Um dos problemas que afloraram nesta
eleição é o da emergência dos fundamentalismos religiosos católicos e
protestantes, tentando influir nas decisões políticas do país. Até mesmo
a famosa organização fascista-católica Opus Dei, de grande penetração
na Península Ibérica, estaria presente em São Paulo, apoiando o
candidato do PSDB.
Luís Carlos Lopes no Carta Maior
Infelizmente, as eleições presidenciais não
se resolveram no primeiro turno. Ter-se-á que voltar às urnas no próximo
dia 31 de outubro. Nesta data, quando chegar a noite, o novo
presidente(a) será conhecido de todos brasileiros. Ao que parecia, no
primeiro turno, o processo eleitoral teria resolvido a mesma questão.
Mas isto não ocorreu. Os resultados impuseram a celebração do segundo
turno e para isto os candidatos e eleitores terão que se posicionar. A
política é cheia de surpresas, de revelações que precisam ser claramente
avaliadas.
A disputa voltará a ser, com mais ênfase, a luta contrária ao candidato-síntese das direitas do país. É possível que ambos disputantes digam – verdade ou mentira – que eram ambientalistas desde criancinhas, bem como, sempre defenderam os princípios religiosos, como mais importantes do que os de natureza laica, isto é, os relacionados à política real.
Equívocos sobre equívocos serão cometidos na tentativa de se obter a vitória final. É quase impossível evitar que tal ocorra, quando o objetivo se esvai em trinta dias e o que se quer é vencer de qualquer modo. De todo o jeito, é preciso lembrar que o presidente da República não é e nem será o proprietário das crenças de ninguém e que o Brasil é um país plural, onde convivem modos diversos de se crer. O que se espera é que o futuro presidente(a) garanta a continuação das conquistas dos trabalhadores, as ampliem e eleve o país a um novo patamar possível, do ponto vista social e cultural.
Um dos problemas que afloraram nesta eleição é o da emergência dos fundamentalismos religiosos católicos e protestantes, tentando influir nas decisões políticas do país. Até mesmo a famosa organização fascista-católica Opus Dei, de grande penetração na Península Ibérica, estaria presente em São Paulo, apoiando o candidato oficial do PSDB. O fundamentalismo de origem protestante renovada teria tido o seu peso nas eleições em vários níveis. Padres e pastores ultraconservadores instaram seus fiéis a apoiarem determinados candidatos e participaram na rede de intrigas sociomidiáticas que vem caracterizando esta eleição. Esta atitude vinha sendo desenvolvida em várias campanhas e problemas nacionais. Desta vez, surgiu com maior força e, talvez, para ficar.
O problema dos grupos religiosos fundamentalistas não é de natureza teológica. Eles demonstram possuir, onde atuam, uma visão política antiga que flerta com o fascismo. Segundo estas organizações, a verdade que acreditam devem ser estendidas a todos. As pessoas deveriam simplesmente obedecer como cordeiros a determinação desta minoria. Apesar de numerosos, eles são minoria e não são tão organizados como parecem ser. Suas opiniões flutuam como folhas ao vento, porque são determinadas pelo que ouvem nos seus templos e nas redes de comunicação que dominam. O recado que passaram é que existem e precisam ser considerados. Entretanto, não é difícil ver que suas convicções, quando ultrapassam o terreno religioso, são facilmente moldáveis pelas exigências que pesam sobre todo mundo, vindas da sociedade de consumo e do espetáculo, isto é, do capitalismo contemporâneo.
As próprias características das religiões professadas pelos mais fundamentalistas os aproximam de problemas materiais bastante concretos. O autor destas linhas não crê que o problema seja exatamente o aborto, praticado na ilegalidade por pelo menos três milhões de brasileiras a cada ano. Pensa que existem muitos que não crêem de fato nas mesmas coisas ditas nos templos, nos programas religiosos da TV e das emissoras de rádio, na imprensa religiosa e nos canais internéticos dominados pela ortodoxia da fé. De algum modo, eles sabem disto tudo, mesmo que neguem ou façam de conta que o mundo é exatamente o que eles acham que deveria ser. De fato, o que desejam é ser reconhecidos e precisam para isto provocar e aprender os limites de suas ações. Não se vive o mundo medieval e nem mesmo o da Reforma e o da Contra-Reforma. Queira-se ou não, religião é coisa fundamentalmente de foro íntimo, compartilhada entre iguais em lugares específicos.
É difícil imaginar que todos os eleitores que votaram sob a influência fundamentalista sejam tão radicais, e acreditem na teoria e na prática que suas verdades são inabaláveis. Certamente, entre as ovelhas existem muitas que podem ser desgarradas e entre os padres, os pastores, nem todos, são tão obedientes assim às ordens da conservação. Como quaisquer seres humanos, eles têm dúvidas e esperam ser ensinados a partir de outras fontes de autoridade, além das que se apropriaram de suas consciências. É provável que alguns queiram ser eles mesmos, por não serem absolutamente alienados ou loucos. Esses podem vir a rejeitar posturas de grupo que não contemplem diferenças individuais. Podem se dividir e votar no segundo turno de modo diverso.
Para convencê-los é preciso repolitizar o debate. A agenda básica do país não é a perseguição às religiões minoritárias e às suas crenças. Espera-se que isto jamais seja o mote de qualquer governo. O Brasil é um país tolerante a qualquer crença e a qualquer movimento religioso. As pessoas devem ser livres para acreditar no que quiserem, mas precisam ser educadas para entender que suas crenças e o modo em que vivem não são únicos. Alguém precisa lhes dizer que não se está na Idade Média, na época do nazifascismo e da ditadura militar. Todos podem ser livres responsavelmente, sabendo os limites sociais de suas liberdades. Ninguém deve impor aos outros, o que acredita como certo e inelutável. A luta é pelo convencimento livre de pressões e imposições é uma conquista que abrange a todos. Mesmo que se saiba que o problema de alguns é o da falta de escolas sérias e de mídias que realmente complementem o processo educacional.
Acha-se estéril uma discussão retórica sobre o problema do aborto. Esta não é uma questão a ser tratada no calor de uma eleição. De outro lado, mais cedo ou mais tarde ele será legalizado. Isto já ocorreu há muito tempo nos EUA, no Canadá, na Europa Ocidental e em Cuba. No Oriente inúmeras nações o legalizaram, tais como a China, a Índia, dentre outras. A América Latina é um bastião contrário, cada vez mais solitário. Todavia, há inúmeros sinais de ruptura. O mais recente foi sua legalização na cidade do México. A marcha é inexorável e precisa ser conhecida de todos. Se ele vier, quem for contrário poderá continuar a sê-lo. Ninguém será obrigado a fazê-lo. Tal como as religiões, isto é, em grande parte do mundo atual, uma questão de foro íntimo. O que tem que acabar é a hipocrisia e a exploração radical das crianças no mundo real.
A disputa voltará a ser, com mais ênfase, a luta contrária ao candidato-síntese das direitas do país. É possível que ambos disputantes digam – verdade ou mentira – que eram ambientalistas desde criancinhas, bem como, sempre defenderam os princípios religiosos, como mais importantes do que os de natureza laica, isto é, os relacionados à política real.
Equívocos sobre equívocos serão cometidos na tentativa de se obter a vitória final. É quase impossível evitar que tal ocorra, quando o objetivo se esvai em trinta dias e o que se quer é vencer de qualquer modo. De todo o jeito, é preciso lembrar que o presidente da República não é e nem será o proprietário das crenças de ninguém e que o Brasil é um país plural, onde convivem modos diversos de se crer. O que se espera é que o futuro presidente(a) garanta a continuação das conquistas dos trabalhadores, as ampliem e eleve o país a um novo patamar possível, do ponto vista social e cultural.
Um dos problemas que afloraram nesta eleição é o da emergência dos fundamentalismos religiosos católicos e protestantes, tentando influir nas decisões políticas do país. Até mesmo a famosa organização fascista-católica Opus Dei, de grande penetração na Península Ibérica, estaria presente em São Paulo, apoiando o candidato oficial do PSDB. O fundamentalismo de origem protestante renovada teria tido o seu peso nas eleições em vários níveis. Padres e pastores ultraconservadores instaram seus fiéis a apoiarem determinados candidatos e participaram na rede de intrigas sociomidiáticas que vem caracterizando esta eleição. Esta atitude vinha sendo desenvolvida em várias campanhas e problemas nacionais. Desta vez, surgiu com maior força e, talvez, para ficar.
