Vivendo no país mais rico do mundo, a classe trabalhadora estadunidense vem comendo o pão que o diabo amassou ao longo das últimas décadas. Os salários reais estão estagnados desde 1973, ou nos últimos 37 anos, ao passo que a renda das famílias mais ricas (1% da população) triplicou, conforme observou o jornalista Edward Luce, do Financial Times, em reportagem intitulada “A agonia da classe média americana”, reproduzida nesta quarta (4) pelo jornal Valor.
A crescente concentração da renda no
topo da pirâmide e o arrocho dos salários na base constituem
provavelmente as principais características do padrão de reprodução do
capitalismo americano no período mencionado, que sucedeu os chamados
“anos dourados” do pós-guerra (décadas de 1959 e 1960). Isto impactou
fortemente a chamada classe média, conforme revela Luce.
Problema estrutural
A tendência à concentração de maior riqueza num pólo e pobreza noutra
foi intensificada nos últimos anos, a tal ponto que “a maioria dos
economistas vê a grande estagnação [dos salários] como um problema
estrutural – ou seja, inume ao ciclo econômico”.
No último ciclo de expansão da economia, “que começou em janeiro de 2002 e terminou em dezembro de 2007, a renda familiar mediana americana ficou US$ 2 mil menor – a primeira vez em que a maioria dos americanos esteve pior no fim de um ciclo do que no início”.
No último ciclo de expansão da economia, “que começou em janeiro de 2002 e terminou em dezembro de 2007, a renda familiar mediana americana ficou US$ 2 mil menor – a primeira vez em que a maioria dos americanos esteve pior no fim de um ciclo do que no início”.
Sem mobilidade
Observa-se, com isto, “um declínio na mobilidade da renda”, ou seja,
“hoje, nos EUA, é menor a chance de passar de um estrato de renda mais
baixa para outro mais elevado do que em qualquer outra economia
desenvolvida.” O jornalista inglês enxerga no avanço da desigualdade “a
crise em fogo lento do capitalismo americano”.
Não surpreende que uma maioria crescente de estadunidenses tem dito, em pesquisas de opinião, acreditar que seus filhos terão um padrão de vida pior do que o deles próprios. O famoso american of way of life (modo de vida americana) já era.
Não surpreende que uma maioria crescente de estadunidenses tem dito, em pesquisas de opinião, acreditar que seus filhos terão um padrão de vida pior do que o deles próprios. O famoso american of way of life (modo de vida americana) já era.
Arrocho e despejo
As coisas pioraram com a recessão iniciada no final de 2007, que
destruiu cerca de 9 milhões de empregos, degradou um pouco mais as
condições de trabalho e rebaixou salários. Além disto, um grande número
de famílias operárias, endividada e sem renda, entrou na fila dos
despejos e amargou também a perda das residências.
As políticas públicas em geral contribuíram para aprofundar o fosso social, reforçando a acumulação de riqueza pelas famílias mais ricas e o empobrecimento da massa trabalhadora. O governo Obama não alterou a lógica do sistema.
As políticas públicas em geral contribuíram para aprofundar o fosso social, reforçando a acumulação de riqueza pelas famílias mais ricas e o empobrecimento da massa trabalhadora. O governo Obama não alterou a lógica do sistema.
Economia e política
O processo de achatamento relativo (e mesmo absoluto) dos salários foi
paralelo ao avanço do parasitismo econômico dos EUA, traduzido na
crescente dependência de capitais estrangeiros para financiar o consumo
excessivo de importados e um déficit público explosivo, que é a
contrapartida das custosas aventuras militares e de um orçamento bélico
que corresponde à metade da despesa mundial com armas e segurança.
Muitos economistas apontam a redução do poder de compra do povo trabalhador como uma das causas da mais recente recessão no país, já que estimulou a superprodução relativa de mercadorias. O baixo consumo das famílias mais pobres reduz as dimensões do mercado interno para a indústria e cria dificuldades adicionais para o comércio e a valorização.
Muitos economistas apontam a redução do poder de compra do povo trabalhador como uma das causas da mais recente recessão no país, já que estimulou a superprodução relativa de mercadorias. O baixo consumo das famílias mais pobres reduz as dimensões do mercado interno para a indústria e cria dificuldades adicionais para o comércio e a valorização.
“Durante anos, o problema foi amenizado e parcialmente oculto pela
disponibilidade de crédito barato. Americanos de classe média foram
ativamente incentivados a se endividar continuamente, oferecendo suas
casas em garantia, ou a canibalizar seus fundos de aposentadoria,
confiando em que os preços dos imóveis e as bolsas de valores
desafiariam permanentemente a gravidade (uma atitude estimulada, entre
outros, pela metade ganhadores do Nobel de Economia em todo o mundo).
Essa reserva de valor, agora, não existe mais”, sublinou.
O resultado disto foi o acúmulo de dívidas impagáveis, concentradas principalmente no ramo imobiliário, que estouraram com a chamada “crise do subprime”. O fenômeno encontra sua explicação em vários fatores econômicos e políticos, objetivos e subjetivos, entre eles a ascensão da China e outros países considerados emergentes, que teria solapado “os salários no Ocidente” e eliminado “postos de trabalho sem qualificação, semiqualificados e até mesmo qualificados. A indústria agora representa somente 12% dos postos de trabalho nos EUA.”
O resultado disto foi o acúmulo de dívidas impagáveis, concentradas principalmente no ramo imobiliário, que estouraram com a chamada “crise do subprime”. O fenômeno encontra sua explicação em vários fatores econômicos e políticos, objetivos e subjetivos, entre eles a ascensão da China e outros países considerados emergentes, que teria solapado “os salários no Ocidente” e eliminado “postos de trabalho sem qualificação, semiqualificados e até mesmo qualificados. A indústria agora representa somente 12% dos postos de trabalho nos EUA.”
Também pesou a filosofia neoliberal que guiou a política econômica dos
Estados Unidos pelo menos desde a reação conservadora do ex-ator Ronaldo
Reagan, “que acelerou o declínio dos sindicatos e reverteu os traços
mais progressistas do sistema fiscal americano” ao reduzir a carga
tributária das camadas mais ricas. No seio da classe trabalhadora os
maiores prejudicados são os imigrantes.
Leia no sitio vermelho, de onde retiramos o artigo, a íntegra da reportagem publicada pelo jornal Valor: