No blog DIARIO LIBERDADE
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Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
sábado, 18 de junho de 2011
A guinada à direita de Chávez: realismo de Estado contra solidariedade internacional
Movimentos sociais se unem na Marcha da Liberdade do Rio de Janeiro
Thais Leitão no JB
Usando faixas, cartazes, adereços,
malabares e megafones, os manifestantes chamavam a atenção da população e
convidavam moradores e frequentadores do bairro a se juntar ao grupo,
com gritos de “Vem pra liberdade”. No percurso, também faziam coro para
se manifestar sobre temas variados.
De acordo com o organizador do
evento, Renato Cinco, a manifestação, que seria inicialmente para
defender a descriminalização do uso da maconha, ganhou o apoio de outros
movimentos e mudou de nome. Na última quarta-feira (15), o Supremo
Tribunal Federal (STF) decidiu liberar marchas pela descriminalização
das drogas no país.
“A princípio seria a Marcha da Maconha, mas
muita gente resolveu se juntar para defender a liberdade como uma coisa
mais ampla. Todos têm o direito de se expressar livremente e isso é o
mais importante” disse.
Com a palavra liberdade escrita com tinta
branca no braço e uma coroa de flores sobre a cabeça, a malabarista Íris
Medeiros, de 21 anos, resolveu participar do evento com outros três
amigos porque espera que os artistas de rua ganhem mais reconhecimento
da sociedade. “Ainda somos discriminados e precisamos ter liberdade de
estar na rua, de nos expressarmos e de levar nossa arte a todo lugar”,
disse.
A advogada Meli Trentin marchou com a filha Rita, de 1 ano,
no colo. Segundo ela, em todos os setores, é possível ver
discriminação, mas nos grupos tradicionalmente excluídos ela é mais
visível. “Estamos vivendo um momento em que se discute a ampliação do
sistema penal, em que movimentos sociais ainda são criminalizados e a
classe média é oprimida. Temos que lutar contra isso e eu trouxe a Rita
porque espero que ela ajude a construir um mundinho melhor”, afirmou.
Segurando
um cartaz que chamava a atenção para a existência de drogas liberadas
pela legislação, como cigarro e álcool, o técnico de planejamento
Leandro Schmidt defendia a descriminalização da maconha. “O capitalismo
exige que algumas drogas sejam legalizadas, mas com a maconha é
diferente. Não precisamos inventar a roda, ela [a maconha] já é liberada
em outros países que têm inclusive regras de uso”, defendeu.
A representante do movimento gay Márcia
Marçal carregava uma bandeira com as cores do arco-íris para criticar a
homofobia. Segundo ela, as ações para coibir a violência contra gays, lésbicas, transexuais e travestis precisam ser mais intensas. “Milhares de gays são mortos a cada ano e é preciso que isso acabe”, defendeu.
sexta-feira, 17 de junho de 2011
Partidos, juventude e os movimentos sociais na internet
Por Marcelo Branco
Os jovens nativos digitais da sociedade em rede têm orgulho de
ser brasileir@s, acreditam que o Brasil é o país do presente e concordam
que têm um papel de transformar a sociedade. Se conectam mais com
discursos coletivos do que individualistas e querem menos consumismo.
Apenas 5% tem como objetivo ficar rico e sabem que podem trabalhar por
uma causa coletiva e buscar seus sonhos pessoais ao mesmo tempo. Estes
mesmos jovens, cada vez mais, vêem a Internet como ferramenta de
mobilização e engajamento político e menos os partidos. [1]
“Quantos jovens não votaram no Chile, na Espanha? Não achem que
estes jovens não acreditam na democracia. Eles não crêem na democracia
que oferecem a eles (…).” Eduardo Galeano na Praça Catalunya [2]
Quando eu divulguei esta pesquisa na rede, surgiram muitos
questionamentos e diálogos vindos, principalmente, de militantes
partidários: isso é positivo ou negativo? Acho isso tremendamente
positivo e tentarei sucintamente colocar a minha opinião, já tuitada de
forma pulverizada. Acontece que os jovens estão exigindo muito mais
participação e democracia do que os partidos políticos e a democracia
representativa os oferecem. Eles querem mais participação. Estão
errados?
Os partidos e os sindicatos são organizações construídas com base na
revolução tecnológica industrial. Foram, por longos anos, a única e a
melhor forma de catalizar de forma coletiva os pensamentos e ideologias
para uma ação política efetiva. Sozinho, ninguém chega a lugar algum, e
isso continua valendo. Estas organizações mediam e intermediam a relação
entre os diversos interesses individuais e coletivos, através do
“programa”, e representam estes interesses junto à sociedade.
Os movimentos sociais em rede, pós-internet, são formados por
indivíduos conectados em rede, que manifestam suas opiniões e movem suas
ações na perspectiva do engajamento coletivo, sem a intermediação de
qualquer organização. Aliás, a Internet veio para questionar o papel de
todas as organizações intermediárias. A indústria fonográfica que o
diga.
Acredito que as formas de organizações da era industrial e as
organizações de indivíduos conectados em rede, típicas da sociedade em
rede, conviverão. Uma não substitui a outra.
Mas é #fato que nos últimos anos, em todo mundo, os partidos
políticos e os sindicatos têm tido menos capacidade de mobilização
coletiva do que os movimentos sociais em rede. E isso não é somente
porque os programas dessas organizações estão defasados ou que não
contemplam os interesses dos coletivos. Atualizar os programas dos
partidos é importante, mas não será o suficiente para engajar a geração
atual na forma de organização hierárquica dos partidos. Estes jovens
estão, cada vez mais, experimentando novas formas para organizar suas
ações políticas coletivas, utilizando a plataforma da Internet como
base. E isso tem dado resultado.
Há quase 12 anos, na manifestação chamada de N30, mais conhecida como a “batalha de Seattle” [3], através da Direct Action Network (ação direta em rede) possivelmente tenhamos inaugurado a era das mobilizaçoẽs 2.0.
Desde Seattle, passando pelas mobilizações do Fórum Social Mundial
aqui em Porto Alegre, nas marchas contra as guerras do Bush-pai, nas
manifestações anti-globalização neoliberal, com destaque para Gênova e
Barcelona, até as recentes revoltas árabes e agora a #globalrevolution
partindo da Espanha para toda Europa [4], comprovam a força das redes da internet para organização de grandes ações coletivas.
Não acredito que os partidos ou sindicatos estão descartados como
forma de organização política. Acontece que agora existem NOVAS formas
de organização política. As novas formas de organização social
(indivíduos conectados em rede) e as velhas (partidos e sindicatos) vão
conviver, mas como organizações distintas.
As velhas organizações não podem ter a pretensão de englobar ou
cooptar as novas. Terão que conviver, lado a lado, mas cada uma com a
sua dinâmica própria. As dinâmicas das redes são distintas das dinâmicas
partidárias. Não há como enquadrar as dinâmicas em rede nas hierarquias
partidárias. Nem é possível que um partido funcione com as dinâmicas
horizontais e sem hierarquias como nas redes.
O sucesso das organizações da era industrial (partidos e sindicatos)
foi justamente o de organizar as pautas e as lutas de forma hierárquica e
aprovadas por maioria. Nas dinâmicas em redes, raramente há votações
para hierarquizar as ações. Funciona por adesão voluntária. A proposta
com maior adesão avança na prática e mobiliza. Assim tem sido as
experiências da última década.
No entanto, as dinâmicas dos movimentos em rede ainda tem sido
incapazes de estabelecer uma nova ordem. Pelo menos por enquanto. Os
partidos sim, estabelecem uma nova ordem, assumem o poder e governam.
Creio que no futuro teremos experiências de uma nova ordem a partir de
dinâmicas sociais em rede. Vivemos uma transição da era industrial para a
era das sociedades em redes. As velhas formas e as novas conviverão,
mas são distintas formas de organizações. Aliadas? Antagônicas?
Complementares?
O certo é que existe, neste momento, uma tendência e um potencial
global democratizante, que questiona os limites da democracia
representativa e que aponta para uma nova democracia participativa,
tendo a internet como plataforma de mobilização e viabilização desta
nova relação direta dos cidadãos com a democracia.
Acredito que a recente pesquisa, “o sonho brasileiro”, realizada
entre jovens de 18 a 24 anos e que ouviu mais de três mil pessoas de 173
cidades do país, aponta dados extremamente positivos na perspectiva de
transformação social.
Fontes:
[1]- Pesquisa “O sonho brasileiro”. Box1824 (agência especializada em mapear tendências de comportamento), e Instituto Datafolha.
Geração “sonhadora” quer “oportunidade para todos” e menos consumismo By Marina Novaes, do R7
- Jovens sonham e acreditam no Brasil By Ricardo Kotscho, do R7
- Pesquisa mostra que enquanto 59% dos jovens não têm preferência partidária, 71% consideram a internet uma ferramenta política By Naira Alves IG
[3]- Seattle: uma década de ativismo 2.0 By #comunidadedigital das turmas e ex-alunos de comunicação digital da ESPM-RJ Turma 7A – 2009.2
[4]-Da #democraciarealya à #WorldRevolution By Marcelo Branco
Para jurista, reações põem em risco conquistas LGBT no Brasil
Roger Raupp Rios é juiz da 4ª Vara Federal de Porto Alegre, mestre e
doutor em Direito pela UFRGS e professor de mestrado em Direitos Humanos
na UniRitter. Tem atuado de forma destacada na questão de direitos
sexuais e antidiscriminação. Ele é autor de uma decisão pioneira no
Brasil, de 1996, quando se posicionou a favor de um casal homossexual em
questão de direito previdenciário. Desde então, tem sido nome
importante no estudo jurídico voltado à consolidação dos direitos dos
homossexuais.
Na noite desta quarta, o jurista participou de um seminário promovido
pela Escola Superior da Magistratura (ESM) da AJURIS, em Porto Alegre.
Ao lado da médica e especialista em antropologia social Elizabeth
Zambrano, Roger Raupp Rios discutiu o panorama que se descortina a
partir da decisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceram por unanimidade no mês passado a união estável para casais do mesmo sexo.
Uma decisão que abre um horizonte novo para as relações homoafetivas,
ao mesmo tempo que desperta um contra-ataque incisivo por parte de
setores que não aceitam a mudança, liderados pela bancada evangélica no
Congresso Nacional.
Minutos antes do começo da palestra, Roger Raupp Rios conversou com o Sul21
sobre a posição do Supremo, interpretando-a como um sinal brasileiro na
direção do que já vinha sendo apontado por tribunais da Europa, EUA e
até mesmo da América Latina. Foi surpreendido pela informação de que o Ministério da Saúde decidiu eliminar as restrições para doação de sangue por homossexuais,
ao mesmo tempo em que fez um alerta sobre a série de iniciativas
políticas que já estão sendo tomadas contra a decisão do STF e contra as
conquistas da comunidade LGBT em geral. E demonstrou descontentamento
com a posição da presidenta Dilma Rousseff, que criticou abertamente a
cartilha para conscientização em escolas como trazendo em si uma
“propaganda de opção sexual”.
Sul21 – Quais são as perspectivas que surgem a partir da
decisão do STF, que reconheceu a união homoafetiva como uma célula
familiar? O que uma decisão como essa nos indica em termos de mudanças
jurídicas no Brasil?
Roger Raupp Rios – Eu diria que nem indica, mas sim
confirma. É uma decisão que confirma o que vem acontecendo há pelo menos
15 anos no Brasil, que confirma o que vem sendo decidido tanto em
tribunais federais quanto estaduais. Já há reconhecimento, nesses
tribunais, de uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo. Nesse
sentido, mais do que indicar uma novidade, a decisão do Supremo confirma
uma tendência que já vem se verificando, e que coloca o Brasil ao lado
de outros tribunais internacionais, inclusive latino-americanos, como
México, Argentina e Colômbia. Ingressamos no grupo dos países cujos
tribunais de cúpula reconhecem esses direitos. Com a decisão, o Brasil
entrou nesse rol, de forma um tanto tardia talvez, mas entrou.
Sul21 – Temos então uma tomada de posição junto à comunidade internacional, também?
RRR - Essa decisão é uma afirmação clara de que o
tipo de preconceito voltado contra homossexuais é incompatível com a
Constituição brasileira e com os direitos básicos do ser humano. Afirmar
isso com todas as letras pode indicar uma série de novas possibilidades
em várias outras áreas, tanto no direito de família como em outros
direitos civis, como no direito do trabalho, da política, no mundo
comunicação social, da saúde, do ensino e aí por diante. É verdade que
já temos avanços nesses mundos, especialmente na saúde. Mas o STF
afirmar, com todas as letras e de forma categórica, que a homofobia
viola a Constituição é um bom indicativo, em minha opinião.
Sul21 – De qualquer modo, já começam a surgir alguns reflexos
positivos da decisão do Supremo, como a sinalização do Ministério da
Saúde em acabar com as restrições a homossexuais na hora de doar sangue…
RRR – Foi anunciado isso? O Ministério da Saúde disse isso?
Sul21 – Sim, o ministro da Saúde (Alexandre Padilha) editou no começo da semana uma portaria sobre esse assunto.
RRR – É curioso. Na verdade, é muito curioso, e digo
isso sem querer ser irônico, não estou usando de ironia ou de cinismo,
de forma alguma. É curioso porque essa é uma questão que há anos vem
sendo debatida e que não tem nada a ver com afetividade. A afirmação de
que a afetividade legitima algum tipo de conhecimento não muda nada no
estado sorológico de uma pessoa. Nesse sentido, é um desdobramento bem
interessante…
Sul21 – Uma mudança de posição, digamos assim.
RRR – E o que fez com que esse padrão fosse
modificado? É isso que acho importante a gente questionar. Saiu alguma
pesquisa? Porque há muitas pesquisas no campo da saúde pública, e há
muitas reivindicações de movimentos sociais ligados à luta contra a
homofobia. Isso é algo que é discutido há muito tempo, e é um ponto que
sempre foi controverso dentro do próprio Ministério da Saúde, que sempre
foi conhecido por ser um ministério bem progressista com relação a
questões de sexualidade. Por exemplo, logo após as primeiras edições das
Paradas Gays o Ministério da Saúde se colocou como financiador, como
parte de uma política de fortalecimento da estima (entre os
homossexuais), como forma de combater a violência e diminuir os índices
de contágio de doenças sexualmente transmissíveis nesse grupo. Então
veja, dentro de um ministério que historicamente sempre foi
progressista, nessa questão da doação de sangue nunca tinha se
conseguido avançar. Então, é extremamente interessante que haja esse
desdobramento.
Sul21 – De qualquer modo, é possível perceber que alguns
setores estão reagindo a essa decisão do STF. Um exemplo está no
material produzido pelo Ministério da Educação, que seria distribuído em
escolas e acabou sendo vetado.
RRR - Sim, e não só nisso, não só no chamado “kit
anti-homofobia”. Há projetos e decretos federativos no Congresso,
articulados por essa chamada bancada evangélica, que desejam não só que o
governo não distribua o kit anti-homofobia, mas também que revogue a
resolução do Conselho Federal de Medicina que tirou a homossexualidade
de seu rol de doenças reconhecidas. Querem revogar essa decisão! Querem
derrubar a portaria do Ministério da Saúde que incluiu, dentro das
atribuições do Sistema Único de Saúde, cirurgias de mudança de sexo. Há
um requerimento da bancada evangélica junto ao Ministério da Justiça
questionando as afirmações do governo de que há muitos registros de
violência homofóbica no país. Entende? Tem uma série de reflexos, de
reações bastante fortes. A própria Presidência da República – de forma
no mínimo infeliz, para não dizer imprudente – desqualificou o trabalho
do Ministério da Educação sem saber do que estava falando…
Sul21 – Eu ia fazer justamente essa pergunta, sobre a posição adotada pela presidente no caso…
RRR - Sim, a presidente da República falou sem
conhecimento, já que os próprios elaboradores da campanha dizem que ela
não viu a campanha como um todo. A campanha sequer tinha sido lançada,
estava iniciando o período de testes para verificar sua eficácia. E uma
campanha que não tem absolutamente nada a ver com propaganda de qualquer
direcionamento sexual! Infelizmente, a coisa foi conduzida de forma
totalmente equivocada. A tensão é muito grande, e acho que essa decisão
acabou colocando ainda mais lenha na fogueira da resistência, acabou
dando ainda mais força a esse movimento de reação.
Sul21 – E qual a posição a ser tomada para consolidar o que já foi conquistado? Como evitar retrocessos?
RRR - Olha, acho importante identificar que tipo de
reação está havendo e em que ela se fundamenta. A partir daí, se for o
caso, e me parece que é o caso, contestar as premissas nas quais se
baseia essa reação. Por exemplo, essas pessoas compreendem de forma
muito equivocada o que é laicidade, porque na verdade não estão propondo
um Estado laico, e sim um Estado cujas políticas sejam baseadas nos
valores de determinadas religiões. Pode ser que se mostre cada vez mais
importante explicitar isso. Também ser mais rigoroso quanto à aferição
de violência e discriminação contra homossexuais do que temos sido até
então. E compreender a decisão do STF não só de forma louvatória – e eu
acho que a decisão deve ser louvada, porque realmente foi muito
importante – mas de uma forma sedimentada e profunda. Crítica até, mas
em um bom sentido, buscando mostrar o tamanho da conquista obtida ao
mesmo tempo em que reforça a necessidade de avançar em pontos que ainda
não foram devidamente atendidos por ela.
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quinta-feira, 16 de junho de 2011
Denúncias geram pedido de cassação de prefeita e vice em Gravataí-RS
Igor Natusch no Sul21
A oposição à prefeita de Gravataí, Rita Sanco (PT), mobiliza-se para
que a líder do Executivo municipal seja retirada do cargo. Capitaneada
pelo PV, uma ação nesse sentido já está tramitando na Câmara de Gravataí
– processo que o Executivo municipal descaracteriza como um movimento
de cunho eleitoral, buscando desgastar a imagem do partido e facilitar a
retomada da prefeitura no pleito de 2012.
São duas as representações contra a prefeita. Uma delas, encaminhada
ao Ministério Público, foi protocolada pelo PV; a outra, aprovada na
semana passada pela Câmara Municipal, é individual, assinada pelo
presidente do Partido Verde em Gravataí, Marcos Monteiro, e pelo
advogado Cláudio Ávila. Por 10 votos a 4, a abertura do processo foi
aprovada pelos vereadores, e uma comissão está elaborando relatório
sobre as denúncias. O pedido, no caso, é pelo afastamento imediato da
prefeita. A votação deve ocorrer no prazo de 90 dias. Caso a votação que
aprovou o processo se repita, a prefeita acabará sendo submetida ao
processo de impeachment, já que estaria caracterizada a maioria de votos
necessária para tal.
“São acusações graves, juridicamente embasadas e que se referem a
fatos incontroversos”, diz Cláudio Ávila, em conversa telefônica com o Sul21.
As denúncias contra Rita Sanco referem-se a crimes como prevaricação,
improbidade administrativa, assinatura de contratos lesivos e crime de
responsabilidade. Além da cassação da prefeita, o processo entregue à
Câmara pede também o afastamento do vice-prefeito Cristiano Kingeski. A
prefeitura recebeu a intimação no começo da semana e terá dez dias para
se defender.
Entre as supostas irregularidades, a mais destacada dá conta de que o
procurador-geral do município, Ataídes Lemos da Costa, teria atuado
como advogado para o marido e o filho de Rita Sanco, além de ser sócio
da filha da prefeita, Raquel Sanco Lima, em um escritório de advocacia.
Além disso, Ataídes teria continuado a advogar depois de sua nomeação,
defendendo cooperativas e sindicatos em ações contra o próprio Executivo
municipal. “Isso é advocacia ilegal”, diz Marcos Monteiro, presidente
do PV em Gravataí. Cláudio Ávila, que atua como secretário municipal de
assuntos jurídicos do Partido Verde, reforça as denúncias. “O
procurador-geral advoga contra o público a favor do privado, enquanto é
pago pelo erário, tudo com o pleno conhecimento desta senhora
(prefeita)”, afirma, sem meias palavras.
Para vice-prefeito, denúncias são “antecipação eleitoral”
As acusações são rebatidas pelo vice-prefeito de Gravataí, Cristiano
Kingeski. Segundo ele, Ataíde e Raquel Sanco não são sócios, tendo
apenas advogado juntos em algumas ações, em nome de cooperativas locais.
Além disso, garante que as insinuações de que o procurador-geral foi
advogado particular de parentes da prefeita não correspondem à
realidade. “Não há problema em um Cargo em Comissão (CC) atuar como
consultor em movimentações judiciais, isso não constitui nenhuma
ilegalidade”, assegura o vice-prefeito. “Depois de assumir como
procurador, ele não advogou em mais nenhuma causa, exatamente como
determina a lei”. Por meio de sua assessoria de imprensa, a prefeita
Rita Sanco informou ao Sul21 que não fará declarações sobre o caso.
De acordo com Cristiano Kingeski, as denúncias contra ele e Rita
Sanco são uma “ação de antecipação eleitoral”. “Não há embasamento
jurídico algum (para o processo)”, defende. Para o vice-prefeito, a
ofensiva da oposição foi deflagrada após o encaminhamento de pedido de
recursos ao governo federal, que podem injetar até R$ 100 milhões para
obras no município. “Uma vez confirmados os recursos e executadas as
obras, o PT fica em posição privilegiada para a eleição (de 2012). Essas
pessoas sabem disso, sentem-se incomodadas com um governo em sintonia
com a população. Como acham que não podem vencer no voto, querem
derrubar à força”, acusa.
Advogado do PV: renegociação com CEEE é uma “afronta”
Outra questão destacada pelos opositores de Rita Sanco refere-se às
renegociações de dívidas feitas pela prefeitura com órgãos como Corsan,
RGE e CEEE. No último caso, o valor total chegaria a R$ 120 milhões,
depois de um acordo que levará ao pagamento em mais de 300 parcelas
mensais – segundo a oposição, a quitação da dívida só ocorreria em 2035.
No caso da Corsan, a garantia de pagamento envolveria dez anos de
retenção de ICMS do município – algo vedado pela Constituição.
Os indexadores de juros, segundo os denunciantes, podem ter sido
direcionados de forma a favorecer as empresas que fazem a cobrança,
lesando os cofres públicos. “Mesmo com a denúncia, o governo insiste em
encaminhar a renegociação feita pela CEEE, que está sob total
suspeição”, critica o advogado Cláudio Ávila, um dos responsáveis pela
ação junto à Câmara Municipal. Segundo ele, a atitude é uma “afronta”
aos que buscam esclarecimento dos fatos. “É uma falta de respeito às
autoridades jurídicas, uma desconsideração completa ao Legislativo
municipal”.
De acordo com o vice-prefeito de Gravataí, a longa duração do
pagamento à CEEE tem como objetivo diminuir o comprometimento de
recursos do município. “Conseguimos baixar a dívida de R$ 82 milhões
para R$ 24 milhões. Se pudéssemos, pagaríamos à vista, mas não temos
recursos, por isso a negociação”, explica. De acordo com Cristiano
Kingeski, trata-se de uma dívida que remonta às administrações de José
Mota (PDT) e Edir Oliveira (PTB). “Nossa busca é por parcelas baixas. É
uma crítica irracional. O que poderíamos fazer, pagar em parcelas de R$ 1
milhão, minando completamente a capacidade de investimentos do
município?”, indaga Kingeski.
As insinuações de que os contratos buscam favorecer apadrinhados
políticos são tratadas pelo vice-prefeito como um “absurdo”. “O acordo
com a CEEE foi travado durante o governo Yeda. Não estamos negociando
com um banco privado, e sim com o Banrisul, que na época da assinatura
era presidido pelo PMDB. Não há nenhum tipo de privilégio, nenhuma má
fé”, assegura.
Outras acusações contra Rita Sanco dão conta de que a prefeita teria
determinado o fechamento do ensino médio no colégio Santa Rita de
Cássia, como forma de promover seu projeto de ensino técnico no local.
Já estaria ocorrendo a impressão e distribuição de material publicitário
para divulgação do curso, que ainda não está confirmado. A oposição
também põe sob suspeição a contratação de 500 professores em regime
emergencial, mesmo com concursados na fila para nomeação. “Houve uma
quebra da ordem cronológica”, acusa o presidente do PV municipal, Marcos
Monteiro.
Cristiano Kingeski diz que a iniciativa de pedir também o seu
afastamento evidencia o caráter político da denúncia feita por
integrantes do PV. “A alegação é de que assinei contrato (com o
Banrisul) sem a aprovação da Câmara. O que eles não explicam é que nos
itens finais do mesmo contrato está explicitado que ele só será válido
após passar pelo legislativo municipal”, frisa Kingeski. “Não há questão
ética alguma, os argumentos são pífios. Nunca tivemos a chance de
esclarecer, de discutir (na Câmara), o bloco da oposição atropelou o
processo”. De qualquer modo, o vice-prefeito admite que, “politicamente
falando”, a cassação é possível. “É uma disputa política, que passa ao
largo de questões judiciais”, diz ele.
quarta-feira, 15 de junho de 2011
Rede Brasil Atual e TVT transmitem, ao vivo, o 2º encontro nacional de blogueiros
A partir desta sexta-feira até domingo, acompanhe pelos sites os debates do BlogProg
A Rede Brasil Atual e a Rede TVT
transmitem ao vivo a partir desta sexta-feira (17) o segundo Encontro
Nacional dos Blogueiros Progressistas (BlogProg), direto do auditório da
CNTC (Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio), em
Brasília. Ao todo, estarão envolvidos na transmissão cerca de dez
profissionais. O blogueiro Emerson Luis, do Nas Retinas e do podcast Na Varanda, participa da transmissão ao lado do editor da Rede Brasil Atual, Ricardo Negrão.
A cobertura especial começa logo na sexta-feira à noite, a partir das
19h, com as presenças confirmadas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva e do atual ministro das Comunicações, Paulo Bernardo.
No sábado, a transmissão começa logo pela manhã, com a discussão
sobre mídia e a luta por um novo marco regulatório da comunicação. O
encontro acaba, no domingo, com uma plenária.
Redes Sociais
A transmissão seguirá
durante todo o evento, levando pelos sites entrevistas, discussões e
debates. Os usuários do Twitter vão usar a hashtag #2BlogProg e o link para o ao vivo (http://bit.ly/BlogProg), além de informações nos perfis da Rede Brasil Atual e Rede TVT.
Também a partir da sexta-feira estará disponível o embed para que
blogueiros também possam transmitir em seus espaços as discussões.
A programação
17 de junho, sexta-feira
17 horas – Início do credenciamento
19 horas – Palestra do ministro Paulo Bernardo sobre os desafios da comunicação no governo Dilma Rousseff
21 horas – Festa de confraternizaçã.
18 de junho, sábado
9 horas – A luta por um novo marco regulatório da comunicação
- Deputada Luiza Erundina (PSB) – coordenadora da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão;
- Jurista Fábio Konder Comparato – autor da Ação de Omissão (ADO) do Congresso Nacional na regulamentação da comunicação;
- Professor Venício Lima – autor do livro recém-lançado “Regulação das comunicações”.
14 horas – Oficinas autogestionadas e simultâneas
1 – Os partidos e a luta pela democratização da comunicação.
- José Dirceu (PT), João Arruda (PMDB), Brizola Neto (PDT), Renato
Rabelo (PC do B), Randolfe Rodrigues (PSOL) – mediação: José Augusto
Valente;
2 – O sindicalismo na era da internet
- Artur Henrique (CUT), Luis Carlos Mota (Foraça Sindical), Nivaldo
Santana (CTB), Ricardo Patah (UGT), Ubiraci Dantas (CGTB) e Antônio
Augusto de Queiroz (Diap) – mediação: Rita Casaro;
3 – A política da internet, tecnologias e a neutralidade na rede
- Sérgio Amadeu, Marcelo Branco, Ricardo Poppi, José Carlos Caribé, Tatiane Pires – mediação: Diego Casaes;
4 – Arte, humor, militância e compromisso: agora por nós mesmos. Compartilhando experiências
- Mediação: Sérgio Teles e Paula Marcondes;
5 – Reforma agrária e as perspectivas na comunicação
- Gilmar Mauro, Rodrigo Vianna, Letícia Silva, Sergio Sauer – mediação: Igor Felippe;
6 – Mulheres na blogosfera
- Luka da Rosa, Amanda Vieira, Mayara Melo – mediação: Niara de Oliveira;
7 – Perseguição e censura contra a blogosfera
- Paulo Henrique Amorim, Esmael Morais e Lino Bocchini – mediação: Altamiro Borges.
8 – A militância digital e as redes sociais
- Eduardo Guimarães, Luis Carlos Azenha, Conceição Oliveira (Maria Frô) – mediação: Conceição Lemes.
9 – Lan houses e a internet na periferia
- Mediação: Mario Brandão.
10 – A economia da outra comunicação: os caminhos e desafios da sustentabilidade da blogosfera
- Ladislau Dawbor, Marcio Pochmann, Clayton Mello – mediação: Renato Rovai.
• Oficina sobre ferramentas do blog – mesa: Marcos Lemos;
19 de junho, domingo
9 horas – reuniões em grupo: troca de experiência, balanço e desafios da blogosfera progressista;
14 horas – Plenária final: aprovação da carta dos blogueiros e constituição da nova comissão nacional organizadora.
Marcadores:
encontro de blogueiros progressistas,
midia,
movimentos sociais
Battisti foi escolhido para ser um bode expiatório, diz Tarso
Em entrevista exclusiva à Carta Maior, o ex-ministro da Justiça do governo Lula e atual governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, faz uma avaliação sobre o desfecho e o significado do caso Battisti. Para Tarso, que concedeu refúgio político ao italiano, esse caso é "o maior exemplo de manipulação midiática que ocorreu no Brasil nos últimos tempos". O governador gaúcho também relaciona o caso à atual situação política na Itália e sustenta que Battisti acabou servindo de bode expiatório de uma aliança entre a extrema-direita italiana, a direita não democrática e a antiga esquerda italiana que "não só ficou isolada durante o reinado de Berlusconi, como também capitulou ideologicamente em questões de fundo".
Marco Aurélio Weissheimer na CARTA MAIOR
O ex-ministro da Justiça e atual governador
do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), estava na Espanha quando o
Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na semana passada, rejeitar a
reivindicação da Itália contra a decisão do ex-presidente Lula, que se
negou a extraditar o italiano Cesare Battisti. Como ministro da Justiça
do governo Lula, Tarso Genro concedeu refúgio político a Battisti por
entender, entre outras coisas, que ele era acusado de crimes de natureza
política e que não existiam provas consistentes de que ele cometera os
assassinatos dos quais é acusado. Em entrevista exclusiva à Carta Maior,
Tarso Genro faz uma avaliação do caso Battisti e dispara: "esse é o
maior exemplo de manipulação midiática que ocorreu no Brasil nos últimos
tempos".
O governador gaúcho também relaciona o caso à atual situação política na Itália e sustenta que Battisti acabou servindo de bode expiatório. "Battisti foi escolhido para ser um bode expiatório da extrema-direita italiana, da direita não democrática e dos partidos da antiga esquerda italiana que não só, ficaram isolados politicamente durante o reinado de Berlusconi, como também capitularam em termos ideológicos em questões de fundo".
"A grande síntese deste processo", acrescenta, "foi feita pelo ministro da Defesa da Itália que, olhando o Brasil como uma colônia, disse que nosso país era muito bom em bailarinas, mas não em juristas".
Carta Maior: Qual sua avaliação sobre o desfecho do caso Battisti?
Tarso Genro: Em primeiro lugar gostaria de salientar, como tenho feito de maneira reiterada, que o caso Battisti é o maior exemplo de manipulação midiática da informação que ocorreu no Brasil nos últimos tempos. Digo isso por vários motivos. Primeiro, porque jamais se informou que o Supremo Tribunal Federal já tinha tomado posição em caso semelhante, concedendo refúgio. Em segundo lugar, não se informou que o Supremo, por decisões que foram tomadas no curso do processo de deferimento do refúgio, tinha violado diretamente texto de lei. A lei que regula o refúgio no Brasil é expressa: quando é concedido o refúgio, interrompe-se o processo de extradição. Em terceiro, não se informou – pelo contrário, desinformou-se – que o conteúdo do processo não revela nenhuma prova contra Battisti. Não há nenhuma prova testemunhal e nenhuma prova pericial de algum assassinato que ele tenha cometido. Em quarto lugar, omitiu-se, também de maneira sistemática, que Battisti foi considerado refugiado político durante onze anos na França, um país maduro democraticamente e que tem um Estado de Direito respeitado em todo o mundo.
Portanto, a decisão que foi tomada pelo Supremo Tribunal Federal repõe três questões fundamentais. Em primeiro lugar, o elemento central da soberania do país para tomar decisões como esta. Em segundo, consagra a posição totalmente adequada à nossa Constituição, segundo a qual a última palavra sobre refúgio é do presidente da República. E, em terceiro, a mais importante delas, reconhece no Battisti uma pessoa que foi acusada de ser um criminoso político e não um criminoso comum. Assim, a decisão do Supremo merece ser respeitada e festejada. Isso não quer dizer que eu tenha qualquer reivindicação de saber jurídico para meu despacho (como ministro da Justiça) e nem que eu despreze os argumentos do ministro Pelluzzo e do ministro Gilmar Mendes, que tiveram uma posição diferente. Mas quer dizer sim que a maioria do Supremo esteve de acordo com o conteúdo do referido despacho e com a decisão do presidente da República.
Carta Maior: O governo italiano ameaçou remeter o caso para o Tribunal de Haia. Na sua avaliação, há alguma possibilidade dessa ameaça prosperar?
Tarso Genro: Trata-se mais de uma manobra política de um governo decadente que já está sendo derrotado nas eleições de seu país e nos referendos que ocorreram neste final de semana. É um governo composto pela centro-direita e pela extrema-direita mais atrasada na cultura política italiana e que tenta, na verdade, provocar contradições fora do país para tentar compensar seu desgaste interno. Portanto, isso não tem nenhum sentido e nenhum apoio na sistemática do direito internacional e não terá o respeito de nenhum jurista seja daqui, seja de fora do país.
Carta Maior: Houve uma coincidência entre a decisão do Supremo e as derrotas eleitorais do governo Berlusconi. O caso Battisti teve uma grande repercussão midiática na Itália e foi muito explorado politicamente pelo governo. Mas não parece ter ajudado muito Berlusconi. O que essas mudanças políticas que começam a emergir das urnas italianas sinalizam?
Tarso Genro: O Battisti, na verdade, foi escolhido para ser um bode expiatório da extrema-direita italiana, da direita italiana não democrática e dos partidos da antiga esquerda italiana que não só, ficaram isolados politicamente durante o reinado de Berlusconi, como também capitularam em termos ideológicos em questões de fundo da democracia italiana. Battisti serviu de elo entre um conjunto de facções políticas na Itália, apelando de maneira reiterada para questões reais que a Itália viveu naquela época, ou seja, desencadeamento de ações terroristas, de ações que culminaram com o assassinato do presidente Aldo Moro, e que tiveram um grande respaldo de estruturas subversivas secretas da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) naquela oportunidade. Essas forças não reagiram contra isso porque precisavam justificar-se perante a opinião pública e preferiram escolher uma pessoa para apresentar em sacrifício e tentar satisfazer uma merecida tensão, angústia e revolta de grande parte da sociedade italiana contra aqueles atos terroristas.
Isso foi feito de maneira articulada. O antigo reformismo italiano, que hoje virou um partido centrista conivente com o governo Berlusconi, apoiou essa campanha e não teve coragem de fazer um enfrentamento ideológico. Battisti foi escolhido a dedo para isso. Com a mudança política que ocorreu na França (derrota dos socialistas), ele perdeu a condição de refugiado e começou a aparecer como um elo de satisfação para purgar a terrível memória daqueles anos onde vários setores da extrema esquerda e também da extrema direita cometeram atos bárbaros. Só que a síntese eles tentaram fazer, através do caso Battisti, foi uma síntese para abater e atacar exclusivamente a esquerda, para desmoralizar tudo que restava de pensamento transformador na democracia italiana. Portanto, o uso de Battisti foi conveniente para a antiga esquerda italiana, para a direita autoritária e para a extrema-direita. A grande síntese deste processo foi feita pelo ministro da Defesa da Itália que, olhando o Brasil como uma colônia, disse que nosso país era muito bom em bailarinas, mas não em juristas.
Carta Maior: Considerando as derrotas recentes de Berlusconi e a desagregação da antiga esquerda, pode-se ver, no cenário político italiano o surgimento de novas forças políticas mais à esquerda?
Tarso Genro: Houve uma mudança significativa na política italiana nos últimos sessenta dias. Primeiro, cabe destacar a vitória de uma esquerda alternativa em Nápoles e em Milão. Segundo, uma vitória da oposição contra Berlusconi em assuntos extremamente importantes que ele submeteu a referendo. O grande problema para a continuidade desse processo de reabertura política na Itália é a ausência de propostas. O Partido Democrático italiano foi para o centro, não fez nenhuma disputa ideológica com Berlusconi e tratou a questão da integração da Itália à União Europeia apenas a partir de um critério de mais liberalismo ou menos liberalismo. Não apresentou nenhuma alternativa à forma de organização da economia, à forma da integração da Itália na Europa e não apresentou nenhuma resposta aos movimentos sociais fragmentados que foram surgindo de maneira acelerada.
Penso que precisaremos esperar ainda um pouco até que surja uma esquerda italiana que seja democrática, que não se submeta aos fetiches ideológicos promovidos pela grande mídia e pela extrema-direita e que tenha uma visão consistente de como integrar democraticamente a Itália na Europa. Acho que esse processo já começou, mas a oposição representada pelo Partido Democrático, que hoje é um partido centrista, não teve capacidade nem coragem política de apresentar uma proposta alternativa ao que significou o reinado de Berlusconi neste período.
Carta Maior: Se, na Itália, a direita está sendo derrotada, na Espanha e em Portugal, os partidos de direita obtiveram recentemente vitórias expressivas. Na França, há a possibilidade de que a extrema-direita dispute o segundo turno das eleições presidenciais. Por outro lado, na Espanha, na Grécia e em outros países, vemos grandes mobilizações de rua, reunindo fundamentalmente jovens que não são ligados a nenhum partido. Na sua avaliação, para onde este cenário aponta do ponto de vista político?
Tarso Genro: O processo de integração europeu é ambíguo. De uma parte, ele gerou condições para que os países se modernizassem em termos industriais e sociais, consolidando democracias estáveis. Essa foi a grande vantagem da integração europeia. Só que as negociações que levaram à essa integração não constituíram salvaguardas alternativas para estabelecer um verdadeiro equilíbrio entre a integração da Europa do capital e da Europa social. Hoje, a grande cobrança que é feita sobre esses países mais débeis economicamente é que eles se adequem ao processo de integração que é comandado pela Alemanha, pelo Banco Central europeu e agora pelo FMI. A integração europeia ainda é um processo em curso, que atravessará uma longa tormenta a partir de agora. E essa longa tormenta irá revelar a existência de movimentos sociais, de movimentos sindicais, de movimentos da intelectualidade que refletirão nos partidos democráticos formando alas de esquerda em suas fileiras, podendo, mais tarde, até dar origem a novas organizações.
Não creio que os partidos socialistas atuais tenham elaborado suficientemente uma estratégia para sair dessa armadilha em que eles se meteram, a armadilha do déficit máximo de 3%. Eles estão atados a uma concepção economicista da União Europeia, onde o equilíbrio financeiro se superpõe ao equilíbrio social. Não há um pacto de transição de médio ou de longo curso para que esses países permaneçam integrados na União Europeia e capazes de manter as instituições básicas de um Estado de Bem Estar. O que ocorre na Grécia, na Espanha, em Portugal e na periferia de Paris indica que teremos um período de perturbações sociais graves. Se a Europa “economicista” ceder é possível que se reajuste o pacto europeu. Se não, ele pode se fragmentar a partir de sucessivas rebeliões dos “de baixo”. É bom lembrar que, nestes países, não estamos falando de populações miseráveis, mas de trabalhadores que já provaram condições de bem estar e que dificilmente renunciarão a elas apenas pelo convencimento.
Carta Maior: Na sua opinião, esse receituário “economicista” dominante na Europa hoje pode desembarcar na América Latina e, em especial no Brasil, em caso de agravamento da crise econômica nos países do centro do capitalismo, especialmente nos Estados Unidos?
Tarso Genro: Creio que o Brasil tem condições especiais para enfrentar esse processo por alguns fatores naturais, como a possibilidade de expansão da fronteira agrícola, o relacionamento equilibrado com a América Latina por meio de políticas que o governo Lula desenvolveu estabelecendo relações de igualdade com países desiguais economicamente, e um mercado interno em expansão. Além disso, nosso país tem a capacidade de combinar um desenvolvimento industrial e técnico tradicional, com utilização intensiva de mão de obra, com um desenvolvimento tecnológico de alto nível, com capacidade competitiva no mercado global.
Estas condições retiram o Brasil da situação de um dilema trágico, de aderir ao neoliberalismo ou continuar crescendo com políticas sociais. Essa, na minha opinião, foi a grande conquista do governo Lula: fez uma transição sem ruptura, onde a ruptura era absolutamente impossível, colocando a questão do desenvolvimento como base para a criação de novos sujeitos sociais que não aceitam mais regredir, que querem mais, que pedirão mais para o Estado, mais escolas, mais educação, mais saúde. E isso só pode ser mantido com crescimento. Então, penso que o Brasil tem condições, sim, de sair desse impasse e, consequentemente, a América Latina também. Isso vai depender, obviamente, dos governos que tivermos daqui para frente. Se tivermos governos que sigam nesta trajetória iniciada pelo governo Lula e que está sendo prosseguida pela presidenta Dilma, acho que o Brasil não cai nesta armadilha e pode, em dez ou quinze anos, um país com muito mais influência que hoje no contexto mundial.
O governador gaúcho também relaciona o caso à atual situação política na Itália e sustenta que Battisti acabou servindo de bode expiatório. "Battisti foi escolhido para ser um bode expiatório da extrema-direita italiana, da direita não democrática e dos partidos da antiga esquerda italiana que não só, ficaram isolados politicamente durante o reinado de Berlusconi, como também capitularam em termos ideológicos em questões de fundo".
"A grande síntese deste processo", acrescenta, "foi feita pelo ministro da Defesa da Itália que, olhando o Brasil como uma colônia, disse que nosso país era muito bom em bailarinas, mas não em juristas".
Carta Maior: Qual sua avaliação sobre o desfecho do caso Battisti?