O problema dos grupos religiosos fundamentalistas não é de natureza teológica. Eles demonstram possuir, onde atuam, uma visão política antiga que flerta com o fascismo. Segundo estas organizações, a verdade que acreditam devem ser estendidas a todos. As pessoas deveriam simplesmente obedecer como cordeiros a determinação desta minoria. Apesar de numerosos, eles são minoria e não são tão organizados como parecem ser. Suas opiniões flutuam como folhas ao vento, porque são determinadas pelo que ouvem nos seus templos e nas redes de comunicação que dominam. O recado que passaram é que existem e precisam ser considerados. Entretanto, não é difícil ver que suas convicções, quando ultrapassam o terreno religioso, são facilmente moldáveis pelas exigências que pesam sobre todo mundo, vindas da sociedade de consumo e do espetáculo, isto é, do capitalismo contemporâneo.
As próprias características das religiões professadas pelos mais fundamentalistas os aproximam de problemas materiais bastante concretos. O autor destas linhas não crê que o problema seja exatamente o aborto, praticado na ilegalidade por pelo menos três milhões de brasileiras a cada ano. Pensa que existem muitos que não crêem de fato nas mesmas coisas ditas nos templos, nos programas religiosos da TV e das emissoras de rádio, na imprensa religiosa e nos canais internéticos dominados pela ortodoxia da fé. De algum modo, eles sabem disto tudo, mesmo que neguem ou façam de conta que o mundo é exatamente o que eles acham que deveria ser. De fato, o que desejam é ser reconhecidos e precisam para isto provocar e aprender os limites de suas ações. Não se vive o mundo medieval e nem mesmo o da Reforma e o da Contra-Reforma. Queira-se ou não, religião é coisa fundamentalmente de foro íntimo, compartilhada entre iguais em lugares específicos.
É difícil imaginar que todos os eleitores que votaram sob a influência fundamentalista sejam tão radicais, e acreditem na teoria e na prática que suas verdades são inabaláveis. Certamente, entre as ovelhas existem muitas que podem ser desgarradas e entre os padres, os pastores, nem todos, são tão obedientes assim às ordens da conservação. Como quaisquer seres humanos, eles têm dúvidas e esperam ser ensinados a partir de outras fontes de autoridade, além das que se apropriaram de suas consciências. É provável que alguns queiram ser eles mesmos, por não serem absolutamente alienados ou loucos. Esses podem vir a rejeitar posturas de grupo que não contemplem diferenças individuais. Podem se dividir e votar no segundo turno de modo diverso.
Para convencê-los é preciso repolitizar o debate. A agenda básica do país não é a perseguição às religiões minoritárias e às suas crenças. Espera-se que isto jamais seja o mote de qualquer governo. O Brasil é um país tolerante a qualquer crença e a qualquer movimento religioso. As pessoas devem ser livres para acreditar no que quiserem, mas precisam ser educadas para entender que suas crenças e o modo em que vivem não são únicos. Alguém precisa lhes dizer que não se está na Idade Média, na época do nazifascismo e da ditadura militar. Todos podem ser livres responsavelmente, sabendo os limites sociais de suas liberdades. Ninguém deve impor aos outros, o que acredita como certo e inelutável. A luta é pelo convencimento livre de pressões e imposições é uma conquista que abrange a todos. Mesmo que se saiba que o problema de alguns é o da falta de escolas sérias e de mídias que realmente complementem o processo educacional.
Acha-se estéril uma discussão retórica sobre o problema do aborto. Esta não é uma questão a ser tratada no calor de uma eleição. De outro lado, mais cedo ou mais tarde ele será legalizado. Isto já ocorreu há muito tempo nos EUA, no Canadá, na Europa Ocidental e em Cuba. No Oriente inúmeras nações o legalizaram, tais como a China, a Índia, dentre outras. A América Latina é um bastião contrário, cada vez mais solitário. Todavia, há inúmeros sinais de ruptura. O mais recente foi sua legalização na cidade do México. A marcha é inexorável e precisa ser conhecida de todos. Se ele vier, quem for contrário poderá continuar a sê-lo. Ninguém será obrigado a fazê-lo. Tal como as religiões, isto é, em grande parte do mundo atual, uma questão de foro íntimo. O que tem que acabar é a hipocrisia e a exploração radical das crianças no mundo real.
Luís Carlos Lopes é professor e escritor.