas/os, embora desses sejam os verdadeiros titulares, por ora não
passem de vítimas da sua violação. Pelo menos esse poder de ressuscitar,
que as sentenças não têm, o povo pobre sem-terra e sem-teto tem provado
ter.
(*) Procurador do Estado do Rio Grande do Sul aposentado
domingo, 22 de agosto de 2010
Rede Globo na mira da Justiça....
Na terça-feira (dia 24), acontecerá o julgamento pelo
Superior Tribunal de Justiça (STJ) - instância máxima da Justiça no Brasil -, da
fraude cometida pela família Marinho (RJ) contra as Organizações Victor
Costa (SP).
Superior
Tribunal de Justiça julga na semana que vem suposta fraude na compra da
Globo
Documentos
de herdeiros de Roberto Marinho são apontados como provas 'montadas’;
uma das alegações é a de falsificação de assinaturas de pessoas mortas
uma das alegações é a de falsificação de assinaturas de pessoas mortas
A
terça–feira da semana que vem, dia 24, será decisiva para os rumos da Rede
Globo. Nesse dia
será julgada pelo Superior Tribunal de Justiça a compra da emissora
em novembro de 1964 por Roberto Marinho.
A
ação foi proposta pelos antigos herdeiros dos acionistas da empresa que hoje
atende por Rede Globo, a Rádio Televisão Paulista S/A, que eram controladores de
52% do capital social inicial da empresa (espólios dos já falecidos Manoel
Vicente da Costa, Hernani Junqueira Ortiz Monteiro, Oswaldo J. O. Monteiro,
Manoel Bento da Costa e outros).
No
processo, os advogados de Roberto Marinho alegaram que ele comprou, em novembro
de 1964, ações que pertenciam a Victor Costa Junior, sendo que este jamais fora
acionista da emissora, mas sim herdeiro do então diretor-presidente, Victor
Costa.
Os
herdeiros de Roberto Marinho alegam terem perdido as procurações originais e os
recibos da compra. Analisados pelo Instituto Del Picchia de Documentoscopia, os
documentos apresentados pelos herdeiros de Roberto Marinho foram apontados como
provas “anacrônicas, falsificadas, montadas”.
Houve
duas assembleias Gerais para tentativa de legalização da transferência do
controle majoritário da emissora realizadas por Roberto Marinho. A primeira foi
em 10 de fevereiro de 1965 e a segunda, em 30 de junho de 1976. Ambas são
rechaçadas pelos herdeiros dos antigos acionistas, pois apontam que o negócio
com Victor Costa Junior não teria validade. Na Assembleia de 1965 apenas um
acionista esteve presente. Ele disse ser representante de dois acionistas
majoritários anteriores, mortos em junho de 1962 e dezembro de 1964.
ORGANIZAÇÕES VICTOR COSTA
Wikipédia*
Na década de
1950, quando a televisão
chegou, eram três os principais grupos de radiodifusão:
Diários
Associados (da TV
Tupi), Grupo Paulo
Machado de Carvalho (da TV
Record) e também a OVC (Organização Victor
Costa).
A trajetória deste último grupo começa antes dele. Victor
Costa era diretor da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, principal
emissora de rádio do país e de propriedade do Governo Federal. Ele, que começou
como ponto, depois foi radioator, cresceu rapidamente no rádio (sua maior
paixão). Em 1953,
ele vem a São
Paulo na tentativa de criar um negócio. É quando ele adquire a Rádio
Excelsior de Paulo
Machado de Carvalho, dono da Rádio
Record e fundador nesse ano da Rede
Record e monta a Rádio
Nacional de São
Paulo (sem vínculos com a do Rio).
Adquiriu também a Rádio
Cultura. E aos poucos começou a comprar diversas emissoras de rádio
pelo país. Onde os outros viam a dificuldade de manter uma estação, Victor Costa
enxergava oportunidades e negócios pertinentes na área. Era o grande
profissional. Foi ainda em 1953 que fundou a OVC (Organização Victor Costa), que
estabeleceu uma ordem para consolidação e construção do grupo.
Com seus diversos contatos, Victor Costa trouxe do Rio de Janeiro os
principais nomes da Rádio Nacional. As "cantoras do rádio", orquestras, os
humoristas da PRK-30, entre outros. Começou a fazer transmissões em "pool" entre
as rádios.
Em 1954
começou a negociar com o deputado Ortiz Monteiro a compra da TV
Paulista, canal 5. Um ano depois comprou a emissora. O canal, que
estava com pouquíssimos recursos era prejudicado pela ascensão e a estrutura da
TV Tupi e TV Record. Com a chegada da OVC, a TV Paulista se transformou. E criou
programas de sucesso como "Teledrama Três Leões" e "Hit Parade". E com o tempo,
a OVC passou a criar novas emissoras de TV, como a TV Santos, a TV Bauru e uma
emissora em Recife. A OVC chegou a obter uma concessão para ter outro canal em
São Paulo, o 9, que no entanto foi vendida, antes mesmo da emissora ser
inaugurada, para um grupo de empresários que mantiveram o nome escolhido pelos
donos originais da concessão (TV
Excelsior).
Em 22 de
dezembro de 1959,
faleceu Victor Costa. Sua esposa e um enteado começaram a gerir os negócios da
OVC. A emissora começou a ser sucateada, com o intuito de venda. E foi assim que
em 1966
Roberto
Marinho adquiriu toda a OVC, inclusive as rádios, criando a Rede
Globo juntamente com sua emissora, a TV
Globo (canal 4 do Rio de Janeiro). A TV Paulista se transformaria em
TV Globo
São Paulo, a Rádio Nacional em Rádio Globo de São Paulo, a Rádio
Excelsior manteria o nome, transformando-se em CBN
em 1991.
A OVC teve uma passagem meteórica, que deixou sua marca na história da
radiodifusão nacional.
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