Tarso Genro: Em primeiro lugar gostaria de salientar, como tenho feito de maneira reiterada, que o caso Battisti é o maior exemplo de manipulação midiática da informação que ocorreu no Brasil nos últimos tempos. Digo isso por vários motivos. Primeiro, porque jamais se informou que o Supremo Tribunal Federal já tinha tomado posição em caso semelhante, concedendo refúgio. Em segundo lugar, não se informou que o Supremo, por decisões que foram tomadas no curso do processo de deferimento do refúgio, tinha violado diretamente texto de lei. A lei que regula o refúgio no Brasil é expressa: quando é concedido o refúgio, interrompe-se o processo de extradição. Em terceiro, não se informou – pelo contrário, desinformou-se – que o conteúdo do processo não revela nenhuma prova contra Battisti. Não há nenhuma prova testemunhal e nenhuma prova pericial de algum assassinato que ele tenha cometido. Em quarto lugar, omitiu-se, também de maneira sistemática, que Battisti foi considerado refugiado político durante onze anos na França, um país maduro democraticamente e que tem um Estado de Direito respeitado em todo o mundo.
Portanto, a decisão que foi tomada pelo Supremo Tribunal Federal repõe três questões fundamentais. Em primeiro lugar, o elemento central da soberania do país para tomar decisões como esta. Em segundo, consagra a posição totalmente adequada à nossa Constituição, segundo a qual a última palavra sobre refúgio é do presidente da República. E, em terceiro, a mais importante delas, reconhece no Battisti uma pessoa que foi acusada de ser um criminoso político e não um criminoso comum. Assim, a decisão do Supremo merece ser respeitada e festejada. Isso não quer dizer que eu tenha qualquer reivindicação de saber jurídico para meu despacho (como ministro da Justiça) e nem que eu despreze os argumentos do ministro Pelluzzo e do ministro Gilmar Mendes, que tiveram uma posição diferente. Mas quer dizer sim que a maioria do Supremo esteve de acordo com o conteúdo do referido despacho e com a decisão do presidente da República.
Carta Maior: O governo italiano ameaçou remeter o caso para o Tribunal de Haia. Na sua avaliação, há alguma possibilidade dessa ameaça prosperar?
Tarso Genro: Trata-se mais de uma manobra política de um governo decadente que já está sendo derrotado nas eleições de seu país e nos referendos que ocorreram neste final de semana. É um governo composto pela centro-direita e pela extrema-direita mais atrasada na cultura política italiana e que tenta, na verdade, provocar contradições fora do país para tentar compensar seu desgaste interno. Portanto, isso não tem nenhum sentido e nenhum apoio na sistemática do direito internacional e não terá o respeito de nenhum jurista seja daqui, seja de fora do país.
Carta Maior: Houve uma coincidência entre a decisão do Supremo e as derrotas eleitorais do governo Berlusconi. O caso Battisti teve uma grande repercussão midiática na Itália e foi muito explorado politicamente pelo governo. Mas não parece ter ajudado muito Berlusconi. O que essas mudanças políticas que começam a emergir das urnas italianas sinalizam?
Tarso Genro: O Battisti, na verdade, foi escolhido para ser um bode expiatório da extrema-direita italiana, da direita italiana não democrática e dos partidos da antiga esquerda italiana que não só, ficaram isolados politicamente durante o reinado de Berlusconi, como também capitularam em termos ideológicos em questões de fundo da democracia italiana. Battisti serviu de elo entre um conjunto de facções políticas na Itália, apelando de maneira reiterada para questões reais que a Itália viveu naquela época, ou seja, desencadeamento de ações terroristas, de ações que culminaram com o assassinato do presidente Aldo Moro, e que tiveram um grande respaldo de estruturas subversivas secretas da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) naquela oportunidade. Essas forças não reagiram contra isso porque precisavam justificar-se perante a opinião pública e preferiram escolher uma pessoa para apresentar em sacrifício e tentar satisfazer uma merecida tensão, angústia e revolta de grande parte da sociedade italiana contra aqueles atos terroristas.
Isso foi feito de maneira articulada. O antigo reformismo italiano, que hoje virou um partido centrista conivente com o governo Berlusconi, apoiou essa campanha e não teve coragem de fazer um enfrentamento ideológico. Battisti foi escolhido a dedo para isso. Com a mudança política que ocorreu na França (derrota dos socialistas), ele perdeu a condição de refugiado e começou a aparecer como um elo de satisfação para purgar a terrível memória daqueles anos onde vários setores da extrema esquerda e também da extrema direita cometeram atos bárbaros. Só que a síntese eles tentaram fazer, através do caso Battisti, foi uma síntese para abater e atacar exclusivamente a esquerda, para desmoralizar tudo que restava de pensamento transformador na democracia italiana. Portanto, o uso de Battisti foi conveniente para a antiga esquerda italiana, para a direita autoritária e para a extrema-direita. A grande síntese deste processo foi feita pelo ministro da Defesa da Itália que, olhando o Brasil como uma colônia, disse que nosso país era muito bom em bailarinas, mas não em juristas.
Carta Maior: Considerando as derrotas recentes de Berlusconi e a desagregação da antiga esquerda, pode-se ver, no cenário político italiano o surgimento de novas forças políticas mais à esquerda?
Tarso Genro: Houve uma mudança significativa na política italiana nos últimos sessenta dias. Primeiro, cabe destacar a vitória de uma esquerda alternativa em Nápoles e em Milão. Segundo, uma vitória da oposição contra Berlusconi em assuntos extremamente importantes que ele submeteu a referendo. O grande problema para a continuidade desse processo de reabertura política na Itália é a ausência de propostas. O Partido Democrático italiano foi para o centro, não fez nenhuma disputa ideológica com Berlusconi e tratou a questão da integração da Itália à União Europeia apenas a partir de um critério de mais liberalismo ou menos liberalismo. Não apresentou nenhuma alternativa à forma de organização da economia, à forma da integração da Itália na Europa e não apresentou nenhuma resposta aos movimentos sociais fragmentados que foram surgindo de maneira acelerada.
Penso que precisaremos esperar ainda um pouco até que surja uma esquerda italiana que seja democrática, que não se submeta aos fetiches ideológicos promovidos pela grande mídia e pela extrema-direita e que tenha uma visão consistente de como integrar democraticamente a Itália na Europa. Acho que esse processo já começou, mas a oposição representada pelo Partido Democrático, que hoje é um partido centrista, não teve capacidade nem coragem política de apresentar uma proposta alternativa ao que significou o reinado de Berlusconi neste período.
Carta Maior: Se, na Itália, a direita está sendo derrotada, na Espanha e em Portugal, os partidos de direita obtiveram recentemente vitórias expressivas. Na França, há a possibilidade de que a extrema-direita dispute o segundo turno das eleições presidenciais. Por outro lado, na Espanha, na Grécia e em outros países, vemos grandes mobilizações de rua, reunindo fundamentalmente jovens que não são ligados a nenhum partido. Na sua avaliação, para onde este cenário aponta do ponto de vista político?
Tarso Genro: O processo de integração europeu é ambíguo. De uma parte, ele gerou condições para que os países se modernizassem em termos industriais e sociais, consolidando democracias estáveis. Essa foi a grande vantagem da integração europeia. Só que as negociações que levaram à essa integração não constituíram salvaguardas alternativas para estabelecer um verdadeiro equilíbrio entre a integração da Europa do capital e da Europa social. Hoje, a grande cobrança que é feita sobre esses países mais débeis economicamente é que eles se adequem ao processo de integração que é comandado pela Alemanha, pelo Banco Central europeu e agora pelo FMI. A integração europeia ainda é um processo em curso, que atravessará uma longa tormenta a partir de agora. E essa longa tormenta irá revelar a existência de movimentos sociais, de movimentos sindicais, de movimentos da intelectualidade que refletirão nos partidos democráticos formando alas de esquerda em suas fileiras, podendo, mais tarde, até dar origem a novas organizações.
Não creio que os partidos socialistas atuais tenham elaborado suficientemente uma estratégia para sair dessa armadilha em que eles se meteram, a armadilha do déficit máximo de 3%. Eles estão atados a uma concepção economicista da União Europeia, onde o equilíbrio financeiro se superpõe ao equilíbrio social. Não há um pacto de transição de médio ou de longo curso para que esses países permaneçam integrados na União Europeia e capazes de manter as instituições básicas de um Estado de Bem Estar. O que ocorre na Grécia, na Espanha, em Portugal e na periferia de Paris indica que teremos um período de perturbações sociais graves. Se a Europa “economicista” ceder é possível que se reajuste o pacto europeu. Se não, ele pode se fragmentar a partir de sucessivas rebeliões dos “de baixo”. É bom lembrar que, nestes países, não estamos falando de populações miseráveis, mas de trabalhadores que já provaram condições de bem estar e que dificilmente renunciarão a elas apenas pelo convencimento.
Carta Maior: Na sua opinião, esse receituário “economicista” dominante na Europa hoje pode desembarcar na América Latina e, em especial no Brasil, em caso de agravamento da crise econômica nos países do centro do capitalismo, especialmente nos Estados Unidos?
Tarso Genro: Creio que o Brasil tem condições especiais para enfrentar esse processo por alguns fatores naturais, como a possibilidade de expansão da fronteira agrícola, o relacionamento equilibrado com a América Latina por meio de políticas que o governo Lula desenvolveu estabelecendo relações de igualdade com países desiguais economicamente, e um mercado interno em expansão. Além disso, nosso país tem a capacidade de combinar um desenvolvimento industrial e técnico tradicional, com utilização intensiva de mão de obra, com um desenvolvimento tecnológico de alto nível, com capacidade competitiva no mercado global.
Estas condições retiram o Brasil da situação de um dilema trágico, de aderir ao neoliberalismo ou continuar crescendo com políticas sociais. Essa, na minha opinião, foi a grande conquista do governo Lula: fez uma transição sem ruptura, onde a ruptura era absolutamente impossível, colocando a questão do desenvolvimento como base para a criação de novos sujeitos sociais que não aceitam mais regredir, que querem mais, que pedirão mais para o Estado, mais escolas, mais educação, mais saúde. E isso só pode ser mantido com crescimento. Então, penso que o Brasil tem condições, sim, de sair desse impasse e, consequentemente, a América Latina também. Isso vai depender, obviamente, dos governos que tivermos daqui para frente. Se tivermos governos que sigam nesta trajetória iniciada pelo governo Lula e que está sendo prosseguida pela presidenta Dilma, acho que o Brasil não cai nesta armadilha e pode, em dez ou quinze anos, um país com muito mais influência que hoje no contexto mundial.
O fim de uma discriminação absurda e anacrônica
Do blog CONTEXTOLIVRE
O
Brasil, hoje, deveria estar comemorando. Mas a notícia, não está tendo o
destaque merecido. É a decisão da Organização Mundial do Trabalho de
abolir qualquer discriminação legal sobre os empregados e empregadas
domésticas. Em termos práticos, isso quer dizer que, a partir da
ratificação do tratado, os trabalhadores e trabalhadoras domésticas
passam a ter direito ao FGTS, adicional por noturno, jornada de trabalho
regulamentadas e outras proteções que não abrangem, atualmente,
cozinheiras/os, babás, faxineiras e motoristas particulares, contratados
por pessoa física.
Essa é ainda
uma chaga que carregamos de séculos passados, quando os serviços
domésticos eram feitos pelos “criados”, uma expressão que vem da entrega
de crianças pobres para famílias capazes de sustentá-los em troca
daquelas “obrigações”. Isso, no Brasil, ainda foi agravado pelas raízes
escravistas de nosso passado.
Para
que se tenha ideia da importância desta decisão, basta considerar que o
emprego doméstico representava, em 2009, a fonte de renda de cerca de
7,2 milhões de trabalhadores e trabalhadoras, ou 7,8% do total de
pessoal ocupado no país.
Em
relação ao mercado de trabalho feminino, os números são mais
impressionantes: nada menos que 17% das mulheres que trabalham tem um
emprego doméstico. Delas, dois terços são mulheres negras.
E
mesmo com a lei formalizando a igualdade da trabalhadora doméstica com
os demais trabalhadores, teremos um longo caminho a percorrer para
regularizar a vida profissional destas pessoas. Em 2009, as
trabalhadoras domésticas apresentaram índice de formalização do trabalho
de apenas 26,3%, o que significa que, do contingente de 6,7 milhões de
ocupadas nesta profissão, somente 1,7 milhão possuía alguma garantia de
usufruto de seus direitos. Mesmo somando as que contribuem na condição
de autômomas, este indice não chega a um terço do total.
Não
vai bastar sermos rápidos na ratificação deste tratado. O plano Brasil
sem Miséria da presidenta Dilma precisa, além as ações assistenciais e
educacionais, fazer com que os Ministérios da Previdência e do Trabalho
façam um esforço de simplificar a regularização destes trabalhadores
para poder, ao mesmo tempo, exigir o cumprimento da lei.
Lei que, finalmente, trata a todos como iguais.
Aloha Núñez:“Os indígenas não eram nem reconhecidos como parte da sociedade”
Vice-ministra do Poder Popular para os Povos Indígenas da Venezuela fala sobre avanços na questão dos povos originários
Vinicius Mansur
de Brasília (DF) via BrasilDeFato
De
passagem pelo Brasil para a reunião da Organização do Tratado de
Cooperação Amazônica (OTCA), a vice-ministra do Poder Popular para os
Povos Indígenas da Venezuela, Aloha Núñez, falou ao Brasil de Fato sobre
as conquistas e os desafios dos povos indígenas de seu país durante o
governo de Hugo Chávez, presidente desde 1999.
Indígena
da etnia wayúu, 27 anos, nascida em La Guarija – no estado de Zulia,
cerca de 900 quilômetros a oeste de Caracas –, Núñez foi coordenadora de
uma associação de estudantes indígenas da Universidade de Zulia, em
Maracaibo, e trabalhou para uma das “missões” empreendidas pelo governo
Chávez, antes de chegar ao ministério.
Brasil de Fato – Qual a população indígena da Venezuela?
Aloha Núñez –
Segundo o censo de 2001, somos entre 2 e 3% da população, pouco mais de
500 mil indígenas. O que não representa a realidade, porque o censo em
2001 não conseguiu chegar a todas as comunidades. E nem todo mundo que
era indígena se identificava assim. Era o início da revolução e, antes
dela, não havia direito e reconhecimento alguns. Dizer que era indígena
gerava um rechaço. Não é como neste momento, quando há uma lei orgânica
de povos indígenas, há direitos. O censo aponta 36 povos indígenas;
agora, já temos 44 reconhecidos e mais de 2.800 comunidades indígenas.
Naquele momento, eram só 2.400.
Há um movimento indígena organizado na Venezuela?
Há
diferentes organizações indígenas tanto em nível nacional como
regional. Cada povo indígena, ou, pelo menos, cada região, tem
organizações que representam um estado. Há, também, organizações
nacionais como o Conselho Nacional Indígena da Venezuela, a Frente
Indígena Waike'puru e a Conbive, Confederação Bolivariana Indígena da
Venezuela.
Qual a relação desses movimentos com a Revolução Bolivariana?
A
luta dos povos indígenas na Venezuela começou há muito tempo. Quando
houve essa manifestação indígena em toda a América, quando começou a
luta pelos direitos indígenas na ONU, quando o Convênio 169 da
Organização Internacional do Trabalho [que garante os direitos
indígenas] foi conquistado, as organizações indígenas conseguiram se
visibilizar. Logo depois, veio a revolução. O comandante Chávez, antes
de ganhar a presidência, assumiu o compromisso com os povos indígenas de
fazer todo o possível para pagar a dívida histórica acumulada. A
relação de abertura do presidente com as comunidades indígenas aconteceu
desde o início da revolução. E isso se viu manifestado não só nesse
compromisso, mas com sua chegada ao poder: quando, imediatamente, ele
convoca a Constituinte, ele incorpora a população indígena.
Como foi isso?
A
Constituinte teve deputados indígenas e a nova Constituição tem um
capítulo especial para povos e comunidades indígenas, direito que nunca
tiveram. A única coisa que existia na Constituição era um artigo que
prometia a “incorporação indígena progressiva à vida da Nação”. Os
indígenas não eram nem reconhecidos como parte da sociedade! Então, a
Constituição de 1999 representou uma grande porta. Ela estabelece que,
para a Assembleia Nacional, três indígenas devem ser eleitos. Eleitos
por região: sul, oriente e ocidente. Além disso, em todos os municípios
indígenas, temos vereadores indígenas. Em todos estados com população
indígena, temos legisladores indígenas. Os indígenas têm, pelo menos,
uma vaga garantida nesses espaços. Depois, criou-se a lei de demarcação
de povos e comunidades indígenas. Em seguida, criou-se a missão
Guaicaipuro, para atender, na parte social, esses povos. Depois,
criou-se a Lei Orgânica de Povos e Comunidades Indígenas. Não conheço
outro país que tenha uma lei que abarque tantos direitos, que vá além do
Convênio 169. E, posteriormente, criou-se o Ministério de Poder Popular
para os Povos Indígenas, dirigido por Nicia Maldonado, uma indígena
yekuana, amazônica, o que representa uma vontade política total. Em
outros países, não vemos ministérios indígenas; em geral, são fundações
do Estado que, muitas vezes, não são dirigidas por indígenas. Então,
nota-se profundamente o compromisso político do comandante Chávez com o
empoderamento do povo indígena.
Como se encontra o processo de demarcação de terras?
Ainda
estamos nele. Na Venezuela, a demarcação se inicia de duas formas: uma
por solicitação da comunidade e outra por ofício da Comissão
Presidencial Nacional de Demarcação, que se encarrega, juntamente com
uma comissão regional, de estudar todos essas questões. Já entregamos 40
títulos de terra, mas nos faltam muitos. São títulos coletivos que vão
acompanhados de um plano integral de apoio a esses povos, para que eles
tenham todas as ferramentas para levar adiante seu território, para que
seja autossustentável e, em algum momento, ajudar o país também.
Há alguma política para a promoção da cultura indígena?
A
lei estabelece de forma oficial os idiomas indígenas. Nas escolas
desses povos, as aulas devem partir em idioma indígena. Antes, só se
falava castelhano. Nas cidades, onde há população indígena, também deve
haver pelo menos um professor para dar o conteúdo indígena, o que se
chama de educação intercultural bilíngue. Ainda temos uma lei de
artesãos e artesãs indígenas.
Hoje, quais são as principais reivindicações indígenas ao Estado?
Terminar
o processo de demarcação, essa é a demanda em toda a América. Para nós,
é uma prioridade, e nosso comandante Chávez foi muito insistente nisso.
Por outra parte, não podemos negar que temos comunidades em alta
vulnerabilidade que reivindicam uma assistência permanente do governo.
Então, criamos uma corresponsabilidade entre as comunidades indígenas e o
Estado, para que o povo se empodere, seja protagonista na superação de
seus problemas e, assim, se livre da miséria e do analfabetismo e
consiga a suprema felicidade social, como já disse nosso libertador
Simón Bolívar. Uma grande quantidade de comunidades ainda não conseguiu
essa libertação. Algumas poucas, sim. Vivemos um processo de revolução,
mas não podemos consertar um problema de mais de 500 anos de invasão,
abandono, extermínio, de uma educação penetrante, invasiva, que te diz
que o indígena é o bruto, o bêbado, o preguiçoso. Estamos nesse processo
de tirar esse “chip” e meter outro.
Há conflitos com comunidades indígenas por conta de megaprojetos implementados pelo governo?
Sim.
Mas nós respeitamos o Convênio 169 da OIT, que estabelece o
consentimento prévio, livre e informado. Então, cada vez que um projeto
vai ser executado em alguma comunidade indígena, deve-se consultá-la,
apresentar o projeto, informar com antecipação. Se há dúvidas, é preciso
eclarecer e, inclusive, se as comunidades não estão de acordo com o
projeto, ele não é levado adiante.
Alguma vez o governo deixou de fazer algum projeto?
Uma
vez, faz tempo, já. Eram umas concessões para explorar carvão em
território yukpa. Os indígenas eram contra e a denúncia chegou ao
presidente, que convocou um ato público com 2 mil trabalhadores
petroleiros e disse que não haveria concessões. E até hoje não há. Isso
foi muito manipulado, porque algumas ONGs diziam que nós não queríamos
demarcar o território. Pensam que, com a demarcação, podem ganhar alguma
autonomia. Nesse caso, fizeram a comunidade discutir e, inclusive,
expulsar o companheiro Sabino Romero, um líder. As ONGs o utilizaram
como único porta-voz indígena, transformaram a luta de uma comunidade
numa luta pessoal. Diziam que ele era o cacique dos caciques, o mais
lutador de todos, mas, quando você vai à comunidade, te dizem que não é
bem assim, que faziam assembleias com um só cacique, não com todos. Em
assembleia, chegaram até a dizer que essa ONG era persona non grata.
Qual é a situação desse cacique agora?
Com
todo esse conflito que se criou, houve um enfrentamento entre duas
comunidades indígenas. O companheiro Sabino Romero e outro companheiro
se enfrentaram. Houve um tiroteio entre duas comunidades que resultou em
três pessoas mortas. Depois desses assassinatos, tanto Sabino Romero
como Alexander Romero estão presos. Então, logo as ONGs começaram a
dizer que eram presos políticos, que a ministra os prendeu, um montão de
coisas... Há um processo judicial em averiguação. Mas é preciso ficar
claro que quem decidiu que Sabino deve ser julgado pela Justiça
ordinária foi o mesmo povo yukpa. E, se fosse pela lei yukpa, talvez o
tivessem matado. Porque isso acontece quando você chega a matar dentro
de uma comunidade indígena. Nós estamos num processo de formação para
não chegar a esses níveis. Para não chegar a esse extremo, a comunidade
decidiu entregá-lo à Justiça ordinária, em uma assembleia que,
inclusive, foi televisionada. Isso ajudou a tratar o tema, porque todo
mundo vitimizava Sabino Romero. Agora, ele está em liberdade
condicional, mas a comunidade foi muito determinante, disse que não quer
Sabino. Mas ele nos disse que não pode ser proibido de voltar, senão,
podem haver mortos. Então, há uma preocupação do Estado, porque não
queremos um enfrentamento entre o povo yukpa.
A Justiça comunitária indígena é reconhecida pelo Estado na Venezuela?
Sim.
A Constituição e a Lei Orgânica de Povos e Comunidades Indígenas
reconhecem a justiça própria. Mas há uma dívida aí, em relação à
regulamentação da lei, que deve ser feita pela Assembleia. Porque há
coisas que devem ser normatizadas. Nós não temos pena de morte e jamais
apoiaríamos isso. Cada comunidade tem suas particularidades e está se
estudando tudo isso, para que ninguém aplique penas que violem os
direitos humanos.
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Forças progressistas e patrióticas formam novo governo no Líbano
Por Lejeune Mirhan no GRABOIS
Esperado
desde janeiro, finalmente, desde o dia 13 de junho, foi anunciado o
novo governo do Líbano, praticamente o único país do Oriente Médio árabe
que mantém uma vida democrática regular e com certa estabilidade, pelo
menos desde 1990 quando terminou a sua sangrenta guerra civil. Este é
assunto de destaque no noticiário internacional da qual queremos
apresentar alguns comentários.
Há duas alianças básicas no Líbano. Vem sendo assim pelo menos desde
2005 quando, em fevereiro, ocorreu o assassinato do ex-primeiro ministro
libanês Rafic Hariri. Uma delas, chamada de “8 de Março”, envolve
basicamente quatro grandes organizações: os xiitas do Partido de Deus,
conhecido como Hezbolláh e do grupo secular Amal, cujos líderes são
respectivamente Hassan Nasralláh e Nabih Bérri e mais os cristãos
maronitas do Movimento Patriótico Livre do general Michel Aoun e os
comunistas do PC Libanês, sob a liderança de Khaled Hadade.
Rafic e Saad Hariri
No outro campo, temos a coligação “14 de Março”, sob a liderança do
filho do ex-primeiro ministro, Saad Hariri, que vinha ocupando a chefia
do governo desde as eleições de 2009, quando ele conseguiu formar um
governo, de orientação pró norte-americano e simpático à Israel. A
coligação em que os comunistas fazem parte, fazia sistemática oposição a
esse governo, ainda que tivesse presença ministerial pela forma como é
formado o governo libanês.
Desde o final de 2010, ministros mais ligados ao Hezbolláh retiraram
apoio ao governo da composição proporcional, que seguia critérios
definidos há muitos anos que reparte o parlamento e o governo com as 18
confissões religiosas cristãs e muçulmanas existentes no país. A
divergência central estava sendo – e continua até hoje – com relação ao
reconhecimento dos trabalhos de uma comissão da ONU, que viola
claramente a soberania libanesa, que investiga o assassinato de Hariri
em 2005. Os EUA e Israel, desde aqueles primeiros momentos do atentado,
apontaram seu dedo acusador para a Síria. Houve levantes no país, de
forma que acabou ficando insustentável a continuidade de tropas sírias
permanecerem no país, como vinha acontecendo desde o término da sua
guerra civil 15 anos antes. Alguns ditos analistas internacionais já
logo se apressaram em chamar esses levantes anti-síria de “Revolução dos
Cedros” (sic).
Existe quase uma centena de partidos políticos no Líbano, ainda que joguem papel cerca de 10 ou 12. Uma situação parecida com a do Brasil, onde a colônia e os descendentes libaneses que aqui vivem ultrapassam a marca de quatro milhões, fazendo o Brasil o mais importante país nas relações com a República Libanesa.
São dois campos completamente distintos. Um, da aliança dos comunistas, com muçulmanos, cristãos e nacionalistas seculares, que defendem a soberania do Líbano, sua independência, contra a ingerência das potências estrangeiras no país e o outro, mais submissa aos interesses imperialistas na região.
Eu diria, grosso modo, que vivemos no Brasil uma situação parecida. Ou o Líbano vive algo parecido com o que vivemos na política brasileira. Aliás, até as datas coincidem. Em 1989 lançamos a candidatura de Lula pela primeira vez, em uma aliança popular e democrática ampla, contra forças mais conservadoras e reacionárias, pró-imperialistas. Lembremo-nos que venceu nessas eleições Collor de Mello e depois FHC, social-democrata em aliança com a direita neoliberal, que governou o país até 2002. Vejamos agora a história recente libanesa.
Um pouco de história
O Líbano, que já foi considerado uma das nações árabes mais prósperas de todo o Oriente Médio e que desde a sua independência em 1943 era considerada uma espécie de “Suíça do Oriente Médio”, acabou por entrar em uma guerra civil em 1975, que durou até praticamente 1990.
Essa guerra civil só conseguiu acabar com a realização na cidade saudita de Taif, no dia 22 de outubro de 1989, de uma reunião especial do parlamento libanês. Desse importante encontro, participaram 62 deputados, sendo 31 cristãos de várias confissões e outros 31 muçulmanos, divididos entre xiitas e sunitas. Interessante registrar que o transporte e alojamento de toda essa imensa delegação, foi inteiramente financiada pelo milionário sunita que seria eleito posteriormente Primeiro Ministro, Rafic Hariri, morto em 2005.
Desse histórico encontro saiu a Carta Nacional de Reconciliação, cujo conteúdo do acordo final assegura uma espécie de divisão sectária e religiosa do parlamento libanês, dividindo cotas das 128 cadeiras (houve ampliação das vagas nesse encontro) entre as 18 correntes religiosas espalhadas pelas diversas regiões libanesas. E ficou acertado que desse momento em diante – e já temos 22 anos de vigência do acordo – todos os presidentes do Líbano teriam que ser cristãos maronitas, o primeiro Ministro seria sempre um muçulmano sunita e o porta-voz do parlamento ou seu presidente, teria que ser necessariamente um muçulmano xiita. Quando uma nova constituição foi escrita em 1990, para sacramentar o final da guerra civil, esses acordos foram incorporados e vem sendo cumpridos até os dias atuais.
O novo governo
O governo demissionário e pró-ocidental de Saad Hariri vinha enfrentando forte oposição em função da sua dubiedade em rejeitar a comissão da ONU que viola a soberania libanesa. A tal Comissão “Independente” formada pela ONU, também chamada de “Tribunal Especial para o Líbano – TEL”, é presidida pelo juiz Daniel Franzen e tem como procurador, encarregado de apresentar a denúncia, Daniel Bellemare. De independente essa comissão não tem nada. Apenas reflete as forças que dominam e controlam a ONU, que a subjugam, encabeçadas pelas potências imperiais como os EUA e Inglaterra, França e Alemanha.
Os objetivos claros, nunca escondidos, dessa comissão da ONU é referendar as opiniões dos Estados Unidos e de Israel, no sentido de que foi a Síria a responsável pelo assassinato, através de seus agentes, do ex-primeiro Ministro Rafic Hariri. Seu filho Saad, chegou a ter uma posição dúbia em relação a reconhecer os trabalhos da referida comissão que fere a soberania nacional do Líbano. No entanto, acabou por optar em aceitar as suas decisões. Isso fez com que os ministros apoiados principalmente pelo Hezbolláh deixassem o governo de composição. Até porque já se ouve que a comissão vai envolver o Hezbolláh no processo. Restou à Hariri a sua renúncia.
O presidente libanês, Michel Suleiman, cristão maronita, em função de novos acordos e da passagem do Partido Socialista Progressista do Líbano de Walid Jumblat, com seus oito deputados para o campo da aliança “8 de março”, liderada pelo Hezbolláh e apoiada pela Síria, a correlação de forças contra Hariri ficou insustentável. Em um regime parlamentarista, forma governo quem tem maioria. Nas eleições libanesas de 7 de junho de 2009, a aliança conservadora e pró-imperialista ficou com 71 deputados, contra 57 da oposição (de um total de 128 parlamentares). Agora, nesta obra de engenharia política, Jumblat, velha raposa política libanesa, retirou seus oito e fieis deputados do campo de Hariri, de forma que o Hezbolláh e seus aliados puderam fazer uma nova maioria, de 65 deputados contra 63 do campo conservador. Assim, desde janeiro, Hariri se encontra demissionário e o presidente Suleiman indicou Mikati para formar o novo governo que deve tomar posse nos próximos dias (veja aqui os resultados das eleições de 2009 http://en.wikipedia.org/wiki/Elections_in_Lebanon).
Existe quase uma centena de partidos políticos no Líbano, ainda que joguem papel cerca de 10 ou 12. Uma situação parecida com a do Brasil, onde a colônia e os descendentes libaneses que aqui vivem ultrapassam a marca de quatro milhões, fazendo o Brasil o mais importante país nas relações com a República Libanesa.
São dois campos completamente distintos. Um, da aliança dos comunistas, com muçulmanos, cristãos e nacionalistas seculares, que defendem a soberania do Líbano, sua independência, contra a ingerência das potências estrangeiras no país e o outro, mais submissa aos interesses imperialistas na região.
Eu diria, grosso modo, que vivemos no Brasil uma situação parecida. Ou o Líbano vive algo parecido com o que vivemos na política brasileira. Aliás, até as datas coincidem. Em 1989 lançamos a candidatura de Lula pela primeira vez, em uma aliança popular e democrática ampla, contra forças mais conservadoras e reacionárias, pró-imperialistas. Lembremo-nos que venceu nessas eleições Collor de Mello e depois FHC, social-democrata em aliança com a direita neoliberal, que governou o país até 2002. Vejamos agora a história recente libanesa.
Um pouco de história
O Líbano, que já foi considerado uma das nações árabes mais prósperas de todo o Oriente Médio e que desde a sua independência em 1943 era considerada uma espécie de “Suíça do Oriente Médio”, acabou por entrar em uma guerra civil em 1975, que durou até praticamente 1990.
Essa guerra civil só conseguiu acabar com a realização na cidade saudita de Taif, no dia 22 de outubro de 1989, de uma reunião especial do parlamento libanês. Desse importante encontro, participaram 62 deputados, sendo 31 cristãos de várias confissões e outros 31 muçulmanos, divididos entre xiitas e sunitas. Interessante registrar que o transporte e alojamento de toda essa imensa delegação, foi inteiramente financiada pelo milionário sunita que seria eleito posteriormente Primeiro Ministro, Rafic Hariri, morto em 2005.
Desse histórico encontro saiu a Carta Nacional de Reconciliação, cujo conteúdo do acordo final assegura uma espécie de divisão sectária e religiosa do parlamento libanês, dividindo cotas das 128 cadeiras (houve ampliação das vagas nesse encontro) entre as 18 correntes religiosas espalhadas pelas diversas regiões libanesas. E ficou acertado que desse momento em diante – e já temos 22 anos de vigência do acordo – todos os presidentes do Líbano teriam que ser cristãos maronitas, o primeiro Ministro seria sempre um muçulmano sunita e o porta-voz do parlamento ou seu presidente, teria que ser necessariamente um muçulmano xiita. Quando uma nova constituição foi escrita em 1990, para sacramentar o final da guerra civil, esses acordos foram incorporados e vem sendo cumpridos até os dias atuais.
O novo governo
O governo demissionário e pró-ocidental de Saad Hariri vinha enfrentando forte oposição em função da sua dubiedade em rejeitar a comissão da ONU que viola a soberania libanesa. A tal Comissão “Independente” formada pela ONU, também chamada de “Tribunal Especial para o Líbano – TEL”, é presidida pelo juiz Daniel Franzen e tem como procurador, encarregado de apresentar a denúncia, Daniel Bellemare. De independente essa comissão não tem nada. Apenas reflete as forças que dominam e controlam a ONU, que a subjugam, encabeçadas pelas potências imperiais como os EUA e Inglaterra, França e Alemanha.
Os objetivos claros, nunca escondidos, dessa comissão da ONU é referendar as opiniões dos Estados Unidos e de Israel, no sentido de que foi a Síria a responsável pelo assassinato, através de seus agentes, do ex-primeiro Ministro Rafic Hariri. Seu filho Saad, chegou a ter uma posição dúbia em relação a reconhecer os trabalhos da referida comissão que fere a soberania nacional do Líbano. No entanto, acabou por optar em aceitar as suas decisões. Isso fez com que os ministros apoiados principalmente pelo Hezbolláh deixassem o governo de composição. Até porque já se ouve que a comissão vai envolver o Hezbolláh no processo. Restou à Hariri a sua renúncia.
O presidente libanês, Michel Suleiman, cristão maronita, em função de novos acordos e da passagem do Partido Socialista Progressista do Líbano de Walid Jumblat, com seus oito deputados para o campo da aliança “8 de março”, liderada pelo Hezbolláh e apoiada pela Síria, a correlação de forças contra Hariri ficou insustentável. Em um regime parlamentarista, forma governo quem tem maioria. Nas eleições libanesas de 7 de junho de 2009, a aliança conservadora e pró-imperialista ficou com 71 deputados, contra 57 da oposição (de um total de 128 parlamentares). Agora, nesta obra de engenharia política, Jumblat, velha raposa política libanesa, retirou seus oito e fieis deputados do campo de Hariri, de forma que o Hezbolláh e seus aliados puderam fazer uma nova maioria, de 65 deputados contra 63 do campo conservador. Assim, desde janeiro, Hariri se encontra demissionário e o presidente Suleiman indicou Mikati para formar o novo governo que deve tomar posse nos próximos dias (veja aqui os resultados das eleições de 2009 http://en.wikipedia.org/wiki/Elections_in_Lebanon).
Michel Aoun
Aqui, não poderia deixar de registrar o exemplo de política que nos foi
dado pelo general cristão Michel Aoun. Esse general reformado, passou 15
anos exilado em Paris. Esse tempo todo foi crítico da presença síria em
terras libanesas. No entanto, ao voltar com a saída das tropas sírias
em 2005 e a formação de novas alianças e coligações nunca teve dúvidas.
Olhou de um lado e viu as forças do império e sionistas, sob comando da
família Hariri e seus aliados. Olhou de ouro, viu as forças vivas da
resistência, uma parte delas armadas, viu os comunistas, os patriotas e
amigos da Síria. Não teve dúvidas. Nessa correlação de forças, aliou-se à
coligação mais avançada para aquela realidade, hoje vitoriosa e que
constitui novo governo. Um belo exemplo de política a ser seguida.
Análise concreta da realidade política concreta dentro da correlação de
forças do momento.
Uma análise preliminar
O novo governo terá a mesma quantidade de ministros que o anterior, trinta ao todo. Sua composição ficou assim estabelecida: Hezbolláh – dois ministros; Amal (xiita, mas secular) – ficou com outros dois e Partido Nacional Social Sírio – um ministro. Isso totaliza cinco ministérios para xiitas. Os sunitas do primeiro-ministro Mikat terão cinco ministérios por ele indicados, além do seu vice-primeiro Ministro. Os cristãos do general Aoun, do MPL indicarão 11 ministros e mais dois maronitas indicados pelo presidente Suleiman. Por fim, os membros do PSP do druso Jumblat indicarão três ministros. Os dois restantes são considerados independentes, mas amigos do Hezbolláh. Não é de todo errado dizer que o artífice dessa política vem sendo o sheik Hasan Nasralláh, uma das lideranças da resistência libanesas mais lúcidas que se tem visto.
Uma análise preliminar
O novo governo terá a mesma quantidade de ministros que o anterior, trinta ao todo. Sua composição ficou assim estabelecida: Hezbolláh – dois ministros; Amal (xiita, mas secular) – ficou com outros dois e Partido Nacional Social Sírio – um ministro. Isso totaliza cinco ministérios para xiitas. Os sunitas do primeiro-ministro Mikat terão cinco ministérios por ele indicados, além do seu vice-primeiro Ministro. Os cristãos do general Aoun, do MPL indicarão 11 ministros e mais dois maronitas indicados pelo presidente Suleiman. Por fim, os membros do PSP do druso Jumblat indicarão três ministros. Os dois restantes são considerados independentes, mas amigos do Hezbolláh. Não é de todo errado dizer que o artífice dessa política vem sendo o sheik Hasan Nasralláh, uma das lideranças da resistência libanesas mais lúcidas que se tem visto.
Hasan Nasralláh
Muitas pessoas estranharam o voto do Líbano em março passado no CS da
ONU a favor da Resolução 1971 que autorizava o bombardeio à Líbia,
votação essa que o Brasil, a Índia, a Alemanha, a China e a Rússia
decidiram – corretamente, diga-se de passagem – se abster. A explicação
tem a ver com a representação libanesa no CS ainda ser a do governo
demissionário de Hariri que não havia ainda entregue os cargos. Isso
deve mudar em curto prazo.
Há alguns destaques a serem feitos no novo ministério. O primeiro deles é que neste novo não há uma mulher sequer entre seus membros (o anterior tinha uma pelo menos). Isso reflete o ainda forte machismo da sociedade árabe em geral no OM. O segundo aspecto é que a poderosa pasta da Justiça ficou nas mãos do Hezbolláh. Acho quase impossível que o novo governo vá acatar os resultados da ata de acusação final da investigação que o TEL vai concluir, esperado para os próximos meses (ou semanas, ninguém sabe ao certo). Por fim, o novo ministro das relações exteriores será Adnan Mansour, que foi embaixador no Irã e tem fortes ligações com esse país. Desde que anunciado a formação do ministério, o presidente sírio Dr. Bashar Al Assad de imediato deu felicitações ao novo governo.
Há alguns destaques a serem feitos no novo ministério. O primeiro deles é que neste novo não há uma mulher sequer entre seus membros (o anterior tinha uma pelo menos). Isso reflete o ainda forte machismo da sociedade árabe em geral no OM. O segundo aspecto é que a poderosa pasta da Justiça ficou nas mãos do Hezbolláh. Acho quase impossível que o novo governo vá acatar os resultados da ata de acusação final da investigação que o TEL vai concluir, esperado para os próximos meses (ou semanas, ninguém sabe ao certo). Por fim, o novo ministro das relações exteriores será Adnan Mansour, que foi embaixador no Irã e tem fortes ligações com esse país. Desde que anunciado a formação do ministério, o presidente sírio Dr. Bashar Al Assad de imediato deu felicitações ao novo governo.
Najib Mikati
Só o fato do governo pró-ocidental e sem capacidade de enfrentar Israel
ter caído já é, por si só, um fato relevante. No entanto, a composição
de forças que Mikati e o Hezbolláh conseguiram esboçar em torno de um
programa patriótico, de soberania nacional, antiimperialista significa
um avanço imenso se comparado com outros países árabes da região. Mesmo
no Egito e Tunísia cujas revoluções encontram-se em estágio mais
avançados, não sabemos ainda o desfecho que podem ter.
Tenho dito, inclusive para entidades e partidos árabes que possuem ramificações no Brasil, que devemos procurar estabelecer no Oriente Médio e no Brasil, uma coalizão de forças que se assemelhe a que formamos no Líbano. Não nos cabe dizer o que os árabes devem ou não fazer. No entanto, a união das forças patrióticas, laicas e seculares, nacionalistas, socialistas e comunistas e mesmo as religiosas e confessionais que não sejam fundamentalistas, devem somar esforços e constituir frente e coalizões de caráter antiimperialistas. O acerto da aliança libanesa deve servir de exemplo para outros países, em especial a palestina que se aproxima de formar um governo de unidade nacional e para o Egito e Tunísia que terão eleições no segundo semestre.
Se isso seguir dessa forma, se as lideranças árabes, sejam elas da juventude, sindicais e dos partidos realmente comprometidos com a soberania árabe compreenderem dessa forma, temos a convicção de que os Estados Unidos e os sionistas e reacionários que governam Israel sofrerão forte e poderoso revés na sua política imperialista e de subjugação dos povos árabes. Um caminho luminoso se abrirá para os árabes.
Tenho dito, inclusive para entidades e partidos árabes que possuem ramificações no Brasil, que devemos procurar estabelecer no Oriente Médio e no Brasil, uma coalizão de forças que se assemelhe a que formamos no Líbano. Não nos cabe dizer o que os árabes devem ou não fazer. No entanto, a união das forças patrióticas, laicas e seculares, nacionalistas, socialistas e comunistas e mesmo as religiosas e confessionais que não sejam fundamentalistas, devem somar esforços e constituir frente e coalizões de caráter antiimperialistas. O acerto da aliança libanesa deve servir de exemplo para outros países, em especial a palestina que se aproxima de formar um governo de unidade nacional e para o Egito e Tunísia que terão eleições no segundo semestre.
Se isso seguir dessa forma, se as lideranças árabes, sejam elas da juventude, sindicais e dos partidos realmente comprometidos com a soberania árabe compreenderem dessa forma, temos a convicção de que os Estados Unidos e os sionistas e reacionários que governam Israel sofrerão forte e poderoso revés na sua política imperialista e de subjugação dos povos árabes. Um caminho luminoso se abrirá para os árabes.
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Sociólogo, Professor, Escritor e Arabista. Membro da Academia de Altos
Estudos Ibero-Árabe de Lisboa e Diretor do Instituto Jerusalém do
Brasil. Colunista de Oriente Médio do Portal da Fundação Maurício
Grabois – FMG. Colaborador da Revista Sociologia da Editora Escala.
E-mail: lejeunemgxc@uol.com.br
